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1 O DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO, O

1.3 O DIREITO À CIDADE E À MORADIA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE

1.3.1 Mandamentos do Direito Urbanístico relacionados ao direito à cidade

Ao enunciar os princípios do Direito Urbanístico, sobretudo àqueles que revelam o direito à cidade, vale uma comparação entre estes e os princípios relacionados à defesa do meio ambiente, que têm sido aplicados com certa regularidade e em maior proporção pelo Judiciário. O clamor social pela defesa ao meio ambiente, consequentemente o conhecimento e divulgação de seus princípios, é maior em relação aos princípios afetos ao Direito Urbanístico, pouco aplicados e menos conhecidos. Em conflitos judiciais, raramente são aplicados.34, 35 Talvez os princípios do Direito Urbanístico, consequentemente os relacionados ao direito à cidade, necessitem de maturidade no sentido de sua aplicação e interpretação no judiciário brasileiro.

Mas, mesmo quando se trata da aplicação de princípios do Direito Urbanístico, a doutrina, segundo Daniela Campos Libório Di Sarno, não é pacífica ao classificar princípios do Direito Urbanístico, e este problema se revelava ainda mais forte, principalmente, na fase anterior à publicação do Estatuto da Cidade, segundo a autora:

No caso do direito brasileiro, a doutrina não é pacífica em classificá-los. José Afonso da Silva e Regina Helena Costa utilizam-se das lições de Antonio Carceller Fernandez para indicar a função pública, a conformação da propriedade urbana, o planejamento urbanístico ao custo da urbanificação e a justa distribuição dos benefícios e ônus derivados da atuação urbanística como princípios de Direito Urbanístico com possível aplicação em nosso direito pátrio.

Indicam, ainda princípios constitucionais, tais como a função pública da propriedade, subsidiariedade e coeção dinâmica, como próprios do nosso sistema jurídico.36

O Estatuto da Cidade, por sua vez, veio a ser a base do conjunto de diretrizes jurídicas, normas e instrumentos de Direito Urbanístico37 e elencando diversas diretrizes38 voltadas à ordenação das funções sociais da cidade e da propriedade para aplicação de instrumentos e

34SAULE JÚNIOR, Nelson; DI SARNO, Daniela Campos Libório; AURELLI, Arlete Inês. (Coords.). Conflitos

coletivos sobre a posse e a propriedade de bens imóveis. Brasília: Secretaria de Assuntos Legislativos do

Ministério da Justiça, 2009. p. 67.

35A referida pesquisa analisou as decisões dos Tribunais de Justiça de São Paulo e Paraná, além dos Tribunais Federais da 3ª e 4ª Região e verificou que: “A função social da propriedade consagra como Direito fundamental no art. 5º, inc. XXIII da Constituição Federal, embora fundamental para a análise da tutela possessória e outras decorrentes dos conflitos fundiários sequer foi mencionada como fundamento da medida liminar nas ações urbanas.”

36Elementos de Direito Urbanístico. Barueri: Manole, 2004. p. 47

37SAULE JÚNIOR, Nelson. A proteção jurídica da moradia nos assentamentos irregulares. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2004. p. 206, cujo capítulo relata a tramitação do projeto de lei que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal.

38BRASIL. Artigo 2º da Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Disponível em:

institutos da política urbana. Dentre as mais importantes diretrizes estão elencadas: a garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações; a gestão democrática por meio da participação popular; a cooperação entre governos no processo de urbanização; o planejamento do desenvolvimento das cidades; a oferta de equipamentos urbanos e comunitários em transportes e serviços públicos adequados; a ordenação e controle do uso do solo de forma a evitar distorções de ordem urbanística e ambiental; a integração e complementariedade entre atividades urbanas e rurais em vista do desenvolvimento dos municipios e territórios sob sua influência; a adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços e expansão urbana; a justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização; a adequação de instrumentos de planejamento e orçamento público de forma a provilegiar investimentos geradores de bem-estar à população; a recuperação dos investimentos do Poder Público decorrentes dos processo de valorização de imóveis urbanos; a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído; a instituição de audiência pública nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído; a regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais e urbanização e ocupação do solo; a simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo visando permitir a redução de custos e o aumento de oferta dos lotes e unidades habitacionais; e a isonomia de condições para os agentes públicos e privados na promoção de empreendimentos e atividades relativos ao processo de urbanização.

