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3. ETAPAS DO PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DE UM SISTEMA DE

3.1 FATORES NECESSÁRIOS PARA O SUCESSO DE UM SISTEMA

Partindo do pressuposto que qualquer município é capaz de implantar um SBP, desde que adaptado à realidade da cidade, algumas ações são necessárias para viabilizar a existência deste serviço antes de iniciar as etapas de implantação. Basicamente, para um SBP tornar-se uma opção atrativa em qualquer cidade, a população deve utilizar a bicicleta como um modo de deslocamento seguro, cômodo e rápido.

Por isso, destacam-se os seguintes aspectos para o bom funcionamento de um SBP: um sistema de transporte que seja integrado física e operacionalmente com o serviço de bicicletas públicas; um recurso suficiente para manter o serviço; um serviço acessível a maioria das pessoas; e uma rede cicloviária associada às medidas de priorização da bicicleta nas interseções, permitindo um deslocamento seguro para os usuários e a continuidade do percurso em toda a área coberta pelo sistema (MIDGLEY, 2009, 2011).

Contudo, a infraestrutura para bicicleta é uma condição necessária, mas não suficiente. É importante que medidas de incentivo ao uso da bicicleta e, consequentemente, das bicicletas públicas, venham acompanhadas de campanhas por parte das autoridades públicas. É imprescindível que haja uma política municipal da bicicleta.

3.1.1 Política municipal da bicicleta

Para que as bicicletas públicas tenham sucesso, inicialmente, são necessárias vontade política e participação cidadã convergindo para um forte consenso político e social em favor da mobilidade urbana sustentável. O serviço deve fazer parte de uma política de fomento ao uso da bicicleta como meio de transporte urbano e de um plano de mobilidade sustentável das cidades (IDAE, 2007).

Deve haver um planejamento onde a ferramenta que servirá de base para a promoção do uso da bicicleta em nível municipal será um plano diretor da cidade ou plano estratégico da bicicleta, onde estarão definidos os objetivos gerais, o planejamento para recursos, os indicadores e as diretrizes. Neste plano diretor, deverão ser estabelecidas as relações entre os diversos modos de deslocamento, e no caso de ser planejado um SBP, como o serviço será inserido nos sistema de transportes da cidade.

Além disso, as políticas devem ser marcadas pela participação cidadã onde todos os atores envolvidos – como políticos, técnicos de mobilidade e de meio ambiente, empresas de aluguel e empréstimo de bicicletas, associações de usuários de bicicletas e Organizações Não-Governamentais (ONG) – devem intervir. Em muitos casos, são realizadas mesas redondas sobre mobilidade sustentável, formadas por uma comissão sobre bicicletas, onde são coordenadas as ações com os atores envolvidos. No caso de Berlim, na Alemanha, a realização de workshops e mesas-redondas ajudou no aumento da popularidade do ciclismo como modo de deslocamento na cidade (SPICYCLES, 2009).

Adicionalmente a uma política municipal da bicicleta, o projeto OBIS constatou que existem alguns fatores que podem contribuir para o sucesso de um SBP e que o êxito é definido pelas perspectivas dos diferentes atores envolvidos. Para OBIS (2011), a abordagem desses fatores não oferece metas que determinam o sucesso econômico nem o sucesso em termos numéricos, mas oferece uma metodologia para ajudar a explicar a complexidade de medição de sucesso de um sistema como esse.

3.1.2 Definição de sucesso e mensurabilidade

A definição de sucesso é diversificada e depende do ponto de vista e dos grupos de atores envolvidos, que podem ser divididos em usuários (residentes ou eventuais), políticos e planejadores, operadores e

fornecedores da tecnologia, que junto aos gestores oferecem, por exemplo, acessibilidade, opções de informação e de pagamento bem como o funcionamento das bicicletas. Portanto, diferentes atores têm diferentes noções de sucesso e diferentes indicadores que servem para avaliar o serviço (quadro 18).

