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LIMITAÇÕES VÁRIAS AO PODER DE AFASTAMENTO DOS ESTRANGEIROS DO TERRITÓRIO NACIONAL

A. Sofia Pinto Oliveira 1 Texto elaborado pela autora expressamente para este e-book.

4. Limitações que decorrem do direito internacional

4.2. Limitações que decorrem da jurisprudência de Estrasburgo

A jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos tem também desenvolvido importantes limitações ao poder de expulsão dos Estados a partir das normas que consagram a proibição de sujeição a penas ou tratamentos cruéis degradantes ou desumanos (artigo 3 da Convenção Europeia dos Direito dos Homem) e o direito ao respeito pela vida familiar (artigo 8 da mesma Convenção). Também do ponto de vista das garantias aplicáveis aos procedimentos de expulsão, em diversas situações, têm entendido os juízes de Estrasburgo haver violação do direito ao recurso efetivo, garantido pelo artigo 13º da Convenção.

Os juízes têm entendido, em diversos casos submetidos à sua apreciação, que a aplicação de medidas de expulsão pode constituir violação destes direitos.

A jurisprudência do Tribunal de Estrasburgo teve uma influência importante na evolução legislativa portuguesa, por considerar que a expulsão de imigrantes de segunda geração ou profundamente integrados e com fortes ligações familiares no Estado parte da Convenção pode constituir uma ingerência ilegítima face ao artigo 8º da Convenção Europeia no direito ao respeito da vida privada e familiar13. Assim, em 2007, a lei 23/2007, de 4 de julho, no seu

artigo 135º, veio estabelecer um travão à expulsão de estrangeiros de segunda geração ou profundamente integrados (alíneas a) e d)) e com fortes ligações familiares (alíneas b) e c)), assim se garantindo o direito à unidade familiar em agregados residentes em Portugal de origens nacionais diversas. Nos termos da lei (artigo 135º), há três tipos de estrangeiros que, mesmo que se encontrem em situação irregular, não podem ser expulsos, salvo em caso de ameaça à segurança nacional e à ordem pública: os que tenham nascido em território português e aqui residam habitualmente (alínea a) do artigo 135º); os que tenham a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa (alínea b) do artigo 135º) ou estrangeira, a residir em Portugal, sobre os quais exerçam efetivamente as responsabilidades parentais e a quem assegurem o sustento e a educação (alínea c) do artigo 135º); e, finalmente, os que se

13 Ver o estudo de Paulo Manuel Abreu da Silva Costa, "A Protecção dos Estrangeiros pela Convenção Europeia dos Direitos do Homem perante Processos de Asilo, Expulsão e Extradição − a Jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem", em Separata da Revista da Ordem dos Advogados, 2000 e de Abel Campos, "A Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o direito dos estrangeiros ou do último recurso", em O Asilo em Portugal, volume II, Lisboa, Conselho Português para os Refugiados, 1994. Ver ainda Kay Hailbronner, Immigration and Asylum Law and policy of the European Union, Hague, Kluwer Law International, 2000, p. 496-499. O Tribunal pronunciou-se, a este propósito, no caso

Moustaquim, em que a um marroquino, imigrante na Bélgica desde os dois anos de idade, na sequência

de numerosos crimes de pequena importância, foi condenado à expulsão daquele país. O Tribunal entendeu que, atentas as particularidades do caso, não se justificava a expulsão do jovem para Marrocos por todos os seus familiares viverem e estarem integrados na Bélgica − ver decisão do caso Moustaquim contra Bélgica, de 18 de Fevereiro de 1991, em www.echr.coe.int. Não havendo nenhuma proteção absoluta face à expulsão quando esta possa pôr em causa a manutenção de uma vida familiar normal, neste e noutros casos, tem entendido aquele Tribunal haver um condicionamento do poder de expulsão dos Estados relativamente a estrangeiros residentes com as suas respetivas famílias no Estado- parte.

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encontrem em Portugal desde idade inferior a 10 anos e aqui residam habitualmente (alínea d) do artigo 135º)14.

O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem aplicado o artigo 3º da Convenção a casos de afastamento de estrangeiros do território de um Estado parte na Convenção Europeia dos Direitos do Homem para países onde estes correm o risco de sofrer tortura ou tratamentos cruéis, degradantes ou desumanos15. Os juízes de Estrasburgo têm entendido que a aplicação

de medidas de expulsão para o país de origem, nestas situações, viola a proibição de sujeição da pessoa humana a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, que é uma proibição de carácter absoluto16.

