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4 ASPECTOS ECONÔMICOS DA COBRANÇA DOS RECURSOS HÍDRICOS

4.3 DA ADOÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO POLUIDOR PAGADOR E DA

4.3.2 Principio da Participação

Inicialmente é imprescindível salientarmos que não existe um consenso quanto à nomenclatura a ser dada, se princípio da participação (MACHADO, 2008) (FIORILLO, 2009), da cooperação (DERANI, 2008) (AMARAL, 2008), democrático (ANTUNES, 2008) (SIRVINSKAS, 2008). No entanto, como já denuncia o título deste texto, adotaremos o termo participação, por entendermos ser este o mais adequado à ordem jurídica, devido à disparidade de forças entre o indivíduo e o Estado, cabendo a toda sociedade participar do processo de gestão ambiental.

O princípio da participação está consagrado na atual Constituição Federal do Brasil em seu art. 225, que impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações; consagrando uma tendência inaugurada a partir da segunda metade do século XX (MACHADO, 2008: 95). Nesta linha, a Declaração do Rio de Janeiro, da ECO 92, em seu artigo 10, aplica o princípio da participação ao sugerir que a melhor forma de cuidar do meio ambiente é garantindo a participação de todos cidadãos interessados, devendo ainda em nível nacional cada pessoa ter a possibilidade de participar do processo de tomadas de decisões.

Pertinentes são as palavras de Cunha Junior (1999: 83), quando, em sua Dissertação de Mestrado sobre A defesa do meio ambiente na ordem econômica, traçou os seguintes comentários sobre o princípio em epígrafe:

Cuida-se, pois, de princípio que orienta uma atuação conjunta do Estado e sociedade, na escolha de prioridades e nos processos decisórios. Entre nós, este princípio também foi confortado pelo texto constitucional, no art. 225, quando ali se prescreve que se impõe ao poder Público e à coletividade o dever de defender o meio ambiente e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

É importante ressaltarmos que os princípios do Direito Ambiental, inclusive o da participação ou cooperação, não são exclusivos deste ramo, já que podem ser percebidos em outras áreas do Direito, em especial no Econômico (DERANI, 2008: 141). O princípio da participação integra a estrutura do Estado Social e orienta a prática de políticas que visam alcançar o bem comum por meio da processualidade e da democracia.

Conforme afirmamos acima, é no século XX que se consolida a participação social na preservação do meio ambiente, por isso é que as Constituições daquela época refletem em seu corpo esta nova perspectiva, a exemplo da Constituição da Finlândia que modificou sua Carta Magna em 1995 para dizer expressamente que cada um é responsável pela natureza, pela biodiversidade e pelo meio ambiente; e que os Poderes Públicos devem garantir a cada pessoa a possibilidade de influenciar na tomada de decisões sobre as questões relativas a seu meio ambiente (MACHADO 2008: 95).

Outro país que acompanhou tal tendência foi a Espanha, quando a Constituição de 1978 diz claramente que:

Artículo 45.2. Los poderes públicos velarán por la utilización racional de todos los recursos naturales, con el fin de proteger y mejorar la calidad de la vida y defender y restaurar el medio ambiente, apoyándose en la indispensable solidaridad colectiva (GOYANES, 1994: 213).

Não restam dúvidas de que somente com a cooperação e participação de todos os agentes sociais, Estado e indivíduos é que garantiremos um ecossistema sadio e equilibrado. Deste modo, fica claro que o vínculo da cooperação se dá por intermédio da solidariedade coletiva que é condição sine qua non, para preservarmos a quantidade e qualidade de nossos recursos hídricos; porém, existem duas interpretações para a solidariedade coletiva: a intergeracional, que se refere ao esforço que deve ser realizado pelas atuais gerações para garantir que as próximas possam gozar de um meio ambiente salubre; e a intrageracional, concebida como a cooperação entre todas as pessoas que habitam o planeta terra (AMARAL, 2007: 157).

Para isso, se deve aplicar o princípio da participação em três esferas, conforme explica magistralmente Antunes (2008: 26-28):

Na esfera legislativa, o cidadão poderá exercer diretamente a soberania popular por meio do plebiscito (art. 14, I, da CF), referendo (art. 14, II, da CF), e iniciativa popular (art. 14, III, da CF). Na esfera administrativa, o cidadão pode utilizar-se do direito de informação (art. 5º, XXXIII, da CF), do direito de petição (art. 5º, XXXIV, a, da CF), e do estudo prévio de impacto ambiental (art. 225, §1º, IV, da CF). Na esfera processual, o cidadão poderá utilizar-se da ação civil pública (art. 129, III, da CF), da ação popular (art. 5º, LXXIII, da CF), do mandado de segurança coletivo (art. 5º, LXX, da CF), do mandado de injunção (art. 5º, LXXI, da CF), da

ação civil de responsabilidade por improbidade administrativa (art. 37, §4º, da CF) e da ação direta de inconstitucionalidade (art. 103 da CF).

Na gestão dos recursos hídricos, especialmente na cobrança pelo uso da água bruta, a participação da sociedade está prevista no art. 1º, VI, da Lei 9.433/97 ao determinar que a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades. Em nosso caso concreto, é no comitê gestor das bacias hidrográficas que se processa o debate público sobre a forma e os valores a serem cobrados pelos usuários, bem como a destinação dos recursos financeiros arrecadados.

Embora o Brasil integre uma posição vanguardista no que diz respeito à gestão de recursos hídricos, falta mobilizar a sociedade para que exerça um papel fiscalizador sobre a política nacional destes recursos, pois existe ainda um tendência de centralizar-se as decisões na esfera estatal, não obstante a composição do Conselho Nacional de Recursos Hídricos seja tripartite (grandes usuários, governo e sociedade civil). Isto por que, mesmo em países com tradição participativa como a França, vem se intensificando pressões sociais para uma expansão da participação das organizações não governamentais na gestão dos recursos hídricos, fato em parte ocasionado pela desconfiança dos usuários em relação à qualidade e transparência da gestão pública (RIBEIRO, 2006: 46).

Não podemos esquecer que o princípio da participação, assim como os demais princípios ambientais, deve voltar-se para a ideia de que o Direito Ambiental é dinâmico e não pode ser concebido distanciado das manifestações sociais de cada época (DERANI, 2008). Ademais, como a dominialidade das águas pertence à União, Estados e Distrito Federal nas suas respectivas competências o que se está descentralizando é a gestão dos recursos hídricos, com o fito de gerar uma maior sinergia entre sociedade usuários e governo no aperfeiçoamento contínuo dos instrumentos de gestão previstos na Lei 9.433/97, ou como melhor explica Celmar Corrêa de Oliveira (2006: 120): “Os modelos atuais de gestão dos recursos hídricos têm-se socorrido da descentralização e na participação da sociedade e usuários como instrumentos para o aperfeiçoamento da gestão desses recursos”.

Enfim, é preciso, também, nos preocuparmos em construir um sistema capaz de se retroalimentar com informações advindas de todos os atores sociais; razão pela qual é necessário construir uma estrutura de representação regional que possa conciliar desenvolvimento econômico com preservação dos recursos hídricos, bem como assegurar a repartição dos custos de proteção dos mesmos com base no princípio do poluidor pagador, com o objetivo de evitar a socialização dos custos da degradação ambiental e privatização dos lucros advindos do uso irresponsável destes recursos.

4.4 MODELOS DE PRECIFICAÇÃO ADOTADOS NA COBRANÇA PELO USO DE