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R OMA E AS EDICTA P RETORIANAS

Se a Grécia é o berço da civilização ocidental, foi em Roma que tudo passou a se desenvolver. É com o surgimento e expansão do Império Romano que podemos afirmar que a sociedade estabeleceu marcos políticos, econômicos e jurídicos para as necessidades que o próprio império clamava. O direito baseado unicamente nos costumes religiosos tornou-se arcaico para este vasto império que exigiu um direito unificado e, mais do que isso, que servisse de espelho para os povos dominados.

Inicialmente, por evidência, todo o direito estava concentrado na realeza, figura representativa dos deuses, estando ligado de forma intrínseca à religião do Império. Era o monarca, portanto, o incumbido de dizer o direito, cabendo a ele a última palavra, a última ratio. Com o fim da realeza, foi necessária a criação de cônsules eleitos anualmente pelos patrícios. Mas o império crescia. E crescia de forma absurdamente rápida, de modo que a necessidade de magistrados fez surgir os cargos jurisdicionais voltados para o direito e não ligados diretamente à religião.

Embora o Ius Civile, que abrangia somente aos cidadãos romanos estivesse ligado à religião, foi esta necessidade que fez surgir a Lei das Doze Tábuas, ainda na

República, tornando-se o cerne do Direito Romano, com grande desenvolvimento das questões processuais ainda hoje importantes para a consecução do direito ocidental.

Eis aqui o primeiro grande marco dessa codificação romana, já que foi através do direito comparado com as leis gregas que as Doze Tábuas surgiram, havendo diferenciações importantes entre o direito público e o privado, distinções que permanecem no direito brasileiro como aspecto da longa duração da influência romanística. Foi a comparação com o direito grego, somado aos costumes romanos, que determinaram o seu sucesso.46

Neste período da República, muitas eram as fontes do direito, como os costumes, as leis, os jurisconsultos e os edictos dos magistrados. Uma das disposições contidas nas Doze Tábuas diz respeito à instituição dos pretores e sua função como magistrado que presidia o processo. Dependendo do período da história romana, o pretor possuía poderes extraordinários na política do Império, sendo ele o responsável por tornar o conflito jurídico através da linguagem, encaminhando posteriormente para os juízes, que consultavam ou julgavam.47

Importante observar que o pretor não era o responsável pelo julgamento, mas sim por ditar os rumos do processo e organizá-los para os jurisconsultos, reais detentores da prerrogativa de julgamento. Os pretores possuíam cargos que mais se assemelham aos dos cartorários e chefes de gabinete na atualidade, que organizam e movimentam o processo para que o juiz, singular ou colegiado, aprecie a causa.

Noticia-se que, na República, o pretor exercia influência considerável sobre o direito romano. Como todos os demais magistrados jurídicos era investido da jurisdictio, mas, além disso, era o detentor do

imperium. Pela jurisdictio podia, não julgar, mas dizer o direito e organizar os processos confiados aos jurados. Ao assumir o cargo, o pretor indicava o edito, afixado no forum, para os casos em que ia usar o imperium, dado a conhecer as diversas fórmulas que aplicaria às

46 Neste sentido: O acontecimento mais importante da República, do ponto de vista jurídico, foi a criação

da Lei das XII Tábuas, resultado da luta da plebe por novos direitos, mas repudiada pelos patrícios e pelo senado. O direito escrito encontrou nesse ordenamento jurídico um monumento para o direito que revela claramente uma legislação rude e bárbara, fortemente inspirada em legislações primitivas e talvez muito pouco diferente do direito vigente nos séculos anteriores. (NETO, Francisco Caseiro; SERRANO, Pablo Jiménez. Direito Romano – Fundamentos, Teoria e Avaliação dos Conceitos do Direito Romano Aplicados ao Direito Contemporâneo. São Paulo: Desafio Cultural Editora, 2002, p. 27).

