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CAPÍTULO II: ASPECTOS ESSENCIAIS DA TEORIA DOS DIREITOS

2.5. Limitações dos direitos fundamentais

Apesar da força jurídica especial que a Constituição outorga aos direitos fundamentais, eles não são absolutos e nem ilimitados, tanto na feição subjetiva que não pode admitir o arbítrio do titular do direito na satisfação de suas necessidades, como na versão de valores onde o reconhecimento da liberdade integra-se no conjunto de valores comunitários. 138

Em geral, a questão dos limites dos direitos fundamentais coloca-se como um conflito prático entre valores. “Valores próprios dos direitos ou entre esses e outros valores comunitários – no contexto do sistema constitucional”.139

As limitações podem ser de ordem interna que servem para determinar o conteúdo do direito,140 de nível diretamente constitucional,141 em forma expressa ou tácita a ser identificada no processo de interpretação constitucional. São os que alguns denominam de limites imanentes que representam “uma construção dogmática para explicar a necessidade e justificar a possibilidade de limitação ou restrição a direito fundamental conferido por norma constitucional escrita sem reserva de lei”.142 Eventuais limitações devem decorrer do próprio texto constitucional, a exemplo da liberdade artística que está subordinada ao princípio da dignidade da pessoa humana.143

Em algumas situações, os “efeitos limitadores resultam da consagração de deveres fundamentais manifesta e inequivocamente dirigidos a certos direitos, havendo por isso de ser contados entre os limites imanentes expressos destes, como acontece, por exemplo, no caso do dever de pagar imposto em relação ao direito de propriedade”.144

De outra face, caracterizam limites externos aos direitos fundamentais aquelas normas de nível infraconstitucional que modificam alguns dos elementos configuradores dos

138

VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 2.ed. Coimbra: Livraria Almedina, 2001. p. 275.

139 VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 2.ed. Coimbra: Livraria Almedina, 2001. p. 276.

140 VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 2.ed. Coimbra: Livraria Almedina. 2001. p. 283.

141

ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Pólíticos y Constitucionales, 2001. p. 277.

142

STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão de Direitos Fundamentais e princípio da Proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 63.

143

MENDES, Gilmar Ferreira. Colisão de Direitos Fundamentais: Liberdade de Expressão e de comunicação e Direito à Honra e à Imagem. In: Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade . 2ª Edição. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1999. p. 94.

144

VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 2.ed. Coimbra: Livraria Almedina, 2001. p. 284.

direitos fundamentais (titular, destinatário, objeto).145 Certas constituições prescrevem expressamente uma reserva de lei para restrição (Alemanha,146 Portugal147), sem que haja preceitos semelhantes na Constituição Brasileira.148 Essa atuação que importa na identificação de limites externos perfaz-se por mediação legislativa. É que as normas sobre direitos fundamentais ordinariamente possuem relativo nível de indeterminação, carecendo de lei que os precise em forma de restrição, quando autorizada, e de conformação, ou seja, da definição do nível de proteção do direito fundamental, quando necessária essa tarefa, sem que se coloquem os direitos fundamentais ao talante do legislador.

No quadro das limitações merece distinção a colisão de direitos que ocorre quando a “Constituição protege simultaneamente dois valores ou bens em contradição numa determinada situação concreta (real ou hipotética)”.149 É dizer, quando o exercício de um direito afeta outro, há colisão que pode ser horizontal (indivíduo versus indivíduo, ex. liberdade de comunicação e direitos gerais da personalidade) ou vertical (indivíduo versus Estado, ex. liberdade de comunicação e segurança pública).150 Em regra, a colisão se dá em concreto e se resolve no judiciário, mas o legislador em abstrato pode prever situações de colisão, como no caso da exclusão de ilicitude da interrupção da gravidez.151

Como critério para a solução das colisões de direitos, tem-se apontado para a ponderação de bens e direitos, no caso concreto, a ser feita com recurso ao princípio da proporcionalidade que se compõe de três elementos parciais ou subprincípios: o da

145 Juan Carlos Gavara de Cara. Derechos fundamentales y desarrollo legislativo: la garantia del contenido esencial de los derechos fundamentales en la Ley Fundamental de Bonn. Madrid: Centro de Estudios constitucionales, 1994. p. 367, apud STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão de Direitos Fundamentais e

princípio da Proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 32.

146

Artigo 19 (Restrição aos direitos fundamentais; respeito à sua essência e garantia do devido processo legal). 1. Quando, segundo esta Lei Fundamental, um direito fundamental for restringido por lei ou em virtude de lei, essa lei será aplicada de maneira geral e não apenas para um caso particular. Além disso, a lei deverá especificar o direito fundamental afetado e o artigo que o prevê. 2. Em hipótese nenhuma um direito fundamental poderá ser afetado em sua essência. 3. Os direitos fundamentais se aplicarão igualmente às pessoas jurídicas nacionais, na medida em que a natureza desses direitos o permitir. 4. Quem tiver seus direitos lesados pelo Poder Público poderá recorrer à via judicial. Não havendo foro especial, o recurso deverá ser encaminhado à Justiça comum. Este parágrafo não interferirá no disposto na segunda frase do § 2 do artigo 10.

147

Art. 18, da Constituição de Portugal. 148

Embora não haja disposição genérica para restrição de direitos fundamentais apenas por lei, como nos países citados, entendemos que no Brasil ela também só é possível mediante atuação legislativa, expressa no texto constitucional ou não, que esteja em compatibilidade com a Constituição.

149

VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 2.ed. Coimbra: Livraria Almedina, 2001. p. 311.

150

STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão de Direitos Fundamentais e princípio da Proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 139.

151

STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão de Direitos Fundamentais e princípio da Proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 70.

adequação, o da necessidade e o da proporcionalidade em sentido estrito.152 Na adequação, cabe investigar se o meio usado é apropriado para atingir o fim perseguido, ou seja, a validade ou conformidade dos fins; na necessidade, indaga-se se a medida é necessária para atingir a finalidade constitucional para assim aferir-se se não pode ser eleita outra medida menos gravosa ao direito fundamental; e na proprocionalidade em sentido estrito, que é a ponderação de bens propriamente dita, verifica-se se o meio utilizado é ou não desproprocional em relação ao fim.153

Construídos os elementos que compõem o princípio da proporcionalidade, discute-se sobre a sua respectiva natureza jurídica. Uns lhe atribuem a feição material como decorrência da noção de justiça154 e outros a natureza formal como um critério para solução de conflitos que só se completa com a aplicação conjunta de outros princípios materiais. 155 Outro ponto de destaque diz respeito à fundamentação normativa do princípio diante da inexistência de referência constitucional expressa. O Tribunal Constitucional Alemão justifica o princípio no Estado de Direito,156 enquanto no Brasil a cláusula do devido processo legal (art. 5º, LIV, da Constituição Federal) tem servido de fundamento para o princípio da proporcionalidade.157

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