• Nenhum resultado encontrado

A reforma da Previdência no governo Lula

4. A SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRA E A QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA 1 ORIGEM E DESENVOLVIMENTO DA PROTEÇÃO SOCIAL NO BRASIL

4.4 AS REFORMAS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA

4.4.2 A reforma da Previdência no governo Lula

Com a posse do presidente Luís Inácio Lula da Silva, em 2003, a imprensa, de um modo geral, desencadeou um novo movimento a favor do aprofundamento da reforma da Previdência, iniciada pelo governo FHC, em 199838.

Mais uma vez, a imprensa apontava o suposto déficit da Previdência como o principal elemento de desequilíbrio das contas públicas. O “déficit” seria causado pela queda do número de contribuintes em relação aos beneficiários inativos, pelos privilégios existentes no sistema, pela incorporação à conta da Previdência de benefícios assistenciais não contributivos, ou, especialmente, pela aposentadoria integral do servidor público39.

Em abril de 2003, foi encaminhada a proposta de reforma da Previdência formulada pelo governo Lula ao Congresso Nacional. Essa previa, inicialmente, a adoção de um regime único para o setor privado e público, teto único, aposentadoria complementar por meio de fundos de pensão, contribuição de 20% sobre o faturamento e não sobre a folha salarial das

38 Para saber mais sobre o papel da imprensa na discussão sobre a reforma da Previdência Social ver Dugnani

(2008).

39 Segundo Silva (2004b), a imprensa conservadora, de linha neoliberal, insiste na visão negativa do sistema

previdenciário público de repartição e tenta convencer que a noção de mérito individual, onde cada trabalhador financia seu próprio futuro e recebe de acordo com suas contribuições, é a melhor opção. Defensora da lógica mercantil, a imprensa prega o regime de capitalização e exige que o Estado faça a reforma e promova o ajuste fiscal de suas contas para que continue honrando seus compromissos em relação às suas dívidas interna e externa, faça o risco-país cair, reduza os juros e seja capaz de reativar o crescimento econômico.

empresas, regra de transição para os trabalhadores já inscritos no sistema previdenciário e contribuição para os inativos.

Após meses de debates polêmicos e pressões variadas por parte de entidades de classe, governadores e do próprio Congresso Nacional, o relatório final da comissão parlamentar definiu alguns pontos da emenda que seria levada à votação: a) foi estabelecida a aposentadoria integral desde que cumpridos os requisitos de dez anos na carreira, 20 anos de serviço público, 35 anos de contribuição para homens e 30 anos para mulheres, 60 anos de idade para aposentadoria para homens e 55 anos para mulheres; b) ficou definido que o benefício seria calculado pela média das contribuições para os servidores que não cumprissem as exigências para a aposentadoria integral; c) criou-se um teto salarial e de aposentadoria para a União, para os estados e municípios, um subteto salarial igual ao salário do chefe de cada um dos três Poderes, e, para o Judiciário estadual, teto de 75% do salário do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF); d) foi estabelecido um teto salarial para a aposentadoria de ingressantes no serviço público e trabalhadores da iniciativa privada; e) ficou definida a aposentadoria complementar por meio de fundos de pensão; f) extinguiu-se a aposentadoria proporcional para servidores que ingressaram até 1998; g) foi estabelecida a idade mínima de 55 anos para as mulheres e 60 anos para os homens solicitarem suas aposentadorias; h) ficou estipulado um limite para pensões integrais e um desconto de 30% sobre a parcela excedente; i) determinou-se o fim da paridade e correção dos benefícios pela inflação para servidores que não cumprirem requisitos para aposentadoria integral; j) foi estipulada a paridade parcial para aposentadorias integrais com correção restrita ao salário-base; k) ficou definida a contribuição de 11% de inativos atuais e futuros sobre a parcela de benefícios superior a um teto estabelecido, tanto para os servidores como para os trabalhadores do setor privado; e l) foi estabelecida a alíquota mínima de contribuição de 11% para União, estados e municípios.

O texto enviado para o Congresso Nacional composto pelos itens apresentados passou por alterações. Após a votação em 2º turno foram definidos os seguintes pontos: a) foi estabelecido um redutor de 5% para cada ano até o máximo 35% para aqueles que quisessem se aposentar a uma idade que respeitasse a idade mínima anteriormente prevista – 53 e 48 anos para homens e mulheres, respectivamente – mas antes dos novos limites de 60 e 55 anos; b) definiu-se um aumento do subteto do Judiciário estadual para 90,25% do salário do ministro do STF; c) foi implantada a exigência de permanência de cinco anos no último cargo para aposentadoria integral; d) ficou definido o aumento de 70 para 75 anos de idade para aposentadoria compulsória a partir de 2012; e) estabeleceu-se um teto de 10 salários mínimos para futuros pensionistas e desconto de 30% sobre a parcela excedente; f) foi implantada a

contribuição de 11% sobre a parcela da aposentadoria ou pensão dos inativos que exceder o valor de 5 salários mínimos, no caso dos estados e municípios, e um pouco acima desse valor, 5,8 salários mínimos, no caso da União; g) para os atuais servidores o teto de isenção, quando se aposentarem, foi estabelecido em 10 salários mínimos; h) ficou determinado um teto de 10 salários mínimos para a aposentadoria do INSS; i) foi determinado que os fundos de pensão40 fossem fechados, públicos e com contribuição definida (quando o beneficiário sabe o quanto deve pagar, mas não o quanto receberá ao se aposentar); j) definiu-se que militares e policiais militares de todos os estados devem ter projeto específico de reforma; e k) modificou-se a fórmula de cálculo do benefício do servidor público, possibilitando que o mesmo fosse feito com base na média dos salários de contribuição, em moldes similares ao que ocorre no RGPS após a reforma de FHC e não mais com base no salário de final de carreira.

