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FUNCIONAMENTO DE APARELHOS AUDITIVOS EM FAVOR DE MENOR SAÚDE DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL ART 227 DA CF/88 LEGITIMATIO AD CAUSAM DO PARQUET ART.

3. ASPECTOS PROCESSUAIS RELEVANTES PARA O ESTUDO DA TUTELA COLETIVA

3.3 Direito ou interesse?

Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr., entendem que o vocábulo “interesses” não oferece a mesma garantia que a expressão “direitos”, e que seria de melhor técnica manter a expressão direitos difusos, direitos coletivos e direitos individuais homogêneos, livres da “falsa” impressão de amplitude do vocábulo “interesses”. Defendem esses autores que toda situação jurídica reconhecida em lei será direito, portanto292.

288

Como informa Hugo Nigro Mazzilli, a súmula n. 7, do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo, propõe o critério da relevância social para aferição da legitimidade (interesse) do Ministério Público para promover a Ação Civil Pública, mesmo em se tratando de direitos individuais (MAZZILLI, Hugo Nigro.

Introdução ao Ministério Público. 6. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 139 e 242). 289

Como dito, em sua gênese o direito à saúde inicialmente surge para a classe dos trabalhadores, coletivo stricto

sensu, portanto. Progressivamente foi assumindo nos textos das constituições status de direito difuso e, por

vezes, chegando a atingir tamanho grau de complexidade somente observado nos direitos metaindividuais. 290

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 523. 291

ARENDT, Hannah ainda destaca: “Há um profundo abismo entre aqueles que, no passado, sabiam que a Terra girava em torno do Sol, que nem a Terra nem o Sol era o centro do universo, e que haviam concluído que o homem perdera o seu lugar e a sua posição privilegiada na criação, e nós, que ainda somos, e provavelmente sempre seremos, criaturas da Terra (...)” (ARENDT, Hannah. A condição humana. 10. ed. Tradução de Roberto Raposo. Posfácio de Celso Lafer. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005, p. 280-281).

292

Para Teori Albino Zavaski, é preferível utilizar a terminologia “direito” somente quando a titularidade do interesse juridicamente protegido pertencer a um “sujeito” perfeitamente “determinável”293.

Interesse interliga uma pessoa a um bem de vida em virtude de um determinado valor que esse bem possa apresentar para aquela pessoa. Pareceria correto, então, o entendimento de que a terminologia “direito” só poderia ser utilizada nas hipóteses onde se verificasse a “proteção” “judicial” de um “interesse” e o titular desse interesse (juridicamente protegido) fosse um “sujeito determinado”, ou, na terminologia adotada pela doutrina clássica, o “indivíduo”.

O estudo dos “interesses” metaindividuais, transcendentes da esfera individual do ser humano, conduziria a uma primeira (mas não definitiva) conclusão, no sentido de ser incorreta a atribuição do “status direitos” a tais interesses.

Refutamos a “teoria” que defende a impossibilidade de se atribuir subjetividade jurídica aos interesses transindividuais. Referimos, então, a “direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos”. Um “novo” conteúdo para o mesmo, no qual a subjetividade diria respeito não mais apenas a um certo indivíduo mas, isto sim, seria uma subjetividade própria da condição humana, sendo, assim, vinculada ao gênero e não ao especimen isolado.

Destarte é possível falar em um direito subjetivo difuso, como relatamos alhures “a eficiência enquanto um direito difuso da cidadania”. Não se trata, portanto, de um direito subjetivo restrito ao Poder Público, nem, tampouco, isolado aos indivíduos, mas, sim, e agora em nova amplitude, de um direito subjetivo pertencente a “todos”, que virá a se tornar a tônica do processo coletivo doravante. O interesse legítimo é colocado entre o interesse simples e o direito subjetivo. Os interesse simples são marcados pela total indiferença do Poder Público.

Diferentemente, a partir do momento em que o Estado passa a tutelar, surge o chamado “interesse juridicamente protegido”. Não há uma diferença essencial, e sim uma diferença em termos de intensidade quanto à proteção estatal. Assim, os estudiosos ao destacarem os interesses legítimos passaram a garantir, ao menos reflexamente, a proteção aos interesses metaindividuais ou transindividuais. A melhor solução foi o reconhecimento da transferência da condição legitimante do parâmetro da “titularidade” do direito para o binômio “relevância social do interesse/adequação do representante”.

293

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo - Tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, passim.

Interesse difuso não apresenta um vínculo jurídico básico, mas exsurge de situações de fato, de largo espectro social, cuja solução dependerá de uma opção entre várias escolhas políticas possíveis, chegando inclusive a observar que o interesse difuso apresenta uma amplitude maior em relação ao interesse legítimo.

