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2 Fundamentação teórico empírica

2.2 Aprendizagem pela experiência

2.3.3 Concepções acerca de emoções no processo de aprendizagem

A aprendizagem sobre as dinâmicas emocionais no contexto gerencial é muitas vezes percebida como desconfortável, complicada e parcial, sendo por muitas vezes evitada ou

ignorada (VINCE, 2001, 2002, 2011). Woerkom (2010) e Simpson e Marshall (2010) também reforçam que as emoções são geralmente tratadas em termos negativos, como agentes de bloqueio, de distorções e subversivas à aprendizagem. Acerca disso, Vince (2002) destaca que as respostas emocionais, especialmente medos e ansiedades, podem atrapalhar de fato, contudo, elas podem também criar a base para a aprendizagem. Nesse sentido, Woerkom (2010) enfatiza que as emoções são indispensáveis para a construção de conhecimento. O referido autor também aponta que pesquisas recentes conduzidas por neurologistas e educadores mostram uma forte conexão entre emoções e razão, sentimentos e pensamento, refutando a ideia de que as emoções sejam inimigas da razão.

De acordo com Vince (2011), um tema recorrente na aprendizagem gerencial é a compreensão das dinâmicas emocionais que permeiam as funções gerenciais. Contudo, este questionamento não é facilmente resolvido, pois temas como ansiedade, incerteza e conflito são áreas da experiência gerencial que devem primeiramente ser sentidos para serem compreendidos. Diante disso, segundo Vince (2001), gerenciar a aprendizagem significa gerenciar ansiedade, pois o papel de um gestor envolve uma conexão emocional com a ansiedade no trabalho. O mencionado autor ressalta também que a aprendizagem é improvável de ocorrer sem que haja ansiedade; e o impacto da ansiedade na aprendizagem pode tanto promover ou desencorajar a aprendizagem, conforme apresentado na Figura 2 (2) a seguir.

Figura 2 (2) – Ansiedade e os dois caminhos Fonte: Vince 2002 p.78

A Figura 2 (2) ilustra os dois diferentes caminhos que podem ser trilhados após o surgimento da ansiedade. Apesar de ser difícil atribuir uma causa particular à ansiedade, de acordo com Shipton e Sillince (2012) ela pode ser descrita como um senso de apreensão ou expectativa de perigo. No ciclo superior, o qual promove a aprendizagem, a incerteza gerada pela ansiedade pode ser suportada por tempo suficiente para que um risco seja tomado. Assim, o risco, juntamente com a dificuldade que emerge, geralmente direcionam o indivíduo a novos conhecimentos ou ideias. Contudo, no ciclo inferior, o qual desencoraja a aprendizagem, a incerteza não pode ser suportada e a ansiedade desencadeia uma negação ou fuga das emoções que aparentam ser muito difíceis de lidar. Neste ciclo, a resistência que surge da ansiedade leva à uma ignorância consentida. Assim, ao sentir ansiedade, indivíduos e grupos vivem um momento estratégico, onde podem ser direcionados para a aprendizagem, ou para o desencorajamento dela (VINCE, 2002).

Ademais, a perspectiva construtivista compreende que a aprendizagem envolva o corpo, a mente, emoções e relações sociais ao passo que os indivíduos tem experiências para construir aprendizado (FENWICK, 2003). Segundo Elkjaer (2013), uma experiência contempla mais do que o pensamento e o conhecimento, uma vez que a intuição, a emoção e o corpo também são constituintes da experiência e os gatilhos para a investigação. Shipton e Sillince (2012) também apontam que a aprendizagem contempla pensamento, sentimento e comportamento. Nesse sentido, Jordi (2011) e Woerkom (2010) enfatizam a necessidade dos estudos conferirem a mesma atenção ao corpo que é dada à mente, e a sugestão de que contemplem sentimentos e emoções como fontes de conhecimento experiencial.

Segundo Dewey (1934), acredita-se, geralmente, que as emoções são simples e compactas e tratadas como se fossem uma entidade que entrasse completa nas situações. Contudo, as emoções são conectadas a eventos e a objetos em movimento. Elas pertencem ao indivíduo, mas ao indivíduo que está interessado no movimento dos eventos acerca de algum assunto que lhe é desejado ou resistido. Ou seja, o pulo de susto se torna medo emocional quando se encontra ou se pensa que existe um objeto ameaçador que deve ser enfrentado ou evitado. A emoção é a força que movimenta e cria unidade entre as variadas partes da experiência. Nesse sentido, não é possível dividir uma experiência vital em prática, emocional ou intelectual, ou ainda comparar essas partes umas com as outras. O aspecto emocional conecta partes em um todo único; o intelectual declara o fato de que a experiência tem um significado; o prático indica que o organismo está interagindo com eventos e objetos que o cercam. Isso não quer dizer que não possa haver distinções linguísticas dos termos, indica apenas que não sejam encarados de formas separadas ou opostas.

