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O arsenal da democracia

7. O FIM DO NAMORO COM O EIXO

Enquanto a guerra começava na Europa, a expansão do Império do Japão no Oriente já causava protestos entre as nações do bloco ocidental, muitas delas detentoras de colônias no Extremo Oriente, como a Holanda, a França e mesmo a Inglaterra. Os japoneses já haviam invadido vários territórios da China, como a Manchúria, desde 1931. Quando ocorreram o massacre de Nanquim — onde foram assassinados cerca de trezentos mil chineses após a conquista da capital da República da China em dezembro de 1937 — e a ocupação da Indochina Francesa, em 1940, os Estados Unidos impuseram um severo embargo comercial ao Japão, privando o país de matérias-primas essenciais, como metais e petróleo.

Depois da Primeira Guerra, na qual o Japão era aliado da Tríplice Entente, formada pelas forças Aliadas contra os alemães, houve uma grande frustração do governo nipônico por ter sido preterido durante a formação da Liga das Nações (uma organização intergovernamental fundada como resultado da Conferência de Paz de Paris, que terminou com a Primeira Guerra). Um pedido dos japoneses pelo fim do preconceito racial aos orientais foi solenemente ignorado.

Foi assim que, ao longo das décadas seguintes, o governo japonês tomou o rumo dos regimes ditatoriais, com seu núcleo dominado por militaristas, liderados pelo ministro da Guerra, Hideki Tojo, que fazia planos para aliar o Japão à Alemanha, manter relações comerciais com os Estados Unidos e estender o Império do Japão no Sudeste Asiático. Mas o embargo comercial americano não correspondeu aos anseios do líder extremista japonês, que manteve o cargo de primeiro-ministro até a derrocada final do Japão, quando seria julgado e condenado à forca.

O imperador Hirohito, líder da religião xintoísta, tinha um papel meramente figurativo nas decisões do gabinete governamental, mas sua importância na tradição nipônica serviu para motivar o senso de lealdade dos soldados japoneses, que lutavam até a morte em honra ao imperador. A fidelidade ao semideus chefe do trono japonês teve consequências até na longínqua comunidade de imigrantes nipônicos no Brasil, durante e imediatamente depois da guerra, nas ações radicais do

grupo ultranacionalista Shindo Renmei.

Os japoneses já haviam assinado o Pacto Tripartite, que formou o Eixo em setembro de 1940, e decidiram retaliar o embargo dos Estados Unidos com um ataque à frota americana em Pearl Harbor, no Havaí, em dezembro de 1941, levando o país à guerra.

“Estou muito triste, está demorando muito para eu morrer.”

(Primeiras palavras de Hideki Tojo após sua tentativa fracassada de suicídio ao ser preso pelos americanos.)

Membro da Taisei Yokusankai, organização parafascista promotora dos objetivos da “Nova Ordem” japonesa e criador do Estado totalitário de um só partido para maximizar o esforço de guerra na China em 1940, o primeiro-ministro Hideki Tojo tentou eliminar as influências dos políticos eleitos em 1942. Entretanto, o Japão jamais se tornou completamente uma nação totalitária. O general Tojo nasceu em 30 de dezembro de 1884, e em 1933 foi promovido a major-general. Tinha formação militarista, nacionalista e fascista, e recebeu o apelido de “Navalha” por sua capacidade de tomar decisões críticas rapidamente. Sua escolha como primeiro-ministro foi feita pelo próprio imperador Hirohito, e, no primeiro dia de mandato, Tojo foi apresentado e apoiou os planos de ataque a Pearl Harbor. Ele acumulou os cargos de ministro do Interior, das Relações Exteriores, da Educação e do Comércio e da Indústria. Apoiou as políticas educacionais militaristas e totalitárias e ordenou várias medidas eugênicas, inclusive a esterilização dos “mentalmente incapazes”. Em fevereiro de 1944, para fortalecer sua posição, Tojo assumiu o posto de chefe do Estado-Maior Geral do Exército Imperial, do qual foi forçado a demitir-se após a queda de Saipan em julho do mesmo ano.

Com a derrota do Japão, Tojo foi localizado em sua residência em Setagaya, e quando a Polícia Militar americana invadiu a casa, ele disparou contra o peito. A bala não atingiu o coração, alojou-se no

estômago, e depois de uma cirurgia de emergência, Tojo aguardou seu julgamento na prisão de Sugamo. Quando foi entregue sua nova dentadura, o dentista americano gravou secretamente a frase “Remember Pearl Harbor” (Lembre-se de Pearl Harbor) em código Morse nos dentes dianteiros. A sentença do Tribunal Militar Internacional de Crimes de Guerra para o Extremo Oriente foi de culpado, pelos seguintes crimes:

• violação de leis internacionais, ao fomentar guerra de agressão;

• fomentar guerra de agressão contra a República da China, os Estados Unidos, a Comunidade das Nações Britânicas, o Reino da Holanda e a República da França;

• ordenar, autorizar e permitir tratamento desumano a milhares de prisioneiros de guerra e milhões de civis nos territórios conquistados pelas forças japonesas.

Em acordo com a promotoria, Tojo garantiu a imunidade do imperador para preservar a

condenado à morte por enforcamento, no dia 23 de dezembro de 1948.

