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CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO AOS CONCEITOS DE

1.8 Ivani Catarina Arantes Fazenda

Um dos nomes mais respeitados quando mencionamos a questão da interdisciplinaridade no campo educacional e nas pesquisas dessa natureza em nosso país é Ivani Fazenda. Ela é uma profissional de reconhecimento internacional pela dedicação aos estudos sobre essa área há mais de 30 anos. Convida-nos a refletir sobre a questão da interdisciplinaridade a partir das leituras de diversos livros e artigos que compôs, todos elaborados com grande propriedade e sustentados em estudos e reflexões de autores e práticas interdisciplinares nacionais e internacionais, incluindo o trabalho realizado pelo Gepi (Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares), que coordena.

Com foco mais voltado à prática educativa e ao currículo, a autora oferece dados reflexivos sobre o espaço escolar e, especificamente, sobre a interdisciplinaridade e suas implicações teóricas, metodológicas, legislativas, formativas e pessoais, conduzindo a discussão da interdisciplinaridade no campo educacional para altos patamares de ordem epistemológica e socioeducativa. Segundo Fazenda, Varella e Almeida (2013, p. 22-23), para “[...] além do desenvolvimento de novos saberes, a interdisciplinaridade na educação favorece novas formas de aproximação da realidade social e novas leituras das dimensões socioculturais das comunidades humanas [...]”, o que solicita uma atitude interdisciplinar perante a vida, o ensino e as relações pessoais estabelecidas.

A interdisciplinaridade segundo os referidos autores, compreende o entendimento e a busca pela superação das relações de poder estabelecidas pelo absolutismo científico

e doutrinário, catequizado pelas instituições de ensino, responsável por deformar as mentes e dificultar as possibilidades críticas de inovação. Engloba ainda o questionamento da certeza do nebuloso conhecimento que possuímos enquanto professores ou cientistas, formados por universidades que fundam seus currículos em ilhas de contornos bem delimitados por saberes calcados no positivismo.

Nessa ótica, a interdisciplinaridade surge com a tarefa de propor um redimensionamento das ações a serem traçadas pela integração entre seus atores e seus conhecimentos particularizados, superando o estágio da integração. Dessa forma, direciona-se para a criação de um postulado pedagógico (no caso educacional), que leve em conta a horizontalidade, o respeito e a humildade no estabelecimento relacional dos envolvidos, ainda que por muitos seja considerada utópica.

Essa abordagem reconfigura o pensamento acerca de questões da mais variada ordem que se encontram implicadas na área educacional, como as formativas, as curriculares, as relacionais e as metodológicas, que são transmutadas em um caleidoscópio de possibilidades integrativas do ponto de vista pessoal, profissional, formativo e metodológico, que delineiam um continuum no sentido de um ensino enriquecido pelas múltiplas faces nele envolvidas. Com isso, cede-se espaço para um ensino mais criativo, crítico e humanizado, que transpõe os limites estabelecidos pela linearização do pensamento, conforme Fazenda, Varella e Almeida (2013).

Instaura-se, portanto, uma nova pedagogia, gestada na prática dialógica. Configura-se o estabelecimento da Pedagogia da Comunicação, considerada essencial se quisermos trabalhar interdisciplinarmente, a qual solicita que a integração ceda espaço para atitudes interdisciplinares no ambiente escolar (FAZENDA; VARELLA; ALMEIDA, 2013).

Enquanto à Interdisciplinaridade se atribui uma questão de atitude, de transformação, a Integração se mostra como justaposição. Segundo os autores,

[...] existe uma profunda diferença entre integração e interdisciplinaridade, ou seja, a integração poderia acontecer em aspectos parciais, como: confronto de métodos, teorias-modelo ou conceitos-chave das diferentes disciplinas, ao passo que, delimitando mais rigorosamente o conceito de interdisciplinaridade, conclui-se que esta seria um passo além dessa integração, ou seja, para que haja interdisciplinaridade deve haver uma “sintonia” e uma adesão recíproca, uma mudança de atitude diante de um fato a ser conhecido; enfim, o nível interdisciplinar exigiria uma “transformação”, ao passo que o nível de integrar exigiria apenas uma “acomodação” [...]. (FAZENDA, VARELLA, ALMEIDA, 2013, p. 87).

