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O Brasil não é um dos campeões em gastos sociais

4. A SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRA E A QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA 1 ORIGEM E DESENVOLVIMENTO DA PROTEÇÃO SOCIAL NO BRASIL

4.6 CRÍTICA À ABORDAGEM NEOLIBERAL SOBRE A PREVIDÊNCIA SOCIAL Alguns argumentos são plausíveis em se tratando das necessidades de uma reforma

4.6.1 O Brasil não é um dos campeões em gastos sociais

Muitas análises promovidas pelos reformistas da Previdência Social a qualquer custo tentam convencer que o Brasil é um dos “campeões” em gastos sociais em âmbito mundial e que isso seria um contrassenso. No entanto, esse tipo de consideração não condiz com a realidade (tabela 5).

Quando se trata de comparar a previdência brasileira às suas congêneres no escopo internacional, (...) é possível destacar que o cenário brasileiro, ao contrário do que vem sendo divulgado pela maior parte da mídia, é coerente com o tipo de mercado de trabalho que foi construído pela trajetória social do país. Além disso, os gastos brasileiros não podem ser comparados aos países da OCDE sem ponderar uma série de especificidades que alteram a substância dos argumentos apresentados pela mesma mídia (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007a, P. 153).

Tabela 5: Gastos sociais em porcentuais do PIB – 2006

“Outro falso argumento utilizado é que o ‘Brasil gasta como país rico’ (...) um patamar fora dos parâmetros internacionais. (FAGNANI, 2007a, p. 20). Considerando a tabela acima, percebesse que o Brasil está longe de possuir os gastos públicos mais elevados44.

Também é preciso destacar, conforme aponta a OIT (2002), que alguns países optam soberanamente por gastar mais do que outros para equacionar os seus problemas sociais. Os países escandinavos, por exemplo, possuem gastos sociais elevados. Mas, (...) continuam sendo muito atrativos para investimentos de capital, pois há baixo nível de conflito social e essas sociedades são marcadas pela grande previsibilidade institucional para incentivar iniciativas de longo prazo, sem falar da elevada qualificação dos trabalhadores (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007a, p. 169).

Além dessa visão equivocada de que os gastos sociais públicos são elevadíssimos, outra ideia muito difundida é de que as despesas com benefícios cresceram a taxas elevadas e que a continuidade desse ritmo colocará em risco as contas públicas. Fagnani (2007b) reconhece que a despesa previdenciária elevou-se em proporção do PIB, passando de 2,5% para 7% entre 1988 e 2006, porém o autor esclarece o porquê desse aumento. Isso decorreria da montagem de um razoável sistema de Proteção Social, com a entrada em vigor dos novos direitos assegurados pela Constituição de 1988; do baixo crescimento da economia nesse período; da “corrida” às aposentadorias, em virtude da perspectiva de nova reforma que esteve na pauta do Congresso entre 1995-98; e do impacto da recuperação real do salário mínimo sobre o piso dos benefícios.

O Brasil gasta muito em aposentadorias? A proporção gasto/PIB (7%) indica que não transgredimos os padrões internacionais. Nem sequer se pode afirmar que o gasto social brasileiro seja elevado. Estudos da Cepal (2006) indicam que o gasto social por habitante na Argentina é o dobro. Também ficamos atrás de Panamá, Chile, Costa Rica, Cuba e Uruguai. (FAGNANI, 2007a, p. 20).

Fagnani ainda esclarece que o crescimento dos gastos previdenciários não deve se tornar “explosivo”. Isso se explicaria devido ao fato da reforma da Previdência de 1998 ter tornado as regras da aposentadoria mais severas; em decorrência da política de valorização do salário mínimo e do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) terem atrelado os reajustes

44 Partindo da metodologia da OCDE, os gastos totais reúnem no núcleo previdenciário as despesas com idade

avançada, morte prematura do segurado titular, invalidez ou doença. Além do chamado núcleo previdenciário, segundo as definições em vigor no Brasil, se associam os gastos com saúde, transferências para famílias (como o salário família, o bolsa família e as despesas decorrentes da LOAS - Lei Orgânica de Assistência Social, de 1996), seguro-desemprego (benefícios tipicamente previdenciários, mas que recebem outro tratamento no debate local), habitação e programas de ativação do emprego. (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007a, P. 155).

do salário mínimo à variação do PIB; e em função da real possibilidade da metade da PEA (desempregados e informais) terem dificuldades futuras para comprovar contribuição mínima exigida. Fagnani destaca ainda que opções macroeconômicas adequadas podem promover maior crescimento econômico capaz de melhorar consideravelmente as contas da Seguridade Social e, automaticamente, da Previdência. (FAGNANI, 2007b, p. 60).

