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O Plano Especial de Obras Públicas e Aparelhamento da Defesa Nacional, de 1939 a

Capítulo 3. Análise da trajetória da política industrial no Brasil

3.2. As políticas industriais formuladas no período de 1938 a

3.2.2. O Plano Especial de Obras Públicas e Aparelhamento da Defesa Nacional, de 1939 a

O Plano Especial69 constitui o primeiro esforço estatal de planejamento sistemático da atividade industrial em direção ao desenvolvimento, deixando em segundo plano as iniciativas direcionadas para a agricultura e a proteção do mercado cafeeiro (TARAPANOFF, 1992). Com vigência de 1939 a 1944, o Plano atribui ao Estado a responsabilidade de promover a criação de indústrias de base, tais como a siderurgia e a mineração, além da execução de obras públicas de transporte, telecomunicação, energia e outros segmentos considerados estratégicos para o progresso econômico e a defesa do País. A despeito de ser um marco inicial do planejamento no Brasil e inclusive de sua relevância para o setor industrial brasileiro70, o plano não é percebido como uma política industrial (COSTA, 1971; TARAPANOFF, 1992; SUZIGAN, 1996; SUZIGAN; FURTADO, 2006).

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Instituído pelo Decreto-Lei 1.058, de 19 de janeiro de 1939.

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A destinação orçamentária do Plano Especial sustenta essa argumentação de que o plano não se configura como uma política industrial, muito embora tenha sido um importante marco para uma incipiente aliança entre o Estado e o setor privado industrial atuantes nos segmentos da siderurgia, transportes, comunicações e extração mineral. Do total do orçamento, 43,33% foi alocado para o Ministério da Fazenda, 21,25% para o

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Para Kira Tarapanoff (1992), a relevância do Plano Especial reside na provocação de um processo de planejamento para o Estado brasileiro. Ainda que o referido plano se caracterize mais como um planejamento orçamentário, do que de fato uma política de desenvolvimento para a indústria, ele representa um esforço inicial de sistematizar e institucionalizar o planejamento junto às instituições estatais, em parceria com a iniciativa privada e o capital estrangeiro. De acordo com Wilson Suzigan (1996), as características principais da política industrial são um planejamento detalhado das ações, com metas e diretrizes claramente definidas, chegando à definição de uma organização institucional com responsabilidade de sua execução e monitoramento dos resultados alcançados.

Jorge Gustavo da Costa (1971) revela que a documentação administrativa não aponta para fundamentos estruturantes dessa primeira experiência brasileira de planejamento quinquenal. Para o autor, o Plano Especial resulta de uma preocupação do Estado sobre o aproveitamento das riquezas minerais disponíveis no País, a urgência de uma solução para os problemas de expansão da produção industrial impulsionada pela segunda onda de substituição de importações, e a necessidade de não dispersar os escassos investimentos do setor público e do privado. Nesse sentido, o Plano é um exercício inicial de coordenação das diversas iniciativas em torno de um plano geral e único para o desenvolvimento nacional. Conforme discurso de Getúlio Vargas destacado pelo autor, “o momento não comporta dispersão de energias. Assim, tudo o que não entrar nos objetivos imediatos dos planos do governo é secundário e adiável.” (COSTA, 1971, p. 56).

Como parte desse esforço de planejamento estatal, um dos segmentos industriais priorizados pelo governo de Getúlio Vargas é o siderúrgico, em especial as fábricas de aço, alumínio e cobre, e secundariamente o segmento de extração mineral, ambos voltados para a exportação (TARAPANOFF, 1992). Esse esforço é articulado com o setor industrial privado, por meio da figura de Roberto Simonsen, e também se beneficia de uma parceria com o capital estrangeiro, por meio de um financiamento acordado com os Estados Unidos através do Export-Import Bank. Logo, as principais indústrias que se beneficiam diretamente do Plano Especial são a Companhia Siderúrgica Nacional e a Companhia Vale do Rio Doce, no contexto das indústrias de base. Como consequência desse acordo com os

Ministério de Viação e Obras Públicas, 16,69% para a defesa nacional, 6,2% para a siderurgia, 2,7% para o Conselho Nacional de Petróleo, sendo o restante destinado para os setores agrícola, da saúde e educação, e para o Ministério da Justiça e Interior. (COSTA, 1971, p. 66).

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EUA, o Brasil recebe duas missões técnicas, a Missão Taub e a Missão Cooke, que dão início a uma análise das condições estruturais do desenvolvimento brasileiro e organizam um conjunto de orientações para o incentivo estatal em outros segmentos produtivos da indústria, a exemplo da indústria de motores e equipamentos, bem como da construção de pequenas usinas hidrelétricas.

Já no que se refere aos investimentos em infraestrutura econômica, as ferrovias de Corumbá-Santa Cruz de La Sierra e a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil são as principais beneficiárias do Plano Especial, além de outras redes ferroviárias já estabelecidas, as quais são beneficiadas com um orçamento complementar. Diversas rodovias são pavimentadas, a exemplo da Presidente Dutra, da Via Anchieta, da Castelo Branco, da Fernão Dias e da Washington Luiz, além da expansão nas ações de dragagem de vários portos e da construção de aeroportos no Brasil. Esse impulso no segmento de transportes e de usinas de energia elétrica resulta no rápido crescimento das indústrias da construção civil no Brasil, tais como a Andrade e Gutierrez, a Mendes e Júnior, a Camargo Correia e a Odebrecht, além de beneficiar indiretamente a expansão produtiva das indústrias siderúrgicas e de materiais de construção, como a Votorantim, a Belgo-Mineira, a Gerdau e a própria CSN.

No total, 159 empreendimentos são realizados sob a égide do Plano Especial, muitos deles por meio de alianças e contratos de concessões estabelecidos com o setor privado, nas diversas áreas de investimento definidas pelo Estado. Constata-se, portanto, que o setor privado assume um papel protagonista no desenvolvimento da indústria brasileira, cabendo ao Estado um papel auxiliar no processo de industrialização, principalmente na articulação dos diversos investimentos em torno de um plano nacional e na definição de incentivos para os setores produtivos considerados prioritários. Assim sendo, o Plano Especial viabiliza uma gradativa aproximação entre o setor privado industrial e o Estado, no momento em que o setor agroexportador ainda exerce grande influência política e econômica junto à burocracia estatal. Desse modo, aos poucos o pensamento desenvolvimentista conquista espaço político e induz à formulação de um novo plano para a expansão da produção industrial.

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