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Relação Trabalhista entre os Auxiliares Locais e o Estado Brasileiro

O MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DO BRASIL

EMPREGOS E FUNÇÕES GAP

4.2 Relação Trabalhista entre os Auxiliares Locais e o Estado Brasileiro

Da análise das normas aplicadas aos Auxiliares Locais, desde quando a figura deste agente público apareceu no sistema jurídico brasileiro, verifica-se que nunca houve a criação de cargo público a eles destinado, tendo sido as contratações, ao longo de todo o tempo, sempre realizadas por meio de contrato de trabalho firmado entre o cidadão, brasileiro ou estrangeiro, e o Estado brasileiro, por intermédio de seus órgãos no exterior.

Considerando, então, que a relação existente entre os Auxiliares Locais e o Poder Público sempre foi de natureza contratual, forçoso reconhecer que o vínculo jurídico é de relação trabalhista aplicada às pessoas jurídicas com personalidade de Direito Privado, regida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Tal conclusão decorre do fato de que, no Brasil, só existem dois regimes trabalhistas: um destinado aos trabalhadores em geral (celetista), a depender da atividade exercida e da legislação de regência, e outro destinado exclusivamente aos servidores ocupantes de cargo público efetivo ou em comissão, criados por lei.

A situação dos Auxiliares Locais é extremamente peculiar, na medida em que as legislações vigentes, conforme apresentado no item anterior, pretendem impor o regime trabalhista vigente no país em que tais agentes são contratados, com aparente exclusão de incidência de todas as regras trabalhistas brasileiras, o que, na maioria dos casos, tem representado uma situação inconciliável.

Além disso, há que se destacar o fato de que os Auxiliares Locais não integram qualquer carreira do Quadro da Administração Pública brasileira, pois inexiste no ordenamento jurídico brasileiro alguma lei que tenha criado os cargos ou empregos públicos típicos das funções por eles exercidas, conforme determina a legislação pátria.

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Ressalte-se, ainda, que os Auxiliares Locais, admitidos antes e/ou depois da Constituição de 1988, vêm sendo contratados sem prévia submissão a concurso público, não obstante a previsão da atual Carta Magna de que a admissão ao exercício de cargos efetivos e empregos públicos deve ser precedida de concurso.

Tais fatos, portanto, merecem especial análise, a fim de se verificar a pertinência desta situação frente às normas brasileiras, relativamente à admissão sem concurso públicos de agentes que prestam serviços ao Estado brasileiro, em especial a Constituição Federal brasileira vigente desde 1988 no país.

Fato é que os Auxiliares Locais são admitidos por contratos de trabalho firmados diretamente entre o cidadão e a Administração Pública direta federal, especificamente pelos Postos do Ministério das Relações Exteriores do Brasil sediados no exterior, que nada mais são que órgãos do Governo autorizados a realizar atos em nome deste e, por não possuírem personalidade jurídica própria, estão sujeitos aos regramentos impostos pela Constituição à Administração Pública.

Conforme delineado no segundo capítulo deste trabalho, nos termos da carta constitucional vigente, somente é possível a admissão de pessoal, pela Administração Direta, para o exercício de cargo, emprego ou função pública, sendo que para cada uma dessas categorias há regramento próprio e específico, determinado em legislações infraconstitucionais brasileiras.

Nesse sentido, induvidoso é o fato de que os Auxiliares Locais, sejam eles brasileiros ou estrangeiros, são contratados de forma direta pela Administração Pública, contudo, as normas infraconstitucionais que regulam tal contratação preveem a submissão a regramento legal de outro país, o que parece não ser consentâneo com a ordem constitucional em vigor.

Esse, portanto, o ponto nodal da presente tese, tendo em vista que a definição da natureza jurídica da relação existente entre o Estado e os Auxiliares Locais é o primeiro passo para se alcançar soluções para tantos outros problemas decorrentes dessa relação.

É necessário, pois, verificar a legalidade e constitucionalidade da contratação dos Auxiliares Locais sem a prévia realização de concurso público e mediante contrato de trabalho regido pela CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, pois a Lei n.º 8.112/90 impôs o regime estatutário a todos os servidores da União, tendo transformado todos os então empregos públicos em cargos públicos, quando preenchidos os requisitos.

