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A tapioca é um prato de origem indígena, que se desenvolveu e perdurou até os dias de hoje nas regiões Norte e Nordeste do Brasil. A definição dessa palavra de origem tupi pode ter dois significados. De acordo com Bezerra (2005) “tapi” significa pão e “oca” quer dizer casa, deste modo, traduz-se este nome como “pão de casa”. Para Ribeiro, (1987) citado por Lima (2007)no sentido etimológico, “Typy-oca” significa o sedimento, o resíduo do sumo da mandioca. Este resíduo seria a matéria-prima base da produção de tapioca.

A tapioca é feita de goma de mandioca, água e sal. Esta é a receita base da massa. De acordo com cada região, pode-se acrescentar ainda o coco ralado na massa. No Ceará, de acordo Casemiro (1982) a tapioca faz-se do seguinte modo:

“Mistura-se a goma com o coco, acrescentando-se aos poucos a água com sal, até começar a embolar. Depois esfrega-se com as mãos até desmanchar todos os bolões. Põe-se para assar em uma frigideira e cobre-se somente antes de virar a primeira vez, depois deixa-se descoberta, retira-se da frigideira e molha com leite de coco”.

Essa é uma receita de tapioca comumente produzida na casa das famílias cearenses, que para além do leite de coco pode ser servida apenas com manteiga. Na linguagem popular estas tapiocas são conhecidas como “tapiocas fininhas” ou “tapiocas da vó”. A título de curiosidade, o acréscimo do coco e do leite coco à receita da tapioca é uma influência portuguesa. O coco foi uma das frutas trazidas pelos portugueses da Índia e muito utilizada pelas mulheres lusitanas, em substituição ao leite(Martins, 2009). A matéria-prima base da tapioca, denominada no Ceará de goma (embora em outros locais possa ser chamada de fécula ou polvilho), deriva da mandioca. Essa raíz foi sempre um alimento importante na culinária indígena e determinante no contexto histórico da colonização e formação da cozinha brasileira, uma vez que dela derivam diversos outros produtos, como a farinha, a carimã e o sumo do qual se faz o tradicional molho do Tucupi no Estado do Pará. No Brasil colonial, a mandioca tornou-

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se o “trigo” europeu, ou seja, passou a ser o produto que substituía o trigo nas receitas trazidas da europa, como por exemplo os bolos(Cascudo, 2004; Martins, 2009)

De acordo com o antropólogo Cascudo (2004), no Brasil, a divulgação da mandioca deu-se através da família índigena Auraca, que habitava na Amazônia. Nesse contexto, encontra-se uma lenda da origem desta raíz, bastante difundida no Norte e Nordeste do país.

“Segundo a lenda contada pelas tribos indígenas, a filha de um cacique ficou grávida sem ainda ser casada. Ao saber da notícia o cacique ficou furioso e a todo custo quis saber quem era o pai da criança. A jovem índia insistia em dizer que nunca havia namorado a ninguém. O cacique, não acreditando na filha, rogou aos deuses que punissem a índia. Sua raiva por essa vergonha era tamanha que ele estava disposto a sacrificar a filha. Porém, numa noite, ao dormir, o cacique sonhara com um homem que lhe dizia para acreditar na índia. A jovem índia deu à luz a uma menininha e deu-lhe o nome de Mani. Para espanto da tribo, o bebê era branco e já nascera sabendo falar e andar. Passando alguns meses, Mani morreu de repente. Todos estranharam o triste fato, pois a criança não havia ficado doente. A menina simplesmente deitou-se, fechou os olhos e morreu. Mani foi enterrada dentro da própria oca onde sempre morou. Todos os dias sua mãe regava o local da sepultura de Mani, como era tradição de seu povo. Após algum tempo, algo estranho aconteceu. No local onde Mani foi enterrada começou a brotar uma planta desconhecida. Todos ficaram admirados com o acontecido. Resolveram, pois, desenterrar Mani, para enterrá-la em outro lugar. Para surpresa da tribo, o corpo da pequena índia não foi encontrado. No local, acharam somente as grossas raízes da planta desconhecida. A raiz era marrom por fora e branquinha por dentro. Após cozinharem e provarem a raiz entenderam que se tratava de um presente do Deus Tupã. A raiz de Mani veio para saciar a fome da tribo. Os índios deram o nome da raiz que hoje conhecemos como mandioca” (Cascudo, 2004).

