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O fenômeno low cost na Amazônia e o impacto na saturação dos terminais de transporte aéreo

Parte II. A Amazônia 6 A formação da Amazônia

Bloco 3: vôos intra-regionais, entre os centros econômicos regionais e as demais cidades,

7.3.1.1. O fenômeno low cost na Amazônia e o impacto na saturação dos terminais de transporte aéreo

O fenômemo low cost é relativamente recente, iniciou-se na década de 70, com a desregulamentação do transporte aéreo americano em 1978 e o nascimento da primeira empresa aérea low cost, a Southwest. O fenômeno seguiu na Europa, Ásia e Canadá, com a criação de diversas companhias aéreas de baixo custo, que inclusive estenderam o conceito a hotéis e transportadoras terrestres, além de promover uma elevada competição com as companhaias aéreas tradicionais, com estruturas mais burocráticas e onerosas.

Companhias européias, como Ryanair, Easyjet e Thomas Cook, foram responsáveis pela popularização de destinos estantaneamente, não só no velho continente, mais também em várias partes do mundo. Cidades localizadas ao longo do mar mediterrâneo, como Faro, e destinos caribenhos, como Cancun, de repente, viram seus terminais lotados com ordas de turistas vindos de diversos países europeus.

No Brasil, o fenômeno somente agora começa a ganhar maturidade. Segundo Beting (2006) diversas empresas testaram o conceito no país, entre elas a Fly Linhas Aéreas (1994 a 2003), Via Brasil (1998 a 2001) e Nacional (2000 a 2002), entretanto nenhuma obteve sucesso no mercado. A mais longeva no mercado, a BRA – Brasil Rodo Aéreo, recentemente (2007) também fechou as portas. Os principais problemas acumulados foram falta de profissionalização, má administração, regularidade, concorrência apenas no tráfego sazonal (alta temporada) e aviões antigos, com custos de manutenção elevados.

O aparecimento destas companhias no cenário nacional só foi possível devido a desregulamentação do mercado aeronáutico ocorrida no Brasil a partir de meados da década de 90 do século passado. Esta concorrência no entanto terminou mantendo no mercado apenas as companhias bem administradas e preparadas para concorrer num mercado de rotas, horários e tarifas livres. Companhias tradicionais como Varig, Transbrasil e Vasp rapidamente perderam mercado, tentando em vão frear o crescimento da então regional TAM, da novata Gol e mais recentemente da Oceanair.

Entretanto, as companhias “grandes”, de atuação nacional, deixaram as cidades de menor tráfego, concentrando suas operações nas capitais. Tal fato possibilitou o crescimento de companhias regionais: TAF, TRIP/TOTAL, Rico, Meta, Pummair, entre outras; que passaram a disputar o mercado nestas localidades antes atendidas pelas grandes companhias.

A partir de 2003, uma nova estratégia das grandes companhias iria causar grande impacto nos terminais de muitas cidades do interior. Os mercados das capitais, das ligações inter e intra- regionais já se encontravam saturados com as principais rotas e horários utilizados. As empresas foram em busca do mercado antes pertecente exclusivamente as regionais, entretanto os terminais destas pequenas cidades acostumados a receber poucos vôos, em aviões turboélices, de repente, viram seus terminais lotados, com aviões de grande porte em suas pistas.

A Amazônia não ficou de fora desta estratégia, cidades como Cruzeiro do Sul, no Acre; Tefé e Tabatinga, no Amazonas; Santarém e Marabá, no Pará; além das capitais Macapá, no Amapá; e Boa Vista, em Roraima; tiveram um incremento significativo de vôos, não só nacionais mais também das companhias regionais que passaram a alimentar as grandes companhias.

Na Amazônia, o aeroporto de Santarém, no oeste do Pará, e Macapá, capital do Amapá, foram os dois terminais que mais sentiram este incremento operacional, sobretudo no segmento low cost. Ao acompanharmos (tabela 1 e 2) o movimento operacional nestes dois terminais, perceberemos o grande impacto causado pelos novos vôos no aumento da demanda e, conseqüentemente no uso do terminal destes aeroportos.

