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Na ótica de Lessard-Hérbert, Goyette,e Boutin (1990) a observação participante é uma técnica de pesquisa que permite compreender um meio social que, à partida, lhe é estranho ou exterior e que lhe vai permitir integrar-se progressivamente nas atividades das pessoas que nele vivem. Nesse sentido, Richardson (2007) destaca que esse método é recomendado especialmente para estudos de grupos e comunidades. Para o autor, o observador participante tem mais condições de compreender os hábitos, atitudes, interesses, relações pessoais e características da vida diária da comunidade. A escolha por esta técnica no processo inicial desta investigação justifica-se pelo fato de ela permitir identificar acontecimentos diretamente, sem qualquer intermediação. A observação participante permite o acesso a dados sobre situações habituais em que os membros das comunidades se encontram envolvidos, possibilita o acesso a dados que a comunidade ou grupo considera de domínio privado e, por fim, permite captar as palavras de esclarecimento que acompanham o comportamento dos observados (Gil, 1999a).

Quivy e Campenhoudt (2008) divide essa técnica em observação direta e indireta. Para o autor a observação direta é aquela em que o investigador procede diretamente a recolha de informações, sem que haja intervenção dos sujeitos observados. Enquanto na observação indireta o investigador dirige-se ao sujeito para obter a informação procurada. Ao responder às perguntas, o sujeito intervém na produção da informação.

No caso desta investigação, realizamos uma observação direta, procurando conhecer o modo como se desenvolvia o quotidiano de trabalho do Centro, como as tapiocas eram ofertadas nos boxes, identificar o fluxo de clientes durante dias da semana e nos finais de semana. Pretendíamos, com essa observação, conhecer minimamente a este comércio e a comunidade que o desenvolvia, para que pudéssemos ter uma grelha de entrevista bastante fundamentada no contexto real.

Para Lessard-Hérbert, M.; Goyette, G; Boutin (1990) a observação participante permite coletar dois tipos de dados. Os dados registados nas notas de trabalho de campo são do tipo da descrição narrativa e aqueles que o investigador anota no seu diário de bordo, que pertencem ao tipo de compreensão, pois fazem apelo à sua própria subjetividade. No âmbito desta tese, optamos por fazer os relatos descritivos que, segundos os autores, constituem a informação sobre o local no qual evoluem os atores, bem como a sua percepção da situação que eles vivem, das suas expectativas

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e das suas necessidades. Documentos desse tipo constituem uma fonte de esclarecimentos objetivos com base na interpretação e na compreensão da realidade. Desta forma, procuramos perceber e descrever relatos sobre temáticas específicas, definidas de acordo com os objetivos do trabalho e com as informações que coletamos na análise dos dados secundários, como por exemplo, sabores da tapioca, formas de atendimento, estrutura física do centro, acessibilidade, modo de produção da tapioca, dentre outros.

A presença do investigador foi autorizada pela Associação dos produtores de tapioca. Inicialmente os sujeitos se apresentaram apreensivos, especialmente por desconfiarem que a investigação pudesse ter alguma ligação com o Governo do Estado. Neste contexto, Richardson (2007, p. 262) destaca que um bom relacionamento entre o pesquisador e os elementos do grupo é de suma importância para o desenvolvimento do trabalho. Conseguindo a compreensão e aceitação dos participantes do grupo, o passo seguinte dependerá apenas do pesquisador, mas, por isso, não será mais fácil de ser dado, porque exige duplo desempenho do papel. É exatamente essa interação do investigador, de forma mais ou menos próxima com a comunidade, o alvo de várias críticas na academia. A presença do pesquisador no ambiente observado pode afetar a espontaneidade dos sujeitos analisados, produzindo resultados pouco confiáveis. Por outro lado, o pesquisador, de acordo com o nível de envolvimento e “participação junto da comunidade, corre o risco de perder o foco e criar relações afetivas com os sujeitos” (Gil, 1999b; Richardson, 2007). Com efeito, essas situações podem ser controladas com o conhecimento e a conscientização prévia do ambiente em que irá se desenvolver o estudo e com a postura que o investigador irá se apresentar diante da comunidade.