Denominada cientificamente de Manihot, a mandioca é uma planta de porte semi- arbustivo, que apresenta cerca de 200 espécies (EMBRAPA). Com efeito apenas a espécie Manihot Esculenta é explorada comercialmente. A mandioca é uma excelente fonte de carboidratos e pertence ao grupo dos alimentos energéticos (Cascudo, 2004; Centec, 2004; Marques, 2010). Pobre em proteínas, porém muito rica em quantidade de vitaminas B, potássio, cálcio, fósforo e ferro (Martins, 2006).

Segundo Lima (2007), a raíz consumida do Nordeste para baixo é a branca, mais delicada, enquanto na região Norte, prevalece um maior consumo da mandioca amarelada.

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Figura 19 - Mandioca Branca

Fonte:http://escondidinhos.blogspot.pt/

A mandioca branca pode ser consumida cozida, dentro de carnes, é matéria-prima de bolos famosos na região Nordeste, como o Souza-Leão, serve para produzir a goma para tapioca, dentre muitas outras funções.

Figura 20 - Mandioca Amarela

Fonte: http://www.elcione.com/blog/?p=388

A mandioca amarela é bastante utilizada para fazer farinha de mandioca, embora possa ser usada para produzir outros pratos/produtos. O seu uso ainda é restrito em alguns locais. Em Fortaleza, local onde se desenvolve este estudo empírico, o uso da mandioca branca prevalece.

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Existem ainda duas grandes divisões para as espécies dessa raiz: a mandioca-mansa ou doce e a mandioca-brava ou amarga. O que determina essa divisão é a quantidade de ácido cianídrico (substância venenosa) contida em algumas espécies. A mandioca doce não é tóxica, mas apropriada ao consumo. Por outro lado, a raiz-brava precisa passar por um tratamento adequado para a retirada do veneno. Essas duas variedades podem ser consumidas e aproveitadas para fazer diversos produtos23. Sublinhe-se que, na linguagem popular, a denominação dada à mandioca pode variar de acordo com a região. Nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste a raíz é conhecida como “Aipim”, nas regiões Norte e Nordeste ela é chamada de “macaxeira”.

O plantio da mandioca na região Nordeste ocorre, normalmente, no início da estação das chuvas (janeiro/março) e pode se prolongar por dois ou três meses, conforme o hábito do agricultor e a área a ser plantada. Nessa região, a macaxeira é cultivada para atender à indústria que produz diversos derivados (goma, farinha, carimã24 etc.), o consumo normal (cozida e frita), bem como para produzir alimentação animal (especialmente para bovinos, suínos e aves) (Centec, 2004).

Da mandioca aproveitam-se tanto a raiz como as folhas, entretanto, o consumo das folhas (a Maniva) está limitado entre o Recôncavo Baiano e a parte oriental da Amazônia(Lima, 2007). Dos produtos desenvolvidos na região Nordeste, destacam-se a farinha, a goma e a carimã. Cada um desses elementos se produz numa etapa diferente de tratamento da mandioca.

Para se obter a goma de tapioca, a mandioca deve passar pelo seguinte processo: “lava-se a raiz para a retirada da terra e coloca-se de molho na água. Após esse processo de amolecimento, a raiz é passada por um ralador que, na cultura indígena, é denominado de “caititu”.

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Figura 21 - Ralador de mandioca (Caititu)

Fonte: Elaboração Própria

O caititu é uma espécie de ralador de mandioca, e tem herança indígena, por isso recebe este nome.

Figura 22 - Prensa de mandioca (Tipiti)

Fonte: Elaboração Própria

O tipiti também é outro aparelho de origem indígena e serve para prensar a mandioca, depois de ralada, permitindo tirar o sumo que fica na massa. Ambos os aparelhos podem ser encontrados em casas de farinha tradicionais, mas já existem em formato industrial.

Desse processo, obtém-se uma massa que pode ser utilizada para fazer a farinha de mandioca, beijus, bolos e um líquido que irá originar a goma. Este líquido passa por um processo de decantação, e o pó branco que fica no fundo é a goma. Ressalve-se que na região Nordeste o líquido que é retirado deste processo não tem utilidade. Por