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5. PROPRIEDADE INTELECTUAL: CASO EMBRAPA

5.4 Consolidação do Projeto Prioritário n°

A “Política Institucional de Gestão de Propriedade Intelectual na Embrapa”, aprovada pela Diretoria Executiva em 199611 e que ainda se encontra em vigor, foi fruto da execução do Projeto Prioritário n° 24. O texto desse documento cristaliza o consenso interno que na época foi possível alcançar, frente às diferentes posições de pesquisadores integrantes do corpo técnico da estatal e de outros profissionais que foram chamados a opinar sobre o assunto.

A política define orientações gerais de gestão das várias formas de propriedade intelectual facultadas pelo arcabouço jurídico vigente no país. Estabelece mecanismos diferenciados para o uso das prerrogativas legais pertinentes aos direitos de propriedade industrial, proteção de cultivares e direitos autorais, contemplando a diversidade de tecnologias geradas pela Embrapa como, por exemplo: equipamentos, máquinas, vacinas, processos na área da biotecnologia, cultivares de espécies anuais como soja, feijão, trigo, etc.; cultivares de espécies perenes como mangueiras, pessegueiros, videiras, etc.; além de produtos de informação em qualquer suporte físico – ai incluídos livros, periódicos, bases de dados, vídeos, CDs e softwares.

A política é constituída por apenas quatro segmentos: a) antecedentes – onde são relatados, de forma resumida, a mudança do cenário internacional, o início da alteração da legislação nacional e as dificuldades do setor público de pesquisa em geral e da Embrapa em particular, para manejar os novos instrumentos legais; b) objetivo geral; c) diretrizes a serem perseguidas; e d) mecanismos operacionais com os quais a estatal pretendia implantar a nova ordem.

A norma interna que aprovou a política de propriedade intelectual estabelece em seu item 2: “... a Embrapa maximizará sua capacidade de usufruir os direitos de propriedade intelectual visando à transferência ou o licenciamento remunerado de tecnologias, processos e produtos passíveis de proteção”. Verifica-se, portanto, que o eixo principal, desde o início, tinha por foco a transferência de tecnologia.

Entre as diretrizes da política, vale ressaltar a regra geral de sempre buscar proteção legal à propriedade intelectual de processos e produtos tecnológicos derivados de sua atividade de pesquisa. Além dessa, outras diretrizes merecem ser destacadas: o

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Deliberação n° 22/1996, de 2 de julho de 1996, publicada no Boletim de Comunicações Administrativa

estabelecimento de sistemática institucional para selecionar produtos e processos passíveis de proteção considerando a relação entre custo e benefício; o controle da informação – e de materiais inacabados com valor agregado de pesquisa, para evitar sua apropriação indevida por terceiros; a capacitação de recursos humanos; a participação ampla de pesquisadores e gerentes na implantação da política e no seu aprimoramento; e a proteção de cultivares antes de seu lançamento comercial.

Considerando o elenco de tecnologias disponíveis e o tamanho e complexidade da Embrapa, não foi trivial construir um sistema que tivesse por objetivo atingir, pelo menos, quatro metas: estabelecer rotinas para seleção de tecnologias passíveis de proteção; conceber um processo institucional definido visando o efetivo requerimento de proteção intelectual a diferentes autoridades governamentais – dependendo da tecnologia-alvo e da forma legal existente para a respectiva proteção; normalizar as diferentes formas de seu licenciamento ao setor privado; e, ao mesmo tempo, difundir os conceitos de propriedade intelectual (PI) pelo universo de empregados, gerentes, consultores, bolsistas e estagiários, que somados atingiam, na época, aproximadamente 12 mil pessoas distribuídas em centros de pesquisa e em campos experimentais localizados em diferentes regiões e Estados da Federação.

Para vencer esses obstáculos a estatal adotou mecanismos operacionais considerados apropriados à implantação da política. Os mecanismos operacionais de maior visibilidade, utilizados no início, foram os seguintes:

a) Criação do Comitê de Propriedade Intelectual da Embrapa (CPIE), vinculado à diretoria, integrado por dez membros nomeados pelo seu presidente e indicados pelos chefes de dez unidades descentralizadas, com a competência, entre outros assuntos, de deliberar sobre:

 A seleção de tecnologias candidatas a pedidos de proteção intelectual.

 Os parâmetros de negociação indispensáveis à: licença de tecnologias patenteadas; constituição de parcerias para o desenvolvimento de tecnologias ou produtos semi-acabados; obtenção de novas cultivares em parceria; licença de cultivares; e comercialização de produtos de informação gerados ou editados pela Embrapa.  Os critérios para distribuição, entre as unidades descentralizadas, da remuneração

 A orientação permanente aos Comitês Locais para o cumprimento da política.

b) Criação em cada unidade descentralizada de um Comitê Local de Propriedade Intelectual (CLPI), vinculado à chefia geral, com as seguintes atribuições:

 Zelar pelo cumprimento dos requisitos administrativos internos e externos indispensáveis à obtenção de proteção em qualquer de suas modalidades.

 Emitir parecer técnico sobre a conveniência e oportunidade da proteção pretendida.

 Analisar o potencial de retorno econômico derivado da exploração dos direitos de propriedade intelectual de tecnologias passíveis de proteção.

c) Criação da Coordenadoria de Propriedade Intelectual (CPI) no Departamento de Programação Econômica e Desenvolvimento Comercial (DEC) integrante, na época, da estrutura organizacional da sede da empresa, com as seguintes finalidades:

 Operacionalizar as decisões do Comitê de Propriedade Intelectual da Embrapa.  Prover os recursos administrativos e financeiros necessários à implantação da

política.