Para que aquele risco possa ser estabelecido, não basta provar a existência de uma situação de anarquia ou de violência generalizada, de conflito armado ou de desrespeito pelos direitos humanos, impõe-se que esse risco se afigure particularmente intenso para a pessoa que pode ser obrigada a regressar ao país de origem17.

A abundante jurisprudência do Tribunal de Estrasburgo neste domínio teve uma influência decisiva na evolução do Direito da União Europeia. Assim, na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, incluiu-se uma norma, o artigo 19º, nos termos da qual:

14 Antes da introdução desta norma em 2007, já jurisprudência do Tribunal Constitucional se debatera com questões semelhantes em que estava em causa a opção pelo exercício do poder de expulsão ou a garantia da vida familiar e optou pelo respeito pela vida familiar. Ver acórdão 181/97, de 5 de Março, relatado pelo Conselheiro Nunes de Almeida, publicado no DR, II Série, de 22 de Abril de 1997 e 470/99, relatado pelo Conselheiro Tavares da Costa, e Acórdão 232/2004, relatado pelo Conselheiro Benjamim Rodrigues, em www.tribunalconstitucional.pt. Ver também comentário em Anabela Leão, "Expulsão de estrangeiros com filhos menores a cargo", em Jurisprudência Constitucional, 2006, nº3, p. 25. Ainda sobre esta matéria, Ana Rita Gil, „Um Caso de Europeização do Direito Constitucional Português – A Afirmação de um Direito Fundamental ao Reagrupamento Familiar“, em Revista de Direito Público, 2009, nº 2, p. 9. Da mesma autora, em termos mais desenvolvidos, Imigração e Direitos Humanos, Lisboa, Petrony Editora, 2017, p. 360 a 417.

15A primeira vez que o fez foi num caso de extradição. Caso Soering contra Reino Unido, de 7 de Julho de 1989, envolvendo requerentes de asilo, seguiram-se os casos Cruz Varas contra Suécia, de 20 de Março de 1991, e de Vilvarajah contra o Reino Unido, de 30 de Novembro de 1991, ver em www.echr.coe.int. 16 Sobre o impacto desta jurisprudência nos sistemas nacionais de asilo, ver Elspeth Guild, “Jurisprudence of the European Court of Human Rights: lessons for the EU Asylum Policy”, em The

Emergence of a European Asylum Policy / L’Emergence d’une Politique Européenne d’Asile, Bruxelles,

Bruylant, 2004, p. 329.

17Assim o entendeu o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem no caso Chahal contra Reino Unido, de 15 de Novembro de 1996, em que o queixoso, de nacionalidade indiana, era considerado, pelas autoridades britânicas, um terrorista, mas o Tribunal entendeu que, mesmo nestas circunstâncias, os Estados-parte estavam obrigados a não expulsar estrangeiros se estes pudessem ser sujeitos a tratamentos contrários ao artigo 3º da Convenção, e também nos casos Vilvarajah e outros contra Reino Unido, de 30 de Outubro de 1991 e H.L.R. contra França, de 29 de Abril de 1997, tendo nestes dois últimos recusado a aplicação do artigo 3 da Convenção por não terem os queixosos provado correrem um risco acrescido de sofrerem tratamentos cruéis, degradantes ou desumanos, por comparação com a generalidade da população. Ver Hailbronner, Immigration and Asylum Law and policy of the European

Union, Hague, Kluwer Law International, 2000, p. 492-494.

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“Ninguém pode ser afastado, expulso ou extraditado para um Estado onde corra sério risco de ser sujeito a pena de morte, a tortura ou a outros tratos ou penas desumanos ou degradantes.” (artigo 19º, número 2 da Carta).

Muito recentemente, em dezembro de 2016, foi dado mais um passo relevante no alargamento do âmbito de aplicação deste artigo 3º a casos de expulsão. Foi decidido pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, no caso Paposhvili contra a Bélgica, 13 de dezembro de 2016, que a expulsão de pessoas que sofram de doença grave para países relativamente aos quais não seja possível estabelecer a possibilidade de tratamento médico adequado pode constituir tratamento contrário ao artigo 3º da Convenção Europeia.

Daqui decorre que os Estado-parte da Convenção Europeia, em situações em que os estrangeiros aleguem dever permanecer no respetivo território por razões de saúde, têm de verificar, caso a caso, se existem cuidados de saúde adequados e acessíveis no Estado de destino, atendendo à situação concreta da pessoa. Toda a informação relevante quanto a estes aspetos tem de ser recolhida antes de a medida de afastamento ser executada. E, se subsistirem dúvidas quanto ao impacto que a expulsão possa ter, o Estado-parte tem de obter garantias individuais suficientes por parte do Estado de destino como condição prévia para proceder à expulsão. A ausência destes trâmites pode fazer o Estado que expulsa incorrer numa violação da Convenção Europeia por infligir um tratamento degradante ao desumano aos estrangeiros que se encontram no seu território.

