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Autora - CARNEIRO, Janãine, D. P. L.

Fonte – Pesquisa de campo, maio de 2012.

As propriedades camponesas que se dedicam à produção do leite em Corumbaíba (GO) têm algumas das suas características apresentadas nas declarações do Presidente da COOPAC ao afirmar que:

[...] a maior parte dos nossos “produtores” são proprietários de suas terras, ou peão de uma grande fazenda que o dono não quer o leite e dá o leite para o peão [...] o leite não é a única renda da terra, tem a venda de gado, outras coisas, o leite é só para manter a despesa, se tiver que fazer algum investimento, tem que vender gado [...] a maioria da mão de obra vem da família mesmo, mas depende do tamanho da fazenda, do tanto de leite que tira, quando tira mais leite aí tem um funcionário. [...] as famílias, mesmo com as dificuldades de alimentação (para o gado) e preço continuam produzindo leite porque pode produzir junto com outras coisas [...] você faz as contas, o leite paga as despesas e sobra o bezerro, sobra a vaca de descarte [...] Quando chega na seca o leite acaba, nas águas derrama de leite, é sazonal64 [...] (PESQUISA DE CAMPO, 2012).

Observa-se que mesmo diante das dificuldades para permanecer no setor, diante das exigências no mercado, a produção camponesa se mantém pela garantia de renda mensal e pela possibilidade de se dedicarem às outras atividades. Nesse caso, ocorre a sujeição da renda da terra, contudo a autonomia camponesa é mantida, incorporando as inovações tecnológicas na medida em que julgar importante para a melhoria da produção e aumento da sua renda.

Nos próximos itens serão apresentadas as dinâmicas territoriais dos diferentes tipos de propriedades rurais em Corumbaíba (GO): as empresas rurais, as de pecuária tradicional e as camponesas.

3.2.1 As empresas rurais

A lógica do desenvolvimento capitalista de produção é, pois, gerada pelo processo de produção propriamente dito (reprodução- ampliada/extração da mais-valia/produção do capital/extração da renda da terra), circulação, valorização do capital e a reprodução da força de trabalho. É essa lógica contraditória que constrói/destrói formações territoriais em diferentes partes do mundo ou faz com que frações de uma mesma formação territorial conheçam dinâmicas desiguais de valorização, produção e reprodução do capital, conformando as regiões.

(OLIVEIRA, 2004)

Nos anos 1990, com a reestruturação produtiva do capital, o setor agroindustrial lácteo experimentou uma nova fase representada pela autorregulação do setor, uma vez que houve a liberalização dos preços, controlados pelo Estado há mais de 40 anos. A liberalização se deu num contexto de grandes concentrações de capitais no setor agroindustrial do leite, o que representou o fortalecimento dos oligopólios com efeitos diretos no rebaixamento da renda dos produtores, principalmente os pequenos, devido ao aumento dos custos de produção, associados às políticas de modernização do setor empenhadas pelas indústrias, que transferiram o ônus da especialização e modernização da produção somente aos produtores (PAULINO, 2012).

A maioria dos produtores, descapitalizados, se manteve no mercado, mas enfrentando uma série de problemas para continuarem produzindo, diante das fortes pressões dos laticínios para se especializarem, por meio das políticas de preços. Outra parcela de produtores abandonou o mercado formal. Ao mesmo tempo, houve o crescimento da especialização da produção leiteira no País, pois os grandes produtores, com o intuito de se manterem na atividade, modernizaram a produção e se especializaram. Vale lembrar que, todo esse movimento foi/é acompanho pelo Estado como agente financiador e incentivador da modernização, além de atuar como normatizador da produção leiteira.

Nesse contexto, a modernização da produção leiteira se intensificou e se expandiu para as diferentes regiões brasileiras, dentre elas, as áreas de Cerrado, por meio das empresas rurais. Estas - fundamentadas pela presença de políticas técnico-científicas, de insumos, de fertilizantes e de créditos, dentre outros - representam a modernização conservadora da

agricultura, pois compreendem o processo de reformulação das técnicas sem alteração das relações de propriedade, que permanecem centradas no latifúndio moderno (MENDONÇA, 2004). Para o autor, a empresa rural ou tecnificação do latifúndio significou:

[...] um novo fôlego para os grandes proprietários de terras, dissimulado sob o discurso produtivista do agronegócio tentando encobrir a necessidade da reforma agrária e descaracterizando os movimentos sociais que lutam pela terra. Dessa forma, não é possível compreender o processo de modernização da agricultura [...] sem considerarmos o movimento mais geral do capital, pois não compreenderíamos, com acuidade necessária, a existência das contradições. [...] (MENDONÇA, 2004, p. 228).

Com as empresas rurais houve aumento significativo da produção e da produtividade dos produtos agropecuários nas áreas de Cerrado. Esse crescimento pode ser atribuído às facilidades de mecanização e ao cultivo em escala (vantagens comparativas), presença de programas especiais de financiamento e construção de infraestrutura necessária (MENDONÇA, 2004). No entanto, é preciso considerar que esse crescimento acontece mediante uma série de problemas sociais e ambientais. Isso porque:

[...] insiste-se na tese de que a modernização da agricultura foi extremamente exitosa e em que o processo de ocupação das áreas de Cerrado – “ocupação racional” e indiscriminada – visava exatamente obter elevada produtividade da terra e do trabalho. A viabilização da modernização da agricultura – projeto integrado e impulsionado pelas necessidades do capital em assegurar as condições de auto expansão – provocou graves problemas sociais e ambientais. A preocupação fundamental era produzir com custos baixos e isso implica em não desenvolver técnicas e tecnologias que pudessem minorar os impactos sociais e ambientais decorrentes das atividades (MENDONÇA, 2004, p. 230).

Nessa perspectiva, a territorialização do capital nas áreas de Cerrado, como Corumbaíba (GO), não deve ser analisada apenas do ponto de vista economicista, pois os índices revelam o crescimento econômico, a partir da modernização da agricultura. Todavia, esse desenvolvimento econômico deve ser considerado como contraditório, pois está vinculado à exploração do trabalho e à desigualdade na distribuição da renda, ou seja, na manutenção da desigualdade estrutural da sociedade capitalista.

No que refere às empresas rurais do setor lácteo em Corumbaíba (GO) nota-se a hegemonia das relações capitalistas de produção, pautadas na crescente especialização e modernização da produção, bem como, nas relações de trabalho assalariado. Contudo, a pesquisa de campo, revela uma realidade contraditória e heterogênea, já que as propriedades especializadas na produção leiteira no Município apresentam aspectos diferenciados entre si, além de apresentarem distintos níveis de modernização e enfrentarem problemas para se manter no setor.

Nas cinco propriedades especializadas na produção de leite em Corumbaíba (GO) a ordenha é mecanizada e realizada duas vezes por dia, no período matutino e vespertino. O

leite é armazenado no tanque de resfriamento e transportado pelo caminhão tanque a cada dois dias. Apenas na Fazenda São Jerônimo a coleta é feita diariamente, pois de acordo com o proprietário, o tanque da propriedade é insuficiente para armazenar o leite produzido por dois dias. Na Foto 26 identifica-se o caminhão tanque da Italac Alimentos que realiza o transporte do leite até a fábrica, em Corumbaíba (GO).

Foto 26 – Caminhão tanque da Italac Alimentos na Fazenda São Jerônimo em Corumbaíba