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DEFESAS • DEFESAS SECUNDÁRIAS

2. Vizinhança do ponto de tá

5.2.2 Defesas secundária intergrupais

As defesas classificadas como intergrupais agregam aquelas que são planejadas, executadas e gerenciadas por grupos de taxistas, ou seja, construídas e realizadas coletivamente pela categoria.

A eficácia das medidas de controle coletiva é creditada pelos taxistas como eficazes e justas diante do tipo de crime cometido pelos agressores, sendo a resposta de acordo com o tipo de crime cometido contra eles. De certa forma, no discurso dos entrevistados, é percebido como atos de violência cruéis, porém justificados pelo tipo de crime cometido que gerou tal resposta. Diante da falta de crédito nas ações da polícia da segurança pública e diante da condição econômica de não disporem de recursos para investir em segurança privada, argumentam que somente uma atitude agressiva poderia conter a violência contra a categoria. Em relação a serviços privados, colocam como muito difícil. Aqueles que pagam por esses serviços são em seus locais de moradia e advertem que seria muito dispendioso ter segurança para os taxistas. Seria necessário cobrir toda a cidade, o que torna inviável.

Taxistas agem em grupos em determinados momentos, mas é verdade que seguem solitários quando se deparam com situação criminosa contra eles. Contam com a maioria dos colegas compondo uma rede social de apoio diante de algumas experiências ou suspeita de vitimização.

A partir da reunião de pequeno grupo de trabalhadores, tomam decisões e convocam o grupo maior. Nem todos aderem à convocação. Um dos entrevistados disse que há taxistas que são da polícia e, portanto, ajudam a montar as estratégias. Em caso de desaparecimento de taxista, roubo de carro, eles desenvolvem por contra própria a busca independentemente da segurança pública. O que leva a crer que possuem conhecimentos muito sutis que possibilitem uma ação que demanda cautela, interrelação em determinados territórios, para que seja possível realizar a busca. Não parece, pelo discurso econômico dos entrevistados sobre esse tema, que eles agem de forma ingênua e amadora.

“Quando mataram nosso colega no Cabula. Ele era uma pessoa tranquila, um pai de família, estava trabalhando e dia tamanho[durante o dia] pegaram ele na rodoviária levaram para o Cabula e mataram sem necessidade. Juntou um grupo de vinte taxistas conhecidos dele e começou a caçada. No final já tinha mais de cinquenta taxista ajudando a polícia. Localizaram o carro e encontram dois suspeitos. Fomos todos pra lá pra linchar, mas polícia já estava lá com eles e não deixou, mas vontade da gente é de acabar com ele também” (C.G., 55 anos, taxista)

Ao mesmo tempo em que fica evidente que as práticas têm um significado para os trabalhadores de caráter “educativo” contra os perpetradores do crime, observa-se um comportamento associado à agressividade construída culturalmente, imanente ao gênero masculino, em que alguns grupos sociais exigem dos homens um comportamento audacioso, corajoso e a utilização da força como meio de garantir e impor ordem (MINAYO, 2005).

Entre as práticas identificadas de controle e proteção contra o crime dos motoristas, a vigilância passa a ganhar uma dimensão ampliada, pois a própria situação de estar nas ruas exige desenvolver mecanismos sutis de observação e percepção com a intenção de controlar e antever eventos não desejados. Esse sensor será chamado aqui de vigilantismo e entendido como ações que exigem planejamentos simples, sendo executadas por pessoas comuns, sem autorização e participação do Estado, podendo usar a força com a intenção de reduzir a sensação de insegurança e buscar proteção (CERQUEIRA e NORONHA, 2006)

O vigilantismo como estratégia de proteção e controle do risco utilizado pelos motoristas de táxi adquire um caráter que se aproxima de um código de ética da categoria. Nele, as respostas podem ser violentas contra os agressores e assumem um significado de medidas julgadas como necessárias para o controle e repressão dos crimes contra motoristas de táxi. Nesse sentido, o vigilantismo passa a ser uma das ações de gerenciamento do risco.

A construção do conhecimento e a disseminação sobre tipos de violência e formas de vitimização entre os motoristas de táxi acontecem basicamente através da transmissão oral, seja contando casos entre grupos nos pontos ou através da central de chamadas de táxi. Apesar de absorverem as informações divulgadas pela imprensa, principalmente rádio e jornais impressos, a comunicação oral e informal entre taxistas permite a construção de conhecimentos e serve para formular defesas para

enfrentamento dos problemas da categoria. Foram encontrados via on line, blogs, grupo em Orkut, porém tem sido baixa a adesão dos taxistas a esses novos meios.

Com se viu anteriormente, os motoristas, diante das centrais de chamada de táxi, adotam uma linguagem própria ao se comunicar através de radiotransmissor, sendo que nessa linguagem são utilizados códigos para identificação do problema e envolvidos. O nome do motorista não é citado, já que a linguagem cifrada adota informações numéricas para identificação do táxi e dos taxistas, utilizando número do alvará (número que consta na lateral do carro), incrementando a linguagem baseada em códigos entre trabalhadores e centrais de chamada de táxi.

