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CAPÍTULO 1 A CONSTRUÇÃO DO OBJETO PESQUISADO

1.1. O CENÁRIO DA PESQUISA

1.1.2 Desafios dos marcos legais

Ainda que se esteja, neste estudo, enfatizando a docência universitária em Parasitologia e Microbiologia e, pormenorizando o modo como esta tem se desenvolvido em IPES do norte do Brasil, o olhar investigativo adotado buscou uma compreensão do contexto sociohistórico e institucional em que os conhecimentos, concepções e práticas dos docentes participantes da pesquisa estavam inseridos.

Deste modo, foi realizada uma revisão de literatura sobre a docência universitária, envolvendo distintas fontes, como os documentos referentes à

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Secretaria do Instituto de Ciências Biológicas (ICB)/UFAM

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legislação educacional brasileira, além daquelas relacionadas à literatura especializada, como livros, artigos científicos publicados em periódicos especializados e comunicações apresentadas em congressos e encontros de pesquisadores.

Em relação à literatura especializada, será apresentada a discussão, envolvendo a prática docente universitária em três distintos coletivos: a Pedagogia Universitária, a EC e EB.

Inicialmente, será feita uma apresentação sintética dos aspectos da docência universitária, presentes em diversos marcos legais, apontando necessidades formativas, objetivos institucionais e diretrizes curriculares. Neste sentido, por exemplo, em relação à formação requerida para o docente visando atender as exigências da LDB (BRASIL, 1996), compreende mais do que o domínio de técnicas educacionais. Requer, segundo este documento, uma formação humanística mais ampla para dar conta das finalidades da educação superior, conforme propugna o artigo 43º., em dois de seus incisos que podem contribuir com a presente análise. São eles:

I - estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo; e; VI - estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade (BRASIL, 1996, p. 38 e 39). Além destes, a referida lei, em seu artigo 52º., prossegue neste mesmo tom, ao afirmar que:

as universidades são instituições pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano (BRASIL, 1996, p. 39).

E, novamente, em seu inciso I, faz referência à contextualização, ao caracterizar as universidades como:

centros de produção intelectual institucionalizada mediante o estudo sistemático dos temas e problemas mais relevantes, tanto do ponto de vista científico e cultural, quanto regional e nacional (BRASIL, 1996, p. 40).

Nestas diretrizes acima referidas, ainda que tais elementos pressuponham a participação integrada destes cursos (e, portanto, de seus

docentes), não há, de modo particular, uma explícita atribuição destas responsabilidades à prática de docentes de conteúdos específicos. Acredita-se, entretanto, que o desenvolvimento das competências e habilidades referidas acima, requeira o ensino interdisciplinar e contextualizado dos conteúdos ministrados nestes cursos e, portanto, o envolvimento destes docentes.

No caso das DCN que tratam, de modo geral, dos cursos de formação de professores para a Educação Básica, as licenciaturas, há (BRASIL, 2002a) uma discussão mais extensa e aprofundada sobre as exigências na formação destes profissionais em relação aos conhecimentos e práticas no campo educacional. Por este motivo, será dado maior destaque a esta discussão.

O referido documento, em seu artigo 5º. (que trata do projeto pedagógico dos cursos), por exemplo, em dois de seus incisos, assinala que:

IV - os conteúdos a serem ensinados na escolaridade básica devem ser tratados de modo articulado com suas didáticas específicas; (e) V – que a avaliação deve ter como finalidade a orientação do trabalho dos formadores, a autonomia dos futuros professores em relação ao seu processo de aprendizagem (...) (BRASIL, 2002a, p. 2).

No caso da articulação entre os conteúdos e as didáticas específicas, o artigo 12 das DCN busca fazer da prática docente um elemento integrador entre as disciplinas, já que esta não poderá ficar reduzida a um espaço isolado, que a restrinja ao estágio, desarticulado do restante do curso e, em seu parágrafo 2º., reafirma que a prática deverá estar presente desde o início do curso e permear toda a formação do professor (BRASIL, 2002a, p.4). Deste modo, ainda que não se faça referência explícita ao papel das disciplinas de conteúdo específico, o referido artigo indica a necessidade de integração entre disciplinas no papel de formar estes licenciandos, indicando a onipresença desta tarefa ao longo de tais cursos.

Já em relação à organização institucional da formação dos professores, o artigo 7º desse mesmo documento aponta alguns princípios norteadores, dentre os quais se assinalaria:

estreita articulação com institutos, departamentos e cursos de áreas específicas, a indicação de formação dos formadores, incluindo na sua jornada de trabalho tempo e espaço para as atividades coletivas dos docentes do curso, estudos e investigações sobre as questões referentes ao aprendizado dos professores em formação (BRASIL, 2002a, p.3).

Neste artigo, chama atenção a necessidade de se implementar, entre os formadores de professores atuantes em disciplinas específicas, práticas que potencializem o desenvolvimento das competências requeridas pelos futuros professores.

Por fim, estas DCN enfatizam ainda (art. 14º.), que cada instituição construa:

projetos inovadores e próprios, com a flexibilidade necessária, que abrangerá as dimensões teóricas e práticas, de interdisciplinaridade dos conhecimentos a serem ensinados (BRASIL, 2002a, p. 4).

O texto da LDB não faz referência explícita às disciplinas de conteúdos específicos, não atribui a elas, em particular, tais tarefas. Tal particularidade do ensino superior pode ser melhor compreendida em outros documentos, como as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) dos cursos em que estes docentes lecionam, sobretudo os da área de Biologia (BRASIL, 2002a) e Saúde, como Medicina (BRASIL, 2001b), Odontologia (BRASIL, 2001c) e Enfermagem (BRASIL, 2001d), por exemplo.

