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A CRIANÇA MIGRANTE E A SUA PROTECÇÃO A NÍVEL INTERNO

V. A Nomeação de Representante legal e a Protecção da Criança: procedimento legal a seguir VI Notas Finais.

I. Introdução

“(…) lamento afirmar que há diversos indícios de que a Europa está a perder de vista o seu dever de dar protecção aos refugiados de acordo com a legislação internacional, conforme estabelecido pela Convenção de 1951. Isto constitui, para mim, uma fonte de profunda preocupação e o risco de provocar um enorme impacto sobre partes do Mundo que olham para a Europa como um exemplo.” (Kofi Annan, Discurso no Fórum Internacional de Estocolmo sobre o Combate à Intolerância)

Todos os dias milhares de pessoas tentam entrar na Europa em busca de melhores condições de vida, escapando da guerra, da fome, da perseguição política ou pura e simplesmente na esperança de poderem deixar de sentir tristeza e dor decorrente de nada terem que os prenda a um lugar, a um país.

De entre estas pessoas, muitas delas são crianças. Umas acompanhadas pelos seus pais, outras enviadas sozinhas por estes, como se o último acto de amor que lhes pudessem dedicar fosse o pagamento da “fortuna” que os exploradores desta desgraça humana cobram por um bilhete (que garante – talvez – 20% de hipóteses de atingir a costa de um país europeu, com vida). Esta é uma realidade que temos que enfrentar e à qual o Direito tem que saber dar resposta de forma adequada com respeito pelos direitos Fundamentais de todos, em especial, atenta as suas especificidades, dessas crianças. Na busca de soluções judiciárias temos que saber interpretar a nossa lei de forma sistemática para que a protecção que venha a ser planeada e decretada seja, efectivamente, aquela que melhor proteja a criança como sujeito efectivo de direitos humanos.

Imbuídos do típico espírito hospitaleiro, altruísta e protector português, poderíamos ser tentados a concluir que não existe qualquer problema. Mas a realidade é que, sempre que um estrangeiro - seja ele adulto ou criança – pretende entrar num determinado país tem que 1 Docente do CEJ e Juíza de Direito.

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O CONTENCIOSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO RELATIVO A CIDADÃOS ESTRANGEIROS E AO REGIME DA ENTRADA, PERMANÊNCIA, SAÍDA E AFASTAMENTO DO TERRITÓRIO PORTUGUÊS, BEM COMO DO ESTATUTO DE RESIDENTE DE LONGA DURAÇÃO - 2.ª edição atualizada

A criança migrante e a sua protecção a nível interno

obedecer às regras que esse mesmo país define como pressupostos de entrada no seu território nacional. Estas regras (algumas de origem interna, outras internacional) estabelecem e condicionam a entrada, permanência e autorização de permanência de estrangeiros nos respectivos territórios nacionais, a par de legislação específica e especial relativa à situação dos refugiados, aos pedidos de asilo e à concessão da nacionalidade. Estas diversas faces do Direito entrecruzam-se muitas vezes, ou não fossem muitas as situações de pessoas que usam documentos falsos para entrar em Portugal, ou sem autorização (visto), e até sem qualquer documento, fugindo de uma situação de conflito armado, da fome, de perseguição, solicitando asilo, podendo mais tarde solicitar a cidadania portuguesa.

Ocupar-nos-emos apenas das crianças.

Analisemos a legislação portuguesa para que possamos delinear um caminho possível para protecção da criança migrante, com respeito pelos seus direitos fundamentais.

II. Entrada e permanência e saída de cidadãos estrangeiros de Portugal

A Lei n.º 23/2007, de 04 de Julho, define as condições e procedimentos de entrada, permanência, saída e afastamento de cidadãos estrangeiros do território português, bem como o estatuto de residente de longa duração (art.º 1.º).

a) Âmbito pessoal:

O âmbito pessoal de aplicação da Lei n.º 23/2007, de 04 de Julho, cinge-se aos cidadãos estrangeiros e apátridas (art.º 4º, nº 1) que se encontrem nas situações genericamente consagradas no art.º 1º e concretamente reguladas na lei, mas não é aplicável a:

− Nacionais de Estados terceiros que residam em território nacional na qualidade de refugiados, beneficiários de protecção subsidiária ao abrigo das disposições reguladoras do asilo ou beneficiários de protecção temporária (nº 2, al. b), do citado artigo 4.º), sem prejuízo da sua aplicação subsidiária e de referência expressa em contrário.

Esclarecendo-se no art.º 5.º (Regimes especiais), nº 2, que “O disposto na presente lei não prejudica as obrigações decorrentes da Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados, adotada em Genebra em 28 de julho de 1951, alterada pelo Protocolo Adicional à Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados, adotado em Nova Iorque em 31 de janeiro de 1967, das convenções internacionais em matéria de direitos humanos e das convenções internacionais em matéria de extradição de pessoas de que Portugal seja Parte ou a que se vincule”.

Para que cidadãos de Estados terceiros possam entrar em território português têm que se verificar determinadas condições.

b) Condições objectivas de entrada e saída do território nacional:

O CONTENCIOSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO RELATIVO A CIDADÃOS ESTRANGEIROS E AO REGIME DA ENTRADA, PERMANÊNCIA, SAÍDA E AFASTAMENTO DO TERRITÓRIO PORTUGUÊS, BEM COMO DO ESTATUTO DE RESIDENTE DE LONGA DURAÇÃO - 2.ª edição atualizada

A criança migrante e a sua protecção a nível interno

Para que qualquer cidadão estrangeiro possa validamente entrar ou sair do território nacional o mesmo tem que ser portador de um documento de viagem reconhecido como válido (artigo 9.º), exigindo-se ainda que sejam titulares de visto válido e adequado à finalidade da deslocação, concedido nos termos da lei ou pelas competentes autoridades dos Estados partes na Convenção de Aplicação.

Ora, esta realidade, quando se trata de crianças, é apenas uma miragem, pois os menores não acompanhados que entram em território nacional encontram-se geralmente indocumentados, ou apresentam documentos falsos: estas crianças migrantes, na sua esmagadora maioria, apenas conseguem aceder a território europeu de forma ilegal, recorrendo a redes de tráfico, empenhando a vida ou a integridade física e sexual, em busca de uma vida melhor.

Sempre que um cidadão estrangeiro seja surpreendido2 a entrar no território nacional sem

que preencha as condições objectivas referidas, o mesmo será detido, a fim de evitar essa entrada, para ser repatriado.

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