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As fontes filosóficas do pragmatismo

MARXISMO E PRAGMATISMO COMO FILOSOFIAS DA PRÁTICA E DE AÇÃO.

6.2. As fontes filosóficas do pragmatismo

A principal característica do pragmatismo – além de sua teoria de conhecimento e de sua concepção de verdade, que abordaremos mais adiante – é o de se reivindicar como uma filosofia de ação.

A palavra pragmatismo vem do grego pragma, significando ato, ação, isto porque em tal filosofia a experiência ocupa lugar central, como critério de validação da teoria.

O sentido de pragma diferencia-se da concepção marxista da práxis –

embora guardem, entre si, convergência semântica. Nos idiomas latinos tanto a palavra prática como práxis podem ser usados indistintamente se bem que a primeira tem uso mais corrente ao passo que a segunda é mais típica da linguagem filosófica.323

Logo, nesta acepção, práxis seria ação com fim em si mesma enquanto atividade refletida, ao passo que prática seria vista como ação destinada a criar objeto externo ao indívíduo, o que aproxima mais do sentido de poiesis.

O pragmatismo ao procurar resgatar uma série de aspectos, logicamente incompatíveis entre si, da ciência e da filosofia de seu tempo, abriu espaço, com isso, a ser criticado de um certo ecletismo e de tentar somar coisas contraditórias.

O pragmatismo é empirista – o que explica seu ceticismo em relação às visões fundacionistas e o aproximaria, grosso modo, do idealismo.

O próprio Peirce relata sua imensa admiração por Kant e admite que nunca conseguiu se libertar dos esquemas filosóficos da escola alemã, admitindo ainda que os primeiros livros estritamente filosóficos que leu, pertenciam à filosofia

322 STALIN, Josif V. Os fundamentos do leninismo. In: Questões de Política. Parte IX – O estilo de trabalho. São Paulo: Ed.

Global, 1982. A passagem completa tem o seguinte teor: ‘não se trata de estilo literário. Refiro-me ao estilo de trabalho, ao específico e peculiar que existe na atividade prática do leninismo e que cria o tipo especial de militante leninista. O leninismo é uma escola teórica e prática, que molda um tipo especial de dirigente do partido e do Estado, que cria um estilo especial de trabalho: o trabalho leninista. Quais são os traços característicos deste estilo? Quais são as suas peculiaridades? São duas: o ímpeto revolucionário russo; o sentido prático norte-americano”. Mas ressaltava: ‘O sentido prático norte-americano pode resultar num utilitarismo mesquinho se não se associar a um espírito revolucionário’.

clássica alemã, o que o teria deixado tão imbuído daquela maneira de pensar e nunca mais fora capaz de se libertar dela.324

Tal reconhecimento, ao meu ver, fundamenta a colocação do pragmatismo, ainda que com reservas, naquele campo genérico supra citado.

Mas, também sua valoração da experiência o aproximaria, vendo-se de uma outra perspectiva, das visões sensualistas e, por conseqüência, de um campo realista. Embora, admita – ainda que pragmaticamente! – a religião, a concepção de mundo pragmática poderia ser tida como um darwinismo social, onde a melhor idéia seria a mais apta no embate entre todas elas.

Talvez esse ecletismo quem melhor explicou foi o próprio James ao definir o pragmatismo como um nome atual para classificar velhas formas de pensar325. Ou

como uma filosofia – aí, de novo, o ecletismo – que pode satisfazer a ambas espécies de procura: pode permanecer religiosa e pode também preservar seu apego aos fatos.326

Por isso é que, aparentemente problemático, é possível se compreender porque as raízes do pragmatismo encontram-se em diversas manifestações filosóficas.

Um dos chamados pioneiros do pragmatismo já lembrava que não havia nada de novo no método pragmático e dele foram adeptos Sócrates, Aristóteles – que o empregara metodicamente -, Locke, Berkeley e Hume, que fizeram contribuições esporádicas à tal metodologia327.

