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Mapa 4. Distribuição das vias expressas, coletoras e locais da cidade de Salvador.

V. DEFESAS DOS MOTORISTAS DE TÁ

O motorista de táxi clandestino (particular) G.R., 51 anos contou que vendeu o táxi e a transferência da licença depois de ter sofrido um assalto. Ele diz que o carro padronizado como táxi é o que provocou a motivação do crime, pois o agressor foi em busca de dinheiro e objetos pessoais que taxistas sempre têm à mão (celular, som, DVD, dentre outros). “O táxi é um carro visado pelos ladrões”. Então, com o dinheiro, ele comprou um carro novo, equipou-o com vários acessórios considerados de luxo e continuou fazendo transporte de passageiro, porém sem a licença regular e carro padronizado (cor, faixa, identificação, taxímetro) e só realiza corridas para clientela conquistada (passageiros conhecidos). O preço é combinado, e o trajeto, sempre previsto e conhecido. Atende a chamada por celular ou com combinação prévia de fazer transporte regular de enfermos, crianças para escola, adolescentes para levar e pegar em festas, idosos, dentre outros. Ele diz que agora transita tranquilo pelas ruas. Entende que essa decisão foi uma medida de proteção tanto pessoal quanto para a clientela.

O motorista de táxi N.G., 55 anos, na mesma situação que o ex-taxista, não vendeu o táxi nem transferiu a licença, mas comprou outro carro financiado e alugou o táxi em tempo integral. Ele diz que, depois de ter passado por três assaltos e não conseguir transitar para outra profissão decidiu alugar o táxi e trabalhar em carro particular, com clientela própria. Como defesa, os dois recorrem à clandestinidade como camuflagem do exercício profissional. A diferença está na condição do Sr. N.G. manter o patrimônio e identidade regular como motorista de táxi, mas atuar como clandestino. No momento em que aluga o táxi, não deixa de garantir ganho financeiro, mas, principalmente, transfere para o motorista auxiliar o risco de vitimização.

Os motoristas de táxi proprietários da licença que não desistiram da profissão, mas querem trabalhar com tranquilidade, buscam associar-se a cooperativas ou associações. As associações criadas pelos próprios taxistas procuram cercar o trabalho com proteção por telecomunicação. Nem todos os taxistas, porém, têm condições financeiras para arcar com despesas com as associações. Os motoristas de táxi auxiliar, principalmente, não conseguem manter as despesas com associativismo, sendo a receita bastante comprometida com o pagamento de diárias para trabalhar. Estes estão mais

expostos a riscos de vitimização, mas nem por isso deixam de se beneficiar e participar das defesas construídas coletivamente.

As defesas que os motoristas de táxi utilizam têm como objetivo essencial proteger-se de agressões que cotidianamente vitimizam a categoria. Como se discutiu anteriormente, a noção de defesa foi tomada de empréstimo da teoria de Marcus Felson (2006), que utiliza a descrição de fenômenos naturais. Voltamos a referir que esse autor classifica as defesas como: a) primárias como aquelas que ocorrem antes de detectar a presença do agressor; b) secundárias como aquelas que ocorrem depois que o risco se concretiza em vitimização. Recorremos a Zedner (1994) na tentativa de ordenar e discutir a noção de segurança enquanto sentimento, mas que recorre a materialização das medidas de proteção através de equipamentos, comportamentos e instituições na busca da sensação de sentir-se seguro. Dessa forma, afirmando como Gambetta e Hamill (2005) descrevem as práticas de proteção dos taxistas que buscam a sensação de segurança a partir das relações de confiança. Para os autores citados convergem a ideia de que os mecanismos defensivos desenvolvem-se a partir da sensação de insegurança, identificação e reconhecimento do risco de vitimização.

Dessa forma, a equação que desencadeia na construção de defesas individuais e grupais parece ter o seguinte fluxo: a) identificar uma situação como de risco, esse risco deve ser reconhecido socialmente como tal; b) saber dos possíveis efeitos, gravidade e extensão dos danos; c) produzir respostas eficazes no controle à criminalidade contra taxistas, gerenciando riscos; d) construir estratégias de redução da gravidade dos efeitos da vitimização.

As estratégias de defesas utilizadas pelos motoristas de táxi articulam múltiplas informações que são analisadas e interpretadas com tempo extremamente curto para que a resposta seja realizada. O processo na construção e concretização das defesas acontece com pessoas envolvidas em determinado contexto temporal e espacial. Os indivíduos envolvidos formam uma triangulação que interage e formula respostas tanto da ação criminosa quanto das defesas das vítimas. Tomando Gambetta e Hamill (2005) como orientação da ideia, a cena é composta por motorista de táxi, por pessoa (as) de “boa fé” que demandam pelo serviço de transporte e o agressor, imitando uma pessoa de “boa

Figura 3. Interpretação do fluxo adotado por Gambetta e Hamill (2005).

No contexto dos motoristas de táxi em Salvador acrescenta-se a leitura e interpretação da cena e cenário, ou seja, onde e como ocorre a solicitação do serviço de transporte. Dessa forma, fazem leitura de sinais que podem potencializar fatores de riscos e/ou de proteção.

O motorista de táxi passa a identificar e analisar diversos sinais emitidos pelo passageiro simultaneamente a solicitação pelo serviço de transporte. Num espaço de tempo muito curto ele precisa analisar a demanda, chegar a uma definição e tomar a decisão de atender ou não à solicitação. Quando identificados sinais considerados como propriedades de risco, os taxistas ampliam a verificação buscando outros sinais que venham a “levantar ou baixar a guarda” em relação ao risco de violência. Quando o passageiro potencial reúne sinais que são entendidos como propriedade de atestar confiança, eles vão reduzindo “a guarda” e aceitam a corrida. No trajeto, mantêm-se atentos aos sinais emitidos pelo passageiro. Porém, quando são identificadas propriedades de risco, se deparam com a difícil decisão de aceitar ou não a corrida. O que pode significar aceitar e adotar defesas secundárias ou negar o risco ou recusar a exposição ao risco, não aceitando a corrida. Essa decisão pode também estar contaminada de preconceitos, que pode levar a conclusões injustas. O grande dilema torna-se muito complexo observando que o tempo disponível para toda essa operação não ultrapassa ao tempo de um minuto, muitas vezes ocorre em frações de segundos.

MOTORISTA DE TÁXI

Levantar a guarda Baixar a guarda Confiança

Defesas

PASSAGEIRO