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5.1 Pesquisa qualitativa e PESQUISA quantitativa

6.1.5 Os Documentos de Área e a Questão da Internacionalização

O processo de globalização e o acirramento da competição intensificaram as comparações nacionais e internacionais entre as universidades, reforçados pelas agências de rankings que realizam estudos de várias universidades no globo e as categorizam hierarquicamente.

Heugens (2015) emprega o conceito de instituições como sendo equivalente a regras, normas e valores, mas que possuem uma dimensão formal e uma dimensão informal. As instituições formais são as leis, as regras e a capacidade coercitiva. De outro lado, as instituições informais são os costumes, os valores, as crenças e a cultura. As instituições informais podem reforçar, ou não, as regras das instituições formais. Nesse sentido, a Capes, enquanto instituição formal, por meio dos CTCs e de suas Comissões, elabora as diretrizes dos Documentos de Área para os cursos de pós-graduação stricto sensu no Brasil e realiza as avaliações de desempenho deles.

O Documento de Área da Administração, Ciências Contábeis e Turismo tem ligado os conceitos mais altos (6 e 7) aos cursos que apresentam maior grau de inserção internacional. Este é um ponto sensível. Para 76% dos entrevistados os conceitos mais altos (6 e 7) geram

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As sete áreas da Grande Área das Ciências Sociais Aplicadas são: 1 - Administração, Ciências Contábeis e Turismo; 2 - Arquitetura e Urbanismo; 3 - Ciências Sociais Aplicadas; 4 – Direito; 5 – Economia; 6 -

polêmicas e conflitos entre os acadêmicos, com destaque para duas questões: Quais critérios e quais variáveis, de fato, deveriam ser escolhidos para avaliar de forma mais genuína o desempenho e caracterizar a excelência dos programas? E se for a inserção internacional do programa, o que a Capes objetivamente entende por internacionalização?

De acordo com o Documento de Área da Administração, Ciências Contábeis e Turismo de 201346, o grau de internacionalização pode ser definido como “a intensidade de seu trânsito

em grupos de pesquisa e de formação em pesquisa atuando em outros países.”47 Segundo o

documento, uma forma mais objetiva “seria ter dados sobre redes mundiais de pesquisa e, com isso, avaliar a intensidade e a centralidade dos programas nessa rede”. A questão que se levanta nesta parte do documento e que foi arguida pelos acadêmicos entrevistados que conheciam o texto, prende-se ao fato de que, quando se propõe abordar a internacionalização da pós- graduação de “forma mais objetiva”, demonstra-se que isso ainda não é possível. Essa evidência é evidenciada quando o documento emprega o tempo verbal no futuro do pretérito: "seria ter dados..." demonstrando que a internacionalização nas propostas da Capes é um fato que ocorrerá, talvez, em um tempo vindouro, mas não no momento atual. O documento reafirma essa perspectiva quando aponta que esse indicador da internacionalização "é ainda incipiente”.48

Desse modo, a CAPES usa outros indicadores mais próximos para avaliar o grau de internacionalização. Ou seja, apesar de quase duas décadas já terem se passado, desde o Documento "Observadores Internacionais Avaliam a Avaliação da Capes", de 1997, o Documento de Área de 2013 aponta que a internacionalização dos programas de pós-graduação é um critério ainda indefinido – um entendimento ainda em processo de construção, para todas as áreas. Argumenta-se que a área da Administração é jovem e em construção no Brasil e que isso reflete no fato de o CTC na Área da Administração, Ciências Contábeis e Turismo não ter sido capaz de delimitar objetivamente seu entendimento do que seria uma internacionalização genuína, talvez, por ainda não se ter os recursos objetivos e as capacidades para tal.

Tendo em vista que a proposta inicial "é ainda incipiente,"49 pois, até o momento, não é

46 Documento de Área da Capes da Administração, Ciências Contábeis e Turismo de 2013. https://www.capes.gov.br/images/stories/download/avaliacaotrienal/Docs_de_area/Administra %C3%A7%C3%A3o_doc_area_e_comiss%C3%A3o_16out.pdf . Visitado em 20/11/2015. 47 Idem. 48 Idem. 49

possível ter esses dados sobre as redes mundiais de pesquisa para a verificação da intensidade e da centralidade dos programas nessa rede, o documento, então, aponta as aproximações, para avaliar a internacionalização dos programas por meio de outros indicadores que seriam:

a) Intercâmbio de alunos e professores com instituições de ensino que possuem boa reputação;

b) Publicação em periódicos estrangeiros com fator de impacto; c) Receber e enviar professores visitantes;

d) Liderar e participar de grupos de pesquisa com a presença de pesquisadores de diferentes nacionalidades;

e) Publicações internacionais conjuntas;

f) Participação dos docentes e discentes em congressos internacionais e em comissões que organizam eventos internacionais sejam eles no Brasil e no estrangeiro;

g) Atuar como membros de conselhos editorial de periódicos; h) Ter projetos de pesquisa financiados por agências internacionais; i) Participar de bancas no exterior; e

j) Ser referee em periódicos e eventos internacionais.