O próprio Aristóteles, conforme os pragmatistas, teria uma noção de justiça claramente empírica, quando afirma que no tocante a justiça e a injustiça, devemos indagar com que espécie de ações elas se relacionam.328

323 VÁSQUEZ, Adolfo S. Filosofia da praxis. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1977. P.3-15.

324 PEIRCE, Charles S. Fragmentos Vários. In: Escritos coligidos. São Paulo: Abril Cultural, 1980. P.114. E o próprio Peirce

conclui: “Devotei duas horas diárias ao estudo da ‘crítica da razão pura’, de Kant, por mais de três anos, até que já sabia o livro todo de cor”.

325 JAMES, William. Pragmatismo: un nuevo nombre para algunos viejos modos de pensar. Conferencias de divulgación

filosofica. Nota preliminar de Jorge Luis Borges. Buenos Aires: Ed. Emecé, 1945.

326 JAMES, William. Pragmatismo. 1ª conferência: o atual dilema em filosofia. In: Pragmatismo e outros textos. São Paulo:

Abril Cultural, 1979. P.3-16.

327 JAMES, William. Pragmatismo. 2ª conferência: O que significa o pragmatismo. In: Pragmatismo e outros textos. São

Paulo: Abril Cultural, 1979. P.19.

Entretanto, devemos nos lembrar que o empirismo é uma designação genérica, abrangendo desde o empiriocriticismo329 (variante formulada no final do século XIX por Mach e Avenarius e segundo a qual, a experiência se caracterizaria pela soma de impressões e sensações subjetivas), até os empiristas radicais (que eram claramente solipsistas), podendo incluir – com a devida cautela, dado a especificidade que marcou o seu desenvolvimento – o pragmatismo.

Tal cautela faz-se necessário porque as visões empíricas mais extremas – por considerarem só possível o conhecimento do que se é experienciado – acabam se aproximando de um idealismo subjetivo, do qual o pragmatismo busca se distinguir.

Para aquele empirismo, a filosofia não deveria levar em conta nada que estivesse fora da experiência humana, ou dito de outro modo, o que não for palpável aos sentidos, não faz sentido.

Por ser esta uma visão ainda muito limitada, é mister salientar que os pioneiros do pragmatismo – Peirce à frente – dela se diferenciavam e consideravam-na insuficiente tendo em vista que reforçaria uma concepção meramente psicologista da experiência.

Os pragmatistas superaram essa visão ao concluírem que os empiristas do passado foram cartesianos demais ao supor que a experiência psíquica se dá fora do mundo natural, não percebendo eles que se a experiência é necessária psíquica, então o empirismo seria uma forma de idealismo.330

Ou seja, a experiência vista por um pragmatista, foge de um padrão psicologista. E se assim fosse vista só poderiamos analisar a filosofia fundada por Peirce como estritamente idealista. Mas, em sentido lato, essa análise é possível, dado que no pragmatismo a experiência ocupa lugar central enquanto critério fundamental de validação das proposições331.

329 LENINE, Vladimir I. Materialismo e empiriocriticismo. Lisboa: Editorial Estampa, 1975. P.31-43. 330 SHOOK, John R. Os pioneiros do pragmatismo americano. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2002. P.17-18.

331 PEIRCE, Charles S. Cómo esclarecer nuestras ideas. www.unav/gep/ P.6. Em 25/12/2002. Ali, Peirce afirma textualmente:

A crítica materialista a todo ponto de vista empírico fundamenta-se no entendimento de que a sensação é um laço direto da consciência com o mundo exterior, transformando estímulos num fato da própria consciência. Em oposição, o campo idealista – e aí incluem os empiristas – considera as sensações não como um liame, um elo entre nossa consciência e o mundo externo e sim como uma divisória, um limite entre um e outro.

A sensação vista desta forma, seria não uma imagem de um fenômeno exterior que a ela corresponde e sim adquiriria o status de único dado existente.

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