• Nenhum resultado encontrado

O CREDO ATANASIANO(C 500)

2.6. O s Credos da Reforma

Os Credos da Reforma são as Confissões de Fé e Catecismos que surgiram no período da Reforma ou por inspiração daquele movimento, refletindo uma teologia semelhante.

O que os séculos 4o e 5o foram para a elaboração dos Credos, os séculos 16 e 17 foram para a confecção das Confissões e Catecis­ mos. A razão nos parece evidente: na Reforma, as Igrejas logo sen­ tiram a necessidade de formalizar sua fé, apresentando sua inter­ pretação sobre diversos assuntos que as distinguiam da igreja ro­ mana; com o passar do tempo, surgem outras denominações dentro da Reforma que discordavam entre si sobre alguns pontos, daí a necessidade de se estabelecer cada um de per si seus princípios dou­ trinários.

Calvino (1509-1564) já combatera a “fé implícita”122 - que era patente na teologia católica declarando que a nossa fé deve ser “explícita”. No entanto, Calvino ressalta que, devido ao fato de que nem tudo foi revelado por Deus, bem como à nossa ignorância e pequenez espiritual, muito do que cremos permanecerá nesta vida de forma implícita.

Calvino (1509-1564), depois de um extenso comentário, nos diz:

“Certam ente que não nego (de que ignorância somos cercados!) que muitas cousas nos sejam agora implícitas, e ainda o hajam de ser, até que, deposta a m assa da carne, nos hajam os achegado mais perto à presença de Deus, cousas essas em que nada pareça mais conveniente que suspender julgam ento, mas firmar o ânimo a m anter a unidade com a Igreja.123 Com 122 Que chama de “espectro papista”, que “separa a fé da Palavra de Deus” [J. Calvino,

Exposição de Romanos, São Paulo, Parakletos, 1997 (Rm 10.17), p. 375],

123 Foi com este espírito que Calvino nos advertiu diversas vezes: “As cousas que o Senhor deixou recônditas em secreto não perscrutemos, as que pôs a descoberto não negli­ genciemos, para que não sejamos condenados ou de excessiva curiosidade, de uma parte, ou de ingratidão, de outra” (J. Calvino, A.ç Instituías, 111.21.4). “Nem nos envergonhemos em até este ponto submeter o entendimento à sabedoria imensa de Deus, que em seus muitos arcanos sucumba. Pois, dessas cousas que nem é dado, nem é lícito saber, douta é a ignorân­ cia, a avidez de conhecimento, uma espécie de loucura” (As Institutas, 111.23.8). ”Que esta seja a nossa regra sacra: não procurar saber nada mais senão o que a Escritura nos ensina. Onde o Senhor fecha seus próprios lábios, que nós igualmente impeçamos nossas mentes de avançar sequer um passo a mais” [J. Calvino, Exposição de Romanos, São Paulo, Edições

Os Símbolos de Fé na História 47 este pretexto, porém, adornar com o nome de fé à ignorância temperada com

humildade, é o cúmulo do absurdo. Ora, a fé jaz no conhecim ento de Deus e

de Cristo 0° 17.3), não na reverência à Igreja”124 (grifos meus).

Em outro lugar:

“Q ue costum e é esse de professar o evangelho sem saber o que ele signi­ fica? Para os papistas, que se deixam dom inar pela fé implícita, tal coisa pode ser suficiente. M as para os cristãos não existe fé onde não haja co ­ nhecim ento.” 125

Pelas palavras de Calvino, podemos observar a necessidade la­ tente do ensino e estudo constante da Palavra de Deus, a fim de que cada homem, sendo como é, responsável diante de Deus, tenha con­ dições de se posicionar diante de Deus de forma consciente; a fé explícita é patenteada pela Igreja através do ensino da Palavra.126

Tillich, interpretando esse fato, diz:

“C ada indivíduo deve ser capaz de confessar os próprios pecados, expe­ rimentar o significado do arrependimento e se tornar certo de sua salvação em Cristo. Essa exigência gerava um problema no protestantismo. Significa­ Parakletos, 1997 (Rm 9.14), p. 330],