Nesse caso, a integração se reporta a relações de caráter pluri ou multidisciplinar, configurando uma justaposição das disciplinas, das matérias ou dos conteúdos escolares. Atualmente elas são muito encontradas nos ambientes educacionais do mais iniciante nível de ensino à universidade, reportando a um ajuntamento de conhecimentos mais ou menos inter-relacionados. Frisamos que não se trata de uma atitude, mas de interesses particularizados que se justapõem (FAZENDA; VARELLA; ALMEIDA, 2013).

Para que uma relação interdisciplinar se configure, a interação é condição primordial, o que pressupõe mudança de atitude, reciprocidade e concepção de multiplicidade, de coletividade em substituição à individualidade. A interdisciplinaridade exige uma mudança de atitude, seja do ponto de vista da ciência ou do ensino.

Consideradas as características que definem a interdisciplinaridade, torna-se evidente a urgência de redefinições acerca da formação dos profissionais e dos pesquisadores formados pelas universidades. Na passagem das práticas individuais e solitárias para as dialógicas e compartilhadas, é essencial repensar e otimizar o já instituído e acomodado “[...] como forma de compreender e modificar o mundo, pelo fato da realidade do mundo ser múltipla e não una [...]” (FAZENDA; VARELLA; ALMEIDA, 2013, p. 88).

Para que as barreiras trazidas pela disciplinaridade sejam superadas, conforme os autores acima citados; antes de mais nada, torna-se necessário que as pessoas estejam dispostas a dialogar, mesmo provendo de diferentes áreas de formação. É na relação dialógica que a interação se instala, complementando os conhecimentos disciplinarmente adquiridos, superando formas obsoletas de ação já cristalizadas.

Fazenda (2009, p. 47-50), ao discursar sobre as características de um professor bem-sucedido e sobre as questões da alteridade presentes em sua ação, traça um perfil que revela o mestre; o professor que conduz o processo de ensino por meio de uma relação de respeito e aprendizagem mútua entre ele e o aprendiz e se desvencilha das amarras de um ensino enquadrado, patriarcal e objetivo, conferindo de certo modo esses atributos à gênese de um docente interdisciplinar.

Essas atitudes são pautadas pela avaliação do que se ensina e de como se ensina, sempre buscando o novo, algo que supere sua insatisfação com a forma posta de trabalho docente, veiculada sob a tutela de um currículo enrijecido disciplinarmente. O gosto e a busca pelo conhecimento também estão presentes nesses atores, bem como a capacidade de se perceber como um ser social.

Do ponto de vista da formação do professor para que ele atue interdisciplinarmente, Fazenda (2009, p. 50) alerta para a necessidade de que sejam traçadas estratégias que busquem a superação de uma possível formação inicial fragmentada. Além disso, é esperado que o professor compreenda como se dá a aprendizagem do aluno, que esteja aberto para a instauração do diálogo, que tenha por objetivo a transformação social e que conceba a troca entre as disciplinas e se insira nesse universo, muito embora todas essas questões ainda mostrem a necessidade de superação em nível pessoal. Ele deve buscar pela sua expansão enquanto inserido num contexto profissional coletivo e dinâmico, que é a escola e a sala de aula.

A prática interdisciplinar clama pelo desapego do individual e solicita a parceria no coletivo. Segundo Yared (2009, p. 158), “[...] educar interdisciplinarmente significa tocar a essência de uma realidade que não é feita somente por pessoas singulares com suas realizações, mas, sobretudo, por pessoas que vivem e agem juntas, conduzidas por uma mesma missão e um mesmo objetivo”.

Desse modo, o que conduz as relações horizontais são características que incluem: humildade, respeito, conhecimento, reciprocidade, mutualidade, coparticipação e outros atributos que conferem um perfil de homem sociável na busca de conhecimento e compreensão dos objetos de estudo, sejam eles das esferas da ciência ou das práticas escolares em suas mais variadas formas, institucionais ou não de manifestação.