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egunDo a concepção clássica de Edwin H. Sutherland, considera-se Criminologia

o conjunto de conhecimentos relativos ao delito como fenômeno social, sendo nele incluído os processos de elaborar as leis, infringir as leis e de reagir à infração das leis. Leciona, ainda, aquele autor, que a sociedade define como crimes certos atos conside- rados indesejáveis e, apesar dessa definição, algumas pessoas persistem no compor- tamento e assim cometem crimes, reagindo, a sociedade, por intermédio da punição ou outra forma especial de tratamento. Para Sutherland, essa sequência de interações constitui a matéria objeto da Criminologia.11

A Criminologia é uma ciência empírica e interdisciplinar que, nas palavras de García-Pablos de Molina, objetiva apresentar uma informação válida, contrastada e

7. Cf. Polaino Navarrete, Miguel. Derecho Penal. Parte General. Tomo I. 5.ed. Barcelona: Bosch, 2004, p. 57.

8. Liszt, Franz von. Tratado de Direito Penal Alemão. Tomo I. Trad. José Hygino Duarte Pereira. Rio de Janeiro: F. Briguiet, 1899, p. 30.

9. Serrano Gómez, Alfonso. Dogmática jurídica, política criminal y criminología. In: Anuario de Derecho Penal y Ciencias Penales, Tomo 33, Fasc. III, Madrid, 1980, p. 616. Sobre a natureza científica da Política Criminal, observa Miguel Polaino Navarrete que se cuida de questão altamente controvertida: “Enquanto alguns autores defendem que se trata de uma disciplina jurídica, outros sustentam que é essencialmente uma matéria política, e, finalmente, há outros que se posicionam por considerá-la como ciência sociológica.” (Polaino Navarrete, Miguel. Op. cit., p. 57).

10. Silva Sánchez, Jesús María. Op. cit., p. 71.

confiável sobre o surgimento, a dinâmica e as variáveis do crime, contemplando-o como fenômeno individual e como problema social.12 Pode-se, ainda, acrescentar que

ela não se limita ao estudo empírico do crime, cabendo-lhe, igualmente, o estudo do criminoso, da vítima e dos mecanismos de reação social.13

Tem-se, assim, que prepondera, na atualidade, uma rica e heterogênea ciência cri- minológica, agrupada em investigações sociológicas, psicológicas ou biológicas, bem como o desenvolvimento de áreas afins, tal como se observa com a Vitimologia, no escopo da compreensão global da delinquência e das suas formas de prevenção ou neutralização.14 Esta pluralidade de teorias, tanto etiológicas como da reação social,

pode ser considerada benfazeja ante a complexidade do mundo contemporâneo e da criminalidade que nele ocorre.

Por conta disso, Adolfo Ceretti prefere se referir, na atualidade, a existência de “Criminologias” ao invés de (uma) Criminologia.15

Winfried Hassemer e Francisco Muñoz Conde também reconhecem a heterogenei- dade dos aportes criminológicos contemporâneos, e propõem a assunção do ecletismo por parte dos estudiosos, ou seja, uma postura capaz de reunir todos os possíveis pontos de vista da criminalidade, encarando-a como um problema tanto individual como social.16

Na mesma esteira, José Cid Moliné e Elena Larrauri Pijoan, após discorrerem sobre as principais teorias criminológicas formuladas ao longo da disciplina, propugnam por uma relação fecunda entre os principais modelos, visto que a explicação do delito não raro vincula-se a fatores diversos. Assim, é perfeitamente possível que, v.g., a violência doméstica, apareça correlacionada com fatores identificados pela teoria da anomia (ocorrendo mais com pessoas com menores oportunidades sociais), pelas teo- rias ecológicas (produzindo-se em maior quantidade em bairros desorganizados) ou pela teoria do controle (registrando-se um índice maior em pessoas selecionadas pela ordem social).17

Merece, por fim, ser feita menção histórica ao surgimento da palavra criminologia. Ao publicar L’uomo delinquente (1876), quis Cesare Lombroso que a nova atividade com pretensões científicas se chamasse Antropologia Criminal, alardeando-a em publi- cações e congressos internacionais. No entanto, Paul Topinard – Diretor da Escola de Antropologia de Paris – insurgiu-se contra tal denominação, pois não desejava que a sua disciplina, bastante prestigiada na época, ficasse indelevelmente associada à construção do criminoso nato de Lombroso, da qual discordava.

