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16. Controle concentrado de constitucionalidade

16.1 Ação direta de inconstitucionalidade (ADIN)

16.1.4 Medida cautelar

A legislação da ADIN permite a concessão de medida cautelar por maioria absoluta dos membros do Tribunal, após a audiência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou o ato normativo impugnado, que terão cinco dias para se manifestarem (art. 10, caput, da Lei n° 9.868/99). O relator também pode ouvir o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, bem como permitir a sustentação oral do representante legal do autor e da entidade ou órgão que expediu o ato impugnado (art. 10, §§ 1° e 2°, da Lei n° 9.868/99).

O STF pode conceder a cautelar sem a prévia oitiva do órgão ou autoridade que aprovou a lei ou o ato normativo questionado em caso de urgência ou em período de recesso do Tribunal (art. 10, caput e § 3°, da Lei n° 9.868/99). Pode ainda o relator, dependendo da relevância da matéria, determinar o julgamento do processo principal pelo Tribunal, depois de ouvidos os legitimados, o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República (art. 12, da Lei n° 9.868/99).

Como não há previsão legal expressa quanto aos requisitos para a concessão da medida cautelar, aplicam-se os mesmos para a concessão da tutela de urgência, quais sejam: probabilidade do direito alegado e necessidade da medida para garantir a efetividade da futura decisão de mérito.

Ainda que se denomine “medida cautelar”, admite-se a concessão de tutela antecipada. A decisão pode consistir na suspensão dos processos perante as instâncias

ordinárias até o julgamento da ADIN642 ou pode suspender a aplicação643 da norma objeto da

ADIN644. A primeira seria medida cautelar e a segunda antecipação de tutela, segundo

classificação da doutrina que distingue os dois gêneros de tutela de urgência.

Se a liminar for revogada por decisão do STF, os efeitos da decisão repercutem nos processos em que a lei ou ato normativo são aplicados pelas instâncias inferiores. Se houve trânsito em julgado, é possível ajuizar ação rescisória com prazo contado a partir da revogação da liminar pelo STF. Se o processo ainda estiver pendente de julgamento, a decisão

642 ALVIM, Eduardo Arruda. Apontamentos sobre as liminares na ação direta de inconstitucionalidade, na ação

declaratória de constitucionalidade e na arguição de descumprimento de preceito fundamental. Revista Jurídica, vol. 57, n° 381, jul./2009, Porto Alegre, p. 18.

643 A medida cautelar suspende a vigência e eficácia do ato impugnado, pois permite a aplicação do direito

revogado sobre a mesma matéria (MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de

constitucionalidade: estudos de direito constitucional, 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 318-319).

644 ZAVASCKI, Teori Albino, Processo coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos, cit., p.

do STF que revogou a liminar deve regulamentar os efeitos da sua cassação em relação aos

processos que tramitam nas instâncias inferiores645.

A decisão da cautelar tem eficácia erga omnes e, em regra, produz efeito ex nunc, salvo se o Tribunal der eficácia temporal diversa, bem como torna aplicável a eventual legislação anterior, exceto se o Tribunal decidir em sentido contrário (art. 11, da Lei n° 9.868/99). A decisão também tem efeito vinculante porque pode impedir a aplicação da norma

impugnada na ADIN por outros órgãos jurisdicionais e administrativos646.

A medida cautelar é essencial na ADIN cujo objeto seja a proteção do direito ao meio ambiente, já que permite a suspensão imediata da aplicação de lei ou ato normativo inconstitucional que cause dano ambiental. Citamos como exemplo a medida cautelar na ação direta de inconstitucionalidade n° 1856/RJ para suspender a eficácia da Lei estadual n° 2.895/98, que permitia a “briga de galos”, pois violava o artigo 225, § 1°, inciso VIII, da Constituição Federal, ao tolerar tratamento cruel aos animais. A cautelar foi posteriormente

confirmada no julgamento do mérito647.

16.1.5 Audiência pública

O relator tem competência para determinar o “esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de notória insuficiência das informações existentes nos autos” por meio da requisição de informações, designação de perito ou comissão de peritos para fazerem parecer. Se essas providências ainda não forem suficientes, o relator pode designar audiência pública para “ouvir depoimentos de pessoas com experiência e autoridade na matéria” (art. 9°, § 1°, da Lei n° 9.868/99).

