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Pesquisador: O trabalho que é feito aqui na EPE, nas aulas de Matemática, pode ser feito em outra escola?

German: Obviamente é difícil de trabalhar desta maneira em outros espaços, por exemplo, na escola tradicional. Eu trabalho num colégio público e tento levar coisas que faço aqui para lá, porém lá é diferente, são grupos muito grandes, e aqui na EPE são grupos de 20 alunos, ou seja, na EPE posso falar com cada um pessoalmente enquanto que na escola tradicional são 40 alunos. Agora, eu tento fazer com eles coisas que faço aqui na EPE, e se obtém algum resultado sendo que eu tento não ser tão tradicional tipo: conteúdo, exercícios, conteúdo, exercícios, ou seja, procuro propor-lhes problemas.

German: Luciano, você leu o artigo escrito por nós “O salto da Rã”? Pesquisador: Sim, eu li.

German: Esse problema eu trabalhei com alunos do outro colégio e se encontraram soluções muito interessantes. Muito curioso porque havia um menino desse colégio, mais pobre, de menos capacidade econômica, aqui (na EPE) os alunos não são pobres. E lá havia um menino que me disse: profi essa solução serve? E, impressionante, ele me apresentou uma solução muito eficiente e diferente para o problema do salto da rã. O importante foi a atitude do menino em querer fazer as coisas.

Pesquisador: Nas outras escolas e aqui na EPE, os alunos te propõem problemas? German: Sim, propõem. Porém, na outra escola menos. Digamos que os problemas que eles propõem são bem-vindos porque parte deles e o mais importante é que parta deles, e não que parta de mim. Eu posso lhes mostrar muitas coisas, porém, posso desmotivar-lhes e quero incentivar, estimular e eles já são donos de sua aprendizagem.

Pesquisador: Muito bonita essa ideia de autonomia...

German: Sim, autonomia, autonomia,...., por isso que dizemos: vejam a escola em geral porque é a partir da autonomia que se pode fazer coisas. Se não há autonomia, se não há curiosidade, não há nada.

Pesquisador: E como tu trata o problema do aluno que quer se preparar para realizar os exames de admissão nas universidades?

German: Digamos, isto já é uma coisa mais formal. Então poderíamos trabalhar a parte com livro formais. Porém, lhe digo que isto é produtivo na medida em que eles estão aproveitando este tipo de trabalho, se é do interesse do aluno. Outra perspectiva é desenvolver o pensamento. Desenvolver o pensamento é desenvolver a atitude. Não queremos que os alunos sejam matemáticos, queremos que pensem. Que pensem em Matemáticas, em literatura, em

ciências naturais,...., que desenvolvam um pensamento como tal. E como se desenvolve o pensamento? Cometendo erros. O erro é um elemento importante que aponta o caminho. Exemplo: como se desenvolveu a ciência ou o conhecimento da humanidade? Cometendo erros. Ou como o ser humano descobriu o fogo? Não sei como, porém, teve que haver um caminho onde ele teve que fazer provas, ensaio, erro, ensaio, erro, e descobriu o fogo. Dominou o seu entorno, ou de outra forma, desenvolveu seu pensamento. Aqui (na EPE) não se diz: você tem que fazer primeiro isso, depois aquilo, etc.

Pesquisador: Para que os alunos dominem e utilizem os conhecimentos formais na resolução dos problemas propostos, como fórmulas e conceitos abstratos, por exemplo, como você faz? Você passa os conteúdos para eles ou deixa que eles busquem esse conhecimento?

German: O propósito é que eu lhes proponha as ideias, ou seja, para trabalhar com triângulos retangulares existem essas ferramentas e essas ferramentas servem para compreender os triângulos. No caso da trigonometria, curso que eles estão agora, e a ideia é observar um pouco que relação existe entre o triângulo e as formas abstratas da Matemática formal. Então, qual é minha tarefa, digamos? Buscar atividades que tenham a ver com triângulos, em atividades concretas da vida real. Como a Matemática está relacionada com a vida real a partir desses triângulos, a partir dessas formas e observar como esses elementos formais nos podem ajudar. Eles não têm que aprender memorizando, mas sim, como podem nos ajudar essas formas, digamos, formais, para poder compreender essas formas concretas. Essa é a ideia, não é a fórmula, tampouco.

Pesquisador: Me parece que existem duas questões, então. Uma é que a Matemática é uma ferramenta,...

German: Sim, uma ferramenta, uma linguagem.

Pesquisador: ...e isto é uma coisa que está postada e que se utiliza na medida da necessidade. Outra coisa é o desenvolvimento do pensamento....

German: ...a partir de problemas...

Pesquisador: ...a partir de problemas sim.

German: Reservamos este problema e não temos ferramentas e não lhes damos nenhuma ferramenta, então pensamos em como resolver o problema e se necessário busca-se algo para resolver.

Pesquisador: Então não se estuda a Matemática primeiramente, para depois utilizá-la na resolução de problemas?

German: Não. Primeiro decidimos como podemos resolver o problema. Essa é a diferença. Na escola tradicional se dá primeiro as ferramentas e depois se tenta resolver um

exercício. Por exemplo: aqui podemos demorar um mês em uma atividade, porém a ideia é compreender o problema como tal. Digamos a ciência dos cientistas é isso. Eles estudam um problema durante anos e demoram em resolvê-lo, como o problema da cura do câncer. Seguem trabalhando, não encontram a solução principal, mas encontram outras coisas que emergem de seus estudos. Aqui (na EPE) é o mesmo. Nesse trabalho seguramente resolveremos o problema ou não, porém encontraremos coisas que vão ajudando a formar nosso pensamento. Aqui o importante não é encher o caderno, mas construir um pensamento, porque na escola tradicional quanto mais cheio o caderno melhor, tristemente não? Tristemente. Porque a escola deveria desenvolver o pensamento, deveria ensinar as crianças a sujarem-se com terra, a se associar no mundo a partir do que estão brincando, de sujar-se, de brincar, de interagir com o outro. Exemplo: o aluno diz “Profi cometi um erro”, então não vamos por esse lado; O aluno diz “isso que você disse não é certo”, o professor diz “porque isso não é certo?”, o aluno diz “porque eu estou argumentando”; aí se trata de que os alunos argumentem, de que eles construam um discurso a partir do que estão tratando de fazer. Por isso que te digo, o professor aqui é o menos importante do que o processo para eles. O professor lhes ajuda, pois sabe mais matemática que eles, porém nas suas construções eles são os protagonistas de sua aprendizagem. Nós, os professores, somos pessoas que lhes estamos mostrando o que pode ou não lhes servir, porém eles é que estão desenvolvendo a sua construção de conhecimento. E por isso aqui não existem notas.

Pesquisador: Sim, eu estava pensando em te perguntar como se faz a avaliação aqui na EPE?

German: Sim, aqui não há avaliação numérica. Agora, eu descrevo Laura, por exemplo. Laura é muito interessada em Matemática, se envolve, está interessada em algumas coisas e em outras não, ou seja, eu faço uma descrição do aluno. Dessa maneira se vai construindo um perfil de Laura a partir do que eu disse, a partir do que disse o professor de literatura, a partir do que disse o professor de ciências, e assim se vai conhecendo como é mais ou menos essa pessoa, mais ou menos, porque cada um tem uma forma de ver diferente. Tem crianças que não gostam de Matemática, mas gostam de literatura e por aí se pode ir.

Neste momento um aluno vem até o professor German e pede instruções sobre a atividade do dia. Sanada as dúvidas do aluno, continuamos com nossa conversa.

Pesquisador: É muito impressionante que os alunos construam o seu conhecimento de maneira livre, podem andar e fazer as atividades em outros ambientes e o conhecimento está sempre sendo construído.

Pesquisador: Porque o ambiente da EPE é muito rico para a construção do conhecimento...

German: Sim, para eles não existe muita diferença em estar dentro da sala de aula ou lá fora. De qualquer forma eles têm que estar trabalhando. E porque isso? Porque eles não trabalham pela nota, eles trabalham por eles mesmos. Na escola tradicional os alunos não fazem nada que não seja em troca de notas.