124 J. Calvino, As Instituías, 111.1.3 (vd. também I11.2.5ss). Em outros passagens, Calvino discorreu sobre a fé; cito aqui algumas delas: “Fé verdadeira é aquela que o Espírito de Deus sela em nosso coração” (J. Calvino, A.v Institutos, 1.7.5). “A fé não consiste na igno­ rância, senão no conhecimento; e este conhecimento há de ser não somente de Deus, senão também de sua divina vontade” (A.ç Institutas, 1II.2.2). “E um conhecimento firme e certo da vontade de Deus concernente a nós, fundamentado sobre a verdade da promessa gratuita feita em Jesus Cristo, revelada ao nosso entendimento e selada em nosso coração pelo Espírito Santo” (As Institutas, III.2.7). “Nossa fé repousa no fundamento de que Deus é ver­ dadeiro. Além do mais, esta verdade se acha contida em sua promessa, porquanto a voz divina tem de soai' primeiro para que possamos crer. Não é qualquer gênero de voz que é capaz de produzir fé, senão a que repousa sobre uma única promessa. Desta passagem, pois, podemos deduzir a relação mútua entre a fé dos homens e a promessa de Deus. Se Deus não prometer, ninguém poderá crer” [J. Calvino, Exposição de Hebreus (Hb 10.23), p. 270], “Fé verdadeira é aquela que ouve a Palavra dc Deus e descansa em sua promessa” [J. Calvino, Ibidem (Hb

11.11), p. 318], “Nossa fé não tem que estar fundamentada no que nós tenhamos pensado por nós mesmos, senão no que nos foi prometido por Deus” (Calvino, Sermones Sobre la Obra

Salvadora de Cristo, Jenison, Michigan: TELL, 1988, “Sermon n° 13", p. 156).

125 João Calvino, Gálatas, São Paulo, Parakletos, 1998 (G1 1.2), p. 25.

126 “a Escritura é a escola do Espírito Santo, na qual, como nada é omitido não só neces­

sário, mas também proveitoso de conhecer-se, assim também nada é ensinado senão o que convenha saber” (J. Calvino, As Institutas, 111.21.3).

va que todas as pessoas precisavam ter o mesmo conhecimento básico das doutrinas fundamentais da fé cristã. N o ensino dessas doutrinas não se em ­ prega o mesmo método para o povo comum e para os candidatos às ordens, ou para os futuros professores de teologia, com a prática do latim e grego, da história da exegese e do pensamento cristão. Com o se pode ensinar a todos? Naturalmente, apenas se tornarmos o ensino extremamente simples.”127

Essa necessidade determina o uso cada vez mais evidente da razão, a fim de apresentar de forma mais razoável possível a doutri­ na e, ao mesmo tempo, de forma simples. Eis dois marcos do ensi­ no ortodoxo: amplitude e simplicidade. O ser humano é responsá­ vel diante de Deus; ele dará contas de si mesmo ao seu Criador; portanto, tendo oportunidade, ele precisa conhecer devidamente a Palavra de Deus em toda a sua plenitude revelada.

Essas declarações de fé precisavam ser até certo ponto comple­ tas, porém, ao mesmo tempo, simples, para que o crente comum (não iniciado nas questões teológicas) pudesse entender o que esta­ va sendo dito, confrontando este ensinamento com a Palavra de Deus, tendo assim uma compreensão bíblica da sua fé. Em outras pala­ vras, a fé não deveria ser apenas “implícita”, mas também “explíci­ ta”. Neste contexto, e com objetivos eminentemente didáticos, sur­ gem os Catecismos (Gr. Kaxr|%éco = “ensinar”, “instruir”, “infor­ mar”. Cf. Lc 1.4; At 18.25; 21.21, 24; Rm 2.18; ICo 14.19; G1 6.6.), constituídos, ainda que não exclusivamente, de perguntas e respostas. Até o século XVI, a palavra “catecismo” ainda não tinha sido usada neste sentido.128 Os Catecismos visavam servir para ins­ truir as crianças e os adultos;129 este é o motivo que contribuiu deci­ sivamente para a sua proliferação, sendo que a maioria deles jamais passou da forma manuscrita, visto que muitos pastores os elabora­ vam apenas para a sua congregação local, visando a atender às suas necessidades doutrinárias.130

127 Paul Tillich, Perspectivas da Teologia Protestante nos Séculos XIX e XX, São Paulo, ASTE, 1986, p. 41.

128 Cf. D.F. Wright, Catecismos: In: Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-Teoló-

gica da Igreja Cristã, I, 249.