Em relação aos benefícios assistencialistas, cabe destacar que a sua programação dentro da Seguridade é muito ampla e dispersa, com ações e programas espalhados nos diversos órgãos. Nos termos constitucionais, os benefícios da Assistência Social no Brasil devem atender ao pressuposto da necessidade, com critérios objetivos que focalizam os segmentos sociais que demandam ações específicas do Estado. Entre os principais benefícios assistenciais no Brasil destacam-se a LOAS45, a RMV46 e os demais benefícios de transferência de renda, que compõem o conjunto do Bolsa-Família47.

De acordo com Castro et al (2007) as despesas com a LOAS e a RMV saíram de apenas R$ 250 milhões em 1996 para R$ 9,8 bilhões em 2005. No início do período, o RMV, sozinho, atendia 1,2 milhões de pessoas. Em 2005, os agraciados pelo Benefício de Progressão Continuada (BPC/LOAS), somados aos beneficiários ainda remanescentes do RMV, totalizavam 2,8 milhões de pessoas.

Como visto anteriormente, entre esses benefícios assistencialistas a LOAS é a mais questionada pelos defensores da redução da Seguridade Social brasileira. As críticas dizem respeito ao peso desses benefícios nas despesas da Seguridade Social, principalmente devido aos repasses dos reajustes reais do salário mínimo verificados nos últimos anos, e sobre uma suposta tendência ao incentivo à informalidade das relações de trabalho, reduzindo a base de arrecadação do sistema, pois indivíduos que possuem renda em torno de 1 salário mínimo não teriam qualquer incentivo para se filiar ao INSS, pois receberiam o mesmo valor, seja como segurado ou como beneficiário da LOAS.

Para Matijascic, Ribeiro e Kay (2007b) esse mito precisa ser combatido, pois não é qualquer pessoa que pode ter acesso ao benefício da LOAS. De acordo com os autores, uma

45 Lei Orgânica da Seguridade Social que estabelece benefícios deferidos aos idosos e portadores de

necessidades especiais que se enquadram num critério de necessidade calculado a partir da renda familiar per capita.

46 Renda Mensal Vitalícia que corresponde a um salário mínimo mensal derivada de disposição legal que visa

reconhecer situação fática anterior à Constituição de 1988, sendo hoje considerada um benefício em extinção, pois seu público alvo vem sendo atendido por outros benefícios.

47 Benefícios deferidos a grupos sociais como: jovens em situação de vulnerabilidade e/ou risco social; famílias

em condição de extrema pobreza, no intuito de garantir a segurança alimentar e combater as carências nutricionais; crianças e adolescentes em situação de trocar a escola pelo trabalho; crianças, adolescentes e familiares vítimas de violência, abuso e exploração sexual; além de famílias que necessitam de proteção social especial.

análise da legislação revela que são elegíveis apenas os idosos com mais de 65 anos ou as pessoas com deficiência física ou mental pertencentes a famílias com renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo vigente. “Trata-se, portanto, de um benefício que requer teste de meios” (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007b, p. 275).

Outro problema dessa argumentação é o de não considerar que os direitos dos trabalhadores do setor formal não se limitam apenas ao benefício à aposentadoria. Um trabalhador assalariado formal, ao longo da sua vida de trabalho, tem direito ao seguro- desemprego, férias remuneradas, 13º salário entre outros diversos benefícios. Em suma, é muito melhor ser trabalhador formalizado, independentemente do salário.

Desde a criação do Sistema de Seguridade Social no Brasil, em 1988, e à medida que, ao longo da década de 90, regulamentou-se um conjunto importante de benefícios previdenciários e assistenciais, de impacto redistributivo evidente e significativo, o debate acerca da adequação dos benefícios sem base contributiva integral (previdência rural) ou não- contributivos (BPC) continua fortemente polarizado. Essa é uma das vertentes que toma a disputa em torno ao grau e padrão de redistribuição que almejamos como sociedade (LAVINAS e CAVALCANTI, 2007, p. 248).

4.6.2 O envelhecimento da população não é o problema da Previdência Social brasileira

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