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2 A LEI N 9.433 DE 1997 ESTABELECE DIRETRIZES DE DIREITO

2.3 DA NORMA DE DIREITO ECONÔMICO

Antes de adentrarmos nesse tópico, mister se faz, a exemplo do professor Washington Albino Souza (2003) e Rosemiro Pereira Leal (2005), pré-estabelecermos o nosso conceito de normas gerais de Direito Econômico; haja vista a dificuldade de estabelecer uma diferença entre norma e enunciado normativo, já que esse constitui um dos modos de tratar a norma.

O primeiro mestre se arrima em Alf Ross (2003) para desenvolver o que esse denominou de normas de competência; ou seja, o novo sentido da correlação União – Estado- Membro, anteriormente restrito somente aos aspectos materiais a serem disciplinados pelas regras e agora ampliado por meio do estabelecimento de balizas de ação politicoeconômica, via princípios; aqui entendido como elemento definidor do conteúdo da norma, no sentido de indicar a ideologia que ela vai concretizar e do referencial regulador de competência entre os Poderes, ou seja, a sua extensão legislativa.

Ademais, Albino de Souza (2003), com o didatismo que lhe é peculiar, estabelece as seguintes definições: a) FUNDAMENTO - define as próprias bases da Ordem Jurídica consagrada nas Constituições; b) PRINCÍPIO - corresponde a valores éticos relacionados com o comportamento social e que define o próprio sentido do justo, de forma a integrar os juízos específicos que são definidos pela ideologia; c) REGRA - é quem assegura a qualidade jurídica (juridicização), ou seja, reconhece a natureza jurídica das opções possíveis, em decorrência da aplicação do princípio que absorveu a explicação advinda da Ciência Econômica; d) NORMA - recebendo da regra a opção já portadora de elementos econômicos e políticos juridicizados, vão imprimir-lhe o sentido do deve ser, ou seja, indicará os modos de efetivação da opção fornecida pela regra (é a expressão do dever ser); e) LEI - é o passo definidor da opção tomada ante as que foram oferecidas pela regra, à norma, e por essa ao legislador, já que se trata de objetivação via atribuição de força cogente.

Particularmente, teremos que discordar do entendimento acima esposado, vez que o mesmo vai de encontro aos fundamentos da teoria discursiva, por nós adotada como marco teórico (HABERMAS, 1997), primeiro porque como bem explica o professor Rosemiro Pereira Leal (2005: 02): “princípios funcionam como memórias de validez teórica em relação

às circunstâncias históricas e aos complexos de interesses aos quais se aplicam, embora a sua legitimidade reclame a exigência de fundamentação juridicopragmática, não bastando uma pura e autossuficiente declaração de generalidade”.

Por sua vez, o autor antecitado, complementa seu raciocínio jurídico dizendo que:

[...] a regra jurídica, como estatuto processual legiferativo, por sua vez, iria conceber e informar a norma jurídica positivada (a lei). Quando equiparamos a regra jurídica a uma especialização projetada do princípio, queremos dizer que a regra será especializada para cada ramo do Direito. O princípio sempre conterá um sentido de validez genérica, sem perder a qualidade de gerar regras nas diversas especialidades do Direito. O roteiro cronológico princípio-regra-norma parece contemplar as diversas conjecturas que se fazem sobre o tema na conceituação dos diversos ramos do Direito (LEAL, 2005: 02).

Verifica-se, portanto, que o conceito de princípio ora analisado precisa ser adequado não só para incorporar as ideias propagadas por Habermas (1997), como também aquelas difundidas por Alexy (1993) e Dworkin (2000), a fim de podermos operar o conflito entre princípios e regras, bem como os que ocorrem entre eles mesmos. Além disso, não se pode mais negar o caráter impositivo dos princípios, vez que autores como Larenz (1997) já pacificaram o entendimento de que os princípios constitucionais são autoexecutáveis, já que não carecem de serem regulamentados.

No mesmo sentido, Humberto Ávila (2003: 18) tem feito a distinção entre essas categorias normativas da seguinte forma:

As regras não precisam nem podem ser objeto de ponderação; os princípios precisam e devem ser ponderados. As regras instituem deveres definitivos, independentes das possibilidades fáticas e normativas; os princípios instituem deveres preliminares, dependentes das possibilidades fáticas e normativas. Quando duas regras colidem, uma das duas é inválida, ou deve ser aberta uma exceção a uma delas para superar o conflito. Quando dois princípios colidem os dois ultrapassam o conflito mantendo sua validade, devendo o aplicador decidir qual deles possui o maior peso.

O ensinamento acima listado demonstra de forma clara a diferença entre princípios e regras, a partir das suas antinomias, haja vista que no primeiro caso haveria ponderação, ou seja, o afastamento de um princípio em detrimento do outro que não seria excluído do ordenamento jurídico, posto que poderia ter a sua validade confirmada em outro caso. Já no segundo, o conflito se resolveria com a invalidade de uma das regras ou com abertura de uma exceção a uma delas.

Sendo assim, as normas não são textos nem um conjunto deles, mas sim os sentidos extraídos a partir da interpretação sistemática de textos normativos, ponto em que divergimos tanto do professor Washington Albino Souza (2003) como do professor Rosemiro Pereira Leal (2005), vez que ambos enxergam a norma jurídica apenas como o que está editado na lei,

isto é, o direito formulado. Por essa razão, algumas das mais importantes fontes do direito como a jurisprudência e os costumes não seriam considerados como pertencentes ao mundo jurídico, o que em nossa opinião provoca um afastamento entre o mundo do direito e o dos fatos.