,29Vd. M. Lutero, Catecismo Maior, Prefácio, II.1-6.

Os Símbolos de Fé na História 49

O primeiro trabalho a receber o título de “Catecismo” foi o de Andreas Althamer (c. 1500-) em 1528.131 Porém, os mais influen­ tes no século XVI, foram os de Lutero (1483-1546): O Catecismo

Maior (1529) e O Catecismo Menor (1529). No prefácio do Cate­ cismo Menor, Lutero declara os motivos que o levaram a redigir

este Catecismo, e apresenta também sugestões de como ensiná-lo à Congregação. No decorrer dos sete capítulos, ele quase sempre ini­ cia, dizendo: “Como o chefe de família deve ensiná-lo à sua casa” ou: “Como o chefe de família deve ensiná-lo com toda a simplici­

dade à sua casa” e expressões similares.

Transcreverei apenas o que Lutero disse a respeito das suas motivações:

“A lamentável e mísera necessidade experimentada recentemente, quan­ do também eu fui visitador,132 é que me obrigou e impulsionou a preparar este catecism o ou doutrina cristã nesta forma breve, simples e singela. Meu Deus, quanta miséria não vi! O homem comum simplesmente não sabe nada da doutrina cristã, especialmente nas aldeias. E, infelizmente, muitos pastores são de todo incompetentes e incapazes para a obra do ensino. (...) N ão sabem nem o Pai-Nosso, nem o Credo, nem os Dez M andam entos.”133

Mais tarde, Calvino (1509-1564) elaborou em francês, durante o inverno de 1536-1537, um Catecismo, não sendo constituído em forma de perguntas e respostas, escrito de modo que julgou acessí­ vel a toda Igreja. O seu objetivo era puramente didático. Esta obra foi intitulada: Instrução e Confissão de Fé, Segundo o Uso da Igre­

ja de Genebra,134 sendo traduzida para o latim em 1538.Posterior­

também pastores, que estavam preocupados especificamente com a sua comunidade local (vd. David. F. Wright, Catechism: Donald K. McKim, ed. Encyclopedia o f the Reformed

Faith, p. 60).

131 Cf. D.F. Wright, Catecismos: In: Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-Teoló-

gica da Igreja Cristã, 1, 250,

132 Lutero viajou pela Saxônia Eleitoral e por Meissen, entre 22/10/1528 e 09/01/1529. 133 Catecismo Menor, In: Os Catecismos, Martinho Lutero, Porto Alegre/São Leopoldo, RS Concórdia/Sinodal, 1983, p. 363.

134 Este Catecismo consistiu num resumo da primeira edição das institutos (1536; cf. John H. Leith, em prefácio à tradução da obra de Calvino e Paul T. Fuhrmann em “prefácio histórico” à mesma obra, Instruction in Faith (1537), Louisville, Kentucky, Westminster/ John Knox Press [1992], pp. 10 e 16; Cf. Tomas M. Lindsay, La Reforma y su Desarrollo

mente, Calvino a reviu - tornando a sua teologia mais acessível aos seus destinatários: as crianças135-, e a ampliou consideravelmente, mudando inclusive a sua forma, passando então a ser constituída de perguntas e respostas, contendo 373 questões.136 Esta nova edição foi publicada entre o fim de 1541 e o início de 1542, tomando-se juntamente com a Instituição um sucesso editorial.137 Em 1545,138 Cal­ vino o traduziu para o latim, visando a dar um alcance maior aos seus ensinamentos, contribuindo deste modo para a maior unidade entre as Igrejas Reformadas. A partir de 1561, este Catecismo ga­ Social, p. 101; John T. M cNeill, The History and Character o f Calvinism, New York, Oxford

University Press, 1954, p. 140. Vd. também, p. 204). Esta foi a primeira “exposição siste­ mática do pensamento calvinista na língua francesa” (A.H. Freundt Jr., Catecismo de Gene­ bra: ln; Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, 1, p. 246). 134 Marc Venard, O Concílio Lateranense V e o Tridentino. In: Giuseppe Alberigo org.

