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2. REVISÃO DE LITERATURA

2.7 North e o conceito de incerteza

Douglass C. North foi agraciado com o Prêmio Nobel, em 1993. Ele também pertence ao seleto grupo de economistas laureados que vêm construindo os conceitos da Nova Economia Institucional (NEI). Na autobiografia que se encontra disponível no site <www.nobelprize.org,> ele revela o principal objeto de seu esforço intelectual, no trecho em que diz:

“Em 1966-67 decidi que deveria mudar [o foco de meus estudos] da história econômica americana para a européia, e então quando recebi a licença para viver em Genebra por um ano, decidi recomeçar. Essa fase alterou minha vida radicalmente quando me convenci de que as ferramentas da teoria econômica neoclássica não eram aptas para explicar o tipo de mudança fundamental na sociedade que tinha caracterizado as economias européias desde a idade média para frente. Nós precisávamos de novas ferramentas, mas elas simplesmente não existiam. Foi durante a longa busca de uma estrutura que pudesse prover novas ferramentas de análise que se desenvolveu meu interesse concernente à nova economia institucional. O resultado foram dois livros iniciais, um com Lance Davis, Institutional Change and American

Economic Growth, e o outro com Robert Thomas, The Rise of the Western World: A New Economic History. Os dois livros foram instrumentos precoces

para tentar desenvolver algumas ferramentas de análise institucional e aplicá- las à história econômica. Ambos ainda foram frutos da teoria econômica neoclássica, e havia muitas conclusões finais que não faziam sentido: tal como a noção de que as instituições eram eficientes (ainda em vigor). O mais sério, contudo, era o fato de não ser possível explicar sob os fundamentos neoclássicos o desempenho pobre da economia ao longo de tanto tempo. Então eu comecei a explorar o que estava errado. As crenças individuais obviamente influem nas escolhas feitas pelas pessoas e a miopia extrema dos economistas os impedia entender a importância das idéias, ideologias e preconceitos. Esse reconhecimento é o bastante para sermos compelidos a examinar o postulado racional de forma crítica.”

North (2005) ensina que a racionalidade substantiva funciona bem na economia em mercados competitivos de preços à vista - ou mercados spot, onde o ambiente competitivo propicia a visualização dos preços e apenas a quantidade a comprar ou vender remanesce como objeto de escolha. A racionalidade substantiva seria suficiente para todos os propósitos se todas as escolhas fossem simples, freqüentes, e tivessem retorno rápido e efetivo. Mas quando os preços passam a depender do comportamento de outros compradores e vendedores, aumenta a complexidade da decisão. No entanto, a tendência dos economistas, é de superestimar a racionalidade de forma ilusória. Os fatos que requerem decisão decorrem da interação entre os seres humanos nos planos econômico, social e político, nos quais os atores se encontram informados de modo imperfeito e o retorno de suas ações é igualmente imperfeito. Não é que a racionalidade seja “errada”, diz North (2005) e tampouco significa que não nos proveram de um manual para entendermos as escolhas humanas efetuadas em grande variedade de contextos. A existência de informação imperfeita e as suas conseqüências ressaltam o caráter da incerteza que é onipresente.

Para ilustrar seu trabalho em relação ao trabalho dos economistas neoclássicos, North (2005) constrói a imagem de uma grande máquina em que os membros individuais são engrenagens intercaladas. A grande máquina se estende para além do plano individual,

incorporando a estrutura da escala social, física e até geopolítica. É a racionalidade difusa e o comportamento dessa grande máquina que a teoria econômica tradicional frequentemente modela com sucesso, esclarece. E prossegue, dizendo que ele busca muito mais, ainda que de forma imperfeita: a compreensão da interação entre os processos cognitivos, a formação das crenças e das instituições.

North (2005, p.6) dá destaque ao papel das instituições no Capítulo 1 quando afirma:

Humans attempt to use their perceptions about the world to structure their environment in order to reduce uncertainty in human interaction. But whose perceptions matter and how they get translated into transforming the human environment are consequences of the institutional structure, which is a combination of formal rules, informal constraints, and their enforcement characteristics……….