5.5 Consolidação do Projeto Prioritário n° 25

A Embrapa, paralelamente, concebeu e executou o Projeto Prioritário n° 25, intitulado “Estratégia da Embrapa frente à Lei de Proteção de Cultivares”. O conceito de cultivar já foi declinado em capítulo anterior: trata-se de uma nova variedade de planta, distinta de todas as outras já existentes no mercado, homogênea e estável, que sob uma única denominação própria em todo o território nacional, é oferecida no comércio aos agricultores sob a forma de semente ou muda, dependendo da espécie vegetal. Novas variedades de soja, trigo, arroz, feijão etc., além de novas variedades de espécies perenes como forrageiras, florestais, fruteiras, videiras, etc., resultam, anualmente, da programação de pesquisa da Embrapa. Essas novas variedades são disponibilizadas sob a forma de semente básica às indústrias nacionais de sementes, setor que congrega cerca de seiscentas

empresas especializadas na produção de sementes de diferentes espécies vegetais12. Os materiais propagativos sob a forma de semente básica ou muda matriz adquiridos da Embrapa e de outras instituições que conduzem programas de melhoramento genético vegetal, constituem o principal insumo das indústrias nacionais de sementes e mudas para a produção de sementes nas categorias comerciais ou formação de jardins clonais para a produção comercial de mudas com origem certificada. Esses materiais se constituem na base tecnológica que dá sustentação à agricultura e pecuária nacionais.

A Embrapa consolidou idéias e sugestões e elaborou a primeira versão do anteprojeto de lei de proteção de cultivares após ampla consulta às suas unidades descentralizadas e aos parceiros públicos externos. O texto do anteprojeto, posteriormente, foi aprimorado pela contribuição de inúmeros colaboradores, notadamente pelas equipes do Ministério da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento e Casa Civil da Presidência da República, tendo sofrido poucas alterações na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Esse trabalho foi iniciado em 1992 e concluído com a promulgação da Lei n° 9.456, de 25 de abril de 1997 e seu regulamento, o Decreto n° 2.366, de 05 de novembro de 1997.

Diante da perspectiva de vir a proteger por direito de propriedade intelectual, as cultivares que desenvolvia no âmbito dos projetos de melhoramento vegetal integrantes da sua programação de pesquisa, a Embrapa implantou o Projeto Prioritário n° 25 cujo resultado se restringiu a um exercício de reflexão sobre 11 questões que na época foram consideradas fundamentais:

1ª Definição das cultivares que deveriam e poderiam ser protegidas, considerando a lista inicial de espécies passíveis de proteção fixada pelo Serviço Nacional de Proteção de Cultivares (SNPC) do Ministério da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento (MAPA) limitada a: arroz, feijão, batata, soja, milho, algodão, sorgo, trigo e cana-de- açúcar.

2ª Definição dos critérios para intercâmbio ou cessão de linhagens avançadas da Embrapa a instituições de pesquisa no país e no exterior.

3ª Definição dos procedimentos a serem adotados visando garantir sigilo das informações, anterioridade e proteção de novas cultivares.

4ª Definição dos procedimentos a serem adotados visando obter padrões internacionais aceitáveis de distinguibilidade, homogeneidade e estabilidade (DHE) e denominaçãode cultivares, com vistas a sua futura proteção.

5ª Definição das unidades da empresa que se responsabilizariam pela base de dados institucional das cultivares lançadas e protegidas.

6ª Definição das unidades descentralizadas que se responsabilizariam pelas coleções de referência para a comparação da distinguibilidade das novas cultivares, por espécie, com as cultivares já existentes no mercado, lançadas pela própria Embrapa no passado ou por terceiros.

7ª Definição do tratamento a ser dispensado às instituições parceiras que haviam atuado como co-obtentoras na criação intelectual das cultivares já lançadas ou em vias de lançamento, ou como colaboradoras por meio da avaliação dos materiais obtidos pela Embrapa.

8ª Definição das bases contratuais dos arranjos destinados à produção ou multiplicação de sementes básicas, no cenário de proteção de cultivares, considerando-se os diferentes tipos de parceiros da Embrapa.

9ª Definição da estratégia de pesquisa em melhoramento genético vegetal da Embrapa por espécie, por região e por grupos diferenciados de plantas – autógamas ou alógamas, considerando o previsível incremento de investimentos do setor privado num cenário de retorno financeiro.

10ª Definição de critérios a serem adotados para o lançamento comercial de novas cultivares.

11ª Definição de critérios de divisão institucional de recursos financeiros auferidos do exercício dos direitos de propriedade intelectual sobre novas cultivares, entre unidades da empresa, líderes e respectivas equipes.

Para refletir sobre essas 11 questões formaram-se grupos de trabalho constituídos por pesquisadores e técnicos de diferentes unidades descentralizadas e dos próprios departamentos da sede da empresa que apresentaram sugestões posteriormente debatidas e aprovadas, com ou sem ajustes, pela diretoria da estatal. Em seguida, essas sugestões foram incorporadas como procedimentos que passaram a integrar as rotinas de trabalho ou se converteram nas primeiras normas operacionais da Embrapa sobre o assunto, algumas das quais se encontram em pleno vigor até hoje.