Assim, aceitando-se a distinção entre interesses difusos e legítimos; reconhecendo-se a tendência moderna das legislações pátrias e alienígenas tutelarem juridicamente os interesses transindividuais, atribui-se a tais interesses o status de direitos subjetivos transindividuais (abrangendo aí, é claro, a sua modalidade “difusa”), mesmo diante de situações em que a sua titularidade seja indeterminada, mesmo diante de situações que não estejam expressamente previstas em lei, ou que, em tese, caracterizaria a figura do “interesse simples” desde que preenchida a condição legitimante, materializada pelo binômio relevância do interesse- representação adequada.

O autor destaca ainda que parte da doutrina classifica os interesses em três categorias distintas e autônomas: públicos, privados e metaindividuais, ou somente, para alguns, difusos. Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin citado por Teori Albino Zavaski, por exemplo, prefere o gênero interesses supra-individuais e às espécies interesses público, difuso, coletivo

strictu senso e individual homogêneo.

Teori Albino Zavaski continua a revisão bibliográfica, desta feita referenciando o expoente Rodolfo de Camargo Mancuso, o qual, por seu turno, salienta que, conquanto se possa distinguir os interesses, segundo sua dimensão subjetiva em “individuais” de um lado e “meta ou supra-individuais” de outro, fato é que, assim como os “individuais” comportam subespécies (“interesse simples ou de fato”, “meras expectativas”, “interesses reflexamente protegidos”) assim também se passa com os “meta ou supra-individuais”, que igualmente se decompõem em subtipos, enquadrados em “faixas” diversas do universo coletivo: interesses “difusos”, “coletivos em sentido estrito” e “individuais homogêneos” (Lei no 8.078/90, art. 81, I, II e III). Prefere-se, então falar em “interesses individuais” (esfera privada), “interesses públicos” (restritos ao Estado, enquanto sujeito de direito) e “interesses transindividuais (transindividuais ou supra-individuais, transcendentes da esfera individual, assumindo feições difusa, coletiva ou individual homogênea)294.

Observamos que não existe muita paz doutrinária quando o assunto é definir essas expressões. Assim, apresentamos uma proposta que se segue de justificativas.

294

O fato é que a Lei 8.078/90 (CDC) ao disciplinar igualmente, ao menos do ponto de vista prático, tornou despicienda a diferenciação entre “direitos ou interesses”. Neste sentido, também é o parecer de Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr., op. cit., p. 64-65.

Partimos do reconhecimento que está-se a discutir liberdade, bem como o estabelecimento do acesso ao gozo de liberdade, não obstante essa seja uma verdade quase inconfessável depois de recepcionadas as ondas renovatórias de acesso à justiça, proposta por Mauro Cappelletti, conforme foi visto.

Assim, inicialmente é contemplado o indivíduo, e, numa dialética constante e circular, a idéia é compartilhada e fruída, igualmente, cada vez mais por todos, observadas as contingências factuais.

Pois bem, com o surgimento da idéia de supremacia da “coletividade”, houve uma relativização do poder individual, produto do equívoco de se acreditar que a Democracia resume-se à prevalência da vontade da maioria. Como se “as maiorias” não fossem compostas de vontades e interesses individuais. Como se este (o indivíduo) estivesse disposto a aceitar sua anulação, apenas por racionalizar em si, a solidariedade. Na gênese, decorre do exclusivismo cientificista que propalou a incompatibilidade entre o organicismo e o mecanicismo. Outro engano secular.

Bem, se reconhecermos uma racionalidade que determina e é determinada por uma perspectiva antropocêntrica, e que cada homem traz em si não apenas essa idéia, mas esse sentir, ainda que inconscientemente, entenderemos que ele jamais negaria a si próprio, mas estabeleceria o consenso apenas como uma necessidade, jamais como uma virtude. E que este mesmo homem quando admitisse a sua relativização em face do coletivo, estaria apenas cada vez mais confirmando a si próprio. Vejam mais adiante as justificativas e os requisitos da tutela coletiva (economicidade, praticidade, acesso a “todos”, os “fins” do Direito, segurança, inviabilidade da tutela individual etc.). Não se fala de virtudes, mas de interesses. Mesmo os valores nascem na empatia, aquela tendência para sentir o que sentiria caso estivesse na situação e circunstâncias experimentadas por outra pessoa. Compreendemos que não fosse o interesse na proteção individual, o proteção coletiva seria sempre subsidiária. Assim, reconhecer a supremacia da tutela coletiva, em verdade é reconhecer o indivíduo com centro de interesses, donde surgem os interesses e para onde regressam.

Deste modo, o transindividualismo é uma perspectiva dialética e circular do próprio indivíduo. Por isso, adotamos a expressão “transindividual” como gênero das espécies difuso, coletivo em sentido estrito e individual homogêneo, também chamado de eventualmente coletivo. Mas, entã,o o que seriam os interesses ou direitos denominados de metaindividuais? A Resposta para esta questão será apresentada no próximo capítulo, em ponto específico, quando tratarmos das categorias difuso, coletivo stricto sensu e individuais homogêneos.

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