Oficialmente, os Estados Unidos entraram na Segunda Guerra depois da invasão alemã à União Soviética, iniciada em 22 de junho de 1941. Mas o “arsenal da democracia” idealizado por Roosevelt — apenas um eufemismo para a consolidação da indústria bélica americana — já funcionava antes mesmo da entrada efetiva dos Estados Unidos no conflito, contornando todos os impedimentos do Congresso americano sobre neutralidade, para fornecer vasta quantidade de armas aos países que combatiam o Eixo.

Os comboios que levavam a preciosa ajuda para a Inglaterra — e logo depois para a União Soviética — eram perseguidos por submarinos nazistas, em outubro de 1941, quando ocorreram combates entre navios da Marinha americana e submarinos alemães no Atlântico Norte. Parecia que eles haviam evitado, enquanto, possível, o estado de beligerância, até que o ataque japonês a Pearl Harbor levou os países do Eixo a declarar guerra oficialmente contra os Estados Unidos, em fidelidade ao Pacto Tripartite, também chamado de Pacto de Aço.

O termo Eixo foi criado por Mussolini para definir o alinhamento entre Roma, Berlim e Tóquio. Pensava-se que o pacto que unia os dois países europeus — assinado no passo de Brenner, fronteira entre Áustria e Itália — e a potência oriental, certamente faria os americanos pensarem duas vezes sobre entrar numa guerra em d o is fronts, ou seja, ocupar-se na luta com os japoneses no distante Pacífico e encarar italianos e alemães no Ocidente.

Em seus devaneios estratégicos, Hitler esperava que os japoneses atacassem os russos no Oriente e os enfraquecesse, o que não ocorreu, uma vez que a União Soviética tinha firmado um pacto de não agressão com o Japão, que foi — por incrível que pareça — respeitado. No dia 11 de dezembro de 1941, em seu discurso em que anunciava o estado de guerra com o Eixo, Roosevelt fez um alerta e convocou as nações livres para a luta:

As forças que se mobilizam para escravizar o mundo por completo se aproximam na direção deste hemisfério. A demora em agir é um convite ao perigo, e os esforços unidos de todos os povos do mundo determinados a permanecer livres

vão garantir uma vitória inequívoca das forças da Justiça e do Direito sobre as forças da selvageria e da barbárie.

Franklin Roosevelt sempre esteve ao lado de Winston Churchill ajudando a Inglaterra na luta contra Hitler e a expansão dos nazistas. Churchill sentia-se aliviado com o apoio do “arsenal da democracia”, determinante para resistir naquela contenda. Os americanos disponibilizaram recursos para os russos e também para os chineses, enviando armamentos e até assistência militar nem sempre oficial, como foi o caso dos Tigres Voadores, famosa esquadrilha de pilotos americanos em ação na China.

Com a resistência do Congresso americano ao envolvimento direto na guerra da Europa, essa ajuda foi viabilizada por meio de acordos para o fornecimento de armas, como o Cash and Carry e depois o Lend-Lease, que aqueciam a indústria bélica americana e ofereciam armamentos em condições especiais de preço e pagamento.

Incrivelmente, em 1939 os Estados Unidos ainda não tinham Forças Armadas modernas e prontas para entrar em combate. Entretanto, ao longo dos anos 1920 e 1930, tinham investido muito na ampliação de sua Marinha de Guerra e voltado os interesses americanos para o Oriente, com a Esquadra americana estacionada na costa oeste, no Havaí, em Guam e nas Filipinas. Prevendo o choque de interesses na hegemonia da região, já tinham preparado o Plano Laranja, que reunia os possíveis cenários de confronto com a Marinha Imperial japonesa, concebido em 1924.

Num curto espaço de tempo, a Marinha americana se tornou tão grande quanto a lendária Marinha inglesa. No final dos anos 1930, os japoneses se constituíram como uma das maiores potências navais do mundo, composta por diversos porta-aviões e dois dos maiores navios de guerra já construídos: os cruzadores Yamato e Musashi, com mais de 65 mil toneladas e nove canhões de calibre 460mm cada um.

Nenhum dos valiosos porta-aviões americanos estava em Pearl Harbor no momento do ataque, o que gerou inúmeras hipóteses sobre um possível conhecimento pregresso do “ataque surpresa” japonês pelos americanos, não evitado para colocar definitivamente os Estados Unidos na guerra. De qualquer forma, a agressão japonesa terminou com a neutralidade presente no Congresso americano. A

maré mudava de forma radical.

Em janeiro de 1942 ocorreu a proclamação da Organização das Nações Unidas, um projeto de Roosevelt e de seu chanceler, Cordell Hull, que reunia inicialmente os 26 países determinados a lutar contra as forças do Eixo, feito que posteriormente rendeu o Prêmio Nobel da Paz de 1945 ao chanceler americano.

Também em janeiro foi realizada a III Conferência Extraordinária dos Ministros das Relações Exteriores das Repúblicas Americanas, que teve como palco o Rio de Janeiro. Havia uma unanimidade entre os participantes em declarar a ruptura de relações diplomáticas e comerciais com os países do Eixo, uma vez que os americanos cobravam a tão proclamada união pan-americana contra agressores do seu território. As distantes ilhas do arquipélago havaiano, onde ficava a base naval de Pearl Harbor, pareciam ter ficado mais perto, apesar dos mais de 12 mil quilômetros que as separavam da América do Sul, o que servia como evidência da ameaça à soberania dos países do bloco ocidental perpetrada pelos japoneses, parceiros dos alemães e italianos.