Esta jurisprudência Paposhvili não é inteiramente nova. Jáno caso D. contra o Reino Unido, de 2 de Maio de 1997, em que D. alegava que, sendo seropositivo, caso fosse expulso para o seu país de origem, a sua morte ia ser acelerada e ocorreria provavelmente em condições desumanas e degradantes, o Tribunal Europeu tinha considerado que, em circunstâncias muito excecionais, de doença terminal, a expulsão poderia implicar violação do artigo 3º da Convenção. Simplesmente, desde o caso D. contra o Reino Unido, a questão da expulsão de pessoas gravemente doentes foi colocada, de novo, várias vezes ao Tribunal e este entendeu sempre que as circunstâncias excecionais, a que se aludiu no caso D. contra o Reino Unido, não se verificavam na situação concreta, pelo que a expulsão não constituía tratamento contrário ao artigo 3º da Convenção.

Neste acórdão Paposhvili, o Tribunal Europeu considera que não é necessário provar que o estrangeiro em causa esteja em iminente risco de morte, basta provar que existe um risco real de sofrer um declínio grave, rápido e irreversível (“serious, rapid and irreversible decline”) do seu estado de saúde, associado a um intenso sofrimento e a uma significativa redução da esperança de vida.

5. Limitações legais (de direito interno e de direito da EU)

A expulsão administrativa está regulada, em termos gerais, no capítulo VIII da lei nº 23/2007, de 4 de julho, com as alterações que lhe foram posteriormente feitas. Foram particularmente relevantes as alterações introduzidas pelo Lei 29/2012, de 9 de Agosto, que transpôs para a

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ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2008/115/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular (a chamada Diretiva Retorno). A decisão de expulsão, de afastamento coercivo, é sempre acompanhada da determinação de um prazo de interdição de entrada em território nacional – que, nos termos da lei atual, não pode ser superior a 5 anos, salvo em caso de ameaça grave para a ordem pública, a segurança pública ou a segurança nacional – que tem de ser devidamente fundamentadas (artigo 144º) A lei regula o procedimento de expulsão, que é de iniciativa oficiosa, sendo de salientar a nota de celeridade que se pretende que marque este procedimento18, sem prejuízo das garantias

de audição e defesa da pessoa, expressamente previstas no artigo 148º da lei. O Tribunal de Justiça da União Europeia tem sido chamado também a esclarecer em que circunstâncias e com que extensão se deve entender este direito a ser ouvido19.

Há determinadas circunstâncias que impedem que se dê início, naquele momento, ao procedimento de expulsão: a apresentação de um pedido de asilo a qualquer autoridade policial e o facto de ser detentor de um título de residência válido ou de outro título, que lhe confira direito de permanência em outro Estado membro e cumpra a sua obrigação de se dirigir imediatamente para esse Estado membro (artigo 146º, número 5). A lei refere no artigo 146º, número 5, alínea a) que a apresentação de um pedido de asilo só impede a expulsão se o pedido for apresentado 48 horas após a entrada irregular. Nada na lei do asilo (lei 27/2008, com as alterações que lhe foram introduzidas pela lei 19/2014, de 5 de maio) dispõe no mesmo sentido e não pode impor-se um prazo (ainda por cima, um prazo curto e irrazoável) para a apresentação do pedido de proteção internacional. Esta norma – na parte em que exige que o pedido seja apresentado nas 48 horas posteriores à entrada − é, em nosso entender, face ao artigo 33º, número 8, da Constituição, inconstitucional.

Os estrangeiros nestas circunstâncias gozam de uma proteção temporária face à expulsão – já que a lei apenas impede que o procedimento avance naquele momento. Porém, uma vez recusado o pedido de asilo ou não cumprida a obrigação de deslocação para o outro Estado- membro, podem ser expulsos.

A entidade competente para decidir o “afastamento coercivo” é o Diretor Nacional do SEF, nos termos do artigo 149º. A decisão tem de ser obrigatoriamente comunicada não só à pessoa visada, como também ao Alto Comissariado para as Migrações e ao Conselho Consultivo e tem de conter a fundamentação da decisão, o conjunto de obrigações que impendem sobre o estrangeiro e o prazo dentro do qual este fica interdito de entrar em território nacional.

18 Ver, neste sentido, Carla Amado Gomes e Anabela Leão, A Condição de Imigrante – Uma Análise de

Direito Constitucional e de Direito Administrativo, Coimbra, Almedina, 2010, p. 77.

