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Entre os sistemas históricos encontra-se, bem sabemos, o capitalismo, do qual trataremos no restante deste estudo. Veremos que tudo dito no correr deste capítulo poderá fornecer elementos para que comecemos a esclarecer a lógica neguentrópica que preside as atividades de uma empresa voltada para o lucro, muito particularmente no estágio atual alcançado pelo modo de produção capi- talista quando, segundo Carlota Perez, a “tendência é aumentar o conteúdo de ‘informação’ nos produtos, mais do que o conteúdo energético ou material”60.

O que vem a ser essa “informação” à qual Perez ainda se refere aspeada- mente, como alguma coisa assim pouco esclarecida, como que pedindo desculpas pelo uso de um termo impreciso, até de duvidosa legitimidade?

Com base em toda a argumentação desenvolvida até aqui, podemos suge- rir agora uma compreensão da informação, centrada na especificidade informa- cional do ser humano:

Informação é um processo de interação semântico-sintática que orienta o trabalho não espontâneo necessário à manutenção e expansão da neguentropia dos sistemas históricos*.*

O “conteúdo informacional dos produtos”, pois, é uma realização semân- tico-sintática da sociedade, através dos bens que produz e consome, conforme discutiremos nos demais capítulos. É parte de um processo informacional que organiza material e culturalmente o ser humano, sendo realização dessa orga- nização. Este processo é produto do desequilíbrio energético original da espécie biológica e meio de acumulação desse desequilíbrio. Por outro lado, é incerteza que orienta a sua ação, mas, dada a dimensão semântica dessa incerteza, pode codificá-la na forma dos projetos que conduzem a ação do Homem na História.

Viemos, ao longo deste capítulo, nos acercando de nosso objeto, até che- garmos a uma compreensão do fenômeno informacional que não exclui os enun- ciados e conceitos anteriores mas, ao contrário, provém deles, desdobra-se deles, e neles se articula na totalidade do conhecimento atualmente possível sobre o Universo. Vimos como Brillouin ampliou a discussão e conhecimento da informa- ção, a partir das formulações originais de Shannon, esclarecendo a relação entre informação e trabalho (neguentropia). Atlan, em seguida, tornou mais abrangen- te as idéias de Brillouin, ao tratar da informação no sistema (conceito estabele- cido por von Bertalanf fy... ou por Bogdânov?), daí redefinindo (positivamente) a noção e função do ruído, fenômeno identificado também originalmente (mas de modo negativo), por Shannon. Eco, também remetendo inicialmente a Shannon, nos ajudou a precisar a fronteira entre um campo quantificável dos sinais, e ou- tro, semântico, não quantificável (a priori, poderia acrescentar Atlan).

Se é fato, como sustenta Lucien Sfez61, que das idéias de Shannon derivou

um programa teórico e práticas sociais distintos daqueles derivados das idéias de Atlan e de outros biólogos; também é fato que eventos elementares do mundo físico ou biológico não podem ser percebidos de modo muito diferente daquilo que realmente são. Num exemplo simples, dualistas ou monistas, ou, adotando a

* Um ano após concluído e defendido este estudo, e escritas essas palavras, o prof. Michel Thiollent observar-

me-ia, com razão, a ausência, nele, de uma terceira dimensão essencial ao estudo da informação, a pragmática. A relação da informação sintático-semântica com a ação (pragmática) será desenvolvida posteriormente, no douto- rado. No entanto ela já está pressuposta na própria relação estabelecida, nesta última definição, entre informação e trabalho. (N2011).

dicotomia política, conservadores ou reformistas, reconhecemos todos os mes- mos efeitos da lei da gravidade. Os ângulos de abordagem dos eventos e, a partir daí, as muitas direções que podem tomar os seus estudos, os graus de aprofunda- mento a que podem chegar, e a utilidade social que podem demonstrar, é que vão variar, ou mesmo conflitar. Das idéias de Shannon, associadas às de von Neumann e outros, derivarão as teorias que permitirão projetar e construir máquinas e sis- temas homeostáticos ligados ao tratamento automático da informação: compu- tadores, ro bôs, programas de “inteligência artificial” etc. Da sua crítica e negação, afirmar-se-ão novas idéias mais adequadas à compreensão das contradições da vida e da sociedade, hoje em dia cada vez mais incorporadas aos estudos ecológi- cos e, também, a conceitos mais avançados de gestão empresarial.

Este segundo programa teórico nos permitiu desdobrar, ao longo deste capítulo e visando o estudo do trabalho social humano, um conceito de informa- ção que nos parece corresponder às categorias e operações do método dia lético- materialista pois percebe a informação em sua totalidade natural e histórica; rela- ciona as suas dimensões quantitativa e qualitativa; apreende o movimento interno de seus processos através de sucessivas negações e afirmações; identifica as deter- minações entre os seus elementos constituintes fundamentais. A informação nos surge como aquele evento real e, no limite, mate rial (pois que energeticamente de- terminado) do movimento do pensamento, cuja forma Hegel estudou e descreveu, cabendo a Marx apontar para os seus fundamentos materialistas. Por fim, o con- ceito aqui proposto nos fornece uma linguagem comum e operacional, respeitadas as especificidades de cada campo de estudo ou trabalho, para o físico, o biólogo, o engenheiro, o economista, o filósofo, o jornalista, o bibliotecário, o semiólogo, o técnico fabril, o caixa bancário - para todos que sejam, de diferentes maneiras, tra- balhadores com Informação. Vale dizer, para praticamente todos os trabalhadores inseridos no modo de produção capitalista avançado.