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Capítulo 3. Análise da trajetória da política industrial no Brasil

3.2. As políticas industriais formuladas no período de 1938 a

3.2.5. O Plano SALTE, de 1950 a

O Plano SALTE75 (Saúde, Alimentação, Transportes e Energia) concretiza esse novo posicionamento do Estado como ator estratégico na formulação de projetos de desenvolvimento nacional. Sua formatação combina características de uma política industrial, com uma política de investimento em infraestrutura econômica, e prevê a participação da iniciativa privada nacional e do capital estrangeiro, de modo a viabilizar os investimentos de capital requerido, como também apropriar-se das competências técnicas e tecnológicas necessárias para o êxito dessas iniciativas.

Apoiando-se nas recomendações apontadas pela Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, o Plano tem suas ações direcionadas para enfrentar alguns dos gargalos identificados para o crescimento da economia do País. Nesse sentido, o Plano prioriza investimentos estatais para a expansão da rede de transportes, o aumento no fornecimento de energia elétrica, e a produção de outras fontes de combustível, como o petróleo. Nesses casos, o protagonismo empresarial é exercido pelo Estado, que assume de modo

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centralizado a execução das atividades previstas no Plano. Todavia, à medida que os resultados se mostram insuficientes, tendo em vista a limitação da capacidade operacional do próprio Estado, a gestão do Plano é alterada para um modelo de concessão para as obras de infraestrutura econômica.

No que diz respeito ao setor de transportes, o Plano abrange as ferrovias, rodovias, portos e aeroportos. As ferrovias do trecho que conecta os estados do sul à região sudeste são concluídas, e diversas obras no nordeste ficam em vias de conclusão. Outras ferrovias já existentes são melhoradas, a exemplo da Estrada de Ferro Central do Brasil, do Noroeste do Brasil, a Viação Férrea do Rio Grande do Sul, além das linhas Cearense e do Leste Brasileiro, ferrovias essas que viriam a constituir a Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA). Já as rodovias beneficiárias do Plano são a Juiz de Fora até Belo Horizonte, Curitiba a Porto Alegre, Belo Horizonte a Vitória e a Transbrasiliana. Os portos são os meios de transporte com menor índice de execução pelo Plano, sendo executadas obras no Porto de Vitória, além dos portos próximos aos nascentes polos industriais de São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina, e do Serviço de Navegação da Amazônia e Administração do Porto do Pará (SNAAPP). Os aeroportos do Galeão, Campina Grande e Porto Alegre são construídos nesse período, além das melhorias no serviço de navegação por meio do aparelhamento da frota marítima.

No segmento de energia, a prioridade está na geração de energia hidrelétrica, muito embora o carvão ainda seja uma fonte utilizada no País. Logo, os investimentos estatais são prioritariamente direcionados para a Companhia Hidrelétrica do São Francisco e outras usinas menores no Amazonas, Ceará, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso, Maranhão, Piauí e Pará, que são executadas em parceria com a iniciativa privada. Paralelamente é criada a Comissão Executiva do Plano do Carvão Nacional para executar a construção e o equipamento de usinas termoelétricas a base de carvão, bem como melhor orientar a progressiva eletrificação das vias férreas. Já no que tange o segmento de petróleo, é criada a Petrobrás, com o objetivo de realizar pesquisas, perfurações e construção de refinarias. Como muitas dessas obras do setor de transportes e energia são investimentos de longo prazo algumas ações são continuadas até 1959, ficando conhecido como liquidação do Plano SALTE.

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Ainda no contexto do Plano SALTE, cabe destacar a criação de duas instituições. Primeiramente, em 1951 é criado o Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), que dá início à estruturação de uma proposta de formação técnico-científica no País. Em segundo lugar, em 1952, é criado o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), cuja atribuição está diretamente relacionada ao financiamento e à gestão desse conjunto de obras empreendidas pelo Estado. Essas iniciativas do Plano SALTE contam com o apoio do segmento industrial, conforme evidenciado no discurso de Euvaldo Lodi, que não apenas reconhece a importância dos investimentos em infraestrutura econômica, mas aponta para a urgência de superar tais gargalos.

Creio que o progresso industrial do país teria alcançado índices incomparáveis, quer no presente, quer no passado da evolução manufatureira dos mais adiantados países industriais, tivesse contado a indústria com suprimento abundante de serviços essenciais, como energia, transporte e tecnologia. Com efeito, mesmo com as carências alarmantes de serviços básicos de que sofre a economia brasileira, no decênio que vai de 1939 a 1949, nenhum país logrou, em termos relativos, crescimento industrial tão rápido quanto o Brasil. É objetivo imediato de uma política nacional de desenvolvimento econômico eliminar os pontos de estrangulamento que entorpecem a atividade produtiva.76

A partir do Plano SALTE fica evidenciado o papel planejador e executor exercido pelo Estado. Por vezes é estabelecida uma parceria com o setor industrial nacional ou ainda o capital estrangeiro, para auxiliar na implementação das atividades planejadas. Porém, a partir de 1950, é crescente o número de estatais criadas para atuar no setor produtivo, em especial como provedor de serviços industriais de utilidade pública nos setores de energia, saneamento e transportes. Conforme colocado por Costa (1971), nos setores de transporte e energia o planejamento fica restrito aos órgãos governamentais, o que confirma esse perfil impositivo exercido pelo Estado na definição das metas e estratégias para o investimento em infraestrutura. De modo similar, Suzigan (1996) classifica o Plano SALTE como um projeto de investimento em infraestrutura econômica e social, tendo em vista sua preocupação também com a área de educação e saúde.

Essa atuação do Estado como ator estratégico no processo de industrialização é reforçada pela criação a Comissão de Desenvolvimento Industrial (CDI), com o objetivo de analisar o contexto econômico e propor o estabelecimento de novas indústrias no País, de modo a desenvolver o mercado interno. Sob a liderança do Ministério da Fazenda, a

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Discurso de Euvaldo Lodi, em 05 de novembro de 1952, na ocasião de sua posse após a reeleição para presidência da CNI.

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CDI é estrutura em torno de comissões executivas setoriais e, em 1954, propõe um Plano Geral de Industrialização para o Brasil, indicando segmentos considerados prioritários para atuação conjunta do Estado e do setor privado. Dentre esses segmentos são destacados o de energia, metalurgia, transformação mineral, química, têxtil, borracha e material de construção. Assim sendo, ademais de reforçar o protagonismo do Estado na aliança público-privada, consolidado pelo Plano SALTE, a CDI aproxima o empresariado industrial dos processos decisórios da política industrial, ainda que de modo segmentado e com pouca articulação entre as diversas estratégias setoriais. Essas proposições setoriais se somam às recomendações da Comissão Mista, levando à formulação do Programa de Metas.