12. García-Pablos de Molina, Antonio. Tratado de Criminología. 3. ed. Valencia: Tirant lo Blanch, 2003, p. 47. 13. Shecaira, Sérgio Salomão. Criminologia. 2. ed., rev. S. Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 48.

14. Cf. García-Pablos de Molina, Antonio. Principales centros de interés de la investigación criminológica. In: Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Jorge de Figueiredo Dias. Vol. III. Coimbra: Coimbra Ed., 2010, p. 1279.

15. Ceretti, Adolfo. El horizonte artificial. Problemas epistemológicos de la criminología. Montevideo: B de F, 2008, p. 103. 16. Hassemer, Winfried; Muñoz Conde, Francisco. Introducción a la Criminología. Valencia: Tirant lo Blanch, 2001, p. 117. 17. Cid Moliné, José; Larrauri Pijoan, Elena. Teorias criminológicas. Explicación y prevención de la delincuencia. Barcelona: Bosch, 2001, p. 255.

Por ocasião do 2o Congresso Internacional de Antropologia Criminal (Paris, 1889),

Topinard pediu a palavra e fez um veemente apelo para que “deixassem em paz” a sua disciplina, argumentando que antes de se estudar as “características patológicas do homem”, seria necessário que se estudasse suas “características positivas” e o “valor do homem em sociedade”. Propôs, em tons dramáticos, que aqueles congressistas adotassem, para a “nova escola”, o título da obra que havia sido publicada, em 1885, pelo Barão Rafaelle Garofalo (La Criminologie), pois, no seu entender mais “legítimo”, “adequado” e “original”, o que, de fato, foi aceito por todos.18

2.4.1. A necessária integração entre Direito Penal e Criminologia

Durante muitos anos perdurou uma disputa entre as chamadas Escolas Penais, ou seja, entre autores do Direito Penal e da Criminologia, cada qual considerando a outra como ciência meramente auxiliar. Contudo, a correta orientação, na atualidade, está em considerar que, apesar de conservar suas respectivas autonomias e seus respectivos métodos científicos (dedutivo e indutivo, respectivamente), a relação entre ambas deve ser de respeito e recíproca troca de informações.

Neste sentido, a separação entre Criminologia e Direito Penal é muito mais apa- rente do que real. Não parece justificável que, em nome da autonomia científica, sejam apartadas radicalmente. Ressalte-se que não existe problema jurídico-dogmático que não requeira um conhecimento de suas bases criminológicas.19

Deve-se, assim, incentivar a integração entre Direito Penal e Criminologia, con- servando, evidentemente, cada qual, a sua autonomia científica. Em outros termos, ambas as disciplinas devem trabalhar para o entendimento global da delinquên- cia e dos problemas atuais de uma sociedade, que é complexa e está em rápida transformação.

Sendo assim, deve ser enfatizado que a compreensão de termos legais ou dou- trinários depende, amiúde, de aportes empíricos, como, v.g., a discussão sobre insa- nidade, embriaguez, doença mental, dentre outros. Até mesmo questões ainda mais corriqueiras, como a noção do que seja um processo mental regular ou os aspectos intelectivo e volitivo do dolo demandam informações psicológicas provenientes da Criminologia.20

Em síntese, há uma frase de Jescheck que bem resume as relações e o significado entre ambas: “o Direito Penal sem a Criminologia é cego e esta sem aquele carece de limites”.21

18. Cf. Pires, Álvaro P. Op. cit., p. 53-54.

19. Morillas Cueva, Lorenzo. Metodología y Ciencia Penal. Granada: Universidad de Granada, 1990, p. 316. 20. Hall, Jerome. General Principles of Criminal Law. 2nd ed. Indianapolis: Bobbs-Merrill, 2009, p. 601.

2.5. DirEiTo DE EXECuÇÃo PENAL,