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Oficina 09 Discussão sobre o

3.3.5. Debate deliberativo

De acordo com o já mencionado, no capítulo anterior, optamos por trabalhar com um gênero textual cuja capacidade de linguagem dominante fosse o argumentar (Quadro 3, p. 48) e a esfera de atuação a escolar (Quadro 4, p. 49-38). Com essa decisão, em uma primeira instância, buscamos respeitar o trabalho desenvolvido pela professora regente antes da inserção da professora pesquisadora. No último ano de estudos na Escola Básica, a professora regente com quem trabalhamos priorizava um estudo da Língua Portuguesa a partir de questões argumentativas, já que que os alunos, usualmente, prestam exames e provas de processos seletivos que englobam gêneros relacionados à argumentação ao concluir o terceiro ano.

Além disso, consideramos que a argumentação está presente em nossa vida diariamente, em diversas situações de interação social e, por isso, em uma segunda instância, interessa-nos esse trabalho. Assim como afirmam Koch e Elias (2016), acreditamos que “se o uso da linguagem se dá na forma de textos e se os textos são constituídos por sujeitos em interação, seus quereres e saberes, então, argumentar é humano” (KOCH; ELIAS, 2016, p. 23, grifo das autoras). Reiteramos que o ato de argumentar está presente em momentos do dia a dia, desde uma entrevista de emprego até em uma discussão entre amigos.

Diversos são os gêneros textuais do argumentar, contudo, conforme o desenvolvimento potencial dos alunos, determinados gêneros interessam mais ao processo de ensino e de aprendizagem na escola formal:

O trabalho escolar será realizado, evidentemente, sobre gêneros que o aluno não domina ou o faz de maneira insuficiente; sobre aqueles dificilmente acessíveis, espontaneamente, pela maioria dos alunos; e sobre gêneros públicos e não privados [...]. As seqüências didáticas servem, portanto, para dar acesso aos alunos a práticas de linguagem novas ou dificilmente domináveis. (DOLZ; SCHNEUWLY; NOVERRAZ, 2004, p. 98).

Os autores sugerem que seja privilegiado o trabalho com gêneros orais públicos, como debate regrado, entrevista, seminário39, narrativa de viagem frente aos colegas. A partir dessas sugestões e do contexto no qual nos inserimos, optamos por trabalhar com o debate. Sabemos que a escolha desse gênero proporcionaria a produção de textos que não são espontâneos, mas que são, sim, elaborados a partir de um propósito comunicativo. Considerando que os sujeitos também estavam em um processo de aprendizagem não encaramos isto como um problema.

Acreditamos que uma das maiores contribuições didáticas que esse gênero promove esteja relacionada ao processo de escuta de pontos de vista do próprio aluno e também de seus pares, acerca de determinado assunto: “com muita frequência, aliás, uma discussão com outrem não é mais do que um meio que utilizamos para nos esclarecer melhor.” (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 2005 p. 46). Além disso, o debate:

[...] coloca assim em jogo capacidades fundamentais, tanto do ponto de vista lingüístico (técnicas de retomada do discurso do outro, marcas de refutação etc.), cognitivo (capacidade de crítica) e social (escuta e respeito pelo outro), como do ponto de vista individual (capacidade de se situar, de tomar posição, construção de identidade) [...] (DOLZ; SCHNEUWLY ; PIETRO, 2004, p. 248-249).

39 Conforme já pontuamos no capítulo anterior, Travaglia et al. (2013) e Costa (2012) não consideram seminário como gênero textual. Entretanto, listamos esse como gênero oral público a ser trabalhado na escola a fim de respeitar o resgate teórico (Dolz; Schneuwly; Noverraz).

Os autores classificam três formas de debate:

a) debate de fundo controverso: visa à exposição de diversos pontos de vista, o que pode ocasionar influência na posição do outro ou revisão de sua própria posição;

b) debate deliberativo: objetiva, a partir de interesses opostos, a uma tomada de posição;

c) debate para resolução de problemas: visa à elaboração coletiva de uma solução para um problema de ordem do saberes.

Costa (2012), a partir do texto de Dolz, Schneuwly e Pietro (2004), identifica, ainda, mais um tipo, o debate público regrado, ou seja, aquele que apresenta regras e a presença de um mediador. A partir dessa classificação, pensamos que o debate deliberativo facilitaria o tratamento dos textos na análise, uma vez que todos os alunos seguiriam os mesmos procedimentos em suas produções textuais. Não haveria, portanto, diferentes funções na atividade.

Por termos como parceiros, neste estudo, sujeitos que também estão em um processo formal de ensino, acreditávamos que a tomada de decisão poderia contribuir numa atitude de reflexão e de reponsabilidade quanto ao posicionamento, à justificativa, à defesa e à refutação de um ponto de vista frente ao grupo de colegas. Entendemos, do mesmo modo, que todos desempenharem a mesma função, na atividade, colabora com a escuta ativa e com a construção de uma deliberação enquanto turma.

Quanto ao tema do debate, Dolz, Schneuwly e Pietro (2004) defendem que quatro dimensões devem ser consideradas:

a) psicológica: motivações, afetos e interesses dos participantes;

b) cognitiva: relação entre complexidade do tema e repertório dos participantes; c) social: potencialidades polêmicas, contextos, aspectos éticos do tema a ser debatido;

d) didática: aprendizagens possíveis a partir da atividade de debate.

Por essas razões, optamos pelo tema Escola sem partido como mote para as produções inicial e final, tópico bastante controverso, que esteve em discussão, tanto nas instâncias midiáticas quanto nas governamentais, no segundo semestre de 2016, gerando posicionamentos distintos. Além do potencial polêmico, este tema está diretamente relacionado ao espaço escolar, o que pensamos - e confirmamos posteriormente - ser um motivador para a participação dos alunos nas atividades.

Tal escolha também estava relacionada à seguinte questão: antes de entrarmos em sala de aula, até cogitamos manter o mesmo tema para as duas produções, de forma que

poderíamos encarar o segundo texto como uma refacção do primeiro. Contudo, ao pensarmos sobre nossos sujeitos, sabíamos que estávamos lidando com um público que poderia não achar profícuo realizar um debate sobre uma questão já discutida anteriormente. Dessa forma, pensamos que as produções inicial e final poderiam ser desdobramentos sobre o mesmo tema, o que também contribuiria na análise dos dados.