Estas diretrizes orientam o planejamento dos Municípios e a aplicação dos instrumentos e institutos previstos no Estatuto da Cidade, disponíveis aos Municípios enfrentarem os problemas de desigualdade social e territorial.

Além das diretrizes, o Estatuto da Cidade elencou os princípios da função social da propriedade, das funções da Cidade e da gestão democrática, como bases de planejamento e execução de toda a política urbana, e elencou os instrumentos de garantia de cumprimento à função social da propriedade, como a exigibilidade do Plano Diretor, os instrumentos do parcelamento e edificação compulsória de imóveis urbanos, o Imposto sobre a Propriedade Urbana Progressivo no Tempo – IPTU, a desapropriação para fins de reforma urbana; os instrumentos de regularização fundiária (também para garantia da função social da propriedade), como o usucapião urbano, a concessão de uso especial para fins de moradia

(disposta na Medida Provisória nº 2.220/2002), a concessão de direito real de uso e as Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS; e, finalmente, os instrumentos de planejamento e da gestão democrática da cidade, como os conselhos de política urbana, as conferências da Cidade, orçamento participativo e as audiências públicas.

Conclui-se que, desde a publicação da Constituição Federal de 1988, há uma consistente e coesa produção de normas, diretrizes e princípios de Direito Urbanístico que reforçam o direito à cidade e à moradia, entretanto, por interferirem diretamente na propriedade, seja ela particular ou pública, sua consolidação caminha fazendo contraponto às práticas nocivas de uso e ocupação do solo, da especulação imobiliária, a concentração e a segregação social e territorial. Em sua maturidade, espera-se que o Direito Urbanístico abra um caminho para cidades mais justas, onde o conceito da função social da propriedade seja uma realidade e o direito à moradia adequada seja garantido a todas as pessoas sem distinção, e como alcance ao direito fundamental à cidade.

Os mandamentos de Direito Urbanístico relacionados a seguir serão aqueles relacionados ao direito à cidade e, em especial, ao direito à moradia e sua exigibilidade:

O direito à cidade

É um direito fundamental, sendo assim reconhecido pelo Estatuto da Cidade, que regulamentando os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece a garantia do direito a cidades sustentáveis. A trajetória do direito à cidade remete à decada de 1960, quando as primeiras ideias sobre o direito à cidade como um direito humano começam a ser desenvolvidas, inicialmente na França, a partir das formulações de Henri Lefebvre, para quem o direito à cidade (não a cidade arcaica, mas a centralidade), em relação aos trabalhadores, encontrava-se em formação assim como o Direito do Trabalho39, e no Brasil, com as lutas sociais pela reforma urbana iniciadas na mesma década, que reivindicavam reformas estruturais no trato das questões fundiárias brasileiras. Em decorrência do regime militar que afundou o Brasil numa ditatura militar que durou de 1964 a 1986, estes temas não puderam ser colocados ampla e publicamente em debate, reaparecendo com força na Assembleia Constituinte.

Esta experiência brasileira, de institucionalizar uma ideia política de cidade inclusiva, foi decisiva para a inclusão do direito à cidade em Fóruns em Conferências Internacionais,

dos quais se destacam o Tratado “Por Cidades, Vilas e Povoados, Justos, Democráticos e Sustentáveis”, elaborado para a Conferência da Sociedade Civil Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento durante a Conferência das Nações Unidas Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, a ECO 92; e os temas da Conferência das Nações Unidas sobre Assentamentos Humanos, Habitat-II, realizada em Istambul em 1996: “Adequada Habitação Para Todos” e o “Desenvolvimento de Assentamentos Humanos em um Mundo em Urbanização”. Esta última Conferência, além de ser um espaço para a construção do direito à cidade em âmbito internacional, ainda reconheceu o direito à moradia como um direito humano, influenciando no Brasil para a promulgação da Emenda Constitucional 26 de 2000, que inclui o direito à moradia aos direitos sociais.40

Segundo a Carta Mundial pelo Direito à Cidade41, o direito à cidade se define como o

usufruto equitativo das cidades dentro dos princípios da sustentabilidade e da justiça social, compreendendo o direito coletivo dos habitantes das cidades em especial dos grupos vulneráveis e desfavorecidos, conferindo-lhes legitimidade de ação e de organização, baseado nos usos e costumes, com o objetivo de alcançar o pleno exercício do direito a um padrão de vida adequado.

