• Nenhum resultado encontrado

CORPO E VOZ EM JOGO – O PAPEL DA ESCUTA

CAPÍTULO III: OFICINA DO CORPO E DA VOZ À COMPOSIÇÃO CINÉTICA, DE

3.5 CORPO E VOZ EM JOGO – O PAPEL DA ESCUTA

Na prática da oficina, Parente deu uma instrução precisa: “Como acordar o som? Ouvir o espaço, buscar um som concreto com o espaço”. (PARENTE; PORTEIRO. Oficina do Corpo e da Voz à Composição Cinética. Notas de oficina de Daiane Dordetti, grifo meu). Essa indicação foi dada por ele fazendo uso das imagens de muitas vezes clara. Ou seja, na oficina, a vibração, o eco, a abertura para ser afetado colocavam a escuta e a propriocepção como entrecruzamento de sentidos, o quiasma merleaupontyano, a zona “entre” emissão vocal e audição. Ouvir o eco da minha voz vindo do chão, das paredes, promoveu a consciência corporal acerca da materialidade do som, da voz. “O som, é como um fogo que tem que ser sempre mantido”, afirmava Parente. Senti essa vibração passeando por dentro do corpo.

Foi desta forma, buscando este entrecruzamento que as viagens sonoras foram experimentadas na oficina. Nas rodas de viagens sonoras, a escuta, assim era a ação que colocava a voz em jogo. Para mim as imagens sonoras surgidas geravam reações vocais, ou seja, outras ações que estavam sempre ancoradas nas ações físicas – as letras do Alfabeto. As ações em equilíbrio precário e oposição continuavam sendo realizadas, mas podiam ser e eram muitas vezes omitidas no corpo, como é possível ver na fig.48.

Além da escuta, outro elemento importante - a ludicidade - também fez parte da metodologia empregada por Parente e Porteiro. Molik e Grotowski falam da importância da

ese fuego, alguien comenzó a repetir las primeras palabras. Eso no era todavía la canción, era un encantamiento, como un mantra. [...] Como dice la expresión francesa, tu es fil de quelqu´un. [...]Pues los que empezaron a cantar las primeras palabras eran hijos de alguien, de algún sitio, de algún lugar. Entonces, si tú encuentras eso, tú eres hijo de alguien. Si tú no lo reencuentras, no eres hijo de alguien, estás cortado, estéril, infecundo. Este exemplo muestra cómo, a partir de um pequeno elemento – uma canción - se desemboca sobre vários problemas de pertinência, de aparición de la canción, de la encantación, de nuestros laços humanos, de nuestro linaje em el tempo, todo esto aparece. [...] Tu eres de algun tempo, de algun lugar. No se trata de actuar el rol de alguien que no eres. Entonces em todo este trabajo aparece el aspecto vertical, siempre más hacia el comienzo, siempre estar

de pié en el comienzo (GROTOWSKI, [1985] 1993,p.75). In: GROTOWSKI, Jerzy. Tu eres Hijo de Alguien.

In: Máscara – Cuaderno iberoamericano de reflexión sobre escenologia, número especial de homenaje a Grotowski, México: Escenología, ano 3, n. 11-12, p. 69-75, jan. 1993.

153 ludicidade no treinamento do ator. No texto A Voz171, Grotowski considerou o procedimento do ator de colocar sua atenção sobre o funcionamento do aparelho fonatório como um entrave para a organicidade da voz. (GROTOWSKI, 2007, p. 142). Grotowski afirmou ter percebido que ainda se tratava de auto-observação, e que a voz “era dura,mecânica (...), automática: não era viva” (GROTOWSKI, 2007, p. 155). No final de “A Voz”, Grotowski afirmou estar experimentando formas de entrar em contato.

Figura 78 Viagem Sonora com o Alfabeto do Corpo

Captação de Imagens: Chaiany Gracietti, 2012

O fato de trabalhar sobre os ressonadores ou vibradores levou os atores a observarem não apenas a voz, mas a vibração no corpo. Embora tenha pesquisado por longos anos os

vibradores ou ressonadores, Molik, (2001) confirmou em sua entrevista à Campo, o motivo

de não trabalhar mais sobre os ressonadores, apontando o mesmo problema. (CAMPO; MOLIK, 2011, p. 105-108). Revendo os problemas auto-observação, no treinamento proposto de um modo geral, Grotowski percebeu que assim como motivar o confronto consigo mesmo, faltava adentrar num campo que estimulasse mais a organicidade do ator e propôs a passagem do treinamento técnico atlético para o treinamento técnico lúdico com vias a conferir ao ator organicidade nas ações físicas e vocais.