Institutional constraints cumulate through time, and the culture of a society is the cumulative structure of rules and norms (and beliefs) that we inherit from the past that shape our present and influence our future.(grifos nossos)

A aprendizagem, segundo ele, deriva do ato de absorver e ajustar eventos que tenham impacto em nossas vidas, modificando incrementalmente nosso comportamento. O conhecimento implícito evolui sem ser racionalizado. De fato, diz ele, nós somos relativamente pobres em argumentação comparada à nossa habilidade para entender os problemas e encontrar soluções. Somos bons em entender e compreender se o assunto é suficientemente similar a outros eventos que tenham ocorrido em nossa experiência. As idéias muito distantes de nossa cultura não são facilmente incorporadas. Nossa habilidade em generalizar e usar a analogia advém de modelos combinados que relembramos e compreendemos. Essa habilidade nos torna bons não só em modelar a realidade, mas também na construção de teorias em face da incerteza real.

Apesar de o processo de aprendizagem ser único para cada indivíduo, uma instituição comum resulta de percepções e crenças compartilhadas. Uma cultura hereditária comum reduz os modelos de diferenças mentais que o povo em sociedade possui e constitui os meios para a transferência das percepções unificadas. As implicações mais amplas sobre a estrutura e funcionamento dos processos de troca de uma sociedade demonstram que a herança cultural – crenças, instituições, ferramentas – não apenas desempenha um papel essencial na formatação das escolhas imediatas dos atores na sociedade, mas também aponta para o sucesso ou falência das sociedades através do tempo. A maior riqueza da estrutura do

passado é diminuir a incerteza em fazer escolhas e proporcionar experimentação e competição criativa, além da própria sobrevivência da sociedade.

Essas generalizações constituem o fundamento do estudo de North (2005) que em síntese confere ao conceito de instituição a idéia do produto da soma das organizações existentes em uma sociedade com as regras do jogo que a mesma sociedade estabelece para o seu respectivo funcionamento. Com efeito, diz ele, o jogo tem sido estruturado para aliviar os indivíduos da incerteza ao fazerem suas escolhas. Por outro lado, um ambiente em desordem é aquele em que as rotinas são rompidas e aumenta a incerteza. Algumas sociedades modernas incorporam uma rica herança cultural que tem convertido a incerteza em certeza ou pelo menos em risco sob controle da atividade humana.

Em seguida, revela o conceito sociológico de “embedded cognition” com base no qual defende o conhecimento não como um fenômeno isolado que pode entrar e tomar conta da cabeça de alguém, mas sua estreita interação com a estrutura externa do ambiente humano em toda a sua complexidade. Assim, as ferramentas do conhecimento não são apenas a infra- estrutura destinada a um processo cognitivo auto-suficiente. A interação de cada qual com os incrementos da tecnologia, ao contrário, é parte intrínseca do processo de cognição. Nesse sentido, salienta “muitas das escolhas racionais não são mera cogitação individual, mas a imersão no processo de conhecimento dentro do contexto mais amplo social e institucional” (NORTH, 2005, p.25, tradução nossa). Vale dizer que a racionalidade, como os economistas tradicionais a compreendem, não é um universo fixo, mas consiste em uma aquisição cultural, tecnológica e econômica em constante mutação e movimento. E diante desse quadro de novas situações, North (2005) revela que seu objetivo é tentar entender as condições que podem aumentar as probabilidades do sucesso humano.

Apesar de a racionalidade encontrar-se na base da teoria econômica, a análise traçada por North (2005) sobre os principais fatores que reduzem a incerteza nos ajuda a compreender os riscos a que podem levar as fragilidades das instituições brasileiras modernas em garantir meios confiáveis para o desenvolvimento de tecnologias de ponta, como a tecnologia alvo de nossa pesquisa.