Ao longo das visitas, os tapioqueiros apresentaram-se mais confiantes e cada vez mais dispostos a manter um contato. Foram realizadas 24 visitas ao Centro, dentre as quais uma delas foi para manter um contato com a Associação dos Tapioqueiros. Em cada dia escolhíamos aleatoriamente um boxe para visitar, consumíamos uma tapioca e a partir dele observávamos a dinâmica do centro durante duas horas. Essa condição de “cliente observador” pareceu-nos deixar os tapioqueiros mais consfortáveis com a nossa presença.

Pela frequência de visitas, optou-se por horários e dias diferentes, para que pudéssemos ter o máximo de compreensão da dinâmica do Centro. De modo a evitar constrangimento com os tapioqueiros, decidiu-se descrever os fatos observados somente após a saída do local.

Esse período de observação foi determinante para o momento inicial da investigação com a comunidade de tapioqueiros porque contribuiu para desenvolver uma grelha de

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entrevista que tivesse questões fundamentadas na realidade do local. Deve se destacar ainda que o contato através desse método “abriu portas” para que a investigação pudesse prosseguir na comunidade de tapioqueiros.

Para Werner e Schoeppfle (1987), a observação participante é uma técnica que pode ser utilizada numa etapa preparatória relativamente à entrevista, permitindo recolher os dados de base daquilo que se tornará a etnografia do meio. No caso desta tese, essa técnica foi utilizada como esse instrumento de coleta de dados base, que em comunhão com as informações secundárias e o quadro teórico permitiram-nos estruturar uma entrevista aprofundada.

6.6.2.2- Entrevista

Nas últimas décadas, o uso da entrevista nas ciências sociais tem se revelado cada vez maior. Esse fato justifica-se porque essa ferramenta de coleta de dados permite aprofundar o conhecimento sobre informações que não estão descritas em fontes documentais e podem ser encontradas em determinadas pessoas(Ribeiro, 2008). De acordo com (Bauer & Gaskell, 2002),a compreensão em maior profundidade oferecida pela entrevista qualitativa pode fornecer uma informação contextual valiosa para explicar alguns achados específicos.

A entrevista é uma das técnicas comumente usadas para a recolha de dados qualitativos (Richards, 1999). De acordo com Duarte (2004, p. 215), as entrevistas “são fundamentais quando se quer conhecer práticas, crenças e valores, pois permitem ao pesquisador coletar indícios dos modos como cada um dos entrevistados percebe e significa sua realidade”.

Para Isabel Guerra (2008), o pressuposto epistemológico dessa ferramenta é o de que o informador é um ator racional capaz de dar sentido às suas ações e que o objeto da entrevista é apreender o sentido subjacente à vida social. Assim, explicar com clareza o objetivo da entrevista e os seus temas é indispensável porque permite estabelecer essa relação de parceria que gera a possibilidade de reflexividade nos dois elementos desta interação(Guerra, 2008, p. 51). Neste sentido, considerando a entrevista como um forma de interação social, (Gil, 1999b) descreve-a como de diálogo assimétrico em que uma das partes busca coletar dados e a outra se apresenta como fonte de informação.

Na ótica de Quivy & Campenhoudt (2008), a entrevista distingue-se de outros métodos pela aplicação dos processos fundamentais de comunicação e de interação humana. Para o autor, “corretamente valorizados, estes processos permitem ao investigador

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retirar das entrevistas informações e elementos de reflexão muito ricos e matizados. Ao contrário do inquérito por questionário, os métodos de entrevista caracterizam-se por um contato direto entre o investigador e os seus interlocutores e por uma fraca directividade por parte daquele” (Quivy & Campenhoudt, 2008, p. 192).

