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EFEITO VINCULANTE: MOMENTO E ABRANGÊNCIA

4 O ESTUDO DOS DISPOSITIVOS QUE REGULAMENTAM A SÚMULA

4.8 EFEITO VINCULANTE: MOMENTO E ABRANGÊNCIA

A Constituição foi expressa em afirmar que a súmula vinculante só começará a gerar efeitos a partir da sua publicação na imprensa oficial. Nesse ponto, vale ressaltar apenas a vedação expressa de qualquer tentativa de retroatividade no caso da súmula vinculante. Dessa forma, mesmo com a lei criando um mecanismo para a modulação dos efeitos (que será analisado mais adiante), essa ferramenta só poderá funcionar para o futuro, pois, do contrário, haveria violação do comando constitucional.

Entre os afetados por esse instituto estão os demais órgãos do Poder Judiciário e a Administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Sobre o assunto, basta afirmar apenas que um dos alvos pretendidos pela Emenda Constitucional 45 era justamente a Administração Pública, que como grande “cliente” do Poder Judiciário passou a ser obrigada a adotar os enunciados vinculantes do Supremo Tribunal Federal, o que pode diminuir significativamente a discussão sobre matérias repetitivas, que já tinham um pronunciamento da Suprema Corte sobre o assunto, mas que, não obstante, eram objetos de discussão pela Administração Pública222. Ademais, houve um cochilo do constituinte (repetido pela Lei 11417 de 2006) que não incluiu o Distrito Federal entre os entes vinculados pela súmula vinculante223. Apesar disso, não há dúvidas de que tal ente também está envolvido por essa autoridade, até pela sua identidade de tratamento em relação a Estados e municípios.

222 Comentando sobre o assunto, Bruno Mattos e Silva é enfático ao afirmar: “Mas o aspecto mais importante da Reforma do Judiciário é, certamente, a aprovação da súmula vinculante para a Administração Pública. A partir de agora, está a Administração Pública direta e indireta, dos três níveis de governo, vinculadas às súmulas do STF que gozarem do atributo da vinculação, isto é, que atenderem aos requisitos do art. 103-A da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº 45/2004 ou do art. 8º dessa mesma Emenda. Se o STF, órgão supremo do Judiciário nacional, constitucionalmente competente para interpretar a Constituição Federal, decide que a interpretação de um dispositivo constitucional é em um determinado sentido, não é nem um pouco razoável que qualquer outro órgão do Estado brasileiro (seja judicial ou administrativo) venha dar outra interpretação ou venha decidir em sentido contrário. Isso significa que se o STF disser que o percentual correto de reajuste para um aposentado ou para o FGTS é xis, não pode (ou, pelo menos, não poderia) um juiz dar outro percentual ou o administrador público deixar de pagar esse xis de reajuste. SILVA, Bruno Mattos e. A súmula

vinculante para a Administração Pública aprovada pela Reforma do Judiciário. Jus Navigandi, Teresina,

ano 9, n. 541, 30 dez. 2004. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/6101>. Acesso em: 11 de junho de 2010.

223 Nesse sentido, Gevany Manoel dos Santos: “Assim, vinculados ao enunciado de súmula vinculante está toda a administração pública citada no §2º da Li da Súmula Vinculante. Lembrando-se que o referido artigo não tem forma taxativa e certamente estão vinculados também os distritos, entre eles o próprio Distrito Federal, mesmo não tendo sido citados. Absurdo seria pensar que os distritos ficaram fora da vinculação quando toda a esfera administrativa está obrigada” (SANTOS, 2008, p. 70).

Quanto aos órgãos do Poder Judiciário que estão vinculados, eles estão indicados no artigo 92 da Constituição224, exceto no que diz respeito ao Supremo Tribunal Federal, que não está vinculado pelas suas próprias súmulas225. Isso ocorre, pois a redação do artigo é bem clara em dizer que somente os demais órgãos estão vinculados, excluindo-se, assim, o Supremo Tribunal Federal desse rol.

Outrossim, o próprio espírito da súmula vinculante é garantir estabilidade às decisões judiciais e não impedir o desenvolvimento jurisprudencial realizado pelo Supremo Tribunal Federal, que não pode se tornar refém das suas próprias decisões. É lógico que uma decisão da nossa Suprema Corte contrária a uma súmula vinculante deve ser fruto de um debate amadurecido dessa nova diretriz tomada, já que provocará grandes alterações no cenário jurídico brasileiro. Isso, contudo, não pode tolher o Supremo Tribunal Federal de tomar as decisões que considerar necessárias para exercer o seu papel de guardião da Constituição. Gevany Manoel dos Santos fala comenta o assunto:

A primeira vista é de se entender que, ficando o Supremo Tribunal Federal fora do elenco dos órgãos obrigados a obedecer às decisões vinculantes, estará ele livre para continuar dando andamento em processos de mesma matéria e até julgando contrário à súmula. (...) Se a Suprema Corte também estivesse obrigada, não haveria razão para a previsão de revisão e de cancelamento porque, uma vez editada a súmula vinculante, adquiria o caráter perpétuo não mais podendo ser modificada ou extinta, nem mesmo por iniciativa dos demais órgãos do Poder Judiciário ou da Administração Pública226.

Por fim, também se percebe que o legislador também não está vinculado às súmulas vinculantes. Isso é fundamental, pois espanca qualquer dúvida que se levante acerca da violação do princípio da separação dos Poderes, tendo em vista que o Legislativo terá plena liberdade de atuação, independentemente do que vier a ser sumulado pelo Supremo Tribunal

224 Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário: I - o Supremo Tribunal Federal; I-A o Conselho Nacional de Justiça; II - o Superior Tribunal de Justiça; III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais; IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho; V - os Tribunais e Juízes Eleitorais; VI - os Tribunais e Juízes Militares; VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.

225 Em sentido contrário, Rodolfo de Camargo Mancuso: “Embora diga o art. 103-A, caput, da CF que a súmula terá efeito vinculante “em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário” – o que à primeira vista parece excluir o STF, órgão de cúpula, emissor da súmula – a interpretação não pode ser assim literal, devendo sofrer os temperamentos que se seguem. Enquanto estiverem em plena vigência e eficácia, as súmulas que o próprio STF

confirmar como vinculantes (art. 8º da EC 45/2004) é claro que são cumpridamente perfilhadas e prestigiadas

pela Corte, não fazendo sentido que o STF tergiversasse sobre os extratos de sua própria jurisprudência assentada, às quais ele mesmo dotou de força vinculativa. Tal não impede que, sobrevindo circunstâncias relevantes, deliberem 2/3 dos seus membros em revisar ou mesmo cancelar este ou aquele enunciado; isso pode ocorrer se, ulteriormente, vem a se formar melhor exegese, ou, principalmente, se advém direito novo, incompatível com o enunciado assentado (Lei 11417/2006, §3º do art. 2º; art. 5º)”. MANCUSO, 2007, p. 367. 226 SANTOS, 2008, p. 46.

Federal, podendo, inclusive, tratar uma matéria de forma contrária ao estabelecido em súmula vinculante227.

A questão será tratada com mais detalhes no capítulo seguinte, quando falaremos da relação entre lei e súmula vinculante. Por enquanto, o importante é deixar evidenciada a independência de atuação do Poder Legislativo, que não está vinculado à autoridade da súmula vinculante228.