Quadro 18: noções de sucesso para grupo de atores envolvidos.

Atores envolvidos Noções de sucesso Indicadores possíveis Positivo se...

Usuários

Acessibilidade Densidade de estações, horas de funcionamento muito Confiabilidade Quantidade de estações cheias/vazias pouco Conforto e velocidade Peso das bicicletas pouco

Políticos e planejadores

Melhorar a imagem da cidade Nº de artigos positivos muito Aumento do ciclismo Mudança no modo por bicicletas (%) muito Redução na emissão de CO2 Nº de viagens por carro/total de viagens substituídas pouco

Operadores Empresas de publicidade e outros fornecedores Visibilidade

Nº de estações do SBP por km²; número de empréstimos diários do SBP pela população

por dia e por noite muito Contratos através de jurisdição Nº e divisão de contratos na área metropolitana muito

Baixos custos de serviço e administração

Custos de administração e serviço por

bicicleta pouco

Agências de transporte

Uso Nº de empréstimos diários do SBP muito Eficiência de investimento Nº de empréstimos diários do SBP por bicicleta muito

Operadores municipais

Benefícios públicos Ganho de tempo e ganho financeiro do usuário por empréstimo do SBP muito Sem “más notícias” acidentes/roubos/casos de vandalismo. Nº de clausulas médio negativo; nº de pouco

Associações

Baixo custo de investimento Custo de investimento projetado para um ano. pouco Baixo custo de funcionamento Custo de funcionamento pouco

Fonte: elaborado pela autora, baseado em OBIS (2011).

É importante destacar que os indicadores do quadro 18 servem de parâmetro para medir o sucesso de um SBP, porém não devem ser encarados como verdade absoluta, uma vez que partem de noções diferenciadas de sucesso e de diferentes visões dos atores envolvidos. Além disso, existem também

aspectos fundamentais que apontam para a sobrevivência do sistema, considerados pelos especialistas, como principais fatores no processo de implantação deste serviço.

3.1.3 Aspectos fundamentais para sobrevivência do sistema

Para garantir a sobrevivência e permanência de um SBP, sete aspectos foram identificados pelo projeto OBIS como importantes no funcionamento do serviço e cada um possui indicadores que servem para avaliar seu andamento. São eles (ibid.):

• Infraestrutura cicloviária da cidade; • Acessibilidade do usuário;

• Segurança;

• Desenho das estações e das bicicletas;

• Modelo de financiamento (proprietário e operador); • Integração com outros modos de transporte;

• Redistribuição das bicicletas.

Muitos desses indicadores são avaliados após a implantação do sistema. Desta maneira, eles somente são utilizados como referência para cidades que planejam implantar o sistema, ou seja, servem de comparação com cidades que já possuem o serviço.

3.1.3.1 Infraestrutura cicloviária da cidade

Esse aspecto está relacionado, por exemplo, à existência e implantação de um plano cicloviário para a cidade ou região, onde são analisados fatores como a construção ou manutenção de ciclovias e ciclofaixas, os mecanismos de sinalização para as longas rotas de bicicletas, as diferentes medidas de segurança nos locais onde ocorre interface com o automóvel e o pedestre, a existência de bicicletários e paraciclos seguros, principalmente em terminais de transporte público, dentre outros (ibid.).

Segundo Niches (2007), a infraestrutura cicloviária é uma condição essencial para a implantação de um SBP, ao lado de ações como o comprometimento com o planejamento e a promoção da bicicleta como um importante meio de transporte seguro e conveniente. São exemplos de indicadores desse aspecto (MIDGLEY, 2011; OBIS, 2011):

• O comprimento da rede cicloviária em termos de ciclovia e ciclofaixas; • A qualidade e a quantidade de espaços destinados às bicicletas;

• A localização específica da rede, desenhada segundo os objetivos do sistema, e a demanda de viagens;

• O montante investido pelo município na infraestrutura cicloviária (sinalização, semáforos, centros de mobilidade, etc.);

• A divisão dos montantes municipais investidos em infraestrutura cicloviária e em infraestrutura para os demais veículos.