H istória dos Concílios Ecumênicos, São Paulo, Paulus, 1995, p. 339.

135 Cf. Tomas M. Lindsay, La Reforma y su Desarrollo Social, p. 100. 136 Este Catecismo pode ser assim esboçado:

1 - Fé (1-130) Introdução (1-18)

Segue a exposição do Credo Apostólico, da seguinte forma: a) Deus Pai (19-29)

b) Deus Filho (30-87) c) Deus Espírito Santo (88-91) d) A Igreja (92-130) II - Os Dez Mandamentos (131-232) III - A Oração (233-295) IV - A Palavra e os Sacramentos (296-373) a) A Palavra e o Ministro (296-308) b) Os Sacramentos (309-373) Definição e Significado (309-323) Batismo (324-339) Ceia do Senhor (340-373)

137 Febvre diz que “de 1550-1564 [ano da morte de Calvino] serão publicadas 256 edi­ ções, das quais 160 em Genebra. A Institution chrétienne é então, sozinha, objeto de 25 reedições, nove latinas e dezesseis francesas das quais a maioria provém dos prelos gene- brinos; e mais ainda, talvez, o Catéchisme par demandes et réponses que Calvino publica em 1541...” (Lucien Febvre & Henry Jean-Martin, O Aparecimento do Livro, pp. 442-443). Wendel nos diz que a primeira edição da Instituição esgotou-se em menos de um ano (Fran- çois Wendel, Calvin, p. 113; Justo L. Gonzalez, A Era dos Reformadores, São Paulo, Vida Nova, 1986 (reimpressão), p. 111; vd. Também, T. George, Teologia dos Reformadores, pp. 177-178).

138 A dedicatória de Calvino é de 02/12/1545 (vd. ln: John Calvin, Tracts and Treatises

on the Doctrine and Worship ofThe Church, Grand Rapids, Michigan, Eerdmans, 1958,

Os Símbolos de Fé na História 51

nhou maior importância, visto que desde então todo ministro da Igreja deveria jurar fidelidade aos ensinamentos nele expressos e comprometer-se a ensiná-los.'39

Quanto às Confissões, elas basicamente não foram feitas como um texto para a instrução na fé Cristã, já que esta era a função dos Catecismos.140 Elas poderiam ser produzidas por homens individu­ almente, para o seu uso privado (A Segunda Confissão Helvética); por um Concílio de uma Igreja em particular (Cânones de Dort)\ por um indivíduo que age como representante de sua Igreja (Con­

fissão de Augsburgo)', por um grupo de teólogos convocados pelo

Estado (Confissão de Westminster) ou escrita como uma defesa de sua fé em meio a uma terrível perseguição (A Confissão dos Val-

denses)141 etc. Com isso estamos dizendo que não havia uma regra

fixa para a elaboração de uma Confissão; os contextos eram varia­ dos e, apesar de haver motivações comuns a todas elas, existiam circunstâncias especiais que conduziam a determinadas ênfases, especialmente no que se refere às questões relativas ao governo e à igreja romana. Isto traz consigo o problema da unificação das Con­ fissões. Por que não unificá-las?!, é uma pergunta pertinente. De fato, esta preocupação existiu. Por exemplo:

139 Cf. Catecismo de la Iglesia de Ginebra, In: C l R., pp. 7-8.

140 Cf. George S. Hendry, The Westminster Confession fo r Today, Richimond, Virgínia, John Knox Press, 1960, p. 10.

141 A Confissão dos Valdenses - que não faz parte de nossa abordagem - é em parte um resumo da Confissão Gaulesa (P. Schaff, The Creeds of Christendom, Vol. III, p. 757. Vd. um quadro comparativo das duas, feito por Alberto Revel, In: Catecismos de la Iglesia

Reformada, Buenos Aires, Editorial “La Aurora”, 1962, p. 195). Ela foi composta prova­

velmente por Jean Leger (1615-?) e possivelmente sistematizada por seu tio Antoine Leger, professor da Academia de Calvino em Genebra. Foi publicada num período de forte perse­ guição religiosa na Itália, quando os Valdenses foram caluniados, martirizados, esbulha­ dos, exilados etc. A edição Italiana da Confissão intitulava-se: "Confissão de fé das Igrejas

Reformadas, Católicas e Apostólicas de Piemonte, confirmada pelo testemunho explícito da Sagrada Escritura".