O direto à moradia

Em âmbito internacional, a moradia é um direito humano reconhecido e protegido em diversos documentos internacionais e tem como fundamento o direito a toda pessoa manter um nível adequado de vida, com dignidade, como prevê o artigo XXV da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

No contexto subjetivo, este direito fundamental legitima a pretensão do seu titular, individualmente, protegendo-o no caso de uma restrição. No contexto objetivo, este direito fundamental representa uma garantia social coletiva, o que implica proibir restrições à sua eficácia, neste sentido, a proteção deste direito implica, também, em ações estatais que fomentem sua realização.

As condições de eficácia do direito à moradia também podem se agrupar em dimensões negativa e positiva. A dimensão negativa significa que ninguém pode ser privado

40SAULE JÚNIOR, Nelson. Direito Urbanístico: vias jurídicas das políticas urbanas. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2007. p. 36.

41A Carta Mundial pelo Direito à Cidade origina-se no Fórum Social das Américas, realizada em Quito, 2004, e é fruto da organização de um conjunto de movimentos populares, organizações não governamentais, associações profissionais, fóruns e redes nacionais e internacionais da sociedade civil.

do direito à moradia e nem impedido de conquistar uma moradia, importando na abstenção do Estado. É a posição de defesa. A dimensão positiva importa no direito a ter uma moradia adequada. É no dizer de José Afonso da Silva42“um direito positivo de caráter prestacional, porque legitima a pretensão do seu titular à realização do direito por via de ação positiva do Estado”.

O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais (PIDESC), dotado pela Resolução nº 2200 (XXI) da Assembleia Geral das Nações Unidas de 16 de dezembro de 1966, e ratificado pelo Brasil em 24 de janeiro de 1992, estabelece no artigo 11:

Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de todas as pessoas a um nível de vida adequado para si próprio e para as suas famílias, incluindo alimentação, vestuário e moradia adequados, assim como um melhoria contínua de suas condições de vida. Os Estados Partes tomarão medidas apropriadas para assegurar a concretização deste direito reconhecendo nesse sentido, a importância essencial de uma cooperação internacional fundada no livre convencimento.43

O direito à moradia propõe um conteúdo. O Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais – um órgão instituído pela Organização das Nações Unidas, em 20 de maio de 1997, editou o Comentário Geral nº 4, a partir do artigo 11 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, detalhando o conceito de habitação adequada, uma vez que o problema das condições de habitação não são observadas apenas em países em desenvolvimento, estando presente em sociedades economicamente desenvolvidas. Estimando a existência de mais de 100 milhões de pessoas desalojadas ou vivendo em habitações inadequadas.

O sentido do Comentário Geral nº4 – entendendo que o direito à habitação não deve ser interpretado num sentido limitado ou restrito, equiparando-o a apenas um abrigo ou teto ou a uma mercadoria – é de que a moradia adequada deve ser estabelecida para viver com segurança, paz e dignidade. O sentido do Comentário é de que em primeiro lugar, o direito à habitação está diretamente ligado a outros Direitos Humanos e aos princípios fundamentais subjacentes às premissas do Pacto. Esta “dignidade inerente da pessoa humana”, exige que o termo “habitação” seja interpretado de forma a ter em conta, acima de tudo, que o direito à moradia deve ser garantido a todas as pessoas, independentemente dos seus rendimentos ou acesso a recursos econômicos. Em segundo lugar, a referência no artigo 11 do PIDESC deve

42Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 315.