As referidas possibilidades representaram mudança significativa quanto ao modelo tradicional de interpretação no controle de constitucionalidade, que se limitava ao “simples

contraste entre a norma questionada e a norma constitucional superior”648. Nessa nova

concepção a interpretação constitucional deve ser aberta para considerar as diversas correntes da sociedade, da opinião científica e de outros órgãos estatais. Segundo Härbele, “o juiz

645 Idem, p. 249-250.

646 MENDES, Gilmar Ferreira, Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito

constitucional, cit., p. 327-329.

647 STF, Pleno, ADIN n° 1856/RJ, rel. Min. Carlos Velloso, j. 26/05/2011, DJe 13/10/2011. 648 MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnoldo; MENDES, Gilmar Ferreira, op. cit., p. 443.

constitucional já não interpreta, no processo constitucional, de forma isolada: muitos são os

participantes do processo; as formas de participação ampliam-se acentuadamente”649.

A audiência pública também visa democratizar o processo decisório para garantir maior legitimidade das decisões do STF nas ações constitucionais (art. 9°, § 1°; art. 20, § 1°, ambos da Lei n° 9.868/99; e art. 6°, § 1°, da Lei n° 9.882/99). Gilmar Mendes leciona que a audiência pública representa a “possibilidade efetiva de o Tribunal Constitucional contemplar as diversas perspectivas na apreciação da legitimidade de um determinado ato

questionado”650.

A utilização da audiência para instruir as ações constitucionais pode ser muito útil, pois apenas alguns legitimados podem propor e intervir no processo, mas todos são afetados pela decisão do STF. Caso a ação não seja instruída adequadamente, o relator pode convocar audiência para que a decisão seja mais acertada e considere outras hipóteses e fatos não ventilados pelos legitimados.

No entanto, a aplicação do instituto começou somente em 2008, quando se percebeu a insuficiência da disciplina legal porque a lei da ADIN não prevê o seu procedimento. Na

primeira audiência pública (realizada na ADIN n° 3510651), o relator aplicou as regras

previstas no regimento interno da Câmara dos Deputados (art. 255). Já nas outras duas

audiências foram adotados regramentos próprios para torná-las mais simples652.

A emenda regimental n° 29 de 2009, que alterou o regimento interno do STF, foi introduzida para suprir a lacuna legal relativa ao procedimento da audiência pública. Ela

ampliou o seu cabimento653 e delineou o seu procedimento em linhas gerais, atribuindo ao

relator ampla competência para regulamentar a audiência.

A audiência pública é importante instrumento para a defesa do direito ao meio

649 HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição:

contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Die offene Gesellschaft der Verfassungsinterpreten. Ein Beitrag zur pluralistischen und “prozessualen” Verfassungsinterpretation. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2002, p. 41.

650 MENDES, Gilmar Ferreira; VALE, André Rufino do (colaborador). O pensamento de Peter Häberle na

jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Observatório da jurisdição constitucional, ano 2. Brasília: IDP, 2008/2009.

651 STF, Pleno, ADI n° 3510-0/DF, rel. Min. Carlos Ayres Britto, disponível em:

http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobj etoincidente=2299631, acesso em: 25/03/2013.

652 STF, Pleno, ADPF n° 101/DF, rel. Min. Cármen Lúcia; STF, Pleno, ADPF n° 54/DF, rel. Min. Marco

Aurélio. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqo bjetoincidente=2226954>. Acesso em: 25 mar. 2013.

653 A ampliação do instituto se deu com a atribuição de competência do Presidente do STF para convocar a

audiência pública com a finalidade de esclarecer circunstâncias de fato, com repercussão geral e interesse público relevante (arts. 13, XVII e 21, XVII, ambos do RISTF). Também se ampliou o seu cabimento em qualquer processo, como em recursos e outras ações de competência originária do STF.

ambiente, pois permite a participação de diversos setores da sociedade e a exposição mais aprofundada sobre questões de elevada complexidade técnica. Ao longo dos últimos anos o STF convocou as seguintes audiências públicas sobre matéria ambiental: importação de pneus

usados654, proibição do uso de amianto655, campo eletromagnético nas linhas de transmissão

de energia elétrica656 e queimadas em canaviais657.