47 Neste sentido: “A Lei das XII Tábuas, que estão estudando em Direito Romano, e é um documento

fundamental do Direito do Ocidente, também se caracteriza por ser uma consolidação de usos e costumes do povo do Lácio. A lei não se distinguia do costume, a não ser por este elemento extrínseco, de ser escrita: apenas esculpia, para conhecimento de todos, aquilo que o poder anônimo do costume havia revelado. E só com o decorrer do tempo, através de uma longa experiência científica, que a lei passa a ter valor em si e por si, traduzindo a vontade intencional de reger a conduta, ou de estruturar a sociedade de modo impessoal e objetivo”. (REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. São Paulo: Editora Saraiva, 25ª Edição, 2001, p. 134).

partes para a sanção de seus direitos. Existem vários tipos de editos: o edito urbano (proclamado pelo pretor urbano), perpétuo (durava o mesmo tempo que o período do pretor – um ano), repentino (de emergência ou circunstancial que se faz em caso especial) e a pars

translaticia (preceitos aproveitáveis) do edito, conservados pelo novo pretor que sucede o anterior.48

Cada edicto tinha uma função específica no direito romano. O pretor, porém, não tinha a função de julgar, como já verificado, mas sim de preparar o processo para o julgamento posterior. Neste ponto é importante deixar claro porque as edicta eram formuladas pelos pretores para serem os trilhos nos quais o processo seguiria, de modo que não cabia aos pretores as prerrogativas decisórias.

Por isso que, inicialmente, suas funções eram bastante limitadas, já que haviam inúmeras outras formas legais e mesmo organizacionais que estavam acima de suas atribuições. Não somente a lei restringia suas ações, como também impedia o pretor de participar dos julgamentos propriamente ditos.

A atuação do pretor era bastante limitada, para além da restrição imposta pelo rígido formalismo próprio do sistema das ações da lei. Não compreendia as suas funções o julgamento do litígio, tal como o faziam o rex e, após, os cônsules. A iurisdictio conferida ao praetor consistia somente no poder de declarar a norma jurídica aplicável no julgamento. Quiçá com uma forma de mitigar a novel delegação da

iurisdictio, houve uma divisão da função de julgar os litígios entre dois órgãos, dicotomizando, assim, o processo civil romano em duas fases. Havia uma primeira fase chamada in iure, perante o pretor, e uma segunda denominada apud iudicem, perante o iudex unus, um cidadão romano que atuava como árbitro. Apenas quando o litígio era travado entre romanos e estrangeiros ou o objeto da controvérsia versava sobre posse ou sucessão hereditária, a fase apud iudicem ocorria junto aos tribunais dos recuperatores e centumviri, respectivamente, e não perante o iudex unus. Era na segunda fase do processo, da qual não participava o pretor, que se dava o julgamento.49

Desta forma, a função do Pretor em muito se assemelha a uma das quais está incumbido o Supremo Tribunal Federal, qual seja, a função de guardião da Constituição Federal da República Federativa do Brasil. Agindo em conformidade com as Doze Tábuas, assim como os Ministros com a Carta Magna, os pretores também deveriam fazer com que a lei fosse aplicada em conformidade com os códigos estabelecidos, corrigindo e evitando que ocorressem desconformidades legais.

48 NETO, Francisco Caseiro; SERRANO, Pablo Jiménez. Ob. Cit. São Paulo: Desafio Cultural Editora,

2002, p. 26.

49 DIAS, Handel Martins. A Evolução dos Poderes do Pretor na História do Processo Civil Romano.

Mas, diferentemente do Judiciário, os pretores não eram nesta primeira fase os responsáveis pelos julgamentos, cabendo-lhes a função de dizer o direito, sem que lhe coubesse também a função de aplicar o direito, restringindo-se à conduzir o processo de forma correta para o julgamento.

A primeira função do pretor consistia justamente na publicação das edicta, programa que dispunha quais seriam suas finalidades jurídicas diante da administração da Justiça em sua magistratura. No ano de sua vigência, os pretores podiam redigir as regras necessárias à manutenção da Justiça quando a lei não o dispusesse ou possuísse lacunas, bem como diminuir poderes de regras do direito antigo, sem ab-rogá-las.

A interpretação e aplicação das leis estavam ligadas à religião. Como o fundamento religioso encontra-se nos dogmas, as suas leis não podem (e não devem) sofrer alterações, mas sim serem complementadas, o que com o passar dos tempos acaba por contradizer as próprias disposições religiosas.