43Conforme Nelson Saule, “os países que concordam e assinam estes documentos internacionais assumem responsabilidades com a comunidade internacional para proteger e tornar concretos esses direitos humanos. As responsabilidades, no caso das declarações como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, resultam em compromissos políticos e éticos. As convenções, tratados e pactos resultam em deveres e obrigações legais” (Direito à cidade: trilhas legais para o direito às cidades sustentáveis. São Paulo: Max Limonad, 1999. p. 325).

ser interpretada e aplicada não só à moradia, mas a moradia adequada. Deste modo, a Comissão sobre os Assentamento Humanos adotou como a Estratégia mundial de comunicação a seguinte afirmativa: A habitação condigna significa privacidade, espaço, segurança, iluminação, ventilação e infra-estruturas básicas adequados, localização adequada em relação ao local de trabalho e facilidades básicas – e tudo isso a um preço razoável.

Nessa linha, o Comentário Geral nº 4 traçou, então, aspectos que identificam a habitação condigna ou adequada que incluem: a) garantia legal da ocupação; b) disponibilidade de serviços, materiais, facilidades, e infraestrutura; c) custo compatível; d) habitabilidade; e) acessibilidade; f) localização; e g) adequação cultural.

Ao final do Comentário, o Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais reconhece os Estados que estabelecem o direito à moradia em seus textos constitucionais, dispondo-se a conhecer o significado jurídico e prático desta abordagem legal. Conclui afirmando que menos de 5% de todo auxílio internacional tem tradicionalmente sido dirigido para a habitação e assentamentos humanos, e muitas vezes a forma como esse financiamento é concedido é insuficiente para satisfazer as necessidades de moradia de grupos desfavorecidos. Neste sentido, os Estados-Partes, tanto os que recebem como os que doam recursos financeiros, devem assegurar a canalização de uma proporção substancial do financiamento para a criação de condições conducentes a uma habitação condigna a um maior número de pessoas.44

As conferências da ONU também são importantes por estabelecerem conceitos e imporem compromissos internacionais ainda que morais. A Declaração sobre Assentamentos Humanos de Vancouver, aprovada na I Conferência da ONU sobre Assentamentos Humanos, realizada em Vancouver em 1973, afirma em seu texto:

Habitação adequada e serviços são um direito humano básico, pelo qual coloca como obrigação a realização destes para todas as pessoas, começando com assistência direta para os menos favorecidos através de programas de ajuda mútua e de ações comunitárias. Os governos devem se empenhar para remover todos os obstáculos que impeçam a realização destas metas. De especial importância é a eliminação da segregação social e racial, através da criação de comunidades mais equilibradas, com a combinação de diferentes grupos sociais, ocupações, moradias.45

44OFFICE OF THE UNITED NATIONS HIGH COMMISSIONER FOR HUMAN RIGHTS. Geneva, Switzerland, 13 dez. 1991. The right to adequate housing (Art. 11, 1). CESCR General Comment 4 (General Comments). Disponível em:

<http://www.unhchr.ch/tbs/doc.nsf/(Symbol)/469f4d91a9378221c12563ed0053547e?Opendocument>. Acesso em: 22 mar. 2012.

45 SAULE JÚNIOR, Nelson. Fichas da Agenda Habitat, In SAULE JÚNIOR, Nelson (coord).Direito à cidade: trilhas legais para o direito às cidades sustentáveis. São Paulo: Max Limonad, 1999. p. 326.

Também a Agenda 21, adotada durante da a I Conferência ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio 92, contém o seguinte anunciado:

O acesso a uma habitação sadia e segura é essencial para o bem estar econômico, social psicológico e físico da pessoa humana e deve ser parte fundamental das ações nacionais e internacionais (...) O direito à moradia é um direito humano básico, que está inserido na Declaração Universal dos Direitos Humanos, e no Pacto Internacional de Direitos Econômicos Sociais e Cultura, e estime que pelo menos um bilhão de pessoas não têm acesso a uma habitação sadia e segura.46

E, em 1996, na II Conferência da ONU sobre Assentamentos Humanos, Habitat II, realizada na cidade de Istambul, o direito à moradia é reafirmado nos seguintes parágrafos:

Parágrafo 26:

[...] nos reafirmamos e somos guiados pelos propósitos e princípios da Carta das Nações Unidas e reafirmamos nosso compromisso de assegurar a plena realização dos direitos humanos a partir dos instrumentos internacionais em particular neste contexto o direito à moradia disposto na Declaração Universal de Direitos Humanos, e provido pelo Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, a Convenção Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, a Convenção sobre Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher e a Convenção Sobre os Direitos da Criança, levando em conta que o direito à moradia incluído nos instrumentos internacionais acima mencionados deve ser realizado progressivamente. Nós reafirmamos que todos os direitos humanos – civis, culturais, econômicos, políticos e sociais – são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados [...].

