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Focalizando os conceitos e/ou definições que ilustram quão complexo é o conceito de Direito, inclusive entre os próprios doutrinadores que discutem o assunto, Villey (1999) reconhece a dificuldade em conceituar o Direito ao dizer que “o problema mais

abstrato e mais difícil de conceber na filosofia do direito” (p.24). Defende o autor francês

que a arte jurídica depende de um recorte inicial que engloba “o conteúdo da legislação, a

extensão da missão do juiz e os programas de ensino do direito”.

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Ao apresentar sua definição a respeito desta ciência, Boaventura (1988, p. 72) afirma que o Direito "é o conjunto de processos regularizados e de princípios normativos,

considerados justiciáveis num dado grupo, que contribuem para a criação e prevenção de litígios e para a resolução destes através de um discurso argumentativo, de amplitude variável, apoiado ou não pela força organizada”.

No entendimento de Del Vecchio (1953, p. 218) o “Direito é a coordenação

objetiva das ações possíveis entre vários sujeitos, segundo um princípio ético que as determina, excluindo delas qualquer impedimento”.

Mais fácil do que encontrar uma definição que seja unanimidade entre os teóricos e doutrinadores é identificar os denominadores comuns quanto à função das Ciências Jurídicas e do Direito, que significa fazer justiça e mediar os conflitos existentes, seguindo os princípios constitucionais e os códigos processuais de cada país em que são disciplinadas as condutas dos indivíduos.

É certo que o estabelecimento do significado atribuído ao Direito bem como a definição dos direitos inerentes à pessoa humana não foram construídos de uma vez, mas aos poucos, de forma gradual e em atendimento às necessidades sociais. Assim, os direitos do homem são direitos históricos. Conforme preceitua Bobbio (1992, p.5), "os direitos do

homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas”.

Demonstrando a necessidade do direito na vida do homem a partir do momento em que este passou a viver em sociedade, Marinela (2013, p.1) esclarece que o Direito torna viável a vida em sociedade, mantém o equilíbrio entre as complexidades inerentes ao ser humano, além de assegurar a existência do Estado e a coexistência pacífica dos indivíduos.

“Desde que o homem passou a viver em sociedade, abdicou de uma parcela de sua liberdade, buscando, como contrapartida, normas e regras que garantissem sua segurança e os seus direitos. Assim surgiu a necessidade do Direito, enquanto conjunto de normas de conduta, impostas coativamente por um Estado politicamente organizado, traduzindo-se em princípios reguladores do convívio social tendentes a realizar a busca pela Justiça. A sistematização desses princípios de conduta social, em normas legais, constitui a denominada ordem jurídica, ou seja, o sistema legal adotado para assegurar a existência do Estado e a coexistência pacífica dos indivíduos em sociedade.”

A autora afirma ainda que o Direito regula o convívio social, administra e busca a solução de conflitos existentes em todas as esferas da existência e mantém a justiça acima de

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tudo. Cumpre este papel por meio de suas duas estruturas, a externa e a interna. A primeira é formada pelas leis ou pelos costumes e a interna é aquela que integra o interesse protegido, a redução do que é injusto ou ilícito e a sanção correspondente.

Surge, neste ponto, a necessidade da lei, que é um produto do ato legislativo, sendo a lei jurídica uma regra imperativa de caráter geral. Juridicamente a lei está inserida entre as leis humanas, porque provém diretamente das leis éticas ou morais, constituindo regra de conduta social, que regula a conduta dos seres humanos entre si.

Sabe-se que a prática do Direito é regulada por normas, que são criadas com base nos costumes. De acordo com Bruhl (1961, p.45) “todo costume novo provém de uma

invenção individual. Em sentido amplo, o costume serve de base para a criação da norma jurídica legislativa”. Pinho e Nascimento (1986, p. 45), ao tratarem da lei e do costume,

destacam tanto os pontos de identidade como as diferenças existentes entre estas duas fontes do direito, conforme suas palavras:

“a lei e o costume têm pontos semelhantes, pois ambos são a expressão da vontade do grupo. Diferem, no entanto, porque o costume é espontâneo e ‘inconsciente’ e a lei emana de um órgão técnico por meio de um processo próprio de elaboração. A lei expressa-se por intermédio de fórmulas redigidas por escrito e o costume é oral.”