Além disso, nunca é por demais lembrar que ocorrem casos onde existe norma sem que haja um respectivo dispositivo legal, como por exemplo, no exemplo dos princípios da segurança jurídica e da certeza do direito, e nem por isso eles deixam de configurar como elementos norteadores do direito; ou como prefere denominar o ministro Eros Roberto Grau (2002), princípios gerais não positivados, isto é, não expressamente enunciados em normas constitucionais explícitas. Ocorrem também, outras situações em que há dispositivo, mas não existe norma, ou seja, há dispositivos em que não é construída norma alguma, como por exemplo, o artigo que prevê a proteção de Deus.

Por fim, há casos em que existem mais de um dispositivo, mas a partir deles só é construída uma única norma, como por exemplo, os dispositivos que garantem a legalidade, a irretroatividade e a anterioridade resultam em um único princípio, tal como, o da segurança jurídica. Dessa maneira, não pretendemos, neste ensaio, reescrever a teoria dos princípios, posto que teríamos que despender inúmeras horas para abordar o trabalho desenvolvido por filósofos do direito estrangeiro do porte de Sanchis (1998), por exemplo; como também de ter que fazer a releitura de autores nacionais como Daniel Sarmento (2003), mas, apenas, chamar atenção para a importância de aprofundamos essa matéria dentro de uma linguagem discursiva a exemplo do que fez o professor Tércio Sampaio Ferraz Júnior (1986).

O professor Washington Albino Souza (2003) faz uma distinção entre princípio e norma a partir da Ciência Política, dizendo que ela trabalha com os diversos aspectos da ideologia a qual é definida pelos princípios, razão pela qual eles se confunde com a Ordem Jurídica, no sentido político amplo, como define o referencial regulador da competência; haja vista que para o Direito Constitucional o princípio figura como conteúdo da norma no regime adotado e, como tal, no Federalismo Brasileiro.

Todavia, quando ele diz que existe a distinção conceitual entre princípio e norma, ele peca ao propor que a ideologia, que a norma vai concretizar, reafirma-se no princípio. Pois, como todos nós sabemos, não existe ideologia capaz de refletir os ideais éticos de justiça; sendo assim, o Direito, enquanto técnica de dominação poderia ser utilizado como instrumento daqueles que exercem o poder acreditando que os fins justificam os meios, a exemplo de Hitler, Mussolini e Stalin.

Não obstante isso, o professor Washington Albino Souza (2003) afirma que, quanto à temática versada pela norma, o seu elemento material igualmente pode ser tratado, tanto de modo amplo (genérico), como específico, de acordo com a própria extensão da competência legislativa de cada um dos poderes; motivo pelo qual invoca o exemplo do Direito Financeiro que, com a Constituição Federal de 1946, teve a sua conceituação como disciplina autônoma, chegando-se à identificação de suas normas e, a partir desse ponto, remeteu-se o condicionamento dessas, às normas gerais respectivas, como passo inicial inevitável de sua legislação.

De igual modo, informa que o Direto Econômico obteve, com a Constituição Federal de 1988 com a jurisdição da política econômica. O entrosamento entre os níveis de competência nos apresenta mais complexo do que no Direito Financeiro, face à própria diversidade e amplitude de sua temática; vide o caso do planejamento, da diversidade temática das políticas econômicas específicas (políticas de mercado de trabalho, de capitais, dos ganhos, de preços, de concorrência, de investimentos, de disciplina do poder econômico, dentre outros).

Não há duvidas de que a última carta magna deu um novo impulso ao Direito Econômico, contudo, como a sua sistematização é imperfeita, ou seja, os princípios relativos à ordem econômica não se encontram reunidos em um único título, mister se faz que seja dada uma maior atenção à questão da sua interpretação, ocasião em que teremos que nos valer do trabalho desenvolvido por Alexy (1993) para construir uma hermenêutica constitucional baseada na primazia de princípios suprajurídicos como o da liberdade, igualdade e solidariedade. Ademais, cabe lembrar que o Direito Econômico se caracteriza pelo conflito de interesses antagônicos como, por exemplo, no caso de escassez de recursos hídricos, ou seja, de conflito de uso, cabe determinar qual dos múltiplos usuários (agricultores, industriais, pescadores, dentre outros) deverá ter prioridade na outorga; fato esse que exige a necessidade de trabalharmos dialeticamente a normatividade econômica.

Por fim, cabe pré-anunciar que uma das formas de se fazer isso seria por intermédio do uso da tópica, ou seja, no resgate do pensar por problemas tal qual desenvolvido na obra de Theodor Viehweg (1979), bem como na releitura das obras de Chaïm Perelman (2002), já que esse realizou um estudo voltado para a recuperação do uso da teoria da argumentação pelo Direito. Com isso, sugerimos o estudo do Direito Econômico a partir da adoção de método aberto, isto é, no abandono do sistema autopoiético de Lühmann (2002: 93-180) com vistas a permitir uma análise não fragmentada da realidade econômica. Destarte, o Comitê Gestor da Bacia Hidrográfica, funciona como verdadeiro Parlamento das Águas, e em face da sua

representação tripartite seria possível o exercício de uma gestão democrática no processo de tomada de decisões estratégicas, numa linha discursiva e procedimental.