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CAPÍTULO II QUADRO TEÓRICO

2.4. Expressão dramática e pedagogia da situação

A pedagogia da situação, de acordo com o modelo proposto por Barret (1986d), baseia-se na exploração de cinco grandes variáveis da situação pedagógica, como o espaço/tempo, o pedagogo, o grupo, o vivido e o mundo exterior, entendidas de acordo com as circunstâncias e segundo a apreciação subjectiva dos intervenientes, como espaço de «vida» na escola, reconciliando a actividade programada com o imprevisto, com todas as implicações que possibilita em termos de aprendizagens fundamentais na formação do indivíduo.

[...] Esta pedagogia seria uma pedagogia da situação, quer dizer uma pedagogia do vivido, explorando cada momento do aqui-e-agora na sua diversidade aleatória (...) sem medo da divergência, da diferença, espontaneamente, simplesmente, não numa relação de força permanente, mas numa coexistência dinâmica, em que a confrontação permite tanto o questionamento como o aprofundamento. [...] (Barret 1986d: 4)

Encontramos afinidades entre a pedagogia da situação e o grupo em auto aprendizagem de Abraham (1987) com professores no activo. O seu trabalho procura responder às solicitações de docentes que exercem uma profissão sujeita a grandes pressões psicológicas, recorrendo a um método destinado a ajudar o professor como ser humano, a fortalecer o seu interior, para que se transforme num sujeito activo, criador de um grupo que favoreça o desenvolvimento completo de si mesmo com todos os outros, podendo ser definido “(…) como método de reconversão, um método grupal centrado sobre o grupo, baseado entre uma comunicação livre entre o si-mesmo e o trans-si-mesmo, entre os diferentes níveis de cada um” (Abraham 1987: 116).

O trabalho desenvolvido baseia-se na discussão livre de temas sem uma ordem pré-estabelecida mas que “(...) se relacionam por um esquema de associações livres com emoções despertadas pela situação na qual se encontram os membros do grupo no aqui e agora” (Abraham 1987: 120). O trabalho do grupo está desprovido de qualquer estrutura social e psicológica, deve construir-se a partir de uma espécie de espaço vazio, com a ajuda de um mediador que promova a autonomia do grupo e desencadeie “(...) processos de tomada de decisões, de espontaneidade e de comunicação criadora” (Ibidem: 123).

O mesmo autor organiza a experiência de acordo com um clima permissivo, em que existe uma fluidez da situação e uma autoexperimentação, criando um clima favorável

à participação na experiência, livre de ameaças e de juízos de valor, em que “(...) o crescimento do si-mesmo real pode efectuar-se sobre o terreno seguro da pertença ao grupo (…) baseado nos fenómenos de cooperação, de intimidade e de autenticidade” (Abraham 1987: 122).

A «discussão livre flutuante», que Abraham (1987) atribui a Foulkes (1969), assim como o respeito pelos silêncios do grupo permite que cada participante se possa expressar espontaneamente em qualquer altura fazendo emergir “(...) o grupo latente ou oculto, onde os desejos e movimentos do fantasma colectivo se tornam cada vez mais claros e conscientes” (Abraham 1987: 124).

De acordo com o mesmo autor, a autoexperimentação reside na criação de condições, nomeadamente a prática de experiências imediatas, nas quais o professor pode viver o momento presente como participante ou como observador. Deve experimentar-se no grupo a cooperação para lá da competência, a livre conduta para lá da autoridade repressiva, a abertura a si-mesmo para lá da máscara convencional. Abraham (1987) destaca no seu trabalho que “quando a experiência vivida pelo grupo é positiva, notamos que a estrutura cognitiva e os ideais cognitivos se cristalizam com facilidade, num arranque de procura intelectual e de acção educativa, em harmonia com as novas relações com respeito por si mesmo e pelos outros” (Abraham 1987: 126).

Quéré (2000) afirma que a atenção colocada na singularidade da acção está ligada a um ponto de vista particular que consiste em considerar “uma acção particular, encarada na sua unidade, como um acontecimento” (Quéré 2000: 147). No desenrolar de uma acção acontecem situações imprevisíveis que produzem alterações que podem dificultar ou favorecer o desenvolvimento da acção, criando oportunidades de exploração aos seus intervenientes, sendo “(...) esta exploração sempre «uma situação individual indivisível e induplicável» (cit. Dewey), uma situação dotada de uma qualidade única” (Ibidem: 161).

Ferry (1987) considera que é o sujeito da formação que está no centro da abordagem situacional, considerada como aquela que “desenvolve uma problemática da formação fundada na relação do sujeito com as situações (educativas) nas quais está inserido, incluindo a situação da sua própria formação” (Ferry 1987: 77). Baseada numa prática experiencial, ela inclui a relação com o vivido individual e colectivo, não separando a formação pessoal da profissional “(...) em situações nas quais a capacidade de sentir, de

compreender e de agir do professor se defronta com as exigências do papel e das realidades do campo educativo” (Ibidem: 77).

Ferry (1987) acrescenta que se verifica nesta abordagem uma intensidade das interacções entre os participantes, reforçada pelo exercício de observação e análise, sendo a prática de actividades dramáticas pelas suas características, um recurso utilizado com regularidade.

[...] O desafio é que experiências vividas sem objectivo de aquisições imediatas, de qualquer ordem que elas sejam, suscitem a disponibilidade ao imprevisto, desenvolvam a capacidade de mobilizar a sua energia para afrontar as situações, explorar, empreender, levar a bem, e façam emergir novos desejos. [...] (Ferry 1987: 80)

Como refere Ducros (1984) é necessário permitir aos professores viver a situação pedagógica como uma aventura existencial que dê lugar, para além das ideias, à expressão das sensações, dos sentimentos e das emoções, advogando uma formação de professores centrada no desenvolvimento pessoal que, “(...) sem ignorar a importância dos conhecimentos que permitem ensinar esta ou aquela disciplina, privilegia o ser sobre o saber” (Ducros 1984: 144).

Lesne (1977) destaca também a importância deste tipo de formação caracterizado pela força da criatividade libertada no processo dinâmico que utiliza os saberes do grupo, em que as pessoas com motivação e dinamismo “(…) tendo vivido novas formas de relação num grupo, vão tentar encontrar um novo modo de equilíbrio pessoal em situação real” (Lesne 1977: 114).