• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO III: DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS CONTRIBUINTES COMO

3.5. Direitos à segurança

3.5.1.3. Lançamento tributário e legalidade

Concebido o lançamento como ato administrativo, é de se estudar a caracterização que lhe forneceu o instrumento normativo que expede normas gerais em matéria tributária, por imperativo constitucional,367 ao enaltecer tratar-se de ato vinculado e obrigatório.368

Vinculado é o ato em que a conduta do administrador está tipificada objetivamente na lei, eliminando-se qualquer interferência subjetiva.369 Normalmente se contrapõe ao ato discricionário, onde existe espaço para atuação do administrador no definir a conveniência e oportunidade na expedição do ato, ou seja, a lei autorizativa não descerra plenamente a conduta a ser observada na situação concreta, o que permite uma relativa liberdade de ação.

No campo preciso do Direito Tributário Formal, a vinculação da atividade do administrador, no lançamento, está interligada ao conteúdo do ato a ser expedido, já a obrigatoriedade condiz com a prática do ato.370 Essa imperatividade impõe que o agente promova a edição do ato, quando dele tenha conhecimento, sob pena de responsabilidade funcional.

A vinculação ao conteúdo do ato de lançamento traz à tona a modalidade especial de redução da liberdade do administrador na área circunscrita ao Direito Tributário, com a conformação que encerra o princípio da legalidade nesse ramo delicado do direito. É que a receita originada de tributos advém da ordem privada, limitando ou restringindo o patrimônio e a liberdade dos cidadãos, seja na configuração direta de pessoa física, seja na indireta de pessoa jurídica.

366

XAVIER, Alberto. Tipicidade da Tributação, Simulação e Norma Antielisiva. São Paulo: Dialética, 2001. p. 31.

367

Art. 146, III, "b", da Constituição Federal. 368

Parágrafo único do art. 142, do Código Tributário Nacional. 369

Celso Antônio expressa conceito nesse mesmo sentido. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de

Direito Administrativo. 10.ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 265/6.

Daí que o princípio da legalidade, para além de uma função de bloqueio, de proteção dos direitos dos contribuintes pela exigência de lei quanto à instituição ou majoração de tributo, desponta para uma função positiva de delimitação da área de atuação do poder de tributar, fixando precisamente a conduta do administrador no ato de lançamento, no que procura, dentre outros fins, eliminar a subjetividade e discricionariedade na expedição do ato e mesmo a tributação por analogia, na conformidade do princípio da tipificação.

Como corolário de uma reserva absoluta de lei, tanto o fundamento da conduta quanto o critério de decisão no caso concreto deverão estar contidos na lei. O juízo que o administrador faz, na concretude, é apenas de subsunção da situação de fato à previsão da lei, independentemente de valoração pessoal.371

A eliminação da subjetividade do aplicador do direito tem freqüentado os debates doutrinários e jurisprudenciais, com a invocação do princípio da legalidade enquanto delimitador dessa atividade de concreção, notadamente para sobrelevar, em tonalidade máxima, o princípio da segurança jurídica que procura eliminar qualquer margem de subjetividade, de liberdade, de discricionariedade, nas decisões administrativas e judiciais, para dotá-las do maior grau possível de previsibilidade.

Alguns autores, porém, denunciam a impossibilidade de eliminação da margem de atuação que existe entre a previsão abstrata da lei e o ato de sua respectiva aplicação no caso concreto, em especial aqueles que consideram conter no ato de aplicação também parcela de criação do direito, constituindo o ato de concreção a produção de norma individual e concreta que tem o seu fundamento de validade na norma geral e abstrata,372 como no caso do lançamento tributário.

Sendo comum o uso de conceitos indeterminados no direito, em sentido geral, também no ramo do Direito Tributário eles estão presentes, carecendo a matéria de estudos particularizados, ainda ausentes na doutrina especializada de nosso país. Talvez tenha contribuído para tal ausência um receio doutrinário de reconhecer essa indeterminação no processo de interpretação e aplicação de normas no âmbito do Direito Tributário, no qual se

371

XAVIER, Alberto. Os princípios da legalidade e da tipicidade da tributação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978. p. 38.

372

Para Souto Maior Borges, "a norma superior somente pode determinar em parte o conteúdo e o processo de elaboração da norma inferior". Acrescentando, ao tratar da vinculação entre o ato superior e o inferior, que "essa vinculação apenas parcial deixa, necessariamente, uma certa margem de indeterminação no conteúdo da norma inferior, preenchível no ato de sua criação". BORGES, José Souto Maior. Lançamento

tem procurado, com muita ênfase, revelar a segurança jurídica imposta pelo princípio da legalidade da tributação, nas vertentes da preeminência de lei e reserva legal absoluta, com as vestes da tipicidade.

Apesar da preocupação garantística sempre presente no Direito Tributário, que normalmente representa uma espécie de interferência no patrimônio dos particulares no exercício do poder de tributar, inevitavelmente são utilizados conceitos indeterminados que carecem de uma mediação pelo administrador.373 É que a administração tributária situa-se numa esfera abrangida pelo Direito Administrativo ou pelo Direito Tributário Formal, onde ocorre a expedição de atos administrativos das mais variadas espécies, com destaque especial para o lançamento tributário.

No ato administrativo de lançamento a autoridade interpreta e aplica a lei tributária material ao caso concreto, no que revela entendimento quanto aos conceitos indeterminados, constituindo-se em veículo de mediação entre a previsão abstrata e a concreção. Em face da evolução da atividade executada no lançamento que atualmente se projeta com caráter fiscalizador e posterior ao nascimento da obrigação tributária, no mesmo documento que contém o ato de lançamento com a exigência do tributo, de regra auto de infração, o agente administrativo também aplica penalidade pelo descumprimento de obrigação a cargo do sujeito passivo.

Nessa linha, o Direito Tributário oferece uma particularidade que conduz a quatro possibilidades de aplicação da norma, quando previsível o lançamento por homologação. Uma pelo contribuinte ao efetuar os registros das operações e antecipar o pagamento do tributo;374 outra pelo agente no lançamento substitutivo da atividade do contribuinte; uma terceira pela administração judicante no julgamento de impugnação administrativa; e uma quarta pelo juiz no controle provocado em ação judicial.

373

Também pelo juiz quando a controvérsia entre o Fisco e o Contribuinte passa para a esfera judicial. 374

Alberto Xavier entende que essa atividade do contribuinte não representa ato de aplicação do direito, mas conformação ou adequação ao direito. O autor não nega, no entanto, que "em determinados casos o contribuinte, para cumprir o imperativo decorrente da norma tributária, procede a uma operação que, do estrito ponto de vista lógico, é idêntica à efetuada pela Administração Fiscal...". XAVIER, Alberto. Do

lançamento: teoria geral do ato, do procedimento e do processo tributário. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense,

1998. p. 80. Em sentido contrário estão aqueles que, como Paulo de Barros Carvalho, equiparam a atividade do contribuinte no lançamento por homologação à atividade da administração no lançamento, dizendo tratar- se de expedição de norma individual e concreta veiculada pelo contribuinte, uma espécie de autolançamento. CARVALHO, Paulo de Barros. Fundamentos Jurídicos da Incidência. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 238.

Documentos relacionados