Em princípio, por ser divina, a lei era imutável. Devemos notar que nunca se revogavam as leis. Podiam se fazer leis novas, mas as antigas subsistiam sempre, por mais contradição que houvesse. O código de Drácon não foi revogado pelo de Sólon: nem as Leis Reais pela das Doze Tábuas. A pedra em que se gravava a lei era inviolável; quando muito, os menos escrupulosos julgavam poder interpretá-la a seu modo. Esse princípio foi a principal causa da confusão que se nota no direito antigo. Leis opostas e de diferentes épocas estavam reunidas, e todas deviam ser igualmente respeitadas.50

Relevante observar que em todo o direito antigo não existia a revogação de leis e sim a sobreposição de umas sobre as outras, sem que estas, porém, perdessem a sua validade e sua aplicabilidade nos casos. E se uma lei não podia revogar outra lei, uma

edicta não poderia ter esse efeito.

Embora as edicta não possuíssem força normativa, tendo por objetivo dirimir as discrepâncias e diferenças que esta possuía, bem como preencher as suas lacunas, assim passaram a ser vistas com o tempo.

Sem embargo, o fomento do papel do pretor no exercício da

iurisdictio no período formular não se resumiu a tal. Ele incorporou uma novel e importantíssima competência, qual seja, a de produzir direitos. Ao assumir o cargo, o pretor publicava o seu programa (edito), por que revelava como atuaria durante aquele ano em que exerceria a pretoria, realizando autêntica atividade normativa. Dessarte, embora sem derrogar as regras do direito quiritário, os pretores passaram discricionariamente a prever direitos que não estavam previstos ou a modificar os já existentes no ius quiritium. Isso permitiu que os pretores, forte no seu poder de imperium, denegassem

ações mesmo quando as tutelas jurídicas pretendidas estivessem insculpidas no direito quiritário ou, ao contrário, concedessem ações quando as pretensões não estivessem previstas no ius civile. Esse direito, produzido e elaborado pelo pretor, era chamado de ius

honorarium.51

O direito quiritário tornou-se inaplicável devido à extensão do Império. Apesar de cumprir sua função dentro da Pólis Romana, não possuía o mesmo alcance e os mesmos efeitos nas mais distantes partes do território.

Por tal razão, com o tempo, as edicta passaram a ter outro significado no direito romano, assim como os pretores passaram a desempenhar outra função que outrora não lhes cabia, função essa de dizer o direito e aplicá-lo, ou seja, julgar os casos.

Neste ponto deixamos de conceber os pretores como guardiões do direito e passamos a vê-los como aplicadores da lei. O problema é que a lei era criada pelos próprios pretores no início de sua magistratura, pois a função de preparar as edicta e afixá-las na porta do fórum continuou, mas cumulada com a função de julgamento.

[...] em virtude do alcance destas disposições – que eram na verdade obrigatórias durante o tempo em que perdurasse o imperium do pretor – e das constantes confirmações dos magistrados subsequentes, os editos vieram por se firmar no tempo, adquirindo praticamente força legislativa reconhecida pelo uso [...]52

Esta abrangência e importância que as edicta passaram a ter foi alavancada pela influência do poder de imperium do pretor. Como verificado, os pretores tinham como escopo diminuir as lacunas do sistema jurídico romano, o que acabou gerando uma abertura muito grande na concepção e na aplicabilidade desse direito.

Em outras palavras, a flexibilização do papel do pretor em cobrir as lacunas tornou as edicta discricionárias. Se o intuito era diminuir a injustiça e propagar a equidade do direito, a liberdade dos pretores em baixar edicta acabou por configurar-se como a própria iniquidade e injustiça, já que aplicariam o direito não de acordo com a lei preestabelecida, mas sim com a sua própria vontade externada nos proclamas.

Essa modificação do sistema romano se deu não pela Lei das XII Tábuas, até porque nela não havia a determinação dos edicto, e sim por leis posteriores à sua criação. A Lei das XII Tábuas é datada de 450 a.C., enquanto o primeiro edicto foi

51 DIAS, Handel Martins. Ob Cit. Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

Intertemas, 2010, pp. 206-225.