O Documento, após listar os critérios de aproximações que seriam a maneira mais objetiva de avaliar a internacionalização, conclui com a expressão: "entre outros"50, o que abre ainda mais a

gama de possibilidades do que seriam os conteúdos internacionais relevantes para a Capes e os condicionantes às notas 6 e 7 dos programas.

Heugens (2015), ao empregar o conceito de instituições como sendo equivalente a regras, normas e valores e que possui uma dimensão formal e uma dimensão informal, refere-se à cultura enquanto parte da instituição, que pode reforçar as regras ou não. Nesse caso, a Capes, por meio dos seus Conselhos Técnico-Científicos, enquanto uma instituição formal, tem 50 Documento de Área da Capes.

trabalhado para criar uma política de internacionalização para a pós-graduação stricto sensu no Brasil. Essas novas diretrizes, por vezes, se chocam com a “tradicional” cultura e com os costumes dos acadêmicos, que não viam a publicação como inerente ao trabalho docente. Em especial a partir dos anos 2000, a Capes trabalha no sentido de mudar esse padrão de comportamento. Por sua vez, as instituições informais, que são os valores, normas e crenças do corpo docente dos programas de doutorado e mestrado, também atuam questionando e, em determinadas ocasiões, alterando essas políticas.

A principal variável da Capes, enquanto instituição formal, atuando na perspectiva top down, é o fato de possuir o enforcement, com suas consequentes sanções e restrições, traduzido na capacidade que ela tem de impor aos programas de pós-graduação em todo o território brasileiro que não cumprem as regras formais. Por enforcement entende-se neste trabalho que a Capes detêm uma posição de poder que lhe atribui com a capacidade de fazer com que os outros sigam suas regras. Do contrário, a instituição aplica uma penalidade, que pode ser a redução da nota do programa ou, mesmo, seu descredenciamento e sua consequente extinção.

Uma das questões que foi levantada pelos acadêmicos é o fato de que quando a norma, especialmente a norma escrita, não é objetiva, deixam-se margens para novas interpretações, como acontece com os Documentos de Área da Administração, Ciências Contábeis e Turismo. O cerne do debate é: Em que consiste a internacionalização de um programa? E como qualificá- la e quantificá-la? Podem-se apontar duas situações: uma positiva e outra negativa. O aspecto positivo prende-se à maior abertura para o entendimento da questão e, mesmo, certa liberdade para incluir novas variáveis e outras alternativas para o entendimento do que seria também considerado como parte do processo de internacionalização. Nesse sentido, a Capes, por adotar a avaliação por pares, demonstra a abertura para as opiniões a respeito da internacionalização, mesmo porque os indivíduos tem suas opiniões próprias, independentemente do posicionamento da Capes.

O aspecto negativo é não ter uma diretriz objetiva, o que gera maiores “custos transacionais”. Para Williamson (1995; 1996), os custos de transação dizem respeito ao dispêndio de recursos econômicos e humanos para planejar, adaptar e monitorar as interações entre os indivíduos, visando assegurar o cumprimento dos termos contratuais e garantir que isso ocorra de forma satisfatória para as partes envolvidas e compatível com sua funcionalidade

econômica (WILLIAMSON, 1995, 1996). No caso da existência de uma lacuna com relação às diretrizes objetivas sobre a internacionalização, isso gera custos transacionais para os programas, pois nem coordenadores nem o corpo docente sabem exatamente o que a Capes valorizará como fator de maior impacto na avaliação da internacionalização para o ranqueamento dos programas com notas 6 e 7. Outros aspectos negativos, apontados por 50% dos entrevistados, são as polêmicas e o desconforto que se criam no mundo acadêmico devido a essa falta de objetividade. Geram também, maior abertura para as reações contrárias e a mobilização daqueles programas que se sentirem prejudicados, acarretando pedidos de revisão e anulação do processo de avaliação, com o argumento de que ocorreram arbitrariedades.

Apesar desses desafios e das polêmicas que o processo de internacionalização causa, quando questionados sobre a possibilidade de retrocessos nesse sentido, ou seja, a internacionalização é um caminho sem volta? 100% dos entrevistados concordaram que sim. “A internacionalização veio para ficar”. (E1)