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O trabalho com informação consiste em tornar disponível algum dado necessário a alguém ou, no limite, em introduzir esse dado na máquina ou em algum outro objeto material de trabalho. Para cada indivíduo inserido na produ- ção capitalista e para o conjunto dos indivíduos, esse trabalho é um exercício de busca e de processamento. Na busca, cada indivíduo coleta, copila, reúne dados diversos. No processamento, ele relaciona esses dados para obter um dado novo, necessário à busca que outros indivíduos realizam ou para o movimento de sub- sistemas de trabalho morto.

Essas atividades de busca e processamento resultam num valor de uso que não está necessariamente contido nas formas possíveis dos materiais uti- lizados para comunicá-lo: como o valor de uso da informação consiste na ação que proporciona ao agente, em princípio pouco lhe importa se a mensagem lhe chega pelas vibrações do ar, em folhas de papel, ou pela rede de computadores. Importa-lhe, sim, o tempo (Capítulo 1). O valor de uso será tanto mais apreciado quanto mais facilmente acessível estiver o evento informativo, quanto mais ra- pidamente ele possa ser obtido pelo agente. Este último aspecto foi confirmado por Allen, em sua longa e detalhada investigação em projetos de engenharia en- comendados pelo governo norte-americano a uma grande indústria de material bélico2. Em relação às fontes de informação mais buscadas pelos engenheiros,

Allen constatou existir “forte relação entre a acessibilidade do canal e a freqüên- cia de uso. A correlação com o fator custo (0,6) é apontada em primeiro lugar com mais que o dobro da relativa ao fator qualidade (0,28) [...] é a acessibilidade que quase exclusivamente determina a freqüência de uso [...] A partir de 154 bus- cas em informação relatadas por 19 engenheiros, nós pudemos realizar um outro teste sobre hipóteses de seleção de canais, mirando para os canais abordados em primeiro lugar, em cada busca. Uma vez mais, a acessibilidade do canal aparece como critério dominante sobre o qual se baseia a seleção”3. Como temos susten-

tado, o valor esperado da informação corresponde ao tempo poupado no pro- cessamento da incerteza, uma vez o dado obtido já atenda ao objetivo da busca.

O trabalho de busca e processamento, portanto, visa, em essência, tornar imediato o acesso a um dado, acesso este que, obviamente, não foi imediato para quem fez a busca e processamento (quem despendeu tempo de trabalho), mas o será para quem utilizou o seu resultado. Este resultado, pois, é um valor espera- do por um indivíduo, empresa ou outra organização social, mas gerado por outro subsistema. Este valor somente pode realizar-se na comunicação. Uma Economia Política da Informação terá que buscar o valor da informação produtiva ali onde ele é efetivamente realizado: no ato de comunicar, na relação que estabelece en- tre dois ou mais indivíduos sociais, ou entre duas ou mais organizações sociais.

O engenheiro que processa incerteza gera e comunica valor esperado para a empresa que emprega o seu trabalho. A empresa gera e comunica valor espera- do para os seus consumidores. Esta lógica, em outras palavras, está descrita por Porter, na sua teoria da “cadeia de valor”. Cada departamento de uma unidade empresarial gera (ou não) valor para outro; cada unidade empresarial transfere o produto desse valor gerado internamente, para seus usuários; cada unidade empresarial é, também, elo de uma cadeia de valor constituída por muitas unida- des, como fornecedora ou compradora. O objetivo da empresa é gerar valor para os seus clientes mas “a questão crucial na determinação da sua lucratividade é se pôde capturar o valor criado para os clientes, ou se este valor foi dividido com outros”4. Na medida em que a empresa gera valor e o “captura” - palavra correta!

- ela cresce, ou, nos nossos termos, ela se incorpora novos níveis de organização sistêmicos: equipamentos, empregados, filiais, investimentos etc. Se não o faz, algum outro competidor o fez - e cresceu em seu lugar.

O valor esperado, desde a origem, está determinado pelo seu uso, está definido pela utilidade que a informação processada terá para alguém. O valor esperado - valor temporal - é o seu próprio uso. Mas este valor de uso, se não mais resulta de um quantum de trabalho simples imediato, está subordinado à complexidade da tarefa, à quantidade e qualidade das interações que exige e, inclusive, ao trabalho so cial já acumulado antes em outros dados eventualmen- te recuperados para a sua consecução. Esquematicamente, o processo pode ser

descrito como se segue. Um dado, que chamaremos I, resulta de outros dados re- lacionados entre si e nele incorporados e contidos. Uma pessoa ou empresa que recebe este dado I, poupou-se tempo em processar os elementos que o geraram mas deverá relacioná-lo a novos elementos - a, b, c,... n - para obter um novo dado J que fornecerá a outra pessoa ou empresa. Esta agora poupou-se o tempo de busca em J e, também, o tempo de busca em I, contido em J. Se transferir J, outro agente o relacionará a elementos p, q, r,... z, para obter K, mas não terá gasto o tempo na busca de J e de I, já realizadas por outros subsistemas sociais, a mon- tante. Logo, cada elo social vai se adjudicando o valor de uso de sucessivos não- tempos acumulados, isto é, de sucessivas trabalhos que se poupou a si mesmo porque realizados em outros elos da cadeia. Cada elo repassa esses não-tempos acumulados, acrescidos do seu tempo, mas este acréscimo, para o elo seguinte, é não tempo como qualquer outro, até porque não-tempo é obviamente imensurá- vel. O dado, pois, pode ser entendido como a forma objetiva do não-tempo ganho por algum agente social que busca sustentar sua neguentropia.

Ao possibilitar a sucessivos agentes eliminar tempo socialmente acumula- do de busca e processamento, o valor de uso não transfere o tempo de trabalho social nele consumido. Assim, qualquer indivíduo ou empresa, mesmo dispostos a reconhecer algum valor ao trabalho que lhes poupou tempo, não aceitarão ar- car com o custo de todo o tempo de trabalho efetivamente aí empregado, tempo este que, sendo so cial, deveria também incorporar outros “tempos subsidiários”. Defrontamo-nos pois com uma inerente desigualdade entre o valor do trabalho para quem o realizou e o valor do resultado para quem o utilizará. Uma desigual- dade, aliás, coerente com a natureza intrínseca da informação, enquanto origina- da de algum desequilíbrio energético, conforme discutimos no Capítulo 1. E que corrobora os impasses aos quais chegaram os neo-clássicos, conforme vimos no Capítulo 4.