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CAPÍTULO IV EXPERIÊNCIA DE FORMAÇÃO EM 2001/

4.1. Actividades desenvolvidas ao longo do ano lectivo

4.1.3. Objectos como suporte da expressão e comunicação

Um dos aspectos que se destaca nos primeiros contactos com os alunos relaciona- se com a evidência de uma educação corporal pouco desenvolvida que se manifesta na utilização incorrecta da postura do corpo, na gestualidade tensa e limitada, numa forma de andar pouco flexível como se estivessem numa «armadura», utilizando as palavras de João Mota.

A primeira parte deste conjunto de sessões, pretendeu, para além de uma sensibilização para o tema, o início de um trabalho mais vasto sobre a correcção da postura

corporal e da eliminação de tensões que tornem o corpo mais descontraído e flexível, na exploração da gestualidade e do olhar, na qualidade da emissão vocal, na posição correcta para se sentar, que se traduz na valorização da presença física enquanto relacionamento connosco próprios e na relação com os outros, influenciando a forma como somos apreendidos por eles.

Os exercícios diversificados sobre o andar com indicações sucessivas de correcção do mesmo, vão cimentando a consciencialização do problema, com o decorrer das sessões é possível observar que esta é uma questão pertinente para os alunos e que existe uma preocupação generalizada com a sua alteração.

Outra das componentes que se inicia neste conjunto de sessões está relacionada com a utilização dos objectos como suporte da comunicação e que funcionam como mediadores da expressão, facilitando o equilíbrio e a segurança dos intervenientes na sua relação com os outros e com o espaço.

A utilização do «paraquedas» como objecto de manipulação e interacção colectiva teve a particularidade de juntar todos os elementos da turma, na tarefa comum de o movimentar em vários sentidos, o que requer uma acção atenta e concertada entre todos, sendo também utilizado como elemento de uma composição de imagens formada por vários elementos do grupo, na sequência do trabalho desenvolvido nas últimas sessões.

Esta sessão (7ª) foi realizada de acordo com a seguinte sequência de exercícios descritos de forma sintética:

- Pede-se aos alunos que caminhem livremente pela sala de aula, estabelecendo-se a regra de pararem sempre que ouvem um sinal sonoro, ficando em posição imóvel;

- Desenvolvimento do exercício anterior, com a chamada de atenção para, ao andar, cada participante tentar observar os detalhes do espaço por onde passa;

- Desenvolvimento do exercício anterior, com alteração sucessiva do ritmo e da direcção da marcha;

- Desenvolvimento do exercício anterior com a preocupação em corrigir progressivamente a postura corporal, imprimindo firmeza no andar e o olhar em frente;

- Desenvolvimento do exercício anterior com cada participante tentando caminhar como se estivesse a patinar;

- Desenvolvimento do exercício anterior, caminhar e dançando, ao som de diferentes suportes musicais;

- Finalização desta sequência de actividades com a realização de um exercício de relaxamento, em que, deitados no chão e de olhos fechados, os participantes vão progressivamente sentindo «o peso do corpo» de acordo com as indicações do professor;

- Desenvolvimento do exercício anterior em que os participantes vão progressivamente «acordando» e estirando o corpo;

- De seguida os alunos levantam-se, colocam-se em círculo e manipulam, todos ao mesmo tempo, um objecto flexível (paraquedas) em movimentos ascendentes e descendentes;

- Desenvolvimento do exercício anterior, fazendo rodar uma bola à volta do objecto numa direcção e depois noutra, tentando por último fazer passar a bola por uma abertura situada no centro do mesmo;

- Colocação do «paraquedas» aberto no centro da sala com os participantes colocados à volta, tendo-se seguido uma construção colectiva de imagens fixas como ponto de partida para uma leitura dessa representação por parte dos alunos;

- Segue-se a retroacção sobre o trabalho realizado tendo-se dialogado em conjunto sobre as vivências da aula sobretudo das propriedades do objecto manipulado por todos na parte final.

A sessão seguinte (8ª) teve também a música como elemento de suporte às actividades procurando criar um ritmo, um ambiente inspirado nas sonoridades o que influencia a forma de agir. Neste caso o exercício já é conhecido dos participantes, trata-se de realizar diferentes percursos na sala de formas diferentes aos quais se junta a música como um dado que orienta a actividade para uma resposta mais atenta, concentrada e também mais inspiradora.