Para além da lei e do costume, uma corrente de doutrinadores considera a doutrina e a jurisprudência também como fontes do Direito. Nader (2009, p. 45) faz parte deste grupo e define a doutrina como sendo os “estudos e teorias desenvolvidas por juristas com o objetivo

de sistematizar e interpretar as normas vigentes e de conceber novos institutos jurídicos”.

Um dos argumentos utilizados pelos juristas que não concordam com o posicionamento defendido por Nader é o de que a doutrina se apresenta como um modelo dogmático, não exercendo disciplina nas relações da sociedade. No entanto, mesmo discordando de Nader e defendendo que a doutrina se apresenta unicamente na forma de teoria determinista, Reale (2009, p. 176) afirma que “a doutrina participa de forma indireta,

sendo uma das molas propulsoras do ordenamento jurídico”.

Com relação à jurisprudência, que é a forma pela qual os tribunais se orientam para solucionar dilemas distintos, a definição oferecida por Diniz (1993, p.59) parece estar completa, conforme é reproduzida a seguir: “jurisprudência é o conjunto de decisões

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constituindo uma norma geral aplicável a todas as hipóteses similares e idênticas. É o conjunto de normas emanadas dos juízes em sua atividade jurisdicional”.

A conceituação de Barros (2010, p.156) complementa o significado de jurisprudência, ao esclarecer que “de origem etimológica vinculada ao termo ‘prudência’,

como virtude intelectual dirigida para a prática, para a ação honesta, leal e justa, entre os romanos, a jurisprudência representou a grande força criadora da ordem jurídica”.

Após a apresentação das tradicionalmente consideradas fontes do Direito, quais sejam: a lei, os costumes, a jurisprudência, os princípios gerais do direito e a doutrina, chega- se, por fim, à estrutura interna do Direito, sendo fundamental registrar-se também a diferença entre direito objetivo e direito subjetivo, o que será feito logo a seguir.

Enquanto para Ruggiero (1935, p.37) o direito objetivo “é o conjunto das regras

impostas aos indivíduos nas suas relações externas”, Bevilacqua (1929, p.66) entende como

direito subjetivo “um poder de ação assegurado pela ordem jurídica”.

Destaca-se aqui o pensamento de uma das três correntes básicas acerca do direito subjetivo, que vem a ser a teoria do interesse, defendida pelo jurista alemão Rudolf Von Ihering. Para aquele pensador, do século XIX, o direito subjetivo significa o interesse juridicadamente protegido por meio de uma ação judicial - “jus est facultas agendi” - que se fundamente na faculdade derivada da norma, da qual é possuidor o ser humano, no sentido de poder invocar a lei na defesa de seus interesses.

Após as considerações sobre alguns dos principais temas do Direito e de sua estrutura, ainda que de forma resumida e geral, torna-se fundamental retomar a afirmação feita no início deste capítulo que ao definir o Direito descatou a importância de se deter a atenção no papel que este cumpre na vida dos cidadãos, enquanto garantia de segurança física, moral e patrimonial, no sentido de possibilitar o convívio humano em sociedade. Em outras palavras, pode-se afirmar, portanto, que o Direito é a base para a manutenção da ordem social, a qual, por sua vez, visa ao estabelecimento de uma situação de igualdade entre todos os membros de uma mesma sociedade.

Contudo, importa mencionar que tanto o não cumprimento das leis, quanto o excesso de legislação e a sobreposição de uma lei à outra, ou uma redação inadequada, que prejudica ou mesmo deturpa o entendimento, e ainda o desuso da lei, tornam-se sérios obstáculos para a ordem social e muitas vezes contribuem para o estabelecimento e a permanência de um estado de desequilíbrio e exclusão permanentes.

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A legislação passa, então, numa situação como esta, a ser um instrumento de dominação de uma determinada classe e pelos representantes de seus interesses. A justiça, assim, deixa de ter dois pesos e duas medidas e confirma o adágio do “um peso e duas medidas”.

Pode-se afirmar, por fim, que assim tem sido a situação vivida por muitos Auxiliares Locais contratados pelo Estado brasileiro, no exterior, diante do emaranhado de leis inadequadas, sobrepostas e até mesmo inconstitucionais, adotadas para tratar de suas questões trabalhistas e previdenciárias. Tudo isto vem contribuindo para a ausência de proteção de direitos constitucionalmente reconhecidos aos Auxiliares Locais, o que se pretende demonstrar ao longo deste trabalho.