No caso da área de Saúde, o artigo 4º., que, versando sobre aspecto compartilhado por todos estes cursos, possui redação idêntica em suas DCN (BRASIL, 2001a; b; c; d), traz diversos elementos da formação destes profissionais que requerem, para sua efetivação, que os docentes promovam uma educação interdisciplinar e contextualizada, como a prática integrada e contínua com as demais instâncias do sistema de saúde, além da capacidade de pensar criticamente e analisar e buscar soluções para os problemas da sociedade (inciso I); capacidade de comunicação eficiente com o público em geral, domínio de, ao menos, uma língua estrangeira e de tecnologias de comunicação e informação (inciso III); aptidão para tomar iniciativas, gerenciar e administrar informação, força de trabalho e recursos físicos e materiais (inciso V) e; além disso, capacidades para o aprendizado contínuo, na formação e na prática, com sua própria formação e com a formação de futuros profissionais (inciso VI).

Falar-se em Docência Universitária na área de Biologia, pressupõe fazer-se referência às Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Ciências Biológicas (BRASIL, 2001a) no que tange à formação do professor de biologia, em particular.

As DCN para os cursos de Ciências Biológicas (estabelecidas pela Res. CNE/CES nº. 7/ 2002 e integrantes do Parecer CNE/CES nº. 1.301/ 2001; BRASIL, 2001a; 2002d) enfatizam a importância de uma compreensão interdisciplinar e contextualizada da Biologia, ao afirmar que particular atenção deve ser dispensada às relações estabelecidas

pelos seres humanos, dada a sua especificidade e ainda que, em tal abordagem, os conhecimentos biológicos não se dissociam dos sociais, políticos, econômicos e culturais (BRASIL, 2001a, p. 1). E dentre as competências e habilidades desejadas, sugere que o biólogo utilize os conhecimentos das ciências biológicas:

para compreender e transformar o contexto sócio- político e as relações nas quais está inserida a prática profissional (...), e atue multi e interdisciplinarmente, interagindo com diferentes especialidades e diversos profissionais (...) (BRASIL, 2001a, p. 3).

Segundo a literatura especializada, os pressupostos indicados como diretrizes curriculares neste documento poderiam ser compreendidos de modo distinto entre docentes universitários de disciplinas pedagógicas e/ou integradoras, em relação aos que lecionam conteúdos específicos, caso da Parasitologia e da Microbiologia.

Diversos estudos têm indicado a presença dos primeiros na construção e sistematização coletiva de conhecimentos nas áreas de EC (NARDI; ALMEIDA, 2004) e EB (SLONGO; DELIZOICOV, 2006; TEIXEIRA; MEGID NETO, 2011). Nestes, os autores descrevem um processo de crescente produção e aprofundamento teórico-epistemológico dos docentes, aprimorado pela criação e desenvolvimento de sociedades científicas nas áreas de EC, como a Associação Brasileira de Pesquisas em Educação em Ciências (ABRAPEC), de Ensino de Biologia (EB), como a Sociedade Brasileira de Ensino de Biologia (SBENBIO), além daquelas que atuam em áreas como o Ensino de Física, Química, Matemática, Geociências, etc.

Pesquisas que envolvem aspectos da constituição de docentes universitários de conteúdo específico, por sua vez, são raras (SILVA; SCHNETZLER, 2001; GONÇALVES et al., 2007; ODA; BEJARANO, 2007; ODA; DELIZOICOV, 2011), requerendo ainda uma sistematização. Na maioria destes estudos, destaca-se a falta de envolvimento de tais profissionais com os saberes e práticas do campo educacional, culminando, consequentemente, em uma postura pedagógica mais tradicional.

Apesar disso, particularmente, dois deles, indicam possibilidade de superar estes problemas, aproximando as práticas destes docentes a um modelo capaz de oferecer a formação indicada pelas referidas DCN.

O primeiro é o de Gonçalves et al., (2007), cujos autores apontam estratégias para uma relação mais próxima entre docentes de conteúdos pedagógicos e/ou integradores e aqueles que ministram conteúdos específicos. Dentre estas estratégias, podem-se referir as atividades de produção conjunta de

livros didáticos, a publicação de artigos na área de ensino em periódicos especializados de áreas ditas hard, etc. Já o segundo destes elementos é apontado por Silva e Schnetzler (2001) e refere-se à existência de certos docentes, que, por suas concepções e práticas, distanciam-se do modelo tradicional. Segundo as autoras, dada a supremacia dos conteúdos específicos em grande parte dos currículos nacionais das licenciaturas, a presença de sujeitos com práticas diferenciadas é fundamental no sentido de propiciar aos alunos um modelo alternativo, mais afinado com pressupostos de uma educação sintonizada com os parâmetros e as diretrizes curriculares das licenciaturas.

Adicionalmente, tais apontamentos não dizem respeito somente ao professor de biologia, antes sinalizam características profissionais do biólogo, quer seja docente da educação básica, do ensino superior ou bacharel.

Deste modo, qualquer curso de Biologia em território nacional deve garantir ao aluno:

um ensino problematizado e contextualizado, assegurando a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; (...) a formação de competência na produção do conhecimento com atividades que levem o aluno a: procurar, interpretar, analisar e selecionar informações; identificar problemas relevantes, realizar experimentos e projetos de pesquisa (BRASIL, 2001, p. 5).

Por fim, neste documento, sugere-se que os conhecimentos biológicos sejam distribuídos ao longo de todo o curso, devidamente interligados e estudados numa abordagem unificadora (BRASIL, 2001, p. 5).

Além destes marcos legais, a balizar a formação pretendida para estes profissionais, especialistas nos campos da Pedagogia Universitária e da EC e EB têm discutido, a partir de vasta produção acadêmica, estes e outros aspectos da docência em nível superior.