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A urgência de regulação financeira

3. A MUNDIALIZAÇÃO FINANCEIRA E A PREVIDÊNCIA SOCIAL

3.1 A MUNDIALIZAÇÃO FINANCEIRA NA PERSPECTIVA DA ECONOMIA POLÍTICA

3.1.5 A urgência de regulação financeira

A sociedade está diante de uma nova correlação de forças que impulsionou a financeirização da economia do cenário local para o mundial. Dessa maneira, ela se vê diante de desafios novos dentro de uma nova realidade. Entre os desafios mais iminentes destaca-se a necessidade de se criar novas formas de regular o sistema financeiro internacional, pois a regulação como vem sendo exercida está amplamente ultrapassada. A organização do mercado financeiro, associado às corporações, instituições financeiras, mídia e o mundo do

25 Jean de Maillard, citado acima, é um juiz francês que investiga os fluxos financeiros ilegais, e elaborou um

interessante atlas do dinheiro: Un Monde Sans Loi: la criminalité financière en images, Ed. Stock, Paris, 1998. O livro é dedicado a 26 magistrados assassinados ao pesquisar este tipo de fluxos financeiros.

crime, que relegam a segundo plano os interesses da sociedade, exige, urgentemente, a criação de um sistema de regulação internacional que não poupe esforço de coordenação global a fim de se responder os interesses do desenvolvimento da sociedade de médio e longo prazo, nos planos econômico, social e ambiental.

Diante dessa realidade, muitos autores têm enfatizado a necessidade de se construir um sistema de regulação mais adequado para o mercado financeiro. A sociedade está diante de um processo onde “o dogma da liberalização se transforma num fim em si mesmo, e não num meio de se chegar a um sistema financeiro melhor” (STIGLITZ,1998, p.12). Os sistemas financeiros, entregues a si mesmos, não fazem um bom trabalho no desempenho daquilo que seriam suas funções. A questão-chave deveria ser a construção da estrutura regulatória que garanta um sistema financeiro efetivo.

(...) as políticas propostas pelo Consenso de Washington são bastante incompletas e algumas vezes equivocadas. Fazer os mercados funcionarem exige mais do que apenas uma inflação baixa, exige uma ordem financeira sólida, uma política de incentivo à competição e políticas que facilitem a transferência de tecnologia, e transparência, para citar alguns pontos fundamentais deixados de lado pelo Consenso de Washington (STIGLITZ,1998, p.3).

Se um bom sistema financeiro é o “cérebro” da economia capitalista, pois tem papel importante no recolhimento e na agregação de poupança de agentes que têm hoje recursos excedentes, que são distribuídos a outros (empresários) que podem fazer usos produtivos deles; um sistema financeiro que funciona mal, em contrapartida, trás uma série de problemas para a economia como um todo. Portanto, uma estrutura legal saudável, associada à regulamentação e à fiscalização, é necessária para amenizar problemas e para desenvolver boas condições para a economia como um todo.

Stiglitz acredita que a construção de sistemas financeiros sólidos vai além de simplesmente evitar crises econômicas ao manter a segurança e a solidez dos mercados e da nação, pois as regulamentações dos mercados financeiros bem-sucedidos servem ainda para proteger os consumidores e garantir que grupos pouco privilegiados tenham algum acesso ao capital.

Portanto, a regulamentação do mercado financeiro é essencial. Ela deve ser fundamentalmente política e a responsabilidade de sua gestão é necessariamente intergovernamental. Não existe nenhum outro meio de criar “uma estrutura ordenada das

taxas de câmbio, de um lado, e de regular a liquidez global em função da demanda de meios de pagamentos internacionais, do outro” (CHESNAIS, 2007).

Um balanço um pouco mais analítico das “realizações” das finanças desregulamentadas, nas quais os danos causados superam de maneira tão evidente os serviços prestados, deveria ao menos convencer da urgência de se quebrar algumas de suas engrenagens. Ao contrário do que dizem, não faltam ideias em relação a esta questão. A Taxa Tobin é uma delas. Sugerida em 1972 pelo Nobel de Economia James Tobin, consiste em uma taxação das transações monetárias internacionais de modo a desencorajar a especulação. Mas caiu prematuramente no esquecimento. Já o SLAM, um projeto para limitar a rentabilidade acionária máxima, e suprimir com isso os estímulos à exploração cada vez mais intensa dos assalariados, é outra dessas idéias. Uma política monetária desmembrada, que financie por meio de taxas de juros diferenciadas a economia produtiva e a economia especulativa, é uma terceira proposta. A exemplo do que foi feito nos Estados Unidos pelo

Glass Steagall Act, a lei adotada em decorrência do desmoronamento dos

anos 1930, por que não considerar a possibilidade de se estabelecer uma separação hermética entre os bancos comerciais e os bancos de investimento? O princípio da separação estanque tem como propriedade atenuar sensivelmente a transmissão dos desastres financeiros para a economia real, que se dá por intermédio do canal do crédito (LORDON, 2008).