Gil (1999b, p. 118) apresenta algumas das principais razões pelas quais as entrevistas são utilizadas na pesquisa social.

 A entrevista possibilita a obtenção de dados referentes aos mais diversos aspetos da vida social;

 A entrevista é uma técnica muito eficiente para a obtenção de dados em profundidade acerca do comportamento humano;

 Os dados obtidos são suscetíveis de classificação e de quantificação;  Não exige que a pessoa saiba escrever;

 Possibilita a obtenção do maior número de respostas, posto que é mais fácil deixar de responder a um questionário do que negar-se a ser entrevistado;  Oferece flexibilidade muito maior, posto que o entrevistador pode esclarecer o

significado das perguntas e adaptar-se mais facilmente às pessoas e às circunstâncias em que se desenvolve a entrevista;

 Possibilita captar a expressão corporal do entrevistado, bem como a tonalidade de voz e ênfase nas respostas.

No processo de investigação científica, a entrevista pode ser utilizada tanto de forma isolada, como em conjunto com outras técnicas. Com efeito, de acordo com os objetivos de cada estudo, ela pode assumir diversas formas. Na academia, encontram- se algumas classificações dos diferentes tipos de entrevista.

Richardson (2007, p. 208) apresenta em sua investigação dois tipos de entrevista, são elas: estruturadas e não estruturadas. De acordo com o autor, uma entrevista construída com perguntas e respostas pré-formuladas denomina-se entrevista estruturada, usualmente chamada de questionário. Por outro lado, a entrevista não estruturada também conhecida como entrevista em profundidade, ao invés de responder à pergunta por meio de diversas alternativas pré-formuladas, visa obter do entrevistado o que ele considera os aspetos mais relevantes de determinado problema: as descrições de uma situação de estudo. Essa entrevista procura saber como e por que algo ocorre, em lugar de determinar a frequência de certas ocorrências, nas quais o pesquisador acredita.

Para Gil (1999b, p. 119), as entrevistas mais estruturadas são aquelas que predeterminam o maior grau de respostas a serem obtidas, ao passo que as menos

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estruturadas são desenvolvidas de forma mais espontânea, sem que estejam sujeitas a um modelo preestabelecido de interrogação. De acordo com o autor a entrevista estruturada desenvolve-se a partir de uma relação fixa de perguntas, cuja ordem e redação permanece invariável para todos os entrevistados, que geralmente são em grande número. Por possibilitar o tratamento quantitativo dos dados, esse tipo de entrevista torna-se o mais adequado para o desenvolvimento de levantamentos sociais. De acordo com Quivy & Campenhoudt,(2008), a entrevista semidiretiva ou semidirigida é certamente a mais utilizada em investigação social. É semidiretiva no sentido em que não é inteiramente aberta nem encaminhada por um grande número de perguntas precisas. Geralmente, o investigador dispõe de uma série de perguntas-guias, relativamente abertas, a propósito das quais é imperativo receber uma informação da parte do entrevistado. Mas não colocará necessariamente todas as perguntas pela ordem em que as anotou e sob formulação prevista. Tanto quanto possível, «deixará andar» o entrevistado para que este possa falar abertamente, com as palavras que desejar e pela ordem que lhe convier.

O autor refere-se ainda a outra variação dessa técnica, a entrevista centrada. Na perspetiva de (Quivy & Campenhoudt, 2008), esse tipo de entrevista analisa o impacto de um acontecimento ou de uma experiência precisa. O investigador, nesse caso, dipõe de uma lista de tópicos precisos a abordar.

Nessa investigação, optamos pelo desenvolvimento da entrevista semidiretiva proposta por Quivy (2008), especialmente porque nos permitiu organizar uma grade estrutural de questões essenciais para responder aos objetivos dessa investigação e realizar uma entrevista que não fosse totalmente fechada, mas que, de acordo com o seu desenvolvimento, pudesse aceitar outras reflexões e levantar outros questionamentos, sem perdermos o foco central definido inicialmente.