O mexicano Jaime Soriano, que foi assistente em uma das sessões de treinamento de Grotowski, em Montecastelo, na Itália em 1985, discorre sobre a proposta de treinamento que foi experimentada por Grotowski:

Em uma primeira fase os exercícios deviam estar muito bem definidos ao nível técnico. Na

171Originalmente uma palestra de Grotowski, transcrita com o mesmo título. GROTOWSKI. A voz. In: Teatro

154

segunda fase o ator teria a liberdade de utilizar os exercícios a dois níveis: a nível de confronto com seus umbrais pessoais do cansaço; o avanço ou não no ganho de habilidades, etc.; e a nível lúdico isto é, utilizar os exercícios como material para a busca de imagens e associações [...]. (SORIANO, 1993, p.132. Grifos meus.).172

O treinamento proposto por Molik, em seu Alfabeto do Corpo, parece ter a mesma ideologia.

Essa questão da ludicidade, do jogo, em relação aos ressonadores e vibradores como forma de garantir a organicidade das ações físicas e vocais foi percebida por mim como uma forma de integrar o corpo e pensamento pela intenção. Na oficina Do Corpo e da Voz á

Composição Cinética, foi mais pelo jogo com as letras que os ressonadores e vibradores

foram descobertos. Todas as “letras” ou ações partiam do Centro Energético de Base. Mas na oficina Voz e Ação Vocal, na qual este componente da ludicidade nas ações não foi enfatizado, não fiquei apenas observando o “aparelho vocal”, utilizando a terminologia de Grotowski, já que todo o meu corpo estava envolvido. Não experimentei uma voz dura e mecânica, pois todo o meu corpo, todo o meu ser estiveram envolvidos nas ações. Como frisei no final do segundo capítulo, na análise da Oficina Voz e Ação Vocal, a técnica não se configurou como uma “técnica fria”, mas, muito pelo contrário, foi percebida por mim e pelos demais participantes como uma forma de perceber a corporeidade da voz. Eu percebi até que doava todo o meu Ser através da voz. E ao ouvir os colegas, fui tocada por eles. O fundamento de trabalhar todas as ações vocais partindo do Centro Energético de Base, do Koshi, foi também o responsável pela corporeidade da voz.

Nas duas oficinas, experimentei uma voz que não estava mais a serviço puro da razão, da linguagem, mas que se colocava em jogo pela escuta e pela exploração da sonoridade. Foi pelo movimento do corpo partindo do Centro Energético de Base, pelas variações de equilíbrio que a voz em movimento, corpo em vibração e voz em vibração foram acessados. Foi pela escuta com todo o corpo voltada para o ambiente – para o outro e para o corpo a voz- vibração gerou imagens, ganhou um significado afetivo e se tornou ação. Para tanto, se fez indispensável que eu e os demais participantes das oficinas tivéssemos abertura para a experiência. Em relação à experiência Bondia coloca que:

[...] o sujeito da experiência se define não por sua atividade, mas por sua passividade, por sua

172 No original: Em uma primeira fase los ejercícios debian estar muy bien definidos a nível tecnico. Em la

segunda fase el ator tenía a libertad de utilizar los ejercicios a dos noveles: a nival de confrontación com sua personales umbrales de la fatiga; el avance o no em el logro de habilidades, etc.; y a nível lúdico; esto es, utilizar los exercícios como material para la busqueda de imágenes e asociacones [...] (SORIANO, 1993, p. 32).

155

receptividade, por sua disponibilidade, por sua abertura. Trata-se, porém, de uma passividade anterior à oposição entre ativo e passivo, de uma passividade feita de paixão, de padecimento, de paciência, de atenção, como uma receptividade primeira, como uma disponibilidade fundamental, como uma abertura essencial. (BONDÍA, 2002, p. 19)

Com as palavras de Bondia finalizo este capítulo, buscando lançar um olhar para a importância da escuta e da percepção como uma abertura para o que está em nós e para o que está além de nós mesmos, como uma vibração do self, como a vibração dos pensamentos, sentimentos, do corpo em si pela voz. A busca da liberação da voz, da vibração de nossa essência, se dá no encontro com o outro, no entrelaçamento de sentidos, de memórias, com outras vozes e vibrações. “Somos filhos de alguém” e não estamos sozinhos. Junto da natureza, somos pura vibração.