O texto francês, diz: “Breve Confissão de Fé das Igrejas Reformadas de Piemonte” e, embaixo, acrescentava: "Publicada em seu Manifesto à ocasião do horrendo massacre do

ano de 1655."

Ao que parece, esta Confissão só viria a ser aprovada oficialmente no século XIX (vd. J. Alberto Soggin em texto introdutório à Confissão de Fé da Igreja Evangélica Valdense, In:

Catecismos de la Iglesia Reformada, Buenos Aires, Editorial “La Aurora”, 1962, pp. 189-

Em 1530, Carlos V, Imperador da Alemanha, convoca a Dieta de Augsburgo. Objetivo: unificação político-religiosa dos seus do­ mínios. Daqui saiu a Confissão de Augsburgo, redigida por Ph. Melanchton (1479-1560), o “preceptor da Germânia”,U2 com a aquiescência de Lutero (1483-1546), que fez um comentário ambí­ guo a respeito da sua leveza.... Esta Confissão foi lida em latim e alemão pelo Chanceler Christian Beyer, da Saxônia Eleitoral, pe­ rante toda a Dieta, no dia 25 de junho de 1530, às 15 horas. Mesmo o Imperador não a aceitando, e proibindo a sua divulgação, ela em pouco tempo foi propagada em toda Alemanha.143

Calvino entende que a divergência em questões secundárias não deve servir de pretexto para a divisão da Igreja; afinal, todos, sem exceção, estão envoltos de “alguma nuvenzinha de ignorância”...

“ ... São palavras do Apóstolo: ‘Todos quantos somos perfeitos sintamos o mesmo; se algo entendeis de maneira diferente, também isto vos haverá de revelar o Senhor’ [Fp 3.15]. N ão está ele, porventura, a suficientem en­ te indicar que o dissentimento acerca destas cousas não assim necessárias não deve ser matéria de separação entre cristãos? Por certo que estará em primeira plana que em todas as cousas estejam os em acordo; mas, uma vez que ninguém há que não esteja envolto de alguma nuvenzinha de igno­ rância, impõe-se que ou nenhum a igreja deixemos, ou perdoemos o enga­ no nessas cousas que possam ser ignoradas não som ente inviolada a suma da religião, mas também aquém da perda da salvação.

“Mas, aqui, não quereria eu patrocinar a erros, sequer os mais dim inu­ tos, de sorte que julgue devam ser fom entados, com agir com com placên­ cia e ser-lhes conivente. Digo, porém, que não devemos por causa de quais­ 142 Cf. Herrlinger e Max Landerer, Melanchthon: In: Philip Schaff, ed. Religious En-

cyclopaedia: or Dictionary ofBiblical, Historical, Doctrinal, and Practical Theology, II,

p. 1461; Paul Monroe, História da Educação, 11“ cd. São Paulo, Companhia Editora Naci­ onal, 1976, p. 179 e Lorcnzo Luzuriaga, História da Educação Pública, São Paulo, Com­ panhia Editora Nacional, 1959, p. 8. Monroe diz que Melanchthon, por ter redigido em 1528 os Regulamentos Escolares da Saxônia, “tornou-se o fundador do sistema escolar do Estado moderno” (P. Monroe, História da Educação, p. 180). Na presidência da Universi­ dade de Wittenberg, ele “exigiu que os professores ensinassem de acordo com o Credo Apostólico, o Credo de Niccia, o Credo dc Atanásio e a Confissão de Augsburgo” (Hayward Armstrong, Bases da Educação Cristã, Rio de Janeiro, JUERP, 1992, p. 62).