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Vale lembrar que hoje só se aplica o regime de emprego público aos agentes públicos contratados pelas entidades da administração indireta com personalidade jurídica de direito privado, quais sejam, as fundações de direito privado, as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

Não obstante a Emenda Constitucional n.º 19, de 1998, ter alterado o artigo 39 da Constituição, extirpando a exigência de fixação de regime jurídico único aos servidores da Administração direta, das autarquias e das fundações públicas, a nova redação encontra-se suspensa por força de cautelar deferida pelo Supremo Tribunal Federal em acção direta de inconstitucionalidade, sendo certo que desde agosto de 2007 a Administração Pública direta, as autarquias e as fundações públicas só podem contratar pelo regime jurídico estatutário, ou seja, para o exercício de cargo público e mediante prévia aprovação em concurso.

Em face, portanto, da atípica situação trabalhista dispensada aos Auxiliares Locais, tem-se visto tramitar, no Poder Judiciário brasileiro, um sem número de ações judiciais nas quais esses agentes solicitam o direito ao enquadramento em cargo público, o que tem sido atendido, na maioria dos casos, especialmente em relação àquele pessoal admitido antes da edição da Lei n.º 8.112/90, que instituiu o regime jurídico dos servidores da Administração Direta, Autarquias e Fundações Públicas Federais.

Nos próximos itens, por oportuno, apresentar-se-á a evolução do posicionamento da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, os quais, há algum tempo, vêm apreciando a matéria relativa ao regime jurídico aplicável aos Auxiliares Locais. Ainda, será apresentada a atual situação dos auxiliares local perante a Suprema Corte Brasileira.

4.2.1 Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal

Regional Federal

Nas duas últimas décadas, os Auxiliares Locais que atuam nos mais variados postos do Brasil no exterior passaram a requerer, judicialmente, o enquadramento como servidores públicos nos quadros da carreira do Ministério das Relações Exteriores.

Em sua grande maioria, os Auxiliares Locais autores dessas demandas foram contratados pelo Poder Público brasileiro antes do advento da Constituição Federal de 1988 e permanecem até hoje atuando na mesma função.

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Há inúmeros julgados do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região reconhecendo o caráter de cargo público da relação trabalhista firmada entre os Auxiliares Locais contratados antes do advento da Constituição Federal Brasileira, em face do que dispôs o artigo 243 da Lei n.º 8.112/90, conforme explicitado no terceiro capítulo deste trabalho.

Como já dito anteriormente, no Estado brasileiro há apenas dois regimes trabalhistas, o celetista e o estatutário, sendo que os Auxiliares Locais sempre foram admitidos pelo regime trabalhista comum, por meio de contrato de trabalho, contudo, a Lei n.º 8.112/90, ao instituir o regime jurídico único para os servidores federais da Administração Pública direta e para as autarquias e fundações públicas, integrantes da Administração indireta, transformou todos os então empregos públicos em cargo, razão pela qual referidos Tribunais reconhecem que o Auxiliares Locais contratados antes do advento do estatuto dos servidores públicos civis da União, ou seja, antes de 11/12/1990, devem ser enquadrados nos quadros de servidores públicos da Administração Direta.

O regime jurídico dos Auxiliares Locais, como dito no item anterior, é ponto nodal para a solução de problemas decorrentes da admissão deste pessoal, sendo de absoluta relevância a formação de entendimento jurisprudencial sobre o tema no Brasil.

Em face disso, foram inseridas, no rol de anexos deste trabalho (ANEXOS H e I), as ementas de julgados do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em ordem crescente de data de julgamento, podendo-se observar que referidos julgados remontam ao ano de 1999 e vêm sendo repetidos até os dias de hoje, tratando-se, pois, de entendimento pacífico e consolidado no Judiciário brasileiro.

Confiram-se, a título ilustrativo, os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça, o primeiro julgado em 2003 e o segundo julgado em 2013, dez anos depois, a demonstrar que há muito o Judiciário brasileiro reconhece que os Auxiliares Locais contratados antes de dezembro de 1990 deveriam ter sido inseridos no quadro de servidores públicos ocupantes de cargo público, por força do artigo 243 da Lei n.º 8.112/90, a qual instituiu o regime jurídico único dos servidores públicos da Administração direta federal em atenção ao determinado no artigo 39, caput, da Constituição brasileira de 1988, in verbis:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. AUXILIAR LOCAL. EMBAIXADA BRASILEIRA NO EXTERIOR. ARTIGO 243 DA LEI Nº 8112/90. ENQUADRAMENTO COMO ESTATUTÁRIO. PRECEDENTES. ORDEM CONCEDIDA. I - Anteriormente à Constituição Federal de 1988, os servidores públicos ou eram funcionários públicos, regidos pela Lei nº 1.711/52, ou então