A entrada da empresa Gol no mercado de Santarém, com dois vôos diários, um na rota Manaus - Santarém – Belém – São Luis – Fortaleza – Recife – Salvador, e outra no sentido inverso, com término em Manaus, além do incremento posterior da TAM, com mais um vôo diário em cada sentido, trouxeram um aumento significativo na demanda para o aeroporto, vejamos (tabela 8):

Tabela 8: Movimento de Passageiros no Aeroporto de Santarém: 2003 a 2007 Ano Passageiros (Milhares) Índice de Crescimento Base – 2003 2003 135.942 100 2004 153.942 113 2005 181.449 133 2006 285.132 209 2007 364.181 267 Fonte: Infraero, 2008

Na cidade de Macapá, além da entrada da Gol na rota Macapá – Belém – Brasília – São Paulo – Porto Alegre duas vezes por dia e do incremento operacional da TAM na rota Macapá – Belém – Brasília compensou, em parte, a saída da rota da Varig e da Vasp que mantinha um vôo diário cada, mas com aeronaves menores, tipo 737-200/300 para no máximo 130 passageiros. A TAM e a Gol operam na rota com aeronaves bem maiores, com média de 160 lugares. A TAF também mantém 3 vôos semanais na rota Caiena – Macapá – Belém – Fortaleza. Estas operações trouxeram um grande incremento operacional (tabela 9):

Tabela 9: Movimento de Passageiros no Aeroporto de Macapá: 2003 a 2007 Ano Passageiros (Milhares) Índice de Crescimento Base – 2003 2003 325.070 100 2004 392.775 121 2005 414.481 128 2006 480.377 148 2007 526.570 162 Fonte: Infraero, 2008

Vê-se que a entrada da low cost em Santarém, em 2005, trouxe um grande incremento de passageiros na região. Entre 2003 e 2005, o movimento médio operacional acrescido a cada ano estava em torno de 22.500 passageiros/ano, mas se consideramos o período seguinte, o incremento médio é da ordem de 90 mil passageiros/ano, 400% a mais. A abertura de novas rotas trouxe um rápido crescimento ao aeroporto, além de uma acentuada redução tarifária. Em 2003, os preços médios nesta rota eram de R$ 300,00 reais (€28 107,00), hoje são de R$ 160,00 reais (€ 57,00), uma redução de quase 50%. Numa relação direta, vemos que uma redução de quase 50% na tarifa média provocou um aumento praticamente proporcional na demanda.

Em Macapá a situação não foi diferente, a redução tarifária provocou um aumento significativo da demanda. Segundo dados da Gol – Linhas Aéreas Inteligentes, publicados em 2007, tal fato ocorre devido à existência de uma demanda reprimida muita grande na região. Entretanto alguns estudos publicados em revistas especializadas como Aeromagazine, Flap e Avião Revue acusam uma mudança de modal, ou seja, estes “novos” passageiros, na verdade, apenas trocaram o barco ou autocarro pelo avião.

Em algumas rotas como Belém – Santarém – Manaus, na qual as tarifas mais baixas nas embarcações regionais chegam a pouco mais de R$ 120,00 (€ 43,00) e Belém – Macapá – Belém cerca de R$ 60,00 (€ 22,00), realmente as tarifas aéreas ficam bem mais vantajosas. As viagens e distâncias na Amazônia são medidas em horas de barco. Estas penosas e demoradas viagens de barco, que duram até 2,5 dias entre Belém e Santarém, até 5 dias entre Manaus e Belém, são vencidas rapidamente em poucas horas de avião a tarifas bastante acessíveis.

Esta rápida mudança de perfil não tem sido acompanhada pelos gestores dos terminais aeroportuários, que, agora, andam as voltas com a saturação inevitável dos mesmos.