143 Vd. Martin Dreher em Introdução à Confissão de Augsburgo, São Leopoldo, RS, Sinodat, 1980, pp. 7-11; J.M. Drickamer, Confissão de Augsburgo: In: In: Walter A. Elwell, ed. Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, I, pp. 328-329.

Os Símbolos de Fé no História 53 quer dissentimentozinhos abandonar irrefletidamente a Igreja, em que so ­ mente se retenha salva e ilibada essa doutrina, mercê da qual se m antém firme a incolumidade da piedade e conservado é o uso dos sacram entos instituído pelo Senhor.”144

“N ão vejo, porém, nenhuma razão por que uma igreja, por mais universal­ mente corrompida, desde que contenha uns poucos membros santos, não deva ser denominada, em honra desse remanescente, de santo povo de Deus.”145

“Todavia, ainda quando a Igreja seja remissa em seu dever, não por isso será direito de cada um em particular a si pessoalm ente assumir a decisão de separar-se.”146

Após argumentar contra aqueles que chamavam os reformados de hereges, ressalta que a unidade cristã deve ser na Palavra:

“Com efeito, também isto é de notar-se: que esta conjunção de amor assim depende da unidade de fé que lhe deva ser esta o início, o fim, a regra única, afinal. Lembremo-nos, portanto, quantas vezes se nos reco­ m enda a unidade eclesiástica, isto ser requerido: que, enquanto nossas mentes têm o mesmo sentir em Cristo, também entre si conjungidas nos hajam sido as vontades em mútua benevolência em Cristo. E, assim, Pau­ lo, quando para com ela nos exorta, por fundamento assume haver um só Deus, uma só fé e um só batismo [Ef 4.5], De fato, onde quer que nos ensina o A póstolo a sentir o mesmo e a querer o mesmo, acrescenta im e­ diatam ente: em Cristo [Fp 2.1, 5] ou: segundo Cristo [Rm 15.5], significan­ do ser conluio de ímpios, não acordo de fiéis a unidade que se processa à parte da Palavra do Senhor.”147

Para os irmãos refugiados em Wezel (Alemanha), que sofriam diversas pressões dos luteranos e sobreviviam numa pequena Igreja

144 J. Calvino, Aç Instituías, IV. 1.12.

145 João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo, Parakletos, 1999, Vol. 2 (SI 50.4), p. 401. 146 J. Calvino, A? Instituías, IV. 1.15. Em outro lugar, Calvino diz: “Deus só é corretamen­ te servido quando sua lei for obedecida. Não se deixa a cada um a liberdade de codificar um sistema de religião ao sabor de sua própria inclinação, senão que o padrão de piedade deve ser tomado da Palavra de Deus” [João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo, Parakletos, Vol. 1 (SI 1.1), p. 53],

141J. Calvino, As Insíiíuías, 1V.2.5. Calvino entendia que “onde os homens amam a dispu­ ta, estejamos plenamente certos de que Deus não está reinando ali” [J. Calvino, Exposição

de I Coríntios, São Paulo, Edições Parakletos, 1996 (ICo 14.33), p. 436], T. George co­

menta com acerto que “Calvino não estava disposto a comprometer pontos essenciais em favor de uma paz falsa, mas ele tentou chamar a igreja de volta à verdadeira base de sua unidade em Jesus Cristo” (T. George, Teologia dos Reformadores, pp. 182-183).

Reformada, Calvino, em 1554, os consola mostrando que apesar dos grandes problemas pelos quais passavam o mundo, Deus lhes havia concedido um lugar onde poderiam adorar a Deus em liber­ dade. Também os desafia a não abandonarem a Igreja por pequenas divergências nas práticas cerimoniais, sendo tolerantes a fim de pre­ servar a unidade. Contudo, os exorta a jamais fazerem acordos em pontos doutrinários.148

Portanto, mesmo desejando a paz e a concórdia, Calvino enten­ dia que essa paz nunca poderia ser em detrimento da verdade, pois, se assim fosse, essa dita paz seria maldita:

“N aturalm ente, há uma condição para entendermos a natureza desta paz, ou seja, a paz da qual a verdade de Deus é o vínculo, Pois se temos de lutar contra os ensinam entos da impiedade, mesmo se for necessário m o­