Em dezembro de 2003, após o Senado promover algumas modificações pontuais no texto original da reforma, foi promulgada pelo Congresso Nacional a Emenda Constitucional nº. 41. Além dos aspectos acima descritos, o texto estabeleceu a contribuição dos inativos, servidores ou não, e aumentou a idade mínima para a aposentadoria, sendo 60 anos para homens e 55 para mulheres.

Entre os pontos aprovados na reforma de Previdência no início do primeiro mandato do governo Lula, a extinção da aposentadoria integral foi a que mais causou polêmica, principalmente no que diz respeito à noção de direito. Esteve em questão principalmente a irretroatividade da lei. Segundo Silva (2004b), criou-se então uma sensação de instabilidade das regras com a violação de princípios constitucionais. Dessa forma, o afrouxamento da noção de direito, base de um Estado democrático, mostrou a fragilidade de um contrato social em função das exigências da política econômica e fiscal. Com a aprovação da reforma previdenciária de 2003, além da manipulação da noção de direito, promoveu-se o nivelamento por baixo dos direitos sociais e a proteção dos custos do capital, isentando-os de tributos e contribuições através de renúncias fiscais.

As amplas modificações imputadas na Previdência Social nas reformas dos governos FHC e Lula provocaram reações diferentes por parte dos envolvidos nesse debate. Os defensores de um estado mínimo esperavam mudanças mais profundas e passaram a fazer pressão por uma futura nova reforma, apontando uma série de problemas que acreditam persistir no sistema previdenciário, entre os quais as regras de aposentadoria bastante “benevolentes” do INSS; o fato de a idade mínima ser baixa em termos de comparações

40 Os fundos de pensão dos servidores públicos, criados com a reforma de 2003, ainda não foram

internacionais; e a exceção feita aos professores do sexo feminino que vão poder continuar a se aposentar com apenas 50 anos (GIAMBIAGI et al, 2004, p. 5).

(...) se a reforma for encarada como um passo de uma sequência de mudanças constitucionais e legais, terá sido uma estratégia correta. Se, contudo, for vista como uma reforma estrutural, após a qual o Estado poderá considerar que estará dispensado de modificar as regras de aposentadoria pelos próximos 10 ou 20 anos, terá sido claramente insuficiente (GIAMBIAGI et al, 2004, p. 8).

Para os apoiadores do Estado de Bem-Estar Social, as alterações das regras previdenciárias imprimiram a redução drástica da ação do Estado nesse campo da Seguridade Social, com a possibilidade de causarem imensas perdas sociais.

As atuais regras de idade mínima para a aposentadoria já são extremamente elevadas para a realidade brasileira. São superiores às de países desenvolvidos com realidade socioeconômica e demográfica que são infinitas vezes superiores à brasileira. A adoção de regras ainda mais excludentes, representará caminho acelerado para o aprofundamento da pobreza, da desigualdade social e para a concentração da renda. Com a reforma (...), teremos uma massa de velhos desprotegidos que estarão nas ruas pedindo esmolas nas próximas décadas. Fazer um novo ciclo de reformas conservadoras vai antecipar ainda mais esse processo (FAGNANI, 2007a, p. 12).

A reforma, na verdade, caracterizou-se por ser mais um passo decisivo na destruição do Estado (processo iniciado no governo Collor), desconsiderando completamente a necessidade da promoção da universalização da cobertura do risco-velhice e adotando a agenda do FMI, do Banco Mundial e dos arautos do capital financeiro com relação aos fundos de pensão (MARQUES e MENDES, 2004). A promoção de novas reformas que visa à contenção de custos foi mantida no debate nacional para reforçar os compromissos com os mercados financeiros internacionais e a redução do papel do Estado. (MATIJASCIC, RIBEIRO e KAY, 2007b, p. 271).

Apesar de ser parcialmente desfigurada, principalmente em relação à Previdência, a Seguridade Social brasileira ainda conseguiu manter boa parte das conquistas elementares previstas na Constituição de 1988.

A Seguridade Social, apesar de todos os percalços a que esteve submetida ao longo de todos esses anos, demonstrou vitalidade e capacidade de materializar direitos sociais, financiar ações e serviços públicos nas áreas de Previdência Social, Saúde e Assistência Social (ANFIP, 2009, p. 10).

4.5 O DIAGNÓSTICO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA NA

Outline

Documentos relacionados