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CAPÍTULO 3 – OS AGENTES DO PROCESSO DECISÓRIO DE ELABORAÇÃO

3.2. AGÊNCIA1 – A INFLUÊNCIA DO INDIVÍDUO E SUA FORMAÇÃO PESSOAL

3.2.3. Ideologia dos agentes

Ao contrário das duas variáveis anteriores, relacionadas com o poder

119 Como se observará no capítulo 6, Bush, apesar de ter uma personalidade ativa e positiva, decidiu

não interferir nas discussões sobre a formulação do orçamento de defesa com o Congresso. Além disso, optou por adotar um discurso cauteloso e conciliador com o Legislativo. O comportamento do Presidente, portanto, não se encaixa perfeitamente no padrão esperado pela caracterização de Barber (1992).

intrínseco do Presidente no processo decisório, a terceira variável do nível1, para a compreensão de como os agentes influenciam o processo decisório, é relevante para a análise da formulação do convencimento no Executivo e no Legislativo.

Apesar de que as demais variáveis agenciais têm grande importância para a compreensão do posicionamento dos agentes políticos nos processos decisórios de que fazem parte, a ideologia, isoladamente, talvez seja a que é mais relevante na compreensão de como um indivíduo constroi seu posicionamento com relação a um tema específico, a ponto de Lindsay (1991) considerá-la, em conjunto com o partido do tomador de decisão, a variável mais importante de suas análises sobre a política de defesa dos EUA.

A ideologia é uma das mais estáveis variáveis das diversas analisadas na tese. Independentemente de pressões externas, de eventos internacionais, da situação da economia doméstica, da popularidade do Presidente ou do posicionamento da opinião pública, dificilmente um agente político altera radicalmente seu modo de pensar. Wittkopf e McCormick (1998), por exemplo, demonstram que a Guerra do Vietnã e o final da Guerra Fria, apesar de terem sido eventos muito importantes para a estrutura de formulação da política externa dos EUA, não alteraram a ideologia dos congressistas estadunidenses, sendo esse um fator de estabilidade para a política do país, mais importante que a própria filiação partidária dos Representantes e Senadores. De acordo com eles, o fim da Guerra Fria alterou a agenda política dos EUA, “mas as responsabilidades das funções e as preferências ideológicas que ditam como os membros do Congresso respondem a essas alterações permanecem intactas” (WITTKOPF; MCCORMICK, 1998, p. 4).

O perfil ideológico dos agentes, para os Presidentes, foi construído com base na extensa literatura consultada a respeito de suas ações, que encaixa Reagan em um perfil neoconservador e Bush em um perfil realista120. Para o Congresso, a tese mensurará a ideologia com base nos registros de votos e avaliações realizados pelo think tank “Americans for Democratic Action”121 – ADA, que dá notas a cada Representante ou Congressista, de acordo com seu posicionamento nas 20 principais questões de cada ano, que incluem votações de política doméstica e externa, relacionadas a temas sociais e econômicos. Cada votação considerada “acertada” (de cunho liberal) pela ADA recebe pontos, sendo os congressistas mais

120 Ambos serão desenvolvidos nos capítulos específicos sobre a administração dos Presidentes. 121 Americanos para Ação Democrática.

bem colocados considerados “herois” e os menos bem colocados considerados “zeros”. A partir da compilação dessas votações, foi possível traçar uma média de cada Congresso estadunidense, que pode ser considerado, portanto, mais ou menos liberal122.

A medida sobre a ideologia dos membros das Casas analisados será realizada com base nos números fornecidos pela ADA e na metodologia proposta por McCormick e Wittkopf (1990, p. 1083), que dividem em três as ideologias dos tomadores de decisão. Em um cenário em que a nota máxima que poderia ser obtida era de 100 pontos, os conservadores são aqueles que obtêm de 0 a 39, os moderados os que obtêm de 40 a 69 pontos e os liberais os que somam de 70 a 100 pontos.

A partir dessa medição, será construída uma média ideológica de cada Casa do Congresso com os quais tiveram que lidar os Presidentes analisados na tese em anos específicos. Presume-se que a tendência de Congressos mais conservadores era o aumento ou, minimamente, a manutenção dos gastos com defesa. Ao contrário, Congressos mais liberais tendem a facilitar a redução dos gastos123.

A ideologia é uma variável que tem se mostrado extremamente relevante para a compreensão dos posicionamentos dos legisladores em diversos estudos e, além disso, opera de modo independente do partido (MCCORMICK; WITTKOPF, 1990; WITTKOPF; MCCORMICK, 1998; LINDSAY, 1991). Os congressistas, principalmente, são mais fieis a suas ideologias que a seus partidos e, portanto, a primeira variável, estatisticamente, tem apresentado maior correlação que o pertencimento a um partido específico na análise dos seus votos.

Isso demonstra o quanto a ideologia é importante na análise de como características inerentes ao próprio indivíduo podem influir no resultado final de uma decisão. O apoio dos conservadores a gastos cada vez maiores com defesa,

122 Conforme já exposto, os perfis ideológicos dos congressistas não serão avaliados individualmente

pela tese.

123 Importante ressaltar que o objetivo, na análise dessa variável, não é a obtenção de dados acerca

da ideologia de cada Representante ou Senador, mas o estabelecimento de uma média para cada Casa, pois, como não serão realizados estudos aprofundados sobre a personalidade de cada membro do Legislativo, da mesma forma mensurar sua ideologia pessoal não trará resultados que possam alterar as conclusões da tese. O objeto do estudo não é a relação entre votos e ideologia, mas a relação entre o Congresso e Executivo. Para tanto, a compreensão sobre quão conservadora ou liberal era cada Casa específica do Congresso e como isso afetou a votação desse órgão acerca do orçamento de defesa será o objetivo da mensuração dessa variável.

principalmente quando outras variáveis estruturais e domésticas contribuem para o sucesso de suas argumentações, é uma força fundamental na análise do orçamento de defesa dos EUA.

A partir dessas três variáveis (personalidade, popularidade e ideologia), poderá ser traçado um desenho das características dos principais indivíduos que participaram do processo e, a partir daí, obter-se-á mais uma contribuição importante para a compreensão dos investimentos em defesa dos EUA. A tendência, em uma cenário com um Presidente popular e com personalidade ativa e positiva, é de prevalência de seus interesses, que vão depender, em grande medida, de sua ideologia. Ao contrário, um Presidente impopular e com personalidade passiva e negativa tende a ser dominado pelo Congresso, que decidirá de acordo com sua ideologia ou seus interesses circunstanciais. As duas primeiras variáveis, portanto, se relacionam com a distribuição de poder entre os órgãos governamentais. A terceira se refere à inclinação dos votos.

A análise do nível de agência1, porém, pouco acrescenta se os outros níveis de agência forem deixados de lado.

3.3. O CONCEITO DE AGÊNCIA2 E SUA RELAÇÃO COM O PARTIDO