3.1.3.2 Acessibilidade do usuário

Esse aspecto está relacionado a todas as medidas adotadas pelo operador/gestor para tornar o sistema fácil de ser acessado, tanto no espaço quanto no tempo. Essa facilidade no acesso deve acontecer desde o registro do usuário no sistema, tornando fácil a utilização do serviço no primeiro contato, até a densidade de estações ou, no caso de programas sem estações, densidade de bicicletas nos locais de demanda (uma esquina, por exemplo).

Fazem parte de uma boa acessibilidade do usuário ao sistema, por exemplo, a dinamicidade do serviço para o empréstimo da bicicleta e a existência de espaços vazios nos racks das estações de destino; a rapidez no reparo de problemas como mau funcionamento das estações ou bicicletas; e a duração que o serviço é disponibilizado para as pessoas. Além disso, especialistas sugerem os seguintes fatores como alguns indicadores do nível de acessibilidade do sistema ao usuário (ibid.):

• A densidade das estações ou bicicletas em uma área efetiva de sistema/km²; • A média do número de empréstimos por estação;

• O custo de utilização incluindo custos monetários e de comodidade; • Horas e dias do ano em que o serviço está disponível;

• A média e o tempo máximo de serviço de reparo das bicicletas e estações;

• Número de perdas de bicicletas nas estações ou carência de estacionamento (por ter estações cheias) no retorno das bicicletas, como uma porcentagem do número de aluguéis;

• Velocidade no acesso, a informação em tempo real e a privacidade e segurança com os dados do usuário.

3.1.3.3 Segurança

O SBP deve garantir segurança ao usuário durante a utilização do serviço. Como o sistema gera o crescimento no número de viagens não motorizadas por bicicleta, cresce também o número de acidentes. Por isso, além dos critérios utilizados para a infraestrutura cicloviária, outros critérios são específicos para a segurança do sistema como, por exemplo, a localização da estação deve ser tão visível quanto funcional no compartilhamento das bicicletas. Ela deve ser segura e não gerar conflitos na via, nem nas calçadas. Deste modo, não devem interferir com outros usuários do espaço público (OBIS, 2011). São exemplos de indicadores de segurança do SBP (MIDGLEY, 2011; OBIS, 2011):

• Total de acidentes com bicicletas/100.000 viagens por bicicleta realizadas;

• A quantidade de terminais e infraestrutura do sistema com boa iluminação e com vigilância; • Número de mortes/100.000 viagens por bicicleta.

3.1.3.4 Desenho das estações e das bicicletas

Esse aspecto tem influência direta no funcionamento do SBP, uma vez que uma opção equivocada no desenho das estações e das bicicletas pode desestimular a utilização do serviço. Ao longo da pesquisa, abordou-se muito a relação do desenho das bicicletas com os atos de vandalismo e roubo. Elas devem ser robustas e possuírem um desenho característico e uniforme, com aparência distinta de forma a inibir os atos de vandalismo. Entretanto, essa característica não pode tornar as bicicletas muito pesadas e de difícil condução, pois desestimula o uso do sistema.

Da mesma forma, as estações devem apresentar um desenho simples que facilite a utilização do serviço pelo usuário. O espaçamento entre bicicletas deve garantir mobilidade no manuseio delas, bem como o sistema de travamento que deve permitir fácil bloqueio e desbloqueio. Como exemplos de indicadores do desenho das estações e das bicicletas, pode-se destacar (ibid.):

• O peso da bicicleta;

• As especificações das bicicletas de acordo com condições demográficas e operacionais dos usuários;

• A visibilidade dos terminais e a interface do sistema com o usuário.

