• Nenhum resultado encontrado

II Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico, de 1975 a

Capítulo 3. Análise da trajetória da política industrial no Brasil

3.3. As políticas industriais no período de 1964 a

3.3.6. II Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico, de 1975 a

O II PND94 dá seguimento às estratégias definidas no âmbito do I PND. Todavia, tendo em vista o agravamento da crise econômica decorrente do primeiro choque do petróleo, o II PND se configura como uma resposta aos novos gargalos para o desenvolvimento brasileiro. Alguns desses gargalos focados pelo II PND são: a escassez de bens de capital (especialmente nos segmentos de siderurgia e química fina); o déficit na

93

Conforme previsto no Decreto-Lei 1.182, de 16 de julho de 1971, o Estado concede estímulos às fusões, às incorporações e à abertura de capital de empresas, com a isenção do imposto de renda incidente sobre o acrescimento de valor. Para beneficiar também ao setor privado, o prazo do regime especial de que trata o Decreto-Lei 1.182/ 71 é prorrogado até 31 de dezembro de 1974, por meio dos Decretos-Lei 1.253/71 e 1.300/73.

94

180

geração de energia; o desabastecimento95 de petróleo em âmbito global; os desafios de integração logística do País; e a necessidade de incrementar a produção de matérias-primas e suas exportações, para equilibrar o balanço comercial.

Diante do exposto, o II PND herda um histórico96 de acelerado crescimento econômico interrompido por uma grave crise econômica internacional. Para enfrentar a desaceleração da economia e a eminente crise produtiva no País, o II PND define uma estratégia de expansão do consumo interno e de imposição de barreiras ao comércio exterior, fechando gradativamente o mercado nacional. Essa nova estratégia se sustenta em dois pilares centrais: i) incentivar um novo padrão de industrialização, fundamentado na reaproximação entre o Estado e o empresariado industrial brasileiro; e ii) corrigir os desbalanceamentos da organização industrial, mediante o fortalecimento do capital privado nacional. Dito de outra forma, à medida que a crise econômica internacional se agrava, o Estado se aproxima dos setores produtivos nacionais.

Com base nessa estratégia, o Estado direciona seus investimentos para novos setores da indústria de bens de capital, de eletrônicos pesados, de química fina e de farmacoquímicos, além de outros bens de consumo duráveis em que ainda carece uma efetiva substituição de importações. Convém destacar que, assim como na terceira onda de industrialização, o II PND está estruturado a partir dos polos industriais e das cadeias produtivas, a exemplo dos complexos petroquímico, eletroeletrônico, automotivo e aeronáutico. Ainda nesse contexto, o II PND oportuniza o estabelecimento de diversas novas alianças com associações setoriais de âmbito nacional, o que corrobora a tendência de pulverização da representatividade do segmento industrial no processo de formulação e execução da política industrial. Entretanto, a despeito do desconforto gerado junto às lideranças políticas do empresariado industrial, essa nova estratégia traz um novo fôlego à terceira onda de substituição de importações. Já no que se refere ao investimento em infraestrutura econômica, o II PND direciona os incentivos estatais para a ampliação a capacidade de produção energética e de combustíveis.

95

Na década de 1970 a procura internacional por petróleo excede a produção. Pressionada pela demanda internacional e oportunizada pela ocupação dos territórios palestinos por Israel, em 1973 a OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) quadruplica o preço do barril de petróleo, o que resulta na recessão da economia mundial e no desequilíbrio econômico de diversos países centrais e periféricos, inclusive o Brasil.

96

Conforme dados do II PND (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 1975), entre 1968 e 1973, período do MEBAG e do I PND, o produto industrial aumenta em 86% e as exportações de manufaturados, de minérios e de produtos agrícolas não tradicionais crescem em 380%, dinamizando a produção industrial no Brasil.

181

No que tange as estratégias horizontais da política industrial, estão compreendidas “a expansão do financiamento de longo prazo, a adaptação do sistema fiscal, a prioridade nas compras de órgãos e empresas de Governo e a ajuda especial para a participação nos

projetos de maior importância do setor público” (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA,

1974, p. 38). Ou seja, é dado continuidade à disponibilização de fundos de investimento para os empreendimentos privados, por meio do BNDE e outros bancos oficiais.