Na segunda parte da sessão propõem-se exercícios de improvisação, neste caso a partir de dois indutores: a palavra e a relação com os objectos. Os exercícios de

improvisação enquadram-se nas actividades dramáticas como modalidade de dramatização ou jogo dramático, termo pela qual são conhecidos sobretudo nos países de língua francesa.

A acção é desenvolvida, em termos gerais, por um grupo de participantes, que com base num determinado tema ou proposta de exploração, executa uma representação perante os outros elementos do grupo, fazendo-o de acordo com um tempo limitado de preparação, o que obriga os intervenientes a improvisar, dando uma resposta adequada a uma situação que não estava prevista.

A prática desta actividade tem já um grau superior de exigência relativamente às propostas anteriores, que como vimos anteriormente, são baseadas na exploração da imagem fixa como elemento de comunicação, tendo nesta fase uma orientação já mais dirigida para a representação de acções perante um público que é familiar, que faz parte do mesmo contexto de formação e que tem também uma característica particular que é o facto de estar constituído por grupos que farão também a sua representação perante os outros.

A metodologia utilizada tem geralmente os seguintes passos:

- Escolha de um indutor de jogo: tema, texto, situação, personagens, objectos, etc; - Constituição de sub-grupos;

- Os grupos estabelecem uma estrutura de improvisação; - Apresentação do trabalho de cada grupo.

Foram realizadas duas actividades de improvisação. Enquanto na primeira o grupo escolhia um «segredo» que fazia parte da sequência de exercícios anteriores, nas representações seguintes as improvisações foram realizadas com base numa composição de objectos (banco de jardim e mala de viagem).

A capacidade de improvisação ou de jogo nas actividades dramáticas é uma questão central, visto que obriga os intervenientes a uma prática de resolução de problemas, que se traduz na necessidade de trabalhar em grupo e na emergência de dar uma resposta a uma determinada questão, resposta essa minimamente estruturada para que possa ser apresentada a outros, sabendo que será necessário improvisar perante o espontâneo exposto ao olhar dos outros participantes.

A exercitação desta capacidade de reacção, que no contexto dramático pode envolver situações que seguem uma sequência lógica, mas também outras que consideramos pouco prováveis ou absurdas, mantém sempre a abertura do jogo, representa uma experiência inovadora e enriquece os participantes com uma melhoria da capacidade de reacção às situações mais diversas e imprevistas.

Os objectos escolhidos, como a mala de viagem e o banco de jardim, têm a vantagem de, sobretudo no caso deste último, produzir uma ficção relativamente à noção de espaço, determinando se o mesmo é interior ou exterior, ou coexistindo os dois espaços, como se articula a relação entre eles respeitando os seus limites.

A associação destes objectos como indutores de jogo, teve uma adesão imediata por parte dos alunos, visto que esses objectos remetem para uma realidade comum à maior parte deles, que viaja regularmente entre a escola e o seu lugar de origem, dando a conhecer um conjunto de vivências associadas a essa realidade e que foi partilhado por todo o grupo.

Esta sessão (8ª) foi realizada de acordo com a seguinte sequência de exercícios descritos de forma sintética:

O trabalho desenvolvido na aula anterior foi referido para sensibilizar os alunos para a relação com o espaço, neste caso o espaço interior da sala de aula, pretexto para falar também da relação com o espaço exterior, com o lugar, com a cidade, tendo os alunos falado sobre as localidades de onde são naturais, como se deslocam para Bragança, onde residem nesta cidade.

Realização de exercícios práticos:

- Pede-se aos alunos que caminhem livremente pela sala de aula ao som de um suporte musical, estabelecendo-se a regra de sempre que a música pára cada um dos participantes pára também, ficando imóvel;

- Cada participante reinicia a marcha sempre que o suporte musical volta a ouvir- se;

- Cada participante executa um ritmo de marcha de acordo com as indicações do professor;

- Cada participante caminha em seguida de «marcha atrás» sem tocar nos colegas; - Cada participante caminha de «marcha atrás», mas sempre que toca num colega tem de continuar a caminhada mantendo também o ponto de contacto;

- Este exercício desenvolve-se até ser dado um sinal de paragem ficando todos os elementos do grupo numa posição imóvel;

- Cada elemento do grupo escolhe um parceiro com o olhar;

- De seguida um dos elementos do par realiza um movimento sendo seguido pelo olhar do outro;

- A continuação do exercício anterior dá lugar à troca de tarefas entre os elementos de cada par;