A central dissemina a informação entre os associados e para outras centrais, assim como providencia chamada de polícia ou socorro mecânico ou de saúde. Esse processo ocorre com comunicação intensa e constante entre a central e taxistas que emitem variadas informações que vão compreendendo a situação. Com a divulgação das informações, alguns motoristas, principalmente aqueles que estão trafegando naquelas imediações, vão até o local ou passam por lá mantendo a central informada. Em muitos casos há uma aglomeração de táxis nas imediações da ocorrência suspeita até que seja identificada a real situação.

“(...) A gente quando percebe algo estranho, passa pelo local, olha, avisa pra

central, retorna ao local, quando é caso de carro quebrado de táxi que é associada [central] então ela comunica, quando não e não tem sinal do motorista pedindo ajuda, aí é considerado suspeito, até mesmo quando não tem ninguém dentro do táxi.” (A.D., 35 anos, taxista).

Aproximam-se com cautela, param o carro com certa distância, observam o ambiente antes de sair do veículo e prestar socorro para o colega. Segundo os entrevistados, os cenários que sugerem suspeita de vitimização por violência têm sido carro parado em lugares escuros com movimento reduzido, nas margens da via principal ou em vias alternativas, fora da via principal, com faróis acesos, luz do interior do veículo apagada, mais de uma pessoa como passageiro e quando o passageiro é homem. Afirmam como comportamento suspeito quando percebe que o colega evita fazer sinal e olhar em direção ao táxi do colega. “Pois parece que ele está sendo ameaçado, não

a. Do espancamento aos linchamentos por taxistas

As punições empregadas pelos taxistas podem alcançar o mais alto grau de vitimização dos agressores que agem contra a categoria. Durante as décadas de 1980, 1990 e 2000, há registro de pena envolvendo espancamento grave e morte. As ações violentas dos taxistas são consideradas por eles como medidas de intimidação dos pretensos agressores. Porém, os atos ultrapassam a compreensão como medida de segurança e ganham teor de crime. Daí os taxistas transitarem, neste contexto, entre os papéis de vítima e criminoso.

Há referências a práticas de autopoliciamento – “punir com as próprias mãos” – em que se verifica o emprego da força e as ações violentas como forma de punição aos agressores. Uma demonstração de força e poder da categoria. Muitos dos entrevistados referem que não participam de atos violentos contra agressores, mas alegam que a falta de respostas eficientes da segurança pública na repressão ao crime favorece o desenvolvimento de ações praticadas por grupos em busca de proteção. Nenhum dos entrevistados revelou ter participado de algum ato de violência contra os criminosos, mas nenhum desaprova a atitude dos colegas que cometeram tal crime e saem em defesa dos seus pares. Argumentam que os taxistas se defendem com os recursos que têm disponíveis e atos que são justificados como medidas de controle do crime.

“Tinha dois marginais que estava assaltando taxistas sempre do mesmo jeito pegava no Rio Vermelho corrida para aeroporto e chamava pelo rádio. Cada um dia ele falava um nome diferente e endereço diferente. Foram mais de dez assaltos em cinco meses. Começamos a perceber que era o mesmo cara. Um dia a gente pegou. Eu chamei a polícia, mas dizem que um grupo de taxista chegou antes da polícia e levou os dois para as dunas lá em Itapuã [bairro] e lá bateram e dizem que enterraram os dois vivos.” (T.E., 48, anos, taxista).

Nos artigos do jornal A Tarde foram identificadas práticas ou tentativas de linchamento dos criminosos ou suspeitos, demonstrando a disposição do grupo em agir com severidade e força no combate ao crime contra a categoria. Os casos registrados revelam uma ação ousada e cruel, como invasão a delegacia, retirada do criminoso/suspeito e realização de linchamento em lugares públicos. Em Vitória da Conquista, em 2004, motoristas de táxi invadiram a delegacia, levaram o criminoso para uma área pública, mataram-no e depois amarraram o corpo em um dos carros, arrastando-o pelas ruas da cidade (A Tarde, “Taxistas lincham criminoso”, 03.02.2004). Cerqueira e Noronha (2006) registram a presença de taxistas e mototaxistas como

perpetradores de crime de linchamento. A exposição pública do agressor morto assume o significado de vingança pela morte do colega taxista e representa ameaça aos potenciais agressores, com a intenção de desencorajar as futuras ações criminosas contra a categoria. O grupo que organiza e executa a ação é composto, geralmente, por colegas do taxista vitimizado.

b. A busca e recuperação de carro roubado

A busca pelo carro roubado acontece através da mobilização de pequenos grupos formados por amigos da vítima e conta com a divulgação e atenção de todos os taxistas que possuem radiotransmissor. As centrais divulgam o roubo do táxi, a identificação do veículo (número do alvará) e do proprietário, o local e circunstâncias da ocorrência. E assim os taxistas ficam convocados à diligência intensa pelas ruas da cidade em busca do carro. Quando o veículo é encontrado, o taxista avisa à central, que aciona a polícia e os outros taxistas. O taxista proprietário segue junto com a polícia e com um grupo de taxistas para o resgate do bem.

5.2.3 Defesas secundárias extragrupais