Ainda nesse contexto de financiamento da atividade industrial, novos instrumentos são concebidos. Primeiramente, os mecanismos de financiamento estatal orientados para atender investimentos em centros estatais de pesquisa, a exemplo da Embrapa, Petroquisa, e outras empresas públicas. A expectativa é aumentar o investimento em ações de desenvolvimento científico e tecnológico, assim como em pesquisas industriais em geral. Um segundo instrumento é direcionado para ações de apoio às pequenas e médias empresas, associadas aos complexos industriais priorizados pelo Plano. Um terceiro instrumento remete à extensão dos mecanismos de fusão e incorporações de empresas, com estímulos financeiros do Estado, principalmente nos segmentos produtivos em que o excesso de indústrias fragiliza a competição do capital nacional perante o concorrente estrangeiro. Por fim, o quarto instrumento são as ações voltadas para o adensamento de cadeias produtivas, com ênfase no atendimento de polos industriais já estruturados no País. Por meio desses novos mecanismos de financiamento, o Estado objetiva criar condições para que as empresas nacionais alcancem condições para competir internacionalmente e, assim, corrigir das distorções do balanço comercial. Ainda acerca dessa questão, Bresser-Pereira (1978) argumenta que, ao longo de todo o período militar, a acumulação privada de capital é amplamente apoiada pelo Estado. Essa acumulação é favorecida por meio da facilitação no acesso ao crédito, ou ainda das iniciativas de participação acionária do Estado em empreendimentos privados, como forma de fortalecer a competitividade da indústria brasileira.

O setor produtivo estatal responsabilizou-se pelos setores infraestruturais - pelo transporte, pelas comunicações, pela siderúrgica e pelo petróleo. Os setores privados nacionais e estrangeiros assumiram a indústria de transformação. Alguns setores, como o da petroquímica, o da mineração e o financeiro apresentaram certa concorrência. Mas mesmo aí a associação ou a complementaridade foram mais características do que a competição. (BRESSER-PEREIRA, 1978, p. 205).

182

Por fim, outra importante característica do II PND diz respeito ao desenvolvimento regional e à distribuição de renda. Embora não estejam diretamente relacionadas à política industrial, essas duas estratégias impactam na dinamização do mercado interno e, consequentemente, na expansão da atividade industrial. Essa estratégia viabiliza a consolidação de complexos industriais de caráter regional e também a formação de novas cadeias produtivas nas regiões nordeste, norte e centro-oeste, evitando assim a concentração da atividade industrial nos estados do sudeste e sul do País.

A despeito da instalação de grandes e complexos parques industriais no País, como resultado desse fechamento para o mercado internacional e da consequente defasagem tecnológica da indústria brasileira, o País se mantém em uma posição periférica e de desenvolvimento tecnológico dependente no contexto da divisão internacional do trabalho. Com exceção dos segmentos automobilístico, siderúrgico, extração mineral e agroindustrial, que registram os maiores índices de expansão produtiva e inclusive de exportação nesse período, os demais segmentos industriais não apresentam um desempenho satisfatórios e puxam os resultados da economia do País para baixo. Dito de outra forma, à medida que a capacidade de produção do País cresce e se sofistica, o intercâmbio tecnológico internacional e o comércio exterior configuram-se como instrumentos indispensáveis para o contínuo aprimoramento da indústria nacional. Sem essa abertura para o mercado internacional, somado à dependência de incentivos estatais para alavancar investimentos privados no País, o ciclo econômico iniciado pela terceira onda de substituição de importações alcança seu limite.