3.1.3.5 Modelo de financiamento

Duas características são importantes e decisivas para a garantia de sobrevivência de um SBP: a ambição do governo local e o tamanho do sistema em relação ao tamanho da cidade (OBIS, 2011). Alguns indicadores desse aspecto são difíceis de mensurar, especialmente os que necessitam de pesquisas de viagens, que normalmente não são realizadas todo ano por questões de custo. Contudo, podem-se destacar como indicadores do modelo de financiamento de um SBP (ibid.):

• O custo total anual (investimento e operação) do sistema/ número de empréstimos (sistemas baseados em estações) ou bicicletas (sistemas sem estações);

• Divisão modal de bicicleta no total do número de viagens diárias, na área de abrangência do SBP, cujo destino final seja para: trabalho, lazer ou negócios.

3.1.3.6 Integração do sistema de transporte e tecnologia da informação

A forma como ocorre a integração no registro, pagamento e uso do cartão inteligente entre o SBP e outros modos de transporte aumentam as chances dos usuários combinarem os modos e contribui para tornar os transportes mais baratos e eficientes. Esse aspecto é extremamente importante em cidades onde existem vários operadores de transporte público e onde a cooperação entre eles necessita de um acordo (ibid.). A integração entre sistemas aliada à T.I. proporciona importantes ganhos para a mobilidade das cidades, por exemplo, ao mapear no telefone móvel a localização das estações e a disponibilidade das bicicletas.

Outro exemplo é a possibilidade intermodal entre conexões e paradas de transporte público. No caso de programas menores, essa integração pode ser difícil de ocorrer se o sistema depender de maiores investimentos. Entretanto, atualmente, alguns programas deste porte já contam com uma tecnologia móvel. Destacam-se como indicadores desse aspecto no SBP (MIDGLEY, 2011; OBIS, 2011):

• Distância máxima entre as estações do SBP e a estação ou parada do transporte público; • Divisão de viagens intermodais em viagens de bicicletas públicas;

• Capacidade de motivação dos moradores transferirem suas viagens para o transporte público.

3.1.3.7 Redistribuição das bicicletas

Sabe-se que a localização das estações e a disponibilidade das bicicletas influenciam diretamente na acessibilidade do usuário ao SBP e que, para manter o nível de serviço das bicicletas públicas e atender à demanda local das estações de forma rápida, faz-se necessária uma constante redistribuição das bicicletas do ponto de destino para o ponto de origem. O que normalmente ocorre é a transferência de papéis ao longo do dia, pois no momento que as pessoas mudam a direção dos seus deslocamentos, os pontos de origem e destino se invertem. Já um sistema direcionado para deslocamentos ocasionais, por exemplo, pode-se trabalhar diferentemente, embora, em alguns casos, possam existir locais de interesse que, provavelmente, serão pontos de destino durante o dia e mudem para origens à noite.

Segundo OBIS (2011), a redistribuição é um desafio tanto para a capacidade do sistema quanto para o impacto ambiental. Em Barcelona, há problemas com relação à redistribuição das bicicletas, pois, além de utilizarem caminhões que dificultam o atendimento em áreas com vias estreitas, o limite máximo de usuários do sistema já foi alcançado.

Além disso, em outras cidades, existe a preocupação ambiental, onde, por exemplo, o pequeno benefício alcançado com a transferência de alguns usuários do automóvel para as bicicletas é desperdiçado pelas emissões de gases poluentes dos caminhões utilizados na redistribuição do sistema. Medidas simples como a substituição do combustível por alternativas “verdes” como o biodiesel, biogás ou eletricidade ajudam a minimizar esse problema. Como exemplos de indicadores do nível de serviço de redistribuição das bicicletas de um SBP, pode-se destacar (MIDGLEY, 2011; OBIS, 2011):

• A quilometragem dos caminhões de redistribuição e dados de emissão de gases tóxicos da frota dos caminhões;

• Mecanismo de mapeamento assimétrico da demanda para bicicletas por localização; • O tipo de combustível e o consumo da frota de caminhões.