52 AZEVEDO, Luiz Carlos de. Introdução à História do Direito. São Paulo: Editora Revista dos

criado em 118 a.C.53 Tal fato se deu por conta da atrofia do direito quiritário, de modo que as edicta passaram a desempenhar o papel de um verdadeiro código.

É importante destacar que com as edicta e os pretores ganhando cada vez mais força e espaço no cenário jurídico romano, novos rumos passaram a ser tomados para incutir na sociedade a aplicabilidade das determinações pretorianas como leis, momento em que surge, no século II, durante o Império de Adriano, o Edictum Perpetuum.

O jurisconsulto Sálvio Juliano ficou encarregado de redigir uma edicta única, codificando todas as demais, vindo a ser esta, após sua publicação, o Código do Império, tornando-se obrigatório nos tribunais com força de lei. Aqui cabe distinguir o

edicto perpetuum proclamado pelos pretores quando do início de sua magistratura e o

Edictum Perpetuum de Sálvio Juliano.

O edicto perpetuum dos pretores estava atrelado ao ano de vigência de sua magistratura, ou seja, eram as proclamas realizadas por eles quando do início de seu mandato, de modo que se tornava perpétuo para aquele pretor enquanto durasse sua magistratura, vigorando até o próximo pretor assumir. Além disso, cabia ao pretor antecedente deixar nas suas edicta determinações para o próximo pretor que o sucederia ao cargo, fazendo com que estas se perpetuassem com o novo pretor e assim de maneira sucessiva enquanto o direito pretoriano vigorou.

Já o Edictum Perpetuum de Sálvio Juliano tinha como base a inalterabilidade, isto é, a codificação realizada a partir de edicta passadas, mas que permaneciam pertinentes ao Império foi a saída encontrada para não mais haver necessidade de novas disposições legais a cada ano, de acordo com as mudanças dos pretores e de suas vontades. Este período do Império Romano, chamado de Pós-Clássico, findou o direito pretoriano, uma vez que as edicta unificadas passaram a vigorar com caráter perpétuo, não no sentido eterno, mas, sim, de inalterabilidade.

O que Adriano pretendeu, portanto – acabando por consegui-lo –, foi dar ao edito de Sálvio Juliano o caráter de perpetuidade, de Código do Império; para tanto, foi o edito sancionado por um senatus consultus, que o tornou obrigatório nos tribunais. A partir de então, ainda que não houvesse perdido o ius edicendi, acabaram os magistrados por sofrer sensível restrição na sua liberdade de redigir e baixar editos, pois as normas contidas nestes deveriam se ater às regras gerais

53 Neste sentido: “Gaio afirma que à época da Lei das XII Tábuas e durante o largo tempo que se seguiu à

sua vigência, o pretor ainda não baixava editos; estes surgiram muito mais tarde, posteriormente inclusive à chamada Lei Hortênsia (468 ab. U.C./286 A.C.), e somente após o abrandamento do primitivo critério onde imperava a unidade legislativa; com efeito, a ação inovadora dos pretores aparece e ganha incremento unicamente a partir da Lei Aebutia (630/605 ab. U.C./151/124 A.C.); ao que consta, o mais antigo edito conhecido seria o do pretor Rutilius, datando de 118 a.C.”. (AZEVEDO, Luiz Carlos de. Introdução à História do Direito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, pp. 63-4).

consagradas pelo edito de Sálvio Juliano; limita-se consideravelmente sua independência, não lhes sendo mais faculdade revogar, por nova disposição, norma contida naquela compilação. Em tais condições, a função criadora do direito, característica de sua autoridade e poder, vai se debilitando, pouco a pouco, até sua completa extinção.54

A necessidade de petrificar o direito surge do mesmo fato de concentrar, nas mãos do governante (no caso, o Imperador), o poder decorrente do próprio direito. Se é o direito aquele que fundamenta, adjunto à religião, o poder estatal conferido ao imperador, este deve ter o controle sobre o direito, demonstrando a sua autoridade.

