• Nenhum resultado encontrado

II. Análise semântico-temporal dos tempos verbais do português no D

2.3. Os tempos do IND

2.3.6.2. O PPC no corpus seleccionado

O dois exemplos transcritos (vd. infra: 89s) englobam as únicas ocorrências de PPC na oração subordinante, sendo que se torna evidente a interpretação semântico- temporal de um tempo verbal que tem como ponto de perspectiva temporal o ME actual e o inclui, sem que haja uma balização temporal exacta quanto ao início ou fim desse intervalo temporal. Repare-se que é possível conceber uma extensão desse lapso temporal projectando-o para lá de ME, daí ele surgir em articulação com PRInd com sentido actual ou futuro, na oração subordinada. Por outro lado, acresce que o valor de iteratividade é

evidente nos predicados “tem insistido”, “tem sido noticiado” e “tem sido”, no exemplo 28:

28) O Ministro da Defesa tem insistido em que as associações estão a exagerar no protesto e que estão a comportar-se como sindicatos dos militares, quando isso é proibido por lei. É por isso que o entendimento do Governo tem sido o de que as associações não podem convocar manifestações, pois isso seria abrir a porta a um comportamento sindical. - p.10

130) Nos EUA, tem sido noticiado que várias delas [refinarias] estão à beira da ruptura. – p. 30

Relativamente às ocorrências de PPC na oração subordinada considerámos os seguintes enunciados:

22) O general Loureiro dos Santos, ex-chefe de Estado-Maior do Exército, afirmou ontem ao Público que tem havido alguns excessos por parte das associações, mas que os problemas “de fundo” mantém-se: “uma grande insatisfação” nas Forças Armadas devido ao sistema retributivo, que se distanciou do das profissões equiparadas. – p.10

150) Por seu turno, Constâncio recordou que os EUA absorvem anualmente 75 por cento da poupança mundial, razão pela qual existem hoje “taxas de câmbio artificialmente mantidas por intervenções no mercado cambial”, uma situação que cria excesso de liquidez e taxas de juro baixas. Esta situação, notou, tem alimentado o preço dos activos financeiros e imobiliários, podendo criar “a maior bolha da história norte-americana”. – p. 32

113a) "Se no período da Primavera a precipitação continuar abaixo do normal, poderão ser adoptadas medidas restritivas de utilização da água", advertiu o membro do Executivo, acrescentando que, neste momento, cerca de 4300 pessoas já têm sido afectadas por cortes

no abastecimento de água.

(http://dossiers.publico.pt/shownews.asp?id=1219531&idCanal=1409, 31.03.05)

Os exemplos que aqui registamos apontam para uma interpretação de PPC semelhante àquela que verificamos ao nível da expressão de relação de ilocução. Efectivamente, as formas verbais de PPC, independentemente, de surgirem em conjugação com o PPS e com o GER, mantêm como ponto de referência ME, ou seja, localizam um intervalo temporal que inclui este marco referencial e que, eventualmente, se estende num

lapso temporal posterior. A ancoragem a ME é reforçada no último enunciado (113a) pelo recurso ao adverbial “neste momento” e pelo monema “já”, o que lhe confere valor iterativo, apontando para uma delimitação posterior do intervalo temporal que, mesmo assim, se sobrepõe parcialmente a ME em sentido lato. O predicado “tem alimentado” (exemplo 150), por ser um evento, inclui uma leitura de iteratividade, enquanto que no enunciado 22, por se tratar de um estado faseável, seria necessário um adverbial para lhe conferir esse mesmo valor. Concluímos, por isso, que o valor de iteratividade do PPC é altamente dependente das relações estabelecidas pelo contexto e pelo tipo aspectual do predicado. No entanto, a sua leitura aspectual de imperfectividade, bem como a sua interpretação temporal decorrem de uma ancoragem directa a ME, que dificilmente nos permite considerá-lo pretérito nem validar a sua perfectividade. Tendo em conta as dificuldades de delimitação semântico-temporal do PPC e as incongruências advenientes da sua designação face à interpretação a que se presta, o PPC é um tempo cuja interpretação não é linear em contexto de discurso indirecto. O facto de designar um intervalo temporal que se inicia no passado, mas se prolonga até ME e o inclui, justifica a utilização de PRInd na oração subordinante, por designar aplicabilidade contínua, quando PPC é o verbo introdutório. Por outro lado, em contexto de discurso citado, o PPC articula- se com PPS na oração subordinante e sua manutenção deve-se ao facto de fornecer uma informação semântico-temporal, que mais nenhum tempo verbal permite, e que é válida em ME e MEO, logo há manutenção da forma verbal de DD para DI, o que é uma modalidade de aplicabilidade contínua.

2.3.7. O PMPS no DI

2.3.7.1. Considerações Iniciais

Aquando da análise das ocorrências do PMPC no DI, referimos a equivalência semântico-temporal entre as formas simples e compostas do mais-que-perfeito, atestada pela consulta da bibliografia e comprovada pela análise do corpus que tomamos em consideração neste trabalho investigativo. Recuperemos a noção de que o mais-que-perfeito tem um valor retrospectivo, ou seja, configura intervalos de tempo circunscritos tendo como ponto referencial um evento passado, anterior ao ME que cita e que se consubstancia no

MEO. Este é, efectivamente, o valor primeiro que o PMPS denota, à semelhança da forma composta.

Naturalmente, que tendo em conta o universo discursivo em análise, o PMPS terá uma aplicação semântico-temporal que vai de encontro à explanada anteriormente. No entanto, é de ressalvar que Cunha & Cintra (1997) referem que as formas do mais-que- perfeito podem, também, evidenciar “um facto vagamente situado no passado” (Cunha & Cintra 1997: 455). Os mesmos autores fazem notar que o PMPS ocorre em cristalizações do tipo exclamativo, típicas do discurso oral, e que apresentam resquícios de modalidade, sendo que neste caso concreto não estabelece uma relação de sinonímia com o PMPC, uma vez que, tal como os autores mencionam, o PMPS emprega-se em vez do IConj (Cunha & Cintra 1997: 456). Não esperamos encontrar nenhuma destas aplicações no corpus em análise, na medida em que o discurso jornalístico prevê, pela sua natureza factual e real, balizações temporais claras; por outro lado, o emprego modal das formas do mais-que- perfeito, tendo em conta o tipo de discurso que o contextualiza, não ocorre neste corpus em particular.