Preocupadas com a tendência de queda da economia brasileira e almejando obter um maior protagonismo na formulação da política industrial, em 1977 os setores produtivos realizam a IV CONCLAP, no Rio de Janeiro. Assim como nas conferências anteriores, a IV CONCLAP97 analisa os problemas afetos aos setores produtivos e, sob uma perspectiva integrada das questões estruturais do País, sugere estratégias para dar seguimento ao desenvolvimento brasileiro. Tendo como tema central a empresa privada e o processo de desenvolvimento econômico, a conferência discute amplamente as relações

97

Originalmente a IV CONCLAP é estrutura em torno de 11 comissões técnicas, a saber: 1) a função social da empresa, 2) A empresa e o Estado, 3) A pequena e média empresa, 4) O setor externo e as políticas de desenvolvimento, 5) O financiamento do desenvolvimento, 6) O mercado interno e seus desequilíbrios regionais e setoriais, 7) A infraestrutura, 8) Política industrial, 9) Agricultura, 10) Comércio e 11) Setor financeiro. Adicionalmente, ao longo da conferência, é formada uma comissão especial sobre “Turismo”, setor econômico que ocupa cada vez uma posição de maior relevância junto à agenda do Estado.

183

entre os setores produtivos e o Estado, na tentativa de evitar um rompimento dessa aliança, frente ao agravamento da crise econômica internacional e seus impactos no Brasil.

O tom adotado pelos setores produtivos98 clama por uma limitação da presença do Estado na economia e por uma maior participação nas decisões estratégicas acerca das prioridades nacionais. Apesar de revelar uma crescente insatisfação do setor industrial com relação à elevada intervenção do Estado na economia, a IV CONCLAP também aponta para uma estratégia de cooperação entre empresários e Estado. Nesse sentido, a argumentação defendida pelo empresariado industrial é que a iniciativa privada deve ser fortalecida em segmentos da indústria de base, de transformação, de bens de consumo e de capital; já o Estado deve permanecer com atribuições de desenvolver a infraestrutura econômica do País, consideradas questões indispensáveis para o crescimento e a sustentabilidade das iniciativas do setor privado.

Ainda que em determinada fase do desenvolvimento brasileiro tivesse sido possível aceitar uma estratégia que atribuiu ao Estado papel preponderante na condução desse processo, a verdade é que a própria dinâmica dos eventos gerou condições para a hipertrofia da ação estatal, que ganhou impulso próprio na sua atuação direta, e deu origem a novas e complexas formas de intervenção indireta, que passaram a descaracterizar e inibir a atividade empresarial privada. (Carta do Rio de Janeiro, de 4 de novembro de 1977).

Todavia, com o impacto do segundo choque da crise do petróleo, a economia brasileira apresenta seus primeiros sinais de recessão e, como consequência, o rompimento da aliança público-privada se mostra cada vez mais inevitável. Conforme analisado por Bresser-Pereira (1978) e Schneider (1994), a crise que se configura ao final do II PND decorre do caráter cíclico da intervenção do Estado na economia, que após seis anos de grande prosperidade entra em fase de recessão. Com a queda dos lucros e a perda da confiança na capacidade do Estado, a terceira onda de industrialização chega ao seu ponto de esgotamento. Essa situação oportuniza uma crescente insatisfação do segmento industrial brasileiro99, inclusive daqueles grupos empresariais que haviam se aliado ao

98

A Carta do Rio de Janeiro foi publicada pelo Jornal da Associação Comercial do Rio de Janeiro, Ano XXXIX, número 121, de novembro de 1977, p. 4 a 12, conforme acesso em 09/07/2016, por meio do link http://docvirt.com/docreader.net/DocReader.aspx?bib=acrjrevistas&pagfis=28030&pesq=

99

Conforme análise de Bresser-Pereira, “A crise política se agrava quando o excedente econômico, ou seja, a produção acima do consumo necessário, começa a reduzir-se relativamente. Quando a taxa de crescimento do produto cai de 10% para 5%. Nesse momento, a luta política pela divisão do excedente, ao nível das classes e grupos dominantes, torna-se acirrada. A crise política pode tomar proporções muito maiores do que a desaceleração econômica.” (1978, p. 149).

184

Estado de forma isolada e setorialmente, que passa a questionar as decisões tomadas para a condução da política econômica e industrial no País.

3.3.7. III Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico, de 1980 a 1985