Aliás, a reunião da legislação produzida em Roma foi empregada em outras oportunidades, como podemos perceber com a codificação realizada durante o reinado de Justiniano.

As Constituições Imperiais se tinham sobreposto, formando de César Augusto a Justiniano, de Ocidente a Oriente, um confuso amontoado legislativo. Sob os auspícios de Justiniano, o jurisconsulto Treboniano realizou o trabalho de seleção, catalogação e codificação das leis imperiais, que resultou no Codex Justinianeus (Código de Justiniano).55

O Corpus Juris Civilis foi considerado um marco da história do direito romano, devido não apenas sua abrangência, mas também por conta da precisão com que um amontoado de normas esparsas se tornou uma precisa codificação legal.

Um ponto significativo deve ser considerado sob a ótica da identificação analógica das edicta com as súmulas vinculantes, guardada as devidas proporções temporais e de alcance jurídico, mas ainda assim determinante para a compreensão posterior da análise que será realizada sobre o instituto constitucional brasileiro.

Quando Sálvio Juliano reúne as edicta tendo como intuito codificá-las, os pretores perdem seu poder de imperium, isto é, cada vez mais são podados na criação de novos direitos, pois devem obedecer às designações contidas no Código do Império. Neste ponto, a codificação acaba com a discricionariedade dos atos dos pretores, bem como impedem que novas edicta surjam a cada ano. Por outro lado, ao direcionar todos os magistrados ao cumprimento estrito do Código do Império, acabou também com a liberdade decisória que estes possuíam para julgar os casos de acordo com as determinações legais.

A ação de Adriano funcionou como uma faca de dois gumes. Enquanto nas questões procedimentais os pretores foram aos poucos compelidos a não proclamarem

54 AZEVEDO, Luiz Carlos de. Ob. Cit. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, pp. 68-9. 55 CICCO, Cláudio de. Ob. Cit. São Paulo: Editora Saraiva, 2013, p. 82.

inúmeras edicta, de outro o processo ficou petrificado, de modo que os julgadores não mais possuíam liberdade para decidir. É, pois, a função automática do magistrado, que Hans Kelsen identifica como sendo a diminuição de suas liberdades:

[...] o juiz está reduzido a uma função puramente automática apesar da infinita diversidade dos casos submetidos ao seu diagnóstico, tem sempre e por toda parte soçobrado ante a fecundidade persistente da prática judicial. Ao êxito aparente e transitório dos autoritarismos sucederá, sempre, a reafirmação das liberdades.56

Isto é importante de se ressaltar, vez que a função criadora do direito saiu das mãos dos magistrados, que ficaram novamente apenas com a função de julgar, ao mesmo tempo que essa função considerada típica estava atrelada ao estrito cumprimento das disposições do Edictum Perpetuum, o que contribuiu para solidificar e petrificar o direito romano.

Cabe ainda ressaltar que os jurisconsultos tiveram importância capital no desenvolvimento do sistema jurídico romano, desde sua fundação na Lei das XII Tábuas até a codificação do Corpus Juris Civilis e do Edictum Perpetuum, desenvolvendo funções que iam além de criar o direito e fazer justiça, mas também uma função pedagógica, desde perpetuar o direito e sua classe até servir de escola doutrinária e guia àqueles que encontravam-se nos mais distantes locais do Império.

Os jurisconsultos romanos não limitam sua atividade à prática judicial, em que aconselham, na qualidade de peritos, as decisões dos prestadores para fazer justiça: eles desenvolvem com muita frequência uma obra científica e pedagógica. O ensino do direito representa papel essencial na constituição de um corpo de teoria do direito. Esse ensino responde a várias necessidades: inicialmente, àquela de formar discípulos que vão perpetuar a profissão; em seguida, àquela de defender eventualmente uma “escola” doutrinária particular contra outra corrente (houve assim uma rivalidade entre a escola dos Sabinianos e a dos Proculianos); enfim, àquela de servir de guia para os praticantes do direito, exilados nos confins do Império, em proveito dos quais os mais ilustres jurisconsultos redigem verdadeiros tratados