Acerca da compreensão das emoções, outros autores também destacam alguns pontos. Shipton e Sillince (2012) definem as emoções como um fenômeno sentido que emerge da avaliação realizada da situação e que modela as ações imediatas e subsequentes. Simpson e Marshall (2010) propõem uma abordagem alternativa que se baseia no pragmatismo, na qual tanto as emoções como a aprendizagem podem ser definidas como processos dinâmicos que emergem no contexto relacional das transações sociais. Reforçam também, que ambas são processos sociais que são interligados e interdependentes.

Conforme Antonacoupoulou et al (2005), a concessão de atenção aos sentimentos também pode criar motivação para a aprendizagem. Segundo os autores, os sentimentos negativos podem ser trabalhados e os positivos podem ser acentuados. Nesse sentido, Boud (1985, 2006) também destaca que um dos elementos fundamentais para o processo reflexivo é a atenção aos sentimentos. O referido autor destaca que tal atenção contempla a utilização de sentimentos positivos e a remoção dos sentimentos obstrutivos. Tal remoção é realizada pela consideração de para que haja aprendizagem, os eventos devem ser observados de forma racional, uma vez que o autor defende que com sentimentos negativos o indivíduo não pode fazer um exame completo e adequado da experiência. Contudo, considera-se que a perspectiva de tal autor difira das abordagens recentes nas quais considera-se as emoções de forma geral como fontes importantes da construção de conhecimento.

Shipton e Sillince (2012) destacam uma caracterização das experiências em algumas categorias com base nas emoções que elas geram, sendo elas: familiares ou não familiares; de validação ou de invalidação. Assim, eles defendem que emoções de alta intensidade como ansiedade ou exaltação podem emergir de experiências não familiares ou desconhecidas, já emoções mais inertes ou passivas, como o senso de conforto ou frustração, são provavelmente ligadas a experiências familiares, conhecidas ou pouco desafiantes. Quanto às experiências de validação, elas são consideradas aquelas que estão de acordo com as expectativas que se tem delas. Por outro lado, as experiências de invalidação ocorrem quando elas falham no objetivo de se alinhar com as expectativas que delas se tinham. Ainda, os resultados empíricos dos referidos autores sugerem que experiências de invalidação façam emergir ansiedade e frustração, enquanto experiências de validação evoquem conforto ou exaltação. Nesse sentido, eles complementam que a invalidação indica que mudanças podem ser requeridas, enquanto a validação reforça a viabilidade das opções selecionadas.

Outras pesquisas empíricas também agregam contribuições para o debate acerca das emoções. Os estudos de Simpson e Marshall (2010) sugerem que o que é convencionalmente nomeado de emoções “positivas” ou “negativas” podem coexistir. Além disso, eles apontam

que apesar de ser considerado de forma geral que a aprendizagem está conectada apenas à resultados positivos, em seus estudos encontraram evidências de ocorrência da aprendizagem durante toda a experiência, nos momentos positivos e negativos. Os achados de Shipton e Sillince (2012) sugerem que as emoções emergem enquanto os membros refletem no progresso ou falta de progresso ao alcançar a aprendizagem organizacional. Ademais, observam diferenças sutis nas emoções relatas por indivíduos de diferentes posições hierárquicas.Ainda, seus resultados mostram que ao menos dois estados emocionais predominantes podem coexistir, e sugerem que experienciar emoções ambivalentes pode capacitar pessoas para lidar com emoções intensas.

Vince (2011) e Leite (2011) também realizaram descobertas relevantes por meio de seus estudos. De acordo com Vince (2011), os gestores apresentam sentimentos de ansiedade e ambivalência, avidez por descobertas, conhecimentos úteis e inúteis, senso de defesa, preocupação, boas ideias e competitividade. O referido autor também destaca a identificação de um paradoxo na vida organizacional, onde a organização ao mesmo tempo é uma estrutura de suporte e de restrição, um espaço no qual a aprendizagem é ao mesmo tempo desejada e evitada. Ainda, os achados dos estudos de Leite (2011) apontam que o ato de viver uma

experiência reduz o impacto emocional quando circunstâncias semelhantes voltam a acontecer, pois cria-se uma proteção devido ao reconhecimento das características de tais experiências.

Por fim, mesmo havendo crescentes contribuições na área, ainda não há um debate robusto e consistente na literatura de AO acerca das emoções (SHIPTON E SILLINCE, 2012). Segundo Simpson e Marshall (2010), há uma vasta literatura acerca de AO como uma perspectiva de compartilhamento de conhecimento, mas pouca atenção tem sido dada à questões emocionais. Dessa forma, os referidos autores sugerem que a aprendizagem possa ser acelerada quando as organizações construírem uma cultura por meio da qual mecanismos de AO ajudem os indivíduos a tolerar estados emocionais conflitantes. Eles sugerem também uma ênfase balanceada, onde as emoções sejam vistas como integradas ao invés de separadas das dinâmicas cognitivas que são subjacentes à aprendizagem nas organizações. Ainda, os referidos autores afirmam que apesar da interação entre emoções e aprendizagem ser uma fonte de crescente debate e investigação em estudos organizacionais, um entendimento detalhado sobre esses aspectos ainda não foi construído.