- Na actividade seguinte, um dos elementos realiza um movimento sendo seguido pelo olhar do outro, movimentando-se este posteriormente de acordo com a situação sugerida pelo primeiro;

- A actividade continua dando lugar à troca de funções entre os elementos de cada grupo;

- Um dos elementos do par fecha os olhos, todos os outros participantes contam um segredo a cada um dos elementos que se encontra de olhos fechados;

- A continuação do exercício anterior dá lugar à troca de tarefas entre os elementos de olhos fechados e os «contadores de segredos»;

- Cada dupla junta-se a outra dupla formando um grupo que tem por tarefa fazer uma improvisação que reproduz o segredo escolhido perante a turma, destacando-se uma das improvisações que reproduziu o segredo “Do mar a Guimarães, «arreguila» o olho para não dormires no comboio”;

- Os alunos foram convidados a criar imagens fixas tendo como indutor a composição de objectos formada por um banco de jardim e uma mala de viagem;

- Seguiram-se improvisações que identificaram “a despedida de um casal de namorados”, “o passageiro que adormece perdendo o autocarro”, “os namorados distraídos ficam sem a mala”;

- Segue-se a retroacção sobre o trabalho realizado tendo-se falado dos segredos, das improvisações, da indução dos objectos.

Se na sequência anterior a exploração dos objectos remete para uma actualização de vivências dos participantes centradas na sua relação com o quotidiano, a sessão seguinte (9ª) parte do princípio que objecto, mesmo vulgarizado no dia-a-dia, pode ter uma abordagem específica como elemento neutro na situação pedagógica, afastando-se da sua função real, para existir como um elemento de composição artística, associando a exploração plástica e dramática.

A cadeira como objecto está presente desde o início da actividade, fazendo parte num primeiro momento, como «arranque», de um trabalho corporal que explora as suas qualidades como objecto fixo e móvel, sendo posteriormente utilizada como elemento escultórico com a realização de «esculturas de cadeiras», num processo contínuo de construção/desmontagem como ponto de partida para a criação de novas composições, de resultado imprevisto e que determinam sempre novas hipóteses de exploração seguinte.

O processo de construção incorpora de seguida elementos do grupo em posição fixa, fazendo uma transição entre a fase anterior designada pelo corpo-escultura, para uma associação entre o corpo como imagem e os objectos como pontos de partida para a expressão/comunicação dos intervenientes:

- Realização de exercícios práticos com base na manipulação de objectos, neste caso uma cadeira;

- Cada participante tenta sentar-se na cadeira procurando fazê-lo de forma diferente;

- Cada participante desloca-se pela sala transportando a cadeira de forma diferente sempre que muda de percurso;

- Cada participante junta-se a outro, deslocam-se pela sala transportando duas cadeiras de forma diferente, sempre que mudam de percurso;

- Desenvolvimento do exercício anterior desta vez com quatro participantes em conjunto;

- Com os alunos sentados no anfiteatro da sala, inicia-se um exercício em que cada um pode colocar uma cadeira no espaço livre da sala na posição que entender;

- Construção de uma composição de objectos formada por cadeiras;

- Construção sucessiva de novas composições de cadeiras seguidas de comentários pelos alunos;

- Construção sucessiva de novas composições de cadeiras e participantes, colocados pelos colegas em posição imóvel, formando uma imagem fixa, seguidas de comentários pelos alunos;

- Segue-se a retroacção sobre o trabalho realizado, tendo-se falado nos objectos como indutores da produção de ideias e acções na actividade dramática, tendo sido salientado as diferenças e complementaridades existentes entre a exploração dos objectos realizada nesta aula e na anterior.

A familiaridade com a exploração de objectos passa a ser uma constante deste trabalho, recuperando regularmente elementos de actividades anteriores, que permitem, como verificámos antes, estabelecer relações entre as várias sessões de trabalho formando um todo coerente, o que facilita a compreensão e assimilação de componentes essenciais desta área de forma integrada e progressiva, melhorando as capacidades expressivas dos participantes, que adoptam ao longo das sessões uma postura cada vez mais descontraída no que diz respeito, por exemplo, à exposição perante os outros.

Depois de uma primeira parte inicial de movimento foi proposto nesta sessão (10ª) a realização de improvisações em grupo, de número não superior a quatro elementos, que tiveram por base a exploração de uma situação da qual fizessem parte alguns objectos já conhecidos por eles, como o banco de jardim e a mala de viagem, articulados com outros como a tábua de engomar e algumas peças de roupa, abrindo o jogo para outras possibilidades de exploração.

