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6. As tutelas de urgência no Projeto do novo Código de Processo Civil

6.5 Tutelas de urgência típicas

6.5.5 Embargos à execução

Assim como na atual disciplina legal dos embargos à execução, os embargos não têm efeito suspensivo (art. 736, caput, do CPC), porém o juiz pode lhe atribuir tal efeito se estiverem presentes os requisitos para concessão da tutela de urgência ou de evidência e a execução estiver garantida por penhora, depósito ou caução (art. 875, § 1°, do PL n° 8.046/2010).

Ou seja, a suspensão da execução fundada na tutela de urgência é cabível se houver: (i) risco de dano irreparável ou de difícil reparação, que é facilmente constatável em razão da iminência de constrição dos bens do executado; (ii) fumus boni iuris, cuja comprovação é mais complexa diante de um título executivo extrajudicial; (iii) garantia do valor executado,

apreciação incidental do pedido apenas se houver prova documental; não havendo, o pedido deve ser apreciado pelos meios ordinários.

186 No mesmo sentido: artigo 1.017, § 2°, do CPC.

187 No mesmo sentido: artigo 1.018, parágrafo único, do CPC. 188 No mesmo sentido: artigo 1.019, do CPC.

que pode ser dispensada se a parte for hipossuficiente com fundamento na interpretação extensiva da disciplina geral da tutela de urgência (art. 276, par. único, do PL n° 8.046/2010), sob pena de se permitir que a parte com recursos financeiros escassos não tenha meio efetivo de defesa nos embargos mesmo quando comprovado o fumus boni iuris.

A decisão que concedeu ou negou o efeito suspensivo aos embargos pode ser modificada ou revogada a qualquer tempo se houver alteração das circunstâncias (art. 875, § 2°, do PL n° 8.046/2010), ao contrário da modificação e revogação da tutela de urgência, que independe da alteração das circunstâncias (art. 283, caput, do PL n° 8.046/2010).

O juiz pode conceder apenas parcialmente o efeito suspensivo aos embargos, prosseguindo-se a execução quanto à parte que não foi suspensa (art. 875, § 3°, do PL n° 8.046/2010).

6.5.6 Efeito suspensivo aos recursos

Os recursos produzem, em regra, apenas efeito devolutivo (inclusive a apelação) na disciplina do Projeto (art. 949, caput, do PL n° 8.046/2010), cujo objetivo é atribuir maior efetividade às decisões recorridas.

Porém, os efeitos da decisão recorrida podem ser suspensos pelo relator se for demonstrada a “probabilidade de provimento do recurso” ou “sendo relevante a fundamentação” e se “houver risco de dano irreparável ou de difícil reparação” (art. 949, § 1°, do PL n° 8.046/2010). Em outras palavras, o relator pode atribuir efeito suspensivo ao recurso se estiverem presentes os requisitos da tutela de urgência para evitar que a execução da decisão recorrida impossibilite ou dificulte excessivamente a satisfação da decisão do tribunal.

O pedido de efeito suspensivo deve ser feito diretamente ao tribunal por meio de petição autônoma ao relator prevento (art. 949, § 2°, do PL n° 8.046/2010). Assim, não é mais necessário o ajuizamento de medida cautelar inominada para requerer o efeito suspensivo ao recurso, como ocorre frequentemente no requerimento de efeito suspensivo aos recursos extraordinário e especial dirigidos aos tribunais superiores. O requerimento de efeito suspensivo à apelação tem especial peculiaridade, pois o mero protocolo da petição suspende os efeitos da sentença até que seja apreciado pelo relator (art. 949, § 3°, do PL n°

8.046/2010)190.

A decisão que conceder efeito suspensivo é irrecorrível (art. 949, § 4°, do PL n° 8.046/2010), podendo ser impugnada por mandado de segurança pelo interessado. No caso de denegação do efeito suspensivo, será cabível agravo de instrumento.

6.6 Responsabilidade objetiva

A responsabilidade pela efetivação da tutela de urgência é objetiva, como no regime atual da medida cautelar e da antecipação de tutela. O requerente da tutela responde pelos danos causados ao demandado decorrentes da efetivação da medida (art. 274, caput, do PL n° 8.046/2010) em hipóteses similares à disciplina legal da medida cautelar.

A primeira hipótese de responsabilidade é a sentença desfavorável no processo principal (art. 274, I, do PL n° 8.046/2010), que é idêntica à previsão do inciso I, artigo 811, do CPC. O segundo caso de responsabilidade é a não promoção da citação do demandado no prazo de citação quando a tutela for concedida liminarmente (art. 274, II, do PL n° 8.046/2010), que – assim como na interpretação da legislação vigente (art. 811, II, do CPC) – somente é cabível se a demora for imputável ao demandante.

A responsabilização do demandante também se aplica para as hipóteses legais de cessação da eficácia da tutela de urgência (art. 274, III, do PL n° 8.046/2010). Dois casos de cessação da eficácia são similares às hipóteses de perda da eficácia da medida cautelar, quais sejam: não propositura do processo principal no prazo legal quando a liminar for impugnada

(art. 284, I, do PL n° 8.046/2010)191; e não efetivação da tutela no prazo de um mês (art. 284,

II, do PL n° 8.046/2010)192.

A terceira hipótese de cessação de eficácia é a improcedência do pedido apresentado pelo requerente ou a extinção do processo sem resolução do mérito (art. 284, III, do PL n° 8.046/2010), ampliando a legislação vigente (art. 808, III, do CPC) para qualquer caso de rejeição do pedido de tutela de urgência. Lembramos que a disciplina legal da medida cautelar é criticada porque não prevê a responsabilidade pela improcedência ou extinção da ação

190 A grande modificação na disciplina legal da apelação, que deixa de ter efeito suspensivo como regra geral,

pode não ter efeito se o Judiciário conceder amplamente efeito suspensivo aos recursos de apelação.

