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CAPÍTULO II QUADRO TEÓRICO

2.5. Quadro metodológico das actividades dramáticas

O ensino de actividades dramáticas de acordo com a pedagogia da situação e as orientações metodológicas do quadro didáctico proposto por Barret e Maréchal (1985), desempenharam um papel determinante no movimento internacional de integração das actividades dramáticas na formação, nos vários níveis de ensino, associando o saber, o saber fazer e o saber ser nos programas de formação de professores, de acordo com uma concepção fundamentalmente humanista, considerando que nesta área em particular, o «sujeito» é também «objecto» de aprendizagem.

Deste modo, os mesmos autores elaboraram um conjunto de considerações relativamente à prática de actividades dramáticas em contexto de formação e que são os seguintes:

- Uma postura experimental relativamente à formação tendo como ponto de partida a realidade do ateliê;

- Acentuação da dimensão psicopedagógica relacional onde emerge um discurso virado para o grupo, acentuando a expressão como dimensão essencial nos vários processos de criação;

- Articulação entre o individual e o colectivo.

As práticas dramáticas em contexto de formação relacionam-se em maior ou menor grau com os conceitos de acção, globalidade, criatividade, vivido, colectivo, aqui e agora, lúdico, situação, «em movimento», processo, subjectividade, neutralidade e polissemia.

Barret e Maréchal (1985) consideram que a prática pedagógica destas actividades deve ter por base um conjunto de princípios que se relacionam com o indirecto, o colectivo e o não-directivo. O indirecto permite fazer uma aprendizagem descontraída e agradável através da exploração lúdica das actividades em que as propostas indirectas, de acordo com Barret (1986), têm por finalidade criar progressivamente um sistema de «ajudas» à expressão/comunicação pelo meio da manipulação de objectos, da formulação das propostas de exercícios, do recurso aos suportes sonoros e visuais e onde a relação com o imprevisto, característica de um trabalho desta natureza, reforça a motivação, a espontaneidade, a criatividade e a autonomia dos participantes verificando-se que “(...) os futuros professores tendo vivido estas formas de aprendizagem estão menos inquietos, com menos sentimentos de culpa, menos reticentes em utilizar o jogo nas suas práticas com crianças” (Barret e Maréchal 1985: 26).

Por outro lado, o colectivo desenvolvido numa interacção progressiva com o individual, pretende que todos os participantes se exprimam simultaneamente, não se destacando ninguém em particular. Desenvolve nos professores a capacidade de escuta e o respeito pelas diferenças, evitando-se a selecção, a competição e “(...) explorando os denominadores comuns que asseguram a existência e o desenvolvimento de um grupo sem impedir as etapas individuais” (Barret e Maréchal 1985: 26).

Quanto ao não-directivo, de acordo com Barret (1986), é um estilo de animação influenciado pela psicologia, não tendo nesta actividade específica uma finalidade terapêutica, exige, no entanto, da parte do animador um grau elevado de implicação e disponibilidade nas relações com o grupo que anima. As propostas de trabalho caracterizam-se pela sua versatilidade, as sugestões de actividades são colocadas como propostas abertas geradoras de uma atitude dinâmica, o que vai influenciar o grau de autonomia dos intervenientes e responde às “necessidades da situação humana e pedagógica, aos imperativos institucionais e às exigências não programáveis dos indivíduos e dos grupos” (Barret e Maréchal 1985: 26).

A opção por diferentes estruturas de grupo que se alternam progressivamente tem por finalidade reforçar o colectivo, promovendo a comunicação entre todos os elementos do grupo, ao mesmo tempo que promove a experiência de participação de acordo com várias possibilidades de organização do colectivo.

O quadro didáctico (Figura 3) proposto por Barret e Maréchal (1985), ou «bússula didáctica» de acordo com a sua interpretação por Rolla (2004), permite observar duas grandes orientações: uma prática orientada para a expressão dramática, para a expressão comunicação, para o sujeito, para uma “(...) arte/ciência do vivido” (Barret e Maréchal 1985: 31) e outra dirigida para a arte dramática, para a componente artística, para a criação-interpretação, para a produção de um objecto artístico.