156

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A dissertação partiu das minhas experiências como performer em processos de treinamento vocal específicos para refletir sobre a noção de corpo orgânico e de corpo vitalista para a compreensão do fenômeno vocal. Propus um diálogo constante entre prática e teoria, entre percepções e reflexões acerca da importância da percepção e ativação do Centro

de Energia de Base para a organicidade vocal do performer.

Para mapear o Centro de Energia de Base, considerei a confluência destes diversos saberes que apontaram para a importância de práticas psicofísicas que estimulam a percepção do performer da relação entre o movimento corporal e a produção vocal; e propus neste trabalho utilizar um termo em português: Centro Energético de Base. Este termo, utilizado em outros discursos, designa a região que engloba o abdômen e a pelve, local físico onde existe um tipo de vibração, que confere presença ao performer e organicidade nas ações físicas e vocais.

Realizei um brevíssimo levantamento do termo centro de energia em algumas práticas culturais de origem asiática, tanto as mais conhecidas e praticadas no Brasil há algumas décadas, especificamente vem Florianópolis e Joinville, como o Kung Fu e o Tai Chi Chuan, quanto práticas menos conhecidas como a dança Topeng. Para isso usei como fontes tanto uma seleção bibliográfica disponível principalmente em português quanto em entrevistas com profissionais da área de Artes Marciais, Teatro e Treinamento Vocal.

O objetivo foi observar a recorrência nessas práticas culturais de origem asiática da noção de que existem centros de energia no corpo. Busquei traçar um breve mapeamento de termos em diferentes práticas culturais orientais que correspondessem à centralidade do corpo: hara (barriga), koshi (quadril), tantien, (entre o umbigo e o púbis); chakra básico (base da coluna vertebral) e chakra umbilical; e putsab nahbhi (umbigo e região em volta deste). Alguns autores fazem o paralelo entre a localização destes centros de energia e o centro de gravidade do corpo (no quadril, à frente da articulação lombo-sacra). Neste primeiro panorama é possível sugerir que aparentemente estes centros sejam locais onde a energia: ki,

chi, prana, ou bayu está associada à respiração e ao movimento. Como foi apontado no

Capítulo I, vários autores e praticantes de práticas psicofísicas de origem asiática acreditam que a respiração aliada ao movimento conectam corpo, mente e espírito.

157 duas aulas que pude fazer de Kung Fu, me permitiram compreender que a energia está associada ao movimento e à respiração nessas práticas. O que fica claro para mim ao realizar essas breves incursões pelas práticas acima citadas experimento o mesmo estado de atentividade que sinto quando pratico o treinamento corporal e vocal que aprendi nas oficinas de Simioni, Parente e Porteiro. O fluxo energético percebido nestas práticas traz a sensação de “bolhas de champagne”. Seria esta vibração das “bolhazinhas de champagne”, o fluxo eletromagnético do corpo? Esta é uma pergunta que ainda não consigo responder e que aponta para uma necessidade de continuidade da pesquisa. Enquanto sensação corpórea, só consigo perceber esta vibração da energia depois de trabalhar movimentos bastantes dinâmicos partindo do Centro de Energia de Base, junto da respiração. Este fluxo energético é o que gera em mim uma voz percebida como encorpada, uma voz mais orgânica.

Nas abordagens Ocidentais, a Fonoaudiologia destaca o apoio respiratório costo diafragmático abdominal, e as dá ênfase na região pubiana, na qual estão inseridos os músculos da cinta abdominal. O método de Educação Somática GDS - da Fisioterapia - aponta a ação conjunta do iliopsoas e do diafragma sobre a coluna vertebral na respiração e afirma não existir uma forma de se respirar, mas que a respiração se “libera”; o Sistema Bartenieff enfatiza o Suporte Muscular Interno, composto pelos músculos iliopsoas, diafragma, quadrado lombar e os músculos profundos do quadril. No Sistema Bartenieff a respiração é um fluxo energético facilitador do movimento. Lembro o leitor que a pesquisa destas abordagens se deu através de uma revisão de literatura. A pesquisa nas obras Behlau, Pinheiro e Baê, da Fonoaudiologia, foi útil para compreender a noção do apoio respiratório, mas além disso, compreender principalmente as implicações da cervical na abertura da laringe. Neste ponto, foi a obra de Campignion, acerca do Método GDS que possibilitou a compreensão da implicação da ação ritmada entre o iliopsoas, músculo flexor do quadril, e o diafragma para a liberação da porção cervical. Foi interessante perceber que tanto para Campignion, autor pesquisado na abordagem GDS, quanto para Grotowski, não existe forma correta de respirar, mas que a respiração “se libera” através da movimentação da coluna vertebral. Nesta linha de pensamento parece que a coluna vertebral num todo faz parte do apoio, e não apenas a porção lombar: se o diafragma age sobre a estática da coluna vertebral, sofre também a sua ação.

Para estabelecer estas relações teóricas com a prática nas oficinas, procurei refazer os exercícios de Parente, Simioni e Porteiro percebendo as musculaturas envolvidas. Não foi possível praticar o Método Bartenieff, uma vez que só tive acesso a esta metodologia por

158 intermédio dos textos de Fernandes. No entanto, encontrei nele o que indiquei ser talvez o mesmo princípio do movimento aliado à respiração presentes no Hatha Yoga, e nas práticas de Artes Marciais; além do engajamento do quadril para liberar a respiração e o fluxo do movimento. Pretendo dar continuidade à pesquisa experimentando essa proposta de movimento, respiração e voz.

O Centro de Energia de Base aloja também, o intestino, tido pela neurologia como um “segundo cérebro”, que faz parte do Sistema Nervoso Entérico e que pode operar de forma independente do Sistema Nervoso Central. Grotowski enalteceu fortemente a importância das ações partindo da base da coluna para a organicidade da ação, e sua proposição reverbera ainda nas pesquisas de treinamento contemporâneas. Por limitação de tempo da pesquisa, em relação à Neurologia, não pude aprofundar as questões acerca do cérebro reptiliano, localizado na nuca. Grotowski também faz relação a ele. Mas podemos imaginar como as pesquisas da Neurobiologia podem elucidar questões específicas do treinamento do performer no que diz respeito ao entendimento teórico os sobre processos de vivência e aprendizagem de movimentos internos e externos e suas relações com a voz, a memória e as emoções.

Ao fazer as oficinas Voz e Ação Vocal e Do Corpo e da Voz á Composição Cinética constatei que o Centro Energético de Base exerceu influência na organicidade das ações vocais. Para que isso ocorresse, houve o aumento de fluxo energético pelo movimento, pelas dinâmicas de oposição musculares, causadas pelas variações do eixo de equilíbrio do corpo. A energia do corpo dinamizada pelo movimento e pela respiração abdominal se configurou como uma vibração energética e se manifestou em voz, modificando em alguns momentos estados de consciência, possivelmente pela alteração das ondas cerebrais. A sensação de alteração no nível de consciência foi percebida principalmente na Voz Etérea, mas também foi percebida em muitos momentos no trabalho com os ressonadores nas duas oficinas. A vibração da energia e da voz, experimentada nas duas oficinas, levaram-me à percepção encarnada de que meu corpo é energia em vibração, de modo que a noção de corpo vitalista pôde ser experienciada.

Na Oficina Voz e Ação Vocal, na qual Simioni buscou trabalhar a voz em um nível pré- expressivo, o Centro Energético de Base nomeado por Simioni de Koshi, “abdômen”, “quatro abdômens” e “cinturão”, foi o fundamento para a organicidade das ações tanto físicas quanto vocais. Através dos movimentos partindo deste ponto central do corpo e do tônus excêntrico na região do abdômen, a energia foi dinamizada no Treinamento Energético e nos exercícios de Estátuas Tridimensionais, com oposição muscular e variação dos níveis de tensão e