Esta seção começou a partir de uma análise de François Chesnais e terminará com um questionamento realizado por esse mesmo autor. “Será necessário que o sistema capitalista mundial passe por uma crise enorme antes de serem recriados os fundamentos de uma regulação monetária e financeira?” (CHESNAIS, 2007).

Frédéric Lordon também faz questionamentos importantes sobre a atual configuração da crise financeira.

Quem ficaria espantado ao tudo isso acabar em catástrofe? Quem poderia se surpreender, quando o próprio objetivo da desregulamentação financeira é abolir todo entrave à ação dos investidores e devolver-lhes, sem a menor restrição, a mais viciadora das formas do lucro e o mais forte dos poderes: a rentabilidade financeira? (LORDON, 2008)

Pois a economia mundial novamente entrou em crise, aliás, a mais forte delas desde os anos 1930. A essência da atual crise não se diferencia em nada da crise da década de 1930 ou daquelas vivenciadas nas últimas décadas do século XX, afinal, a crise é inerente ao capitalismo. O modo de produção capitalista, mais uma vez movido pela ganância, permitiu a extrapolação do capital portador de juros, expressão máxima do fetiche do capitalismo – dinheiro gerando dinheiro, sem que haja produção – estimulando à criação de capital fictício,

ou seja, de um falso capital que não encontra uma contrapartida na produção. “Levou um longo tempo para se aceitar a idéia de que o mercado financeiro é sistematicamente muito volátil (...) quando as coisas estão indo bem, há uma forte tendência para supor que mercados financeiros podem tomar conta de si mesmos. Bem, eles não podem” (PAUL KRUGMAN apud ANFIP, 2009, p. 7).

O que se verifica de novo na atualidade é que a ocorrência de crises sistêmicas tem sido mais frequente, pois os ciclos de prosperidade se abreviaram. A explicação para tal fato se encontra no processo de mundialização financeira iniciada nos anos 1970, calcada em liberalização da circulação de capitais e desregulamentação dos mercados financeiros, expondo de forma escancarada a fragilidade do modo de produção capitalista.

Nem todas as negações do mundo impedirão que a crise atual apareça tal como é: uma experiência real, que demonstra a nocividade intrínseca de mercados e operadores de mercado livres de qualquer controle. Mas esta experiência não é a primeira do tipo. Quem não se lembra das cenas grandiloqüentes de indelicadeza e fraude proporcionadas pelo crash das empresas de alta tecnologia, em 2000? Do apelo solene das autoridades financeiras à regulação, à transparência, à reintegração das transações que as empresas excluíam de seus balanços? “Nunca mais”, juram toda vez os atores do mundo das finanças, antes de partirem para uma nova rodada. Mas os seus juramentos de bêbados; a idéia de que eles enriquecem de maneira solitária e fabulosa durante a bonança e põem a economia inteira em perigo quando suas imperícias vêm à tona, obrigando os poderes públicos a salvá- los da difícil situação na qual qualquer falido ordinário seria abandonado à sua própria sorte; tudo isso dá vontade de “virar a mesa”, o que parece ser a única solução para que esta seja verdadeiramente a “última rodada” (LORDON, 2008).

Apesar da força da crise financeira atual e os seus impactos inevitáveis sobre o processo de acumulação do capital, a sociedade ainda não está diante do fim do capitalismo. No entanto, este é o momento ideal para que “as forças progressistas de todo o mundo comecem a questionar decisivamente a viabilidade desta forma de organização, de produção, de distribuição e do padrão de consumo a que chegou o capitalismo contemporâneo” (MARQUES e NAKATANI, 2008). Somente uma nova correlação de forças políticas que devolva sentido à economia e a recoloque a serviço dos interesses da sociedade poderá alterar esse quadro de constantes recaídas do sistema capitalista.

3.2 O PAPEL DOS FUNDOS DE PENSÃO E DOS FUNDOS MÚTUOS NO

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