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empregados públicos, regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho. Os Auxiliares Locais, que prestavam serviços nas Embaixadas Brasileiras no Exterior, não sendo titulares de cargos públicos, enquadravam-se na categoria de empregados públicos, sob a regência da legislação trabalhista brasileira, nos termos do artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho. II - A legislação especial que dispôs sobre a situação dos funcionários do Serviço Exterior - Lei nº 7.501/86, Lei nº 8.745/93 e Decreto nº 1.570/95 - assegurou aos Auxiliares Locais a aplicação da legislação brasileira, inclusive dispondo sobre o direito de opção. III - Consoante já se manifestou a Eg. Terceira Seção, os Auxiliares

Locais - prestadores de serviço a órgão público no exterior - submetidos ao regime celetista, mediante contrato de trabalho firmado por prazo indeterminado, foram alcançados pela regra prevista no artigo 243 da Lei nº 8.112/90, submetendo-se ao Regime Jurídico com todos os direitos decorrentes dessa extensão. Precedentes. IV - Ordem concedida. (MS 8.680/DF, Rel.

Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 12/11/2003, DJ 09/12/2003, p. 207).66 (grifei)

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. AUXILIAR LOCAL. COMISSÃO MILITAR BRASILEIRA NO EXTERIOR. ENQUADRAMENTO. ART. 243 DA LEI N. 8.112/1990. POSSIBILIDADE. APOSENTADORIA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. NECESSIDADE. 1. A jurisprudência do Superior

Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o Auxiliar Local de representação diplomática ou repartição consular brasileira no exterior, contratado anteriormente ao advento da Lei n. 8.112/1990, tem assegurado o enquadramento no regime jurídico dos servidores públicos civis da União, em observância ao disposto no art. 243 do referido normativo. 2."O fato de ter sido excluída a expressão 'legislação brasileira' do regime a ser aplicado ao Auxiliar Local, por força da redação conferida ao art. 67 da Lei n. 7.501/1986 pela Lei n. 8.028/1990, não excluiu dos Auxiliares Locais a aplicação do regime da CLT, uma vez que tão somente determinou a observância da 'legislação que lhe for aplicável'". (EDcl no MS 8.802/DF, Rel. Min. ARNALDO

ESTEVES LIMA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/9/2005, DJ 7/11/2005). 3. No que tange ao pedido de aposentadoria, a impetrante não fez prova pré- constituída de ter satisfeito os requisitos legais, tornando inviável a apreciação de tal pleito em sede de ação mandamental, que não admite dilação probatória. Ressalte-se que, uma vez obtido o enquadramento na Lei n. 8.112/1990, poderá a servidora pleitear aposentadoria estatutária, no âmbito administrativo ou judiciário (vias ordinárias). 4. Segurança concedida, em parte, a fim de determinar o enquadramento da impetrante como servidora estatutária, nos termos do art. 243 da Lei n. 8.112/1990, com os consectários legais correspondentes. (MS 9.698/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES, TERCEIRA

SEÇÃO, julgado em 12/06/2013, DJe 26/06/2013).67 (grifei)

Não é diferente o entendimento do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, conforme se vê dos seguintes precedentes, in verbis:

TRABALHISTA. AUXILIAR ADMINISTRATIVO DO CONSULADO GERAL DO BRASIL EM FRANKFURT. LEI 7.501/61, ART. 44. SERVIDORA COM MAIS

66 Disponível em https://ww2.stj.jus.br/processo/revistaeletronica/inteiroteor?num_registro=2002/0128269-

4&data=9/12/2003. Acesso em 28.09.2013.

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Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200400642719&dt_publicacao =26/06/2013. Acesso em 28.09.2013.

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DE 5 (CINCO) ANOS DE EXERCÍCIO CONTINUADO, EM 05.10.88. LEI 8.745/93. INAPLICABILIDADE. ADCT/88, ART. 19. LEI 8.112/90, ART. 243. ENQUADRAMENTO COMO AGENTE ADMINISTRATIVO. 1. O art. 44 da Lei

nº 3.917/81, que autorizava a contratação de Auxiliar Local em caráter