Parágrafo 39:

[...] nós reafirmamos nosso compromisso para a plena e progressiva realização do direito à moradia, provido por instrumentos internacionais. Neste contexto, reconhecemos a obrigação dos Governos de capacitar as pessoas para obter habitação e proteger e melhorar as moradias e vizinhanças. Nós nos comprometemos com a meta de melhorar as condições de vida e de trabalho numa base sustentável e equitativa, pelo qual todos terão adequada habitação sadia, segura, protegida, acessível, e disponível e que inclui serviços básicos, facilidades e amenidades, e o gozo de liberdade frente a discriminações de moradias e segurança legal da posse. Nós devemos implementar e promover este objetivo de maneira plenamente consistente com as normas de direitos humanos [...].

46SAULE JÚNIOR, Nelson. Fichas da Agenda Habitat, In SAULE JÚNIOR, Nelson (coord) Direito à cidade: trilhas legais para o direito às cidades sustentáveis. São Paulo: Max Limonad, 1999. p. 326. p. 327.

Parágrafo 61:

Desde a adoção da Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, o direito à moradia tem sido reconhecido com um importante componente do direito a um nível adequado de vida. Todos os governos sem exceção, têm responsabilidade no setor de habitação, como por exemplo através da criação de ministérios de moradia ou agências, através da alocação se fundos para o setor de moradia e por suas políticas, programas e projetos. 47

É notável a força normativa do direito fundamental à moradia, mas talvez o fato deste direito envolver o acesso à terra e à propriedade faça de sua exigibilidade e controle de acesso uma tarefa difícil. Inobstante esta correlação de forças, nem o Poder Público nem o particular podem relativizar estes direitos sociais, que são inerentes ao exercício da dignidade humana e a moradia encontra-se neste rol.

Para além do direito individual, o direito coletivo à moradia pode revelar o direito à cidade com maior intensidade, eis que o seu déficit não é medido apenas quantitativamente, mas qualitativamente também, ou seja, a inobservância do direito à cidade pode ser medida pela ausência de regularização fundiária e urbanística de muitos de seus assentamentos, assim como a falta de infraestrutura urbana e mobilidade. Portanto a baixa qualidade dos assentamento e falta de saneamento afetam toda cidade e não somente o núcleo carente.

Princípio da função social da cidade

A Carta de Atenas48 de 1933 define a cidade como parte de um conjunto econômico, social e político que constitui a região, e classifica como funções essencialmente urbanas: habitar, trabalhar, recrear e circular. A Carta Mundial pelo Direito à Cidade, mais recente, denomina cidade toda vila, aldeia, capital, localidade subúrbio, município, povoado organizado institucionalmente como uma unidade local de governo de caráter Municipal ou Metropolitano, e que inclui as proporções urbanas, rurais ou semirrural de seu território, cujo usufruto é conferido a todos os seus habitantes permanentes ou transitórios. Para José Afonso da Silva49, cidade é o núcleo urbano qualificado pelo conjunto de sistemas político- administrativo, econômico não agrícola, familiar e simbólico como sede do governo municipal qualquer que seja sua população. Rogério Gesta Leal entende a cidade “não apenas como um lugar no mapa da sociedade nacional”, segundo o autor, na cidade se concentram as

47SAULE JÚNIOR, Nelson. Fichas da Agenda Habitat, In SAULE JÚNIOR, Nelson (coord). Direito à cidade: trilhas legais para o direito às cidades sustentáveis. São Paulo: Max Limonad, 1999. p. 327-330.

48A Carta de Atenas, de 1933, é produto do 4º Congresso Internacional de Arquitetura Moderna, realizado em Atenas, Grécia. Disponível em:

<http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=233>. Acesso em: 20 mar. 2012 49Direito Urbanístico Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 26.