19 O Tribunal de Justiça da União Europeia, numa decisão de 11 de dezembro de 2014, no caso Boudjlida, Processo C-249/13, que o direito de exprimir, antes da adoção de uma decisão de expulsão, o seu ponto de vista quanto à legalidade da sua residência e que não obriga a autoridade nacional competente a prevenir o referido nacional, antes da audição organizada com vista à referida adoção, de que tenciona adotar uma decisão de regresso a seu respeito, nem a comunicar-lhe os elementos com base nos quais tenciona justificar a mesma. Ver também sobre a matéria a decisão no caso Mukarubega, de 5 de novembro de 2014, no processo C- 166/13.

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Esta decisão pode, naturalmente, ser impugnada nos tribunais administrativos. A lei não prevê, no entanto, um efeito suspensivo automático associado a esta impugnação, ao contrário do que acontece no domínio da lei do asilo (lei 27/2008, de 30 de junho, com as alterações que lhe foram introduzidas pela lei 26/2014, de 5 de maio) – o que significa que a decisão de expulsão pode ser executada antes de haver apreciação judicial da decisão administrativa. A impugnação pode ser acompanhada (ou precedida) de um pedido de adoção de uma medida cautelar de suspensão da eficácia do ato de expulsão, nos termos da lei processual administrativa, conforme expressamente prevê o artigo 150º, número 2 da lei de estrangeiros20. Pode haver, aliás, aqui motivos para lançar mão do mecanismo especialíssimo

do decretamento provisório de providência cautelar, previsto no Código do Processo dos Tribunais Administrativos, no artigo 131º, aplicável quando se „reconheça a existência de uma situação de especial urgência, passível de dar causa a uma situação de facto consumado na pendência do processo“. Refira-se que este mecanismo pode ser requerido pelo interessado, o requerente da providência cautelar, ou pode ser de iniciativa oficiosa. Entendemos que, aliás, pode até ser exigível às autoridades judiciais que assim procedam, sobretudo naquelas situações em que se possa configurar uma situação de ameaça grave a direitos fundamentais. O artigo 13º, número 2, da Diretiva 2008/115/CE, que garante vias de recurso judicial efetivas face a decisões administrativas de afastamento, prevê, no seu número 2, que os tribunais „são competentes para reapreciar as decisões relacionadas com o regresso a que se refere o n.o 1 do

artigo 12.o, incluindo a possibilidade de suspender temporariamente a sua execução, a menos

que a suspensão temporária já seja aplicável ao abrigo da legislação nacional.“ – o que não é o caso em Portugal.

Em 18 de dezembro de 2014, o Tribunal de Justiça da União Europeia, no caso Abdida, processo C-562/13, considerou que os artigos 5.° e 13.° da Diretiva Retorno, lidos à luz dos artigos 19.°, n.° 2, e 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, e o artigo 14.°, n.° 1, alínea b), desta diretiva devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional que não confere efeito suspensivo a um recurso interposto da decisão que ordena a um nacional de país terceiro, que padece de uma doença grave, que abandone o território de um Estado-Membro, quando a execução dessa decisão for suscetível de expor esse nacional de país terceiro a um risco sério de deterioração grave e irreversível do seu estado de saúde“.

20 Ver sobre esta, Carla Amado Gomes e Anabela Leão, A Condição de Imigrante – Uma Análise de

Direito Constitucional e de Direito Administrativo, Coimbra, Almedina, 2010, p. 79 a 81. Se nenhum

interesse público relevante for invocado para a execução imediata da decisão de expulsão, atendendo a que, para o estrangeiro, a execução imediata da decisão de expulsão constitui um “facto consumado”, haverá boas probabilidades de a suspensão ser decretada. Ver, neste sentido, a argumentação do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 1 de junho de 2011, no Processo 07608/11. A circunstância de o novo Código de Processo dos Tribunais Administrativo, na sequência das modificações introduzidas em 2015, ter alterado o artigo 120º, elevando as exigências no que diz respeito ao “fumus boni iuris” para as providências de carácter conservatório pode, no entanto, dificultar a obtenção de sentença cautelar favorável.

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Será este o primeiro passo para que, por força da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, venha a ser reconhecido um efeito suspensivo automático à impugnação de decisões administrativas de afastamento de estrangeiros do território nacional?

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Direito ao reagrupamento familiar: permissão e ingerência do Estado

DIREITO AO REAGRUPAMENTO FAMILIAR: PERMISSÃO E INGERÊNCIA DO ESTADO1

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