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O envelhecimento da população e as aposentadorias precoces

4. A SEGURIDADE SOCIAL BRASILEIRA E A QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA 1 ORIGEM E DESENVOLVIMENTO DA PROTEÇÃO SOCIAL NO BRASIL

4.5 O DIAGNÓSTICO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA NA PERSPECTIVA NEOLIBERAL

4.5.5 O envelhecimento da população e as aposentadorias precoces

Outro fator explicativo para a diminuição da relação entre o número de contribuintes e o número de beneficiários é a ampliação do tempo em que esses benefícios são pagos aos aposentados. Nesse caso, o fator explicativo é o envelhecimento da população brasileira. Graças a esse fenômeno, a permanência dos aposentados no sistema recebendo benefícios também se prolongou. A expectativa de vida no Brasil passou da casa dos 54 anos em 1950 para os 66 anos em 1991, 68 anos em 2000 e, atualmente, ultrapassa a casa dos 72 anos. Um aumento de mais de 20 anos de vida em comparação aos anos 1950.

O que interessa para a Previdência são os anos de sobrevida que um segurado tem no momento da aposentadoria. O aumento da sobrevida dos que se aposentam resulta na ampliação do tempo de permanência no sistema, sem que haja um número compatível de contribuintes. Ou seja, com o aumento da expectativa de vida e, portanto, com a ampliação do tempo de vida após a aposentadoria, essa relação entre o total arrecadado e os gastos dificulta o pagamento dos benefícios.

A interação desse conjunto de fatores determinou a expansão do gasto com benefícios. Por sua vez, o fraco desempenho do emprego assalariado e do salário real provocou a queda da capacidade de arrecadação da Previdência. (...) No meu entender, o principal responsável pelo fraco desempenho das contribuições tem sido a mudança do mercado de trabalho. (...) Para o futuro próximo, portanto, se não houver crescimento do emprego formal e aumento real dos rendimentos, não haverá, consequentemente, alternativa de financiamento para a Previdência (MARQUES, 1997, p.171).

O Brasil praticamente completou sua transição demográfica com as modificações nos padrões da população ocorridas nos últimos anos, principalmente a redução da natalidade e o aumento da expectativa de vida. A taxa de fecundidade em 1980 era de 4,3 filhos por mulher, em 1991 caiu para 2,4 filhos e, em 2000, atingiu 2,2 filhos – quase a taxa de reposição da população.

Além disso, o Brasil já não pode ser considerado um país jovem. Em 1970, o país tinha 53% de sua população com menos de 20 anos de idade. Em 2000, esse total caiu para 40,1% da população. Nesse mesmo intervalo de tempo, a população idosa, acima de 65 anos, subiu de 3,1% para 4,8%, sendo que a expectativa de vida avançou em torno de 8,5 anos entre 1970 e 2000.

Essas mudanças demográficas que fizeram o Brasil deixar de ser considerado um país jovem balizaram os principais argumentos para promoção da reforma na Previdência. Entretanto, apesar das alterações, a população do Brasil ainda não pode ser considerada velha, como a dos países europeus. Em 2000, cerca de 64% da população brasileira tinha entre 15 e 64 anos, portanto, com idade para trabalhar. Essa realidade seria por si só extremamente positiva para a Seguridade Social e, consequentemente, para a Previdência, desde que esses trabalhadores tivessem condições de exercer atividades formais (MARQUES, BATICH e MENDES, 2003).

Essas novas dinâmicas populacionais, principalmente o aumento da expectativa de vida, geraram novas necessidades em relação à Previdência Social brasileira. Como as pessoas tendem a viver mais, aumenta também o tempo em que elas recebem os seus

benefícios. Esse é um dos motivos que embasou a iniciativa do governo de introduzir o fator previdenciário, de substituir a aposentadoria por tempo de serviço pela de contribuição e de incluir, também, o critério de idade como condição de acesso à aposentadoria daqueles que ingressarem no mercado de trabalho depois da aprovação da lei (MARQUES, BATICH e MENDES, 2003). Vale lembrar que o critério de idade havia sido derrotado no Congresso e que o fator previdenciário foi incorporado como uma forma de introduzir, às avessas, a idade sem que houvesse maiores discussões. No entanto, os defensores da continuidade das reformas previdenciárias apontam para a insuficiência do fator previdenciário como mecanismo único de redução das despesas da Previdência.

Embora a aprovação do chamado “fator previdenciário” tenha sido um passo na direção certa, no sentido de melhorar a situação atuarial da previdência social, o citado fator não evita que os indivíduos continuem se aposentando antes do que ocorre em outros países e sem sofrer perdas significativas (GIAMBIAGI et al, 2004, p. 12).

Nesse sentido, segundo Giambiagi et al, mesmo o fator previdenciário sendo um elemento móvel, ajustado de acordo com o aumento da expectativa de vida, ele apresenta um efeito relativamente modesto. Embora a expectativa de vida ao nascer tenha aumentado substancialmente entre 1970 e 2003 no Brasil, a expectativa de vida de quem chega vivo aos 50 anos mudou muito menos, pouco mais de 1 ano a mais por década no caso dos homens. As mudanças fundamentais “acorreram na redução da mortalidade infantil, fenômeno que, porém, não afeta a expectativa de vida de quem chega aos 50 ou 60 anos de vida” (GIAMBIAGI et al, 2004, p. 15).

