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Impedimento e suspensão da prescrição

No documento LIVRO PROPRIETARIO direito civil i (páginas 191-195)

Prescrição e decadência

10.2.10. Impedimento e suspensão da prescrição

Em algumas situações específicas o ordenamento jurídico determi- na que o prazo de prescrição não corre em razão da situação ou condi- ção em que se encontra o titular do direito violado (situação pessoal, profissional, familiar etc.). Os arts. 197, 198 e 199 do Código Civil de 2002 retratam causas que podem ser tanto de impedimento como de suspensão. Se a causa já existia quando do surgimento da pretensão, a hi- pótese é de IMPEDIMENTO e o prazo de prescrição começará a correr quando esta desaparecer. Se a causa só veio a existir depois do surgimen- to da pretensão, a hipótese é de SUSPENSÃO e o prazo voltará a correr quando esta desaparecer.

Exemplificando: o art. 197, I, do Código Civil, determina que a prescrição não corre entre os cônjuges na constância da sociedade con- jugal. Assim, se um cônjuge causar dano ao outro durante o casamento, o prazo de prescrição ficará impedido de correr; dissolvida a sociedade conjugal, o prazo começará a correr do zero. Por outro lado, se o dano foi causado antes do casamento, celebrado este, o prazo será imediatamente suspenso; dissolvida a sociedade conjugal, o prazo voltará a correr pelo período restante.

10.2.10.1. Hipóteses de impedimento e

suspensão

O Código Civil de 2002 agrupou as hipóteses de impedimento e suspensão em três artigos, cada qual com três incisos. Por representarem exceções à contagem do prazo de prescrição, devem ser interpretadas restritivamente, compreendendo a doutrina majoritária que o rol dos arts. 197, 198 e 199 do Código Civil é taxativo (recomendamos que essa posição seja gabaritada em fase objetiva). Contudo, concordamos com forte corrente doutrinária que sustenta que o rol pode ser ampliado pela regra contra non valentem agere non currit praescriptios: a prescrição não corre contra quem estiver impossibilitado de agir. A taxatividade do rol impede a analogia, não a interpretação extensiva. Como exemplo dessas situações, podemos citar: a paralisação da justiça por caso fortuito ou força maior, a ocultação dolosa do débito pelo devedor, pedido de paga- mento de indenização à seguradora (Súmula 229/STJ) etc.

Vejamos, agora, quais são as hipóteses de impedimento e suspensão da prescrição que estão previstas no Código Civil de 2002:

a) Entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal (art. 197, I – impedimento e suspensão): a hipótese se justifi ca pela necessidade de se proteger a convivência harmônica entre os cônjuges durante o casamento, evitando que sejam propostas ações entre eles. Deve ser destacado que o Código Civil de 2002 substitui a expressão matrimônio, presente no Código Civil de 1916, por sociedade conjugal, uma vez que somente durante a existência desta é que persiste a comunhão plena de vida (afe- to e patrimônio). Dissolvida a sociedade conjugal pela separa- ção, divórcio, viuvez etc., o prazo começará ou voltará a correr. Quanto à separação de fato, entendemos que esta deve ser equi- parada à separação judicial em seus efeitos, permitindo que a prescrição corra. Em caso de anulação ou decretação de nuli- dade do casamento, o cônjuge de boa-fé deve ser considerado protegido até o fi m da sociedade conjugal; quanto ao de má- -fé, não haverá suspensão nem interrupção do prazo. A questão mais polêmica diz respeito à aplicação analógica do dispositivo à união estável:

1ª Corrente: defende que o dispositivo deve ser aplicado por analogia. Compreendemos que essa é a posição mais coeren- te em razão da obrigação constitucional que o Estado tem de proteger a família, formada seja pelo casamento, seja pela união estável (Constituição Federal, art. 226). Esse também é o posicionamento do Conselho da Justiça Federal, nos termos do Enunciado 296: “Não corre a prescrição entre os companheiros, na constância da união estável”.

2ª Corrente: defende que não há impedimento ou suspensão do prazo de prescrição na constância da união estável em razão da omissão legislativa. Em fase objetiva de concursos públicos que sigam a literalidade da lei, recomendamos que

Súmula 229- STJ:

“O pedido do pagamento de indenização à seguradora sus- pende o prazo de prescrição até que o segurado tenha ciência da decisão”.

essa posição seja gabaritada. Já em fase subjetiva deve ser ga- baritada a primeira corrente.

b) Entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar (art. 197, II – impedimento e suspensão): assim como o dis- positivo anterior, o objetivo da norma é a proteção da unida- de familiar formada pelos pais e filhos, evitando o litígio entre eles durante o exercício do poder familiar (antigo pátrio po- der). Cessado o poder familiar, por meio da maioridade ou da emancipação, o prazo voltará ou começará a correr. Há quem entenda que o dispositivo retrata unicamente causa de impe- dimento, mas compreendemos que também pode servir como causa de suspensão, por exemplo, se o poder familiar foi estabe- lecido posteriormente à violação do direito, mediante adoção. Cessado o poder familiar (por meio da maioridade, morte ou destituição), o prazo de prescrição começará ou voltará a cor- rer. Se em vez da destituição (que é definitiva) ocorrer simples suspensão do poder familiar (que é temporária), o prazo de prescrição não correrá.

c) Entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores durante a tutela ou curatela (art. 197, III – impedimento/sus- pensão): também sob o fundamento de preservação da convi- vência harmônica entre determinadas pessoas, o ordenamento jurídico impede o transcurso da prescrição entre tutores e tute- lados e entre curadores e curatelados. Se houver a remoção do tutor ou curador, mas permanecer a tutela ou curatela, o prazo de prescrição poderá correr entre o incapaz e o tutor/curador removido. No entanto, em se tratando de absolutamente inca- paz, deve ser observada a regra do art. 198, I do Código Civil. d) Contra os incapazes de que trata o art. 3º (art. 198, I – impedi-

mento/suspensão): de acordo com o dispositivo, não corre pra- zo de prescrição contra os absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I – os menores de 16 anos; II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; e III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. O prazo só não corre contra o absolutamente incapaz, isto é, quando este é o titular do direito violado (o incapaz é o autor da ação). Se, por outro lado, o absolutamente incapaz for o violador do direito de outrem, o prazo de prescrição fluirá normalmente a favor dele, que será beneficiado pela inércia do titular do direito (o incapaz é o réu da ação). Devemos destacar que a hipótese do art. 198, I, do Código Civil, refere-se apenas aos absolutamente incapazes. Em se tratando de incapacidade relativa (art. 4º), o prazo flui normalmente consoante determi- nação do art. 195.

e) Contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios (art. 198, II – impedimento/sus-

pensão): como a norma não especifi ca o tipo de serviço públi- co, a doutrina tem admitido sua aplicabilidade para proteger toda pessoa que preste, fora do País, serviços de utilidade para a União, Estados ou Municípios: agentes diplomáticos; agentes consulares; adidos militares; delegados em missões ofi ciais; co- missionados para estudos ou pesquisas no exterior etc. Não se exige que sejam servidores públicos em sentido estrito, basta que exerçam atividade assim qualifi cada, a favor da administra- ção direta ou indireta.

Outros ausentes: embora não exista dispositivo legal regulan- do o impedimento e a suspensão da prescrição em favor dos ausentes (pessoas que desaparecem de seu domicílio sem deixar notícias – Código Civil, arts. 22 a 39), há enunciado do Conse- lho da Justiça Federal no sentido de que “desde o termo inicial do desaparecimento, declarado em sentença, não corre a pres- crição contra o ausente” (Enunciado 156/CJF).

f) Contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra (art. 198, III – impedimento/suspensão): a norma deve ser interpretada de forma a proteger as pessoas que compõem as Forças Armadas durante períodos de guerra, es- tejam cumprindo função dentro ou fora do País. Protege, tam- bém, os membros das Forças Armadas que integram as forças de paz da ONU.

Observação: todos os incisos dos arts. 197 e 198 do Código Civil (acima analisados) retratam hipóteses subjetivas de suspensão E impedimento da prescrição. Diversamente, todos os incisos do art. 199 do Código Civil (abaixo analisados) representam hipóteses objetivas de suspensão OU impedimento da prescri- ção.

g) Pendendo condição suspensiva (art. 199, I – causa impediti- va): a regra é explicada pela natureza da condição suspensiva: suspende o exercício e a aquisição do direito, gerando mera ex- pectativa de direito. Como o direito condicional não é exerci- tável, não há falar em prazo de prescrição para o exercício do direito em juízo.

Súmula 229 do STJ: “pedido de pagamento de indenização à seguradora suspende o prazo de prescrição até que o segurado tenha ciência da decisão”.

h) Não estando vencido o prazo (art. 199, II – causa impeditiva): as mesmas razões invocadas para justifi car o dispositivo ante- rior se aplicam a essa hipótese, pois o direito submetido a um prazo, embora integre o patrimônio do seu titular (direito ad- quirido), não é exercitável antes do implemento do termo certo (evento futuro e certo).

i) Pendendo ação de evicção (art. 199, III – causa impeditiva): denomina-se ação de evicção aquela que pode resultar na con-

denação de uma pessoa à perda de um bem com base em mo- tivo jurídico anterior à sua aquisição (p. ex.: a ação pauliana). Procedente a ação, o evictor toma o bem do evicto, restando a este ingressar com ação de regresso contra o alienante. O pra- zo para ser proposta essa ação só começa a correr a partir do trânsito em julgado da ação de evicção, pois é a partir desse momento que surge a pretensão ressarcitória do evicto em face do alienante.

j) Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, antes da respectiva sentença definitiva (art. 200 – causa suspensiva): embora a responsabilidade civil tenha certa independência da responsabilidade criminal (vide art. 935 do Código Civil), o legislador determinou que a prescrição para ser exercida pretensão civil não deve correr enquanto não exis- tir sentença penal com trânsito em julgado. Entendemos que a hipótese não é de impedimento, mas, sim, de suspensão da prescrição a partir do início da ação penal (recebimento da de- núncia ou da queixa) até o advento da sentença definitiva, seja condenatória ou absolutória.

10.2.10.2. A relação entre a suspensão da

prescrição e as obrigações solidárias

De acordo com o art. 201 do Código Civil, suspensa a prescrição a favor de um dos credores solidários, só aproveitam os outros se a obri- gação for indivisível. Isto ocorre, pois a suspensão e o impedimento es- tão fundamentados em uma situação pessoal (p. ex.: o absolutamente incapaz, o casado, o tutelado etc.), não havendo motivo para se estender a exceção aos outros credores. A única exceção é a hipótese em que a obrigação solidária tem por conteúdo uma prestação indivisível: é im- possível separar a parte não prescrita da prescrita.

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