A introdução destes objectos levou os alunos a um conjunto de improvisações que implicaram a relação entre espaço interior e exterior, a escolha de objectos principais e acessórios, a criação de personagens e a sua adequação ao contexto, a relação entre o

espaço de jogo e o espaço de interacção com o público, formado pelos outros elementos do grupo, a gestão do tempo de preparação e o tempo de apresentação.

Relativamente às apresentações, foi interessante verificar como determinados objectos ganham protagonismo em determinadas situações, o que se verificou neste caso relativamente à tábua de engomar, com a realização de improvisações que fizeram sobretudo uma leitura crítica das relações entre sexos.

Esta sessão foi realizada de acordo com a seguinte sequência de exercícios descritos de forma sintética:

- Realização na primeira parte de um exercício de movimento, de acordo com um dispositivo espacial composto por dois círculos formados pelos elementos do grupo, rodando um deles à volta do outro, o que permite estabelecer diferentes interacções entre os intervenientes;

- Realização de improvisações por grupos formados por quatro elementos, criando e desenvolvendo situações em que estivessem presentes os objectos referidos anteriormente.

- Segue-se a retroacção sobre o trabalho realizado, tendo-se falado sobre a qualidade das apresentações apesar dos improvisos e do interesse que a manipulação de objectos tem nesta área.

A sessão seguinte procurou sensibilizar os alunos para a polivalência do fio de lã como objecto, explorando as suas características como suporte de movimento, manipulado por grupos pares, em que um dos elementos segue a acção do outro, fazendo o objecto a ligação entre eles.

Esta actividade segue uma sequência que evolui ao longo da sessão, diversificando as propostas de manipulação produzidas e seguidas pelos participantes como exploração inicial, seguindo-se a interpretação de imagens, primeiramente, como desenho efectuado no chão com os fios de lã e a segunda com a construção de uma «teia gigante» na sala, ambas envolvendo todos os alunos.

Esta actividade evidenciou uma grande polivalência do objecto, quer em termos de apoio ao movimento, quer como material de expressão e exploração artística do espaço, em termos plásticos e dramáticos, o que associado à audição de música se tornou numa

acção inspiradora e atraente em realizar, tendo provocado um certo efeito de surpresa pelo resultado obtido nomeadamente com a construção da teia.

Este efeito de surpresa e relação com o imprevisto, em que os próprios intervenientes não se limitam a ser meros espectadores mas antes protagonistas da acção, tem um impacto positivo na dinâmica de grupo, fortalecendo as relações entre os seus elementos e destes com o professor, o que reforça a progressiva integração dos alunos no processo de conhecimento da linguagem dramática.

Esta sessão (11ª) foi realizada de acordo com a seguinte sequência de exercícios descritos de forma sintética:

- Início da actividade com a manipulação de um objecto como indutor do movimento;

- Cada participante escolhe um parceiro que se encontre num lugar próximo, distribuem-se pelo espaço colocando-se a uma certa distância entre si, com o fio esticado, um deles inicia um movimento que é reproduzido pelo outro elemento do par;

- Seguem-se propostas de exercício onde se alterna a orientação do movimento trocando as mãos que seguram o fio;

- Continuação do exercício anterior com os dois elementos de cada grupo a segurar dois fios esticados, fazendo-se a orientação e reprodução do movimento alternadamente;

- Variações do exercício alternando os movimentos em simetria por outros realizados por oposição;

- Realização do exercício anterior cruzando todos os fios num ponto comum no centro da sala, sendo produzidos desta forma movimentos de acordo com essa situação;

- Colocação no chão dos fios esticados com todos os elementos do grupo dispostos em círculo;

- Elaboração de uma pequena composição com as pontas dos fios que cada elemento segurava, pretexto para uma leitura da imagem produzida, tendo os alunos referido que a composição lembrava a união, uma aranha, uma bola de praia, um guarda- chuva;

- Construção de uma grande «teia de aranha» por todos os elementos da turma, cada um com o seu novelo de lã, distribuída por todo o espaço da sala de aula, ao som de um suporte musical;

- Segue-se a retroacção sobre o trabalho realizado, tendo-se falado da composição realizada por toda a turma tendo os alunos referido que o trabalho representava encruzilhadas da vida, destruição, marionetas, abandono, interacção, liberdade de expressão.