191 Similar ao inciso I do artigo 808 do CPC: “se a parte não intentar a ação no prazo estabelecido no art. 806.” 192 Hipótese muito parecida com o inciso II do artigo 808 do CPC: “se não for executada dentro do prazo de 30

cautelar, como, por exemplo, a desistência da medida cautelar depois da obtenção da liminar. O requerente da tutela de urgência ainda pode ser responsabilizado se a alegação de prescrição ou decadência for acolhida (art. 274, IV, do PL n° 8.046/2010), assim como no dispositivo legal vigente das medidas cautelares (art. 811, IV, do CPC).

Embora seja expressamente admitida a concessão da tutela de urgência de ofício em situações excepcionais ou previstas em lei (art. 277, do PL n° 8.046/2010), o Projeto é omisso quanto à responsabilidade pela cessação da eficácia da medida. Podemos adotar a mesma interpretação para a legislação vigente, ou seja, o beneficiário da tutela de urgência pode ser responsabilizado se agir com dolo ou culpa, enquanto o Estado responde objetivamente pelos danos causados ao demandado, com fundamento no § 6°, artigo 37, da CF/88.

A liquidação da indenização para ressarcir os danos decorrentes da efetivação da tutela de urgência deve ser apurada nos mesmos autos em que foi concedida (art. 274, par. único, do PL n° 8.046/2010), isto é, da mesma forma que a reparação de perdas e danos nas medidas cautelares (art. 811, par. único, do CPC). Não é necessária condenação expressa na sentença, bastando a cessação da eficácia da tutela de urgência em algumas das hipóteses previstas em lei. A liquidação das perdas e danos pode resultar em indenização equivalente a zero se for comprovado que a efetivação da tutela de urgência não causou dano ao demandado.

7. Síntese conclusiva

As tutelas de urgência vigentes no direito brasileiro foram inspiradas no direito italiano, que tem medidas cautelares típicas e atribui o poder geral de cautela ao juiz, bem como permite a concessão de medidas conservativas e antecipatórias do mérito. Embora o direito brasileiro tenha adotado disciplina legal semelhante, a doutrina pátria enfrentou dificuldade para admitir a antecipação de tutela com base no poder geral de cautela.

Antes da reforma de 1994, parte da doutrina e da jurisprudência não admitiam a concessão de antecipação de tutela em sede de medida cautelar, mas na prática era frequente a concessão de medidas satisfativas no âmbito da cautelar para evitar dano irreparável ou de difícil reparação ao direito provável do autor.

Após a reforma de 1994, a maior parte da doutrina defendeu a distinção rígida entre a antecipação de tutela e a medida cautelar, apontando diversas diferenças quanto aos seus requisitos e procedimento. A distinção levou à denegação de acesso à justiça em muitos casos em que o juiz ou tribunal indeferiam a cautelar porque entendiam que era cabível a antecipação de tutela, ou vice-versa. Também havia divergência doutrinária e jurisprudencial quanto à tutela de urgência cabível, pois em alguns casos era muito difícil distinguir a antecipação de tutela da cautelar. Assim, era possível que determinado juízo entendesse cabível a cautelar e outro a antecipação de tutela para a mesma situação.

Para evitar que o direito ameaçado deixasse de ser tutelado por questões formais, a legislação processual foi novamente reformada para introduzir a fungibilidade entre as tutelas de urgência. Dessa forma, o juiz ou tribunal pode conceder a tutela de urgência que considerar adequada independentemente do nome atribuído pelo requerente, desde que estejam preenchidos os requisitos legais. A fungibilidade entre as medidas de urgência levou a doutrina a relativizar a diferença entre as duas tutelas de urgência.

Concordamos com a tese pioneira de José Roberto dos Santos Bedaque que afirma que as medidas de urgência têm a mesma natureza, pois exercem a mesma função no processo de resguardar a efetividade da tutela jurisdicional.

Por isso, é acertado o Projeto do Novo Código de Processo Civil, que prevê o mesmo procedimento para a cautelar e a antecipação de tutela, tornando definitivamente irrelevante o debate doutrinário quanto à diferença entre as duas tutelas de urgência. Ademais, o Projeto ainda inovou ao possibilitar a estabilização dos efeitos da tutela de urgência não impugnada pelo demandado, afastando a obrigatoriedade do processo principal para se debater matéria que não é objeto de divergência entre as partes.

Não obstante as divergências doutrinárias quanto à diferença entre as tutelas de urgência, elas exercem papel fundamental no processo civil brasileiro, já que o processo de conhecimento tradicional é moroso e insuficiente para tutelar os direitos ameaçados por iminente prejuízo irreparável ou de difícil reparação. Ademais, o Poder Judiciário não julga tempestivamente as demandas em razão do déficit de recursos materiais diante da crescente demanda.

As tutelas de urgência têm especial relevância para a tutela do direito material cuja reparação é impossível ou muito difícil, como o direito ambiental. Por isso, destacamos neste trabalho a sua importância para a tutela do direito ao meio ambiente, especialmente no tocante à aplicação do princípio da precaução. A tutela de urgência não só é indispensável para a

proteção do meio ambiente, como é o instrumento adequado no âmbito do processo para dar efetividade ao princípio da precaução.

PARTE II

DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE

EQUILIBRADO E PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO