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4.2 Indícios de mudanças

4.2.4 Indícios de mudanças nas práticas de sala de aula

Além dos números e das operações fundamentais, conteúdos que a literatura de formação de professor que ensina matemática aponta que são enfatizados nos cursos de formação, as alunas-professoras apresentaram outras áreas da matemática como a geometria e também o trabalho com alguns aspectos da estatística, como a construção de tabelas e gráficos. Percebemos que esse trabalho com a estatística ainda é discreto e, por vezes, superficial, mas compreendemos ser um passo a mais no caminho para romper com o enfoque apenas nos números e na aritmética.

As outras áreas da matemática surgiram tanto nas regências do estágio como nas práticas de sala de aula relatadas pelas alunas-professoras e podemos perceber a ampliação da base de conhecimento para o ensino e o processo de raciocínio pedagógico, pois

elas tiveram que planejar e elaborar as regências e relataram práticas de sala de aula. Nesse sentido, necessitaram mobilizar seus conhecimentos do conteúdo específico, resgatar o conhecimento pedagógico geral e o conhecimento pedagógico do conteúdo, ao abordar um conteúdo matemático.

As alunas-professoras buscaram alternativas para mudar as práticas engessadas do ensino de matemática, que receberam durante suas vidas escolares, como a resolução de problemas e a socialização das estratégias para resolvê-los, o trabalho com obras de arte como as de Volpi e as de Tarsila do Amaral, com textos como o Governar31 de Carlos Drummond de Andrade, os jogos como o Avançando com o Resto e os materiais manipulativos. Alguns desses dados são discutidos no eixo temático Processos formativos em matemática.

Trazemos alguns excertos sobre a resolução de problemas em que Su destacou, no fórum de discussão sobre o pensamento estocástico, que o ensino das operações deve ser iniciado com situações-problema, quando podem ser mobilizados conhecimentos prévios, articulados com novos, para que se tornem significativos para os estudantes. Dessa forma, os alunos mudam a ideia de que resolver problemas está associada a resolver uma conta, pois

Muitas vezes não conseguimos interpretar o que está nos pedindo e sim associando a matemática simplesmente em fazer contas. Não pensando nas tantas possibilidades que ela [matemática] nos fornece. Por isso, a necessidade de trabalhar desde a Educação Infantil a Estatística, a probabilidade e o combinatório para preparar os educandos a pensar sobre eventos, fatos e fenômenos (Fórum de discussão, LM2 – AIV-1).

31 Os garotos da rua resolveram brincar de governo, escolheram o presidente e pediram-lhe que governasse para o bem de todos.

- Pois não – aceitou Martim. – Daqui por diante vocês farão meus exercícios escolares e eu assino. Clóvis e mais dois de vocês formarão a minha segurança.

Januário será meu Ministro da Fazenda e pagará o meu lanche. - Com que dinheiro? – atalhou Januário.

- Cada um de vocês contribuirá com um cruzeiro por dia para a caixinha do governo. - E que é que nós lucramos com isso? – perguntaram em coro.

- Lucram a certeza de que têm um bom presidente. Eu separo as brigas, distribuo tarefas, trato de igual para igual com os professores. Vocês obedecem, democraticamente.

- Assim não vale. O presidente deve ser nosso servidor, ou pelo menos saber que todos somos iguais a ele. Queremos vantagens.

- Eu sou o presidente e não posso ser igual a vocês, que são presididos. Se exigirem coisas de mim, serão multados e perderão o direito de participar da minha comitiva nas festas. Pensam que ser presidente é moleza? Já estou sentindo como esse cargo é cheio de espinhos.

Nessa perspectiva, Maria Clara e Su destacaram, no texto elaborado na wiki, que as situações, em que os estudantes, realmente, se envolvem para buscar soluções, promovem mais aprendizagens sobre os conceitos trabalhados e, que essa participação consiste em “indagar, dialogar, analisar, levantar hipóteses, propor soluções, expor seus

raciocínios, observar os raciocínios dos outros, compará-los, concluir sobre os mesmos, sintetizar e recontextualizar os conhecimentos construídos” (wiki, LM1 – AIV-3), sendo, portanto, muito mais importante os caminhos percorridos para se chegar aos resultados do que o resultado propriamente dito.

E uma das estratégias, para Kerusca, que auxilia na compreensão da resolução de problemas é “solicitar aos alunos que descrevam os procedimentos de resolução dos

mesmos, ou então falem sobre esse processo, para que o professor conheça o que o aluno está pensando, como está organizando a solução da questão proposta” (Texto individual,

LM1 – AIV-4).

Su, ao discutir as potencialidades da resolução de problemas, explicitou um aspecto interessante no que se refere à matemática reduzida ao cálculo, que Ponte (1992) evidencia como sendo uma das crenças sobre o ensino de matemática. Esse autor aponta que, apesar do cálculo ser importante, não se pode reduzir a matemática a esse aspecto, principalmente com o surgimento das calculadoras e do computador que fazem os cálculos com muito mais agilidade e rapidez.

Assim, no trecho de Su percebemos que ela não tem essa visão e amplia a ideia de que resolver problemas não se reduz a realizar uma conta. Essa afirmação está estreitamente ligada aos casos em que muitos alunos buscam pistas nas situações-problema para identificarem a operação que deve ser realizada, e não se preocupam com todo o contexto. Além disso, a aluna-professora relaciona a resolução de problemas com diferentes conteúdos matemáticos – operações e estatística.

Nesse sentido, Maria Clara e Su destacaram que são mais importantes os caminhos percorridos para se chegar à solução do que o resultado propriamente dito, ou seja, há que se enfatizar os processos, as estratégias utilizadas pelos alunos ao invés do produto final. Assim, o professor pode se dar conta de como eles pensaram para resolver a situação e também verificar alguma incompreensão nesse processo, possibilitando solucioná-la.

Corroborando essa afirmação, Kerusca relatou a importância de os alunos descreverem, na forma escrita ou mesmo oral, as estratégias utilizadas na resolução, permitindo ao professor compreender como eles estão pensando e organizando suas ideias.

A partir do exposto, uma alternativa para romper com essa crença de matemática como cálculo é o trabalho, diferente da maioria apresentada nos livros didáticos, com a resolução de situações-problema, denominadas por Smole e Diniz (2001) como problemas convencionais ou padrão que são aqueles que: contêm frases e parágrafos curtos; oferecem pistas para a operação a ser efetuada; indicam, no enunciado do problema, todos os dados necessários para sua resolução; apresentam uma única solução; oferecem uma solução numérica a partir da aplicação direta de algoritmos.

Assim, o professor precisa propor aos alunos outros tipos de situação em que a solução não é aparente, que requer a busca e a seleção de estratégias e conhecimentos, que instigue o estudante, permitindo que ele crie, reflita e teste diversas hipóteses de solução.

Nesse sentido, Smole e Diniz (2001) apresentam diferentes tipos de situações- problema que podem ser propostas aos alunos: sem solução, com mais de uma solução, com excesso de dados, de lógica, entre outros.