É natural que, individualmente, todos queiram se aposentar cedo e com altos valores de benefícios. Entretanto, se todos usufruírem desse direito, a “dívida previdenciária” assim constituída seria impossível de ser honrada pelas gerações futuras, resultando, certamente, em futura instabilidade política ou macroeconômica (GIAMBIAGI et al, 2004, p. 2).

Os reformistas da Previdência Social apontam que a despeito dos argumentos sobre ser justo ou não se aposentar após os 30 anos de contribuição para mulheres e 35 anos para homens, a questão central é a incapacidade de se obter recursos fiscais para manter tal prática. “A benevolência da legislação brasileira em relação às aposentadorias precoces fica ainda mais patente no caso das mulheres” (GIAMBIAGI et al, 2004, p. 15).

A Constituição de 1988 estabeleceu o direito da mulher de se aposentar cinco anos antes em relação aos homens, seja por idade (60 contra 65 anos), seja por tempo de

contribuição (30 contra 35 anos). Giambiagi et al reconhecem que o fato de as mulheres poderem se aposentar antes não é uma exclusividade brasileira e costuma ser justificada como uma forma de compensação pela chamada dupla jornada de trabalho, ligada ao trabalho doméstico e ao esforço de criação dos filhos. Entretanto, os autores argumentam que essa diferenciação vem sendo questionada em diferentes países e, principalmente, ela possui um efeito fiscal nocivo, sendo que no caso brasileiro essa nocividade é acentuada pela aposentadoria por tempo de contribuição sem requisito da idade mínima, que também conta com uma antecipação em cinco anos no caso das mulheres. Assim sendo, como as mulheres se aposentam antes, mas vivem por mais tempo em média em comparação aos homens, elas recebem benefícios por um tempo médio mais prolongado.

Consequentemente, embora a alegação da dupla jornada possa ser vista como aceitável por parte da sociedade, o fato é que esse benefício entra em choque tanto com as tendências demográficas como com a realidade fiscal. Uma forma de conciliar a demanda social da referida compensação, com a necessidade de evitar novas pressões fiscais, pode ser por exemplo conservar a diferenciação, porém reduzir a diferença, de cinco para dois anos, após uma certa fase de transição (GIAMBIAGI et al, 2004, p. 19).

A mesma crítica que os reformistas da Previdência fazem em relação à aposentadoria antecipada para mulheres se aplica à possibilidade de professores se aposentarem cinco anos antes de outras categorias profissionais. No caso das mulheres trabalhadoras sob regime do INSS, esses cinco anos de antecedência têm caráter cumulativo ao benefício antecipado citado anteriormente. Assim sendo, os homens professores podem se aposentar com 30 anos de contribuição, e não 35 anos; e as mulheres podem se aposentar com 25 anos de trabalho.

Os cinco anos de antecipação da aposentadoria para mulheres e professores também se aplica aos trabalhadores do setor público. A reforma da Previdência Social de 2003, no governo Lula, estabeleceu uma idade mínima de aposentadoria para seus servidores, de 60 anos para homens e 55 para mulheres, sendo que no caso dos professores essa idade é de 55 anos para homens e 50 para as mulheres. Os reformistas apontam que os trabalhadores da educação, no caso os professores, são uma fração expressiva da folha salarial dos estados e municípios, portanto, a aposentadoria precoce dos professores pesa consideravelmente nas despesas com os inativos, principalmente devido ao fato da maioria desses trabalhadores ser do sexo feminino. “O argumento que se usa para justificar a vantagem no caso das mulheres não se aplica aos professores. (...) Portanto, a distinção especial para professores deveria ser simplesmente extinta” (GIAMBIAGI et al, 2004, p. 20).

No entanto, pesquisa realizada pelo Sindicato dos Professores no Estado do Paraná (Sinpropar) apontou que 52% dos professores da rede particular de ensino daquele estado são afetados pelo estresse e 38% sentem dores nas costas e nas pernas. Essa mesma pesquisa indicou que os professores sofrem ainda com problemas vocais, respiratórios, de articulação, fadiga, insônia e alergia. Se esses problemas são frequentes entre os professores da rede privada, no caso da rede pública, em que as condições de trabalho tendem a ser menos adequadas, possivelmente esses problemas devem se repetir com mais intensidade.

Mediante o aqui exposto, uma das propostas mais comuns dentro da visão neoiberal de Previdência Social diz respeito à elevação da idade mínima para a aposentadoria, a redução das diferenças entre o direito à aposentadoria entre homens e mulheres e a eliminação de aposentadorias especiais dos professores.

Giambiagi et al propõem elevar a idade mínima para a aposentadoria das mulheres para os 63 anos e a dos homens para 65 anos, eliminar a aposentadoria por tempo de contribuição e eliminar a aposentadoria antecipada dos professores, devendo isso ocorrer gradativamente.

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