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Santarém, com terminal dimensionado para atender 223 mil pessoas entre embarques e desembarques, já atende 364.181 e não há previsão da construção de um novo no curto prazo. Macapá, dimensionado para atender 170 mil, já atende três vezes mais. Esta situação multiplica os problemas: filas fora do terminal, falta de pessoal, pouco espaço para oferta de novos serviços, salas de espera apertadas, poucas esteiras de restituição de bagagem, falta de vagas de estacionamento e reclamações crescentes.

Observa-se uma falta de planejamento da infra-estrutura aeroportuária, não dimensionada para receber tantos vôos num espaço curto de tempo. Um planejamento adequado reveria os horários de pousos e decolagens, da infra-estrutura disponível de forma a adequar a disponibilidade que há. Recentemente, no aeroporto internacional do Rio de Janeiro – Galeão, a Infraero recusou os horários de operação da Alitalia na rota Roma – Rio de Janeiro – Roma, pois o mesmo ocorreria num horário no qual a infra-estrutura do aeroporto e, em particular, do terminal já estaria comprometida. A companhia recusou as opções dadas e estuda outro momento para entrar no mercado.

Esta mesma medida poderia ser tomada para os demais aeroportos da rede, ou seja, aproveitar melhor a estrutura disponível, mudando os horários de alguns vôos para que não chegassem a momentos muito próximos, congestionando o terminal e causando a série de problemas já listados.

A Infraero prevê para os próximos dois anos um crescimento médio anual de 12% para os aeroportos da rede na região Norte, índice que, se mantido, trará ainda mais problemas para os já congestionados terminais. No médio e longo prazo, se nada for feito, poderá afastar e inibir novos viajantes, além de impossibilitar a criação de novas freqüências.

Apesar da divulgação destes estudos preliminares sobre as perspectivas de aumento da demanda, a gestão da maioria dos aeroportos do Brasil, e especificamente na Amazônia, apenas acompanha as tendências, não conseguindo antecipá-las por meio de estudos e pesquisas. As medidas são sempre reativas, vêm tarde demais, quando os problemas já estão afetando o crescimento potencial da demanda e da oferta, inibindo a criação de novos produtos.

“Para as cidades que são servidas por empresas de baixo custo, isso pode representar uma enorme diferença em termos do fluxo de turistas”. Pois “a questão é que os destinos turísticos

muitas vezes fazem um excelente trabalho de marketing junto a mercados potenciais, mas têm uma atitude muito passiva quando se trata de trabalhar em parceria com as empresas de transporte para facilitar o ingresso de turistas na região” (Palhares, 2001).

Na Amazônia, muitas cidades do interior da região, como Parintins, Monte Alegre, Tucuruí, Altamira e Juruti, que possuem atrações divulgadas em vários mercados nacionais potenciais, como São Paulo e Rio de Janeiro, apresentam sérios problemas em seus pontos de acesso. Falta uma maior oferta de vôos regulares, tarifas mais competitivas, sem mencionar os problemas estruturais da falta de hospedagem e qualificação para os operadores locais.

A médio e longo prazos, os problemas associados ao acesso a estes destinos podem inviabilizar a consolidação dos produtos existentes, a criação de novos, além de prejudicar a demanda real e a potencial para a região. As futuras operações de novas linhas aéreas e o aumento das freqüências ficam, também, bastante prejudicadas, pois os gestores destes terminais não possuem uma visão competitiva dos terminais que administram. Nestes casos, quando há aumento do fluxo de viajantes, segundo Espírito Santo (2001), “ocorre por causa da redução tarifária e não da articulação com a administração do terminal”.

Lembramos que o crescimemto da demanda turística ocorre por questões conjunturais macro, que um aeroporto por si só não tem como promovê-las, mas pode antecipá-las e se posicionar diante delas. No caso das low cost na Amazônia, uma melhor gestão admininstrativa poderia evitar muitos dos problemas apresentados.

Os dados apresentados acima, também mostram que o acesso desenvolve, mais um vez, um papel fundamental para o desenvolvimento de uma destinação. Entretanto, este não esta ligado apenas ao desenvolvimento físico destas áreas, ou seja, a capacidade de receber mais aviões; mas também do incremento qualitativo, de forma a atender as necessidades de viajantes e operadores de receptivo.