159 relaxamento. Os ressonadores, que correspondiam à localização dos chakras foram trabalhados de forma individual, com os performers atentos à percepção do fluxo energético e às sensações despertadas. A voz foi vivenciada por mim como um corpo que carrega aspectos íntimos do ser, como emoção por ter despertado através da vibração meu corpo-memória. Uma sensação de plenitude e de não fronteira entre meu corpo e a sala, proporcionou-me a compreensão encarnada da noção de corpo vitalista. Meu corpo e a voz eram vida, energia, imanentes à minha existência. Mesmo sem o objetivo de criações vocais, na oficina Voz e

Ação Vocal, durante as improvisações vocais, as imagens surgidas alimentaram a criação de

outras ações vocais. A minha compreensão encarnada dos princípios pré-expressivos:

equilíbrio precário, oposição e omissão, fixada verbalmente por Simioni permitiu a mim, na

continuidade deste treinamento, ter autonomia para realizá-lo sozinha e prosseguir com segurança ensinando parte dos exercícios nas aulas e oficinas de preparação vocal que ministro.

Na Oficina Do Corpo e da Voz à Composição Cinética, as ações ou letras do Alfabeto partiram igualmente do Centro de Energia de Base, não tendo sido enfatizada a tensão excêntrica no abdômen. Entretanto, as letras trabalharam o fortalecimento da musculatura do

Centro Energético de Base, e muitas a ampliação da tronco, conforme explicitei na análise

dos exercícios. Nesta oficina, que tinha foco final na criação de ações, a combinação dinâmica das letras, que lembravam ásanas da Yoga com as ações em equilíbrio precário entre uma e outra letra, foi que ampliou a circulação de energia. As letras se configuravam em ações por associações imagéticas e a vibração e a ressonância eram trabalhadas de forma dinâmica. A criação de ações físicas e vocais partiu de associações imagéticas com as letras. Através da dinâmica das letras, e da vocalização junto destas, tive acesso ao corpo-memória, e talvez eu tenha tido a experiência da voz como veículo. Uma música que surgiu numa das partituras e que veio a se repetir em outros dias, sem que eu fizesse o esforço de lembrar, me trazia muita emoção, e Parente afirmou que poderia ser “o canto da minha vida”.

A percepção e ativação do Centro de Energia de Base foi que permitiu para mim a experiência da voz como sendo um fenômeno do corpo-memória e do corpo-vida. Em ambas as oficinas, foi através das ações oriundas deste centro que a voz foi sentida por mim como um prolongamento do Ser, e que tive acesso a uma música pessoal como uma memória encarnada, experiência que me trouxe muita emoção. Em uma investigação futura poderiam ser aprofundadas questões relacionadas ao DNA da voz, surgidas no decorrer desta pesquisa à luz das teorias do Campo Morfogenético, formulada pelo biólogo Rupert Sheldrake.

160 A partir da minha experiência como performer nas oficinas descritas ao longo dessa dissertação, busquei refletir sobre os processos práticos de conscientização do Centro

Energético de Base na vocalidade poética. A organicidade advinda da consonância entre os

aspectos posturais e cinéticos do corpo na produção de voz pode não ser a esteticamente desejada para a cena, mas a partir da conciêncoa do Centro Energético de Base, da noção do apio vocal, podem haver vários desdobramentos. Assim, acredito ser possível ao performer descobrir outras formas de sonoridade tais como ruídos, sons dissonantes, produções vocais interessantes cenicamente para outras propostas estéticas que não tenham a ver com harmonia e organicidade.

Não prouz nesta dissertação comparar as experiência vivenciadas nas duas oficinas, mas relacioná-las ao Centro Energético de Base. Entretanto, compartilho algumas descobertas feitas quando, enquanto professora, ao repassar os exercícios nas aulas e oficinas que ministro. Percebo semelhança entre o a execução do Treinamento Energético e o Alfabeto do

Corpo. Ambos precisam de certo tempo de execução e do envolvimento do corpo num todo

para aumentar o fluxo energético. Entretanto, nem todos os participantes conseguem compreender fisicamente, em curto período os princípios pré-expressivo da omissão. Nas pausas, em omissão, muitas vezes, perdem a energia que deveria estar fluindo intensamente, numa imobilidade que deveria ser apenas aparente. Por este motivo, além da consciência corporal parece ter de haver, principalmente entre iniciantes, um tempo maior de circulação do fluxo energético para liberação das tensões. Para que isso ocorra, percebo que os