A prática de actividades dramáticas estrutura-se de acordo com o quadro didáctico proposto, e tendo em conta o seu funcionamento em ateliê, com a sua progressão e o seu conteúdo, caracterizando-se pelo funcionamento em dupla-estrutura.

A estrutura de progressão desenvolve-se em quatro etapas interligadas entre si, do princípio ao final dos ateliês: o arranque, de acordo com a interpretação de Rolla (2004) da expressão francesa de «mise en train»; o relaxamento; a expressão/comunicação e a retroacção.

O arranque cria um espaço de passagem entre o espaço exterior e o espaço interior do ateliê. Baseia-se na realização de actividades que acentuam com alguma predominância o trabalho do corpo, fazendo apelo à eliminação de tensões, ao aquecimento muscular sem esforço físico exagerado. A duração é relativa e em função dos elementos que compõem o grupo, fazendo apelo ao uso de suportes sonoros ou suportes visuais como motivação.

Quadro didáctico

Figura 3

A retroacção, na sequência daquilo que dissemos anteriormente, é uma ocasião na qual se estabelecem relações entre os participantes ou entre os participantes e os animadores, segundo Maréchal (1981). Representa, segundo o mesmo autor, uma tomada de consciência da acção, uma apropriação pelos participantes da sua expressão comunicação e que se traduz numa participação em que existe uma troca verbal entre elementos do grupo sobre o conteúdo da experiência.

A retroacção pode também ser escrita, produzindo uma reacção em diferido, geralmente entre dois ateliês, prolongando a reflexão de cada um sobre as actividades e criando também um espaço que vai de encontro aos participantes que experimentam algumas dificuldades na verbalização e exposição pública das suas ideias.

A estrutura de conteúdo baseia-se essencialmente sobre quatro possibilidades de exploração: o médium; a identificação; o tema e a situação.

O médium, segundo Marchand (1979), é um objecto que tem por finalidade equilibrar o indivíduo na sua relação com o espaço, servindo de suporte para a expressão do seu corpo, ao mesmo tempo que lhe transmite uma certa segurança criando uma indução para os movimentos, o que favorece a comunicação e as relações interpessoais.

Para que seja eficaz, o médium deve ter um conjunto de características: simples, facilitando a sua transformação, neutro, tendo o mínimo valor simbólico e atraente, proporcionando uma manipulação agradável. De acordo com o mesmo autor, os médiuns imaginários sugerindo imagens mentais, podem também ser utilizados alternando a sua utilização com objectos.

A identificação é um dos exemplos de propostas de expressão utilizando o indirecto e desenvolve-se fazendo recurso à projecção ou à imitação, sendo esta última a forma mais simples de identificação mas também aquela que pode tornar-se num inconveniente para a expressão do indivíduo, visto recorrer-se facilmente aos estereótipos, como refere Barret (1986).

Os temas oferecem largas hipóteses de exploração que podem variar, ainda segundo o mesmo autor, entre a matéria inanimada e animada, a actividade humana e o conceito.

A situação é a última etapa da progressão e concretiza-se sem o recurso a acessórios, suportes ou pretextos, como prova limite em que os participantes reagem uns com os outros encontrando formas de comunicação sem recurso a qualquer mediação, como refere Barret (1986c).

Entrar na sala, no círculo, no grupo, movimentar-se ou ficar imóvel são actos espontâneos ou funcionais que são também formas de intervenção, segundo Barret (1986c). A «qualidade» da intervenção está directamente ligada com o tipo de propostas que o professor faz, sendo o termo proposta já elucidativo da relação pedagógica que é exercida em expressão dramática, qualificada como disciplina que tem subjacentes princípios de ordem deontológica, como refere Lapuyade (1985), desenvolvendo uma atitude ética de respeito pelo outro, não o utilizando no interior de uma